INGLÊS INSTRUMENTAL PARA A FORMAÇÃO DE LEITORES AUTÔNOMOS Cintia Camargo Furquim Caseiro UNOESTE – Universidade do Oeste Paulista, FACLEPP‐ Faculdade de Ciências, Letras e Educação de Presidente Prudente. E‐MAIL: cintiacf@unoeste.br RESUMO O ensino da Língua Inglesa é de grande importância. Muitos buscam cursos de Inglês Instrumental para serem capazes de ler textos em suas áreas de atuação. O curso de Inglês Instrumental trabalha a habilidade de leitura, focando o desenvolvimento de estratégias, vocabulário e gramática. Durante os meses de agosto, setembro e outubro do ano de 2011, um curso de Inglês Instrumental para um grupo de alunos interessados em ingressar em programas de Mestrado foi proposto com o objetivo de prepará‐los para um exame de proficiência linguística. O trabalho foi iniciado com resumos de artigos científicos simples e, posteriormente, textos mais complexos. Um questionário para testar os conhecimentos dos alunos em relação à língua foi aplicado. No final, um novo questionário foi respondido com o objetivo de medir a satisfação dos alunos. Os resultados foram muito satisfatórios com a aprovação da grande maioria dos alunos. Palavras‐chave: Inglês. Estratégias. Leitura. Autonomia. Habilidade. INTRODUÇÃO E OBJETIVO
O ensino da Língua Inglesa é de grande importância nos dias de hoje. Os meios de comunicação, a tecnologia, as produções científicas e as relações e trocas humanas apontam para a necessidade crescente da aprendizagem desta língua. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira para o 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental (1998) (PCNs), “a aprendizagem de Língua Estrangeira é uma possibilidade de aumentar a autopercepção do aluno como ser humano e como cidadão”. Neste sentido, a língua estrangeira faz parte do currículo da escola da rede oficial de ensino a partir do 6º ano (antiga 5ª série do Ensino Fundamental). Nas escolas da rede particular de ensino e em algumas da rede municipal, a língua estrangeira, em especial a Língua Inglesa, faz parte do currículo desde muito cedo, sendo inserida desde o 1º ano do Ensino Fundamental ou até antes disso.
No entanto, notamos que as línguas estrangeiras ainda encontram‐se deslocadas da escola, pois a maioria das pessoas busca a aprendizagem destas línguas em cursos particulares especializados. Aqueles que não o fazem chegam ao final do Ensino Médio com um conhecimento estrutural da língua estrangeira, em especial o Inglês, muito deficiente e com quase nenhuma competência comunicativa.
Ao se depararem com uma exigência prática do conhecimento do Inglês, seja no campo acadêmico, profissional, ou pessoal, as pessoas costumam buscar um curso simplificado e rápido
que possa suprir suas deficiências mais sérias, focando determinada habilidade (escrita, oral, de leitura ou de audição), dependendo de suas necessidades reais.
É muito comum a busca por cursos de Inglês Instrumental, já que grande parte das pessoas necessita ler textos relativos a suas áreas de atuação para estarem inseridos no mercado de trabalho.
O foco na leitura é inclusive justificado pelos PCNs de Língua Estrangeira quando o documento defende que uma pequena parcela da população tem a oportunidade de usar a língua estrangeira como instrumento de comunicação oral dentro ou fora do país. No entanto, é comum o contato com a Língua Inglesa escrita através de textos da internet, manuais, músicas, artigos científicos, entre outros.
O curso de Inglês Instrumental objetiva desenvolver estratégias de leitura, aumentar o vocabulário e ensinar a gramática da língua para que o aluno seja capaz de ler, compreender e traduzir textos em determinada área.
Note que não há uma preocupação com o desenvolvimento das habilidades oral e de audição e, mesmo no que se refere à gramática, devem‐se enfatizar somente as estruturas mais recorrentes nos textos com os quais o aluno tem contato. O vocabulário a ser trabalhado também será determinado a partir dos textos selecionados.
Trata‐se de um recorte bem delimitado e claro da língua ensinada e, por isso, são cursos rápidos e práticos que instrumentalizam o aluno para que o mesmo possa continuar sua trajetória de leitor de forma autônoma.
Tal autonomia é um fim ao qual só se chega se houver intenção por parte do aprendiz. Ele deve fazer auto avaliações constantes para perceber que estratégias utiliza e quais sente mais dificuldade em aplicar. Segundo Carrel (1989), a metacognição, que pode ser definida como o pensar sobre o pensar, tem um papel vital no processo de leitura.
O aprendiz deve, também, estar disposto a aplicar tais estratégias sempre que se deparar com situações de leitura na língua estrangeira, além de trabalhar continuamente com o vocabulário específico para que seu nível lexical esteja sempre crescendo.
Ainda de acordo com os PCNs, para que o aluno possa construir significados e conhecimentos, ele utiliza ou ativa três tipos de conhecimento: conhecimento de mundo, conhecimento da organização textual e conhecimento sistêmico. Tais conhecimentos devem ser explorados, ativados e extrapolados durante as atividades de leitura.
O conhecimento de mundo se refere ao conhecimento que as pessoas têm sobre as coisas do mundo que as cerca, conhecimentos estes, construídos ao longo de suas experiências de vida.
O conhecimento de organização textual, também chamado de intertextual, diz respeito ao que as pessoas sabem sobre diferentes tipos ou gêneros de textos orais e escritos.
O conhecimento sistêmico se refere à língua especificamente. Trata‐se dos conhecimentos léxico‐semânticos (vocábulos e seus significados), morfológicos, sintáticos e fonético‐fonológicos.
A necessidade de se resgatar e desenvolver os conhecimentos citados acima é corroborada pela definição de leitura de Anthony, Pearson e Raphael (1993, p.284), pois para tais estudiosos “leitura é o processo de construção de significado através da interação dinâmica entre o conhecimento existente do leitor, a informação sugerida pela linguagem escrita, e o contexto da situação de leitura”.
O professor do curso de Inglês Instrumental deve, portanto, selecionar textos adequados às necessidades dos alunos e, a partir deles, propor atividades de pré‐leitura, leitura e pós‐leitura bem elaboradas, sem perder de vista as estratégias que deseja desenvolver. O planejamento é, portanto, de extrema importância.
De acordo com um estudo de caso feito por Richards (1990) sobre um professor de leitura eficiente, constatou‐se que o mesmo tinha bom conhecimento teórico sobre a leitura em língua estrangeira e, principalmente, objetivos claros bem estabelecidos no planejamento do curso.
As questões de pré‐leitura devem chamar a atenção do aluno para a apresentação gráfica do texto e seus elementos, tais como o título, os subtítulos, as figuras, as legendas das figuras, a fonte, entre outros. É importante trabalhar com a capacidade que o aluno tem de fazer previsões sobre o assunto, partindo dos conhecimentos que ele já traz.
O trabalho de leitura é realizado por partes. É adequado propor uma primeira leitura ininterrupta com o objetivo de checar se as previsões dos alunos podem ser confirmadas ou não. Tal leitura é chamada de SKIMMING e não tem foco na tradução do texto. Uma segunda leitura mais detalhada (SCANNING) deve, então, ser proposta com o objetivo de buscar informações específicas, responder questões propostas, identificar palavras cognatas (parecidas com a nossa língua) ou palavras conhecidas. É interessante, ainda, focar a compreensão de cada parágrafo, explorando o conhecimento sistêmico do aluno e incentivando a estratégia da dedução dos significados de palavras a partir do contexto, pois, segundo Paran (1996, p.29), quando lendo um texto em língua estrangeira, os leitores tendem a se apoiar no contexto e na previsão porque eles precisam “compensar a falta de uma boa habilidade lingüística”.
Se for o caso, a tradução pode ser realizada a partir deste momento. Deve‐se mostrar aos alunos que é necessário delimitar um período, um trecho curto. Não se pode traduzir palavra por
palavra já que a ordem das palavras é diversa na língua Inglesa. Além disso, é importante atentar para as expressões que não podem ser traduzidas literalmente.
Outro aspecto importante é o de se relacionar idéias e conhecimentos para que o repertório lingüístico, cultural, social e histórico do aluno cresça a cada trabalho. Geralmente este trabalho é realizado durante as atividades de pós‐leitura.
Nota‐se, portanto, que o trabalho desenvolvido nas aulas pode variar muito. De acordo com Jansen (1996), as estratégias de leitura compreendem desde a releitura de uma parte difícil do texto e da dedução de um significado com base no contexto até resumos e relações das informações com o conhecimento anterior do aluno.
O objetivo da presente pesquisa foi avaliar a eficácia de um curso de Inglês Instrumental desenhado e aplicado dentro dos moldes defendidos pelos PCNs e por teóricos da área.
Durante os meses de agosto, setembro e outubro do ano de 2011, o curso de Inglês Instrumental foi proposto e aplicado a um grupo de alunos interessados em ingressar em programas de Mestrado em Agronomia e Ciência Animal de Instituições públicas e privadas do Estado de São Paulo, com o objetivo de prepará‐los para o exame de proficiência linguística.
METODOLOGIA
Trata‐se de uma pesquisa‐ação em que a pesquisadora realiza a ação de delinear e aplicar um curso de Inglês Instrumental com base nos estudos realizados na área e na visão sociointeracional pregada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira (1998) que norteiam o desenvolvimento da habilidade de leitura nas salas de aula atualmente.
O curso foi projetado e oferecido de forma independente e particular pela pesquisadora a um grupo de seis alunos sem nenhuma relação com um programa de mestrado específico. Os alunos eram todos docentes de uma universidade onde a pesquisadora também ministra aulas.
Foram marcados dois encontros semanais de uma hora cada, durante 10 semanas.
O trabalho foi iniciado com abstracts (resumos de artigos científicos) simples e foi avançando em termos de complexidade.
No início dos trabalhos, um questionário para testar os conhecimentos e experiências dos alunos em relação à Língua Inglesa foi aplicado. Além disso, houve questionamentos sobre a postura dos alunos envolvidos enquanto leitores em língua estrangeira. Era importante saber se os estudantes tinham consciência de como agiam e como pensavam quando se deparavam com textos escritos em outro idioma.
Durante as aulas, um texto era lido com a minha intervenção e um outro era enviado como tarefa para ser lido em casa com a observância das estratégias trabalhadas em sala.
No final, um novo questionário foi respondido com o objetivo de medir a satisfação dos alunos com o curso realizado e para que os mesmos pudessem se auto‐avaliar.
Todos os dados coletados (respostas aos questionários, resultados de interpretações em sala e exercícios de tradução realizados, além dos resultados dos exames de proficiência que os alunos obtiveram nos programas em que se candidataram) foram analisados com relação às seguintes categorias de análise: a) conhecimento linguístico e experiências passadas dos alunos quanto à Língua Inglesa; b) desenvolvimento de estratégias; c) resultados práticos obtidos.
RESULTADOS
Dos seis alunos que deram início ao curso, somente um deles já havia estudado Inglês em escolas de línguas enquanto criança, os outros só haviam tido aulas de Inglês na escola regular. Três deles haviam estudado em escolas da rede particular de ensino, os outros três haviam estudado em escolas da Rede Oficial. Todos eles mostraram muitas dificuldades com aspectos gramaticais básicos como os tempos presente, passado e futuro, os pronomes pessoais e os artigos. Em termos de vocabulário, um deles mostrou mais conhecimento em relação ao vocabulário específico elencado no questionário, apresentando 12 acertos entre 20. Tal aluno acrescentou nos comentários que procurava ler textos em Inglês na área com freqüência. Todos os outros tiveram menos de 6 acertos.
Nenhum deles parecia muito consciente das estratégias usadas no momento da leitura, mostrando que não atentavam para este aspecto. Quatro deles mostraram certa ansiedade ao confessarem que, ao se depararem com textos em Inglês, partiam para a tradução imediata das palavras sem buscar uma compreensão geral.
O primeiro texto foi aplicado sem a intervenção da pesquisadora com o objetivo de testar os alunos quanto às estratégias. Ao serem questionados, concluíram que não observaram a organização textual e não exploraram os elementos do texto de forma adequada.
Os vocábulos chave e específicos importantes eram anotados no caderno e os alunos deveriam estudá‐los com freqüência. Eles percebiam que seu vocabulário aumentava e se sentiam muito satisfeitos quando se deparavam com palavras que já conheciam.
Quanto à gramática, foram desenvolvidos apenas pontos estratégicos para a interpretação dos textos de forma pouco aprofundada. A gramática funcionava como um caminho e não um fim. Os alunos percebiam que as explicações eram práticas e aplicáveis imediatamente. Não mostravam
ansiedade ou desmotivação, comuns em cursos com foco no desenvolvimento de longas e complexas regras gramaticais.
A partir da quinta semana de curso, notamos que os resultados obtidos pelos alunos eram cada vez mais satisfatórios, o que podia ser corroborado pelo retorno que davam nas tarefas e também pessoalmente em conversas informais.
Ao responderem o questionário final, afirmaram que se sentiam menos ansiosos, que estavam mais atentos à forma como liam e às estratégias aplicadas.
Cinco dos alunos passaram nos exames de proficiência dos programas de Mestrado em que haviam se candidatado. Ao me informarem sobre as notas obtidas pelos mesmos, pude concluir que as melhores notas foram conseguidas pelos que frequentavam as aulas regularmente e sempre realizavam as atividades propostas como tarefa.
DISCUSSÃO
Quanto ao conhecimento linguístico e experiências passadas dos alunos quanto à Língua Inglesa, verificamos que pouco conhecimento da língua foi acumulado pelos alunos durante sua vida escolar, o que pode sugerir o quanto a disciplina Inglês encontra‐se deslocada tanto na rede particular quanto oficial de ensino. Os alunos de forma geral não percebem a importância da disciplina que é tratada quase como uma atividade extracurricular.
Mesmo com relação à gramática – aspecto mais trabalhado nas aulas tradicionais de Língua Inglesa nas escolas – pouco conhecimento foi observado. Os alunos mostravam inclusive desconhecimento de pontos gramaticais repetidamente trabalhados na escola como o verbo “to be”.
No tocante ao desenvolvimento de estratégias, observamos que as mesmas também não pareciam ter sido trabalhadas previamente com os alunos durante sua vida escolar. Eles afirmaram que não atentavam para as estratégias que utilizavam no momento da leitura e mostraram certa dificuldade para seguirem os passos determinados dentro dos momentos de pré‐leitura, leitura e pós‐leitura, passando para a tradução do texto imediatamente. Tal fato mostra o quanto o trabalho da leitura geralmente negligencia a compreensão e o desenvolvimento da autonomia, restringindo seu objetivo à tradução pura e simples.
O desenvolvimento de estratégias como a ênfase às palavras cognatas e conhecidas, a inferência quanto ao significado das palavras e a construção de um glossário da área específica são muito eficazes, mas necessitam ser bem explicadas, discutidas e frequentemente aplicadas para que se tornem práticas automáticas no momento da leitura em língua estrangeira.
Já no que se refere aos resultados práticos obtidos, ficou claro que o empenho do aluno é de extrema importância para que o mesmo atinja bons resultados. A construção da habilidade de leitura depende da prática constante aliada à ampliação do vocabulário específico e dos pontos gramaticais importantes dentro do gênero trabalhado – no caso os artigos científicos.
CONCLUSÃO
Diante dos dados analisados e discutidos acima, consideramos que os objetivos foram atingidos, pois, além de os resultados práticos terem sido muito significativos com a aprovação de 5 dos 6 alunos do curso, também pudemos perceber uma melhora significativa com relação às habilidades dos alunos como leitores durante o processo.
Acreditamos, também, que o sucesso foi alcançado porque havia um objetivo claro compartilhado pelos alunos e pelo professor, um caminho pré‐estabelecido flexível e um contínuo exercício de auto‐avaliação realizado pelo docente, que continuamente repensava sua prática e as atividades propostas, e pelos discentes, o que possibilitava a conscientização dos mesmos quanto à importância da realização das tarefas com a observância das estratégias trabalhadas. REFERÊNCIAS ANTHONY, H.M., PEARSON, P.D., e RAPHAEL, T.E. Reading Comprehension: a selected review. New York: MacGraw‐Hill, 1993. BRASIL. MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Estrangeira, Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria da Educação Fundamental, Brasília: 1998. CARREL, P.L. Can Reading Strategies Be Successfully Taught? ARAL, 21 (I), 1‐20, 1998. JANSEN, J. Teaching Strategic Reading. TESOL Journal, 6 (I), 6‐9, 1996. PARAN, A. Reading in EFL: facts and fiction. ELT Journal, 50 (I), 25‐34, 1996. PERRENOUD, P. Construir as Competências desde a Escola. Porto alegre: ARTMED, 1999. RICHARDS, J.C. The Language Teaching Matriz. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.