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VI - LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

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Academic year: 2021

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VI - LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

(O texto abaixo foi extraído de: SEVERINO, Antônio Joaquim. Diretrizes para a Leitura, Análise e Interpretação de Textos. In: Metodologia do Trabalho Científico. 21. ed. São Paulo: Cortez, 2000.)

ANÁLISE TEMÁTICA

“De posse dos instrumentos de expressão usados pelo autor, do sentido unívoco de todos os conceitos e conhecedor de todas as referências e alusões utilizadas por ele, o leitor passará, numa segunda abordagem, à etapa da compreensão da mensagem global veiculada na unidade.

A análise temática procura ouvir o autor, apreender, sem intervir nele, o conteúdo de sua mensagem. (p. 53) Praticamente, trata-se de fazer ao texto uma série de perguntas cujas respostas fornecem o conteúdo da mensagem.

Em primeiro lugar busca-se saber do que fala o texto. A resposta a esta questão revela o tema ou assunto da unidade. Embora aparentemente simples de ser resolvida, essa questão ilude muitas vezes. Nem sempre o título da unidade dá uma idéia fiel do tema. Às vezes apenas o insinua por associação ou analogia; outras vezes não tem nada que ver com o tema. Em geral, o tema tem determinada estrutura: o autor está falando não de um objeto, de um fato determinado, mas de relações variadas entre vários elementos; além dessa possível estruturação, é preciso captar a perspectiva de abordagem do autor: tal perspectiva define o âmbito dentro do qual o tema é tratado, restringindo-o a limites determinados.

Avançando um pouco mais na tentativa da apreensão da mensagem do autor, capta-se a problematização do tema, porque não se pode falar coisa alguma a respeito de um tema se ele não se apresentar como um problema para aquele que discorre sobre ele. A apreensão da problemática, que por assim dizer ‘provocou’ o autor, é condição básica para se entender devidamente um texto, sobretudo em se tratando de textos filosóficos.

Pergunta-se, pois, ao texto em estudo: como o assunto está problematizado? Qual dificuldade deve ser resolvida? Qual o problema a ser solucionado? A formulação do problema nem sempre é clara e precisa no texto, em geral é implícita, cabendo ao leitor explicitá-la.

Captada a problemática, a terceira questão surge espontaneamente: o que o autor fala sobre o tema, ou seja, como responde à dificuldade, ao problema levantado? Que posição assume, que idéia defende, o que quer demostrar? A resposta a esta questão revela a idéias central, proposição fundamental ou tese: trata-se sempre da idéias mestra, da idéia principal defendida pelo autor naquela unidade. Em geral, nos textos logicamente estruturados, cada unidade tem sempre uma única idéia central, todas as demais idéias estão vinculadas a ela ou são apenas paralelas ou complementares. Daí a percepção de que ela representa o núcleo essencial da mensagem do autor e a sua apreensão torna o texto inteligível. Normalmente, a tese deveria ter formulação expressa na introdução da unidade, mas isto não ocorre sempre, estando, às vezes, difusa no corpo da unidade. (p. 54)

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Na explicitação da tese sempre deve ser usada uma proposição, uma oração, um juízo completo e nunca apenas uma expressão, como ocorre no caso do tema.

A idéia central pode ser considerada inicialmente como uma hipótese geral da unidade, pois que é justamente essa idéia que cabe à unidade demonstrar mediante o

raciocínio. Por isso, a quarta questão a se responder é: como o autor demonstra sua

tese, como comprova sua posição básica? Qual foi o seu raciocínio, a sua argumentação?

É através do raciocínio que o autor expões, passo a passo, seu pensamento e transmite sua mensagem. O raciocínio, a argumentação, é o conjunto de idéias e proposições logicamente encadeadas, mediante as quais o autor demonstra sua posição ou tese. Estabelecer o raciocínio de uma unidade de leitura é o mesmo que reconstituir o processo lógico, segundo o qual o texto deve ter sido estruturado: com efeito, o raciocínio é a estrutura lógica do texto.

A esta altura, o que o autor quis dizer de essencial já foi apreendido. Ocorre, contudo, que os autores geralmente tocam em outros temas paralelos ao tema central, assumindo outras posições secundárias no decorrer da unidade. Essas idéias são como que intercaladas e não são indispensáveis ao raciocínio, tanto que poderiam ser até eliminadas sem truncar a seqüência lógica do texto. Associadas às idéias secundárias, de conteúdo próprio e independente, completam o pensamento do autor: são subtemas e subteses.

Para levantar tais idéias, basta ler o texto perguntando se a unidade ainda é questão de outros assuntos.

Note-se que é esta análise temática que serve de base para o resumo ou síntese de um texto. Quando se pede o resumo de um texto, o que se tem em vista é a síntese das idéias do raciocínio e não mera redução dos parágrafos. Daí poder o resumo ser escrito com outras palavras, desde que as idéias sejam as mesmas do texto.

É também esta análise que fornece as condições para se construir tecnicamente um roteiro de leitura como, por exemplo, o resumo orientador para seminários e estudo dirigido.” (p. 55)

EXEMPLO:

RÁPIDA UTOPIA

Antes de encerrar esta seção de prognósticos para os próximos anos, seria interessante refletir sobre os significados do século que agora se encerra. Afinal, é do passado que retiramos boa parte da inspiração necessária para planejar o mundo que desejamos.

Ação a distância, velocidade, comunicação, linha de montagem, triunfo das massas, Holocausto: por meio das metáforas e das realidades que marcaram o século XX, aparece a verdadeira doença do progresso...

O último século talvez tenha sido o menos hipócrita que os anteriores. Ele enunciou regras de convivência; certamente as violou, mas moveu e move processos públicos contra essas violações. Se isso não impede que elas se repitam, ao menos teve influência sobre nosso comportamento cotidiano e sobre as probabilidades de um

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grande número de cidadãos, sobretudo no mundo ocidental, viver por mais tempo, evitando abusos de poder de toda ordem.

Hoje posso andar pela rua sem me fazer matar por alguém que queira manter sua trajetória na mesma calçada que a minha, e sei que meus filhos não receberão cacetadas do filho de um duque como meio de aprendizagem do poder. Indivíduos prepotentes tentam ainda hoje expulsar uma mulher negra do ônibus, mas a opinião pública os condena: há apenas dois séculos, teríamos pensado em agir como honestos cidadãos se tivéssemos investido uma parte de nosso pecúlio numa empresa que teria vendido essa mulher como escrava aos Estados Unidos.

O século XX é também o da aceleração tecnológica e científica, que se operou e continua a se operar em ritmos antes inconcebíveis. Foram necessários milhares de anos para passar do barco a remo à caravela ou da energia eólica ao motor de explosão; e em algumas décadas se passou do dirigível ao avião, da hélice ao turborreator e daí ao foguete interplanetário.

Mas as conquistas tecnológicas estão intimamente ligadas ao fato de ter sido, nesse século, que a humanidade colocou mais diretamente em questão a sobrevivência do planeta. Um excelente químico pode imaginar um excelente desodorante, mas não possui o conhecimento que lhe permite saber que seu produto irá fazer um buraco na camada de ozônio.

Vivemos no tempo da linha de montagem, no qual cada indivíduo conhece apenas uma fase do trabalho. Privado da satisfação de ver o produto acabado, cada um é também liberado de qualquer responsabilidade. Podem-se produzir, e isso ocorre com freqüência, venenos sem que isso seja percebido. A vantagem da linha de montagem é permitir a fabricação de aspirinas em quantidade para o mundo todo. E rápido. Mas a outra face disso é que se pode destruir o mundo em apenas um dia.

O século XX é o da comunicação instantânea. Hernán Cortez pôde destruir uma civilização e, antes que a notícia se espalhasse, teve tempo para encontrar justificativas para seu empreendimento. Hoje, os massacres da praça da Paz Celestial, em Pequim, tornam-se atualidades no mesmo momento em que se desenrolam e provocam a reação de todo o mundo civilizado. Mas informações simultâneas em excesso, provenientes de todos os pontos do globo, produzem um hábito. O século da comunicação transformou a informação em espetáculo. Arriscamo-nos a confundir a todo instante a atualidade e o divertimento.

Ciência, tecnologia, comunicação, ação a distância, princípio da linha de montagem: tudo isso tornou possível o Holocausto. A perseguição racial e o genocídio não foram uma invenção do século XX, mas o que a torna terrível em nosso tempo é o fato de o genocídio nazista ter sido rápido, tecnologicamente eficaz e ter buscado o consenso, servindo-se das comunicações de massa e do prestígio da ciência. O século XX soube fazer do melhor de si o pior de si. Tudo o que aconteceu de terrível a seguir não foi senão repetição, sem grande inovação.

O século do triunfo tecnológico foi também o da descoberta da fragilidade. Um moinho de vento podia ser reparado, mas o sistema do computador não tem defesa diante da má intenção de um garoto precoce. Os tempos andam estressados, porque não se sabe de quem se deve defender nem como: somos demais poderosos para poder evitar nossos inimigos. Encontramos o meio de eliminar a sujeira, mas não de

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eliminar os resíduos. Porque sujeira nascia da indigência, que podia se reduzida, ao passo que os resíduos (inclusive os radioativos) nascem do bem-estar que ninguém quer mais perder. Eis por que o século XX é o da angústia e da utopia de curá-la. Espaço, tempo, informação, crime, castigo, arrependimento, absolvição, indignação, esquecimento, descoberta, crítica, nascimento, longa vida, morte... tudo em altíssima velocidade. A um ritmo de estresse. O século XX é o do enfarte.

( Adaptado de : ECO, Umberto. Rápida Utopia. Veja 25 anos, reflexões para o futuro. São Paulo: Abril, s.d. p.108)

Tema → Transformação do desenvolvimento tecnológico e científico em uma doença do progresso.

Problema → Como o desenvolvimento tecnológico e o científico podem ameaçar a sobrevivência do planeta?

Tese → Na linha de montagem, o indivíduo conhece apenas uma fase do trabalho, é privado da satisfação de ver o produto pronto e liberado de responsabilidade, pois não possui conhecimento para saber que seu produto pode prejudicar a sobrevivência do planeta.

Argumentação → Venenos são produzidos sem que isso seja percebido

→ A comunicação permite que os fatos sejam conhecidos simultaneamente a sua ocorrência, mas transformou a informação em espetáculo.

→ O genocídio nazista foi rápido, tecnologicamente eficaz e buscou o consenso, servindo-se das comunicações de massa e do prestígio da ciência.

→ Descoberta da fragilidade: não se sabe de quem se deve defender nem como.

→ Encontramos o meio de eliminar a sujeira, mas não de eliminar os resíduos.

Síntese do texto:

Em Rápida Utopia, Umberto Eco discute a transformação do desenvolvimento tecnológico e científico, através da ação do próprio ser humano, como sendo uma doença do progresso.

A humanidade, no século XX, passa a questionar como o desenvolvimento tecnológico e o científico podem ameaçar a sobrevivência do planeta. O autor, então, defende a seguinte idéia: a linha de montagem, ao exigir indivíduos especializados em uma única função, priva o trabalhador do prazer de ver o produto pronto e isenta-o de respisenta-onsabilidades, pisenta-ois isenta-o trabalhadisenta-or (que perdeu sua cisenta-onsciência) nãisenta-o pisenta-ossui conhecimento para saber que a fabricação do seu produto pode prejudicar a sobrevivência do planeta.

Os fatos ocorridos no século XX comprovam a tese do autor, visto que venenos foram produzidos, em quantidade e rapidez, sem que essa prática fosse notada. No entanto, a comunicação de um fato tornou-se instantânea a produção excessiva de notícias transformou a informação em espetáculo, as pessoas já não sabem distinguir o que é atualidade do que é divertimento. Tragédias, como o genocídio nazista, foram

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rápidas e eficientes porque fizeram uso da tecnologia e do prestígio da ciência. O ser humano, no auge de seu poder, descobriu a fragilidade, pois não sabe de quem deve defender-se e nem como, ou seja, não sabe quem é o inimigo. São descobertos meios para acabar com a sujeira, mas o que fazer com os resíduos? Os resíduos são conseqüência do bem-estar promovido pela tecnologia e ninguém quer abrir mão dele.

As pessoas vivem a angústia da destruição do planeta, mas têm a esperança de que soluções sejam encontradas. O ritmo de vida está cada vez mais estressado, por isso, o século XX é o século do enfarto.

Referências

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