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PRINCIPIOS PEDAGOGICOS NA ED DE JOVENS E ADULTOS

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Academic year: 2021

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Ivanilde Apoluceno de Oliveira( )

Resumo

Neste texto refletimos sobre os princípios pedagógicos na educação de jovens e adultos, tendo como referência no âmbito legal, documentos oficiais como a Constituição Federal de 1988,

a Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e as Diretrizes Curriculares

Nacionais contidas no Parecer CEB 11/2000 e Resolução CNE/CEB 1/2000. No campo educativo utilizamos como referência os aportes teórico-metodológicos do pensamento educacional de Paulo Freire. Centralizamos as nossas reflexões em torno de três questões: Quem são os/as alunos/as atendidos na Educação de Jovens e Adultos? Por quê educá-los? Como educá-los?

Palavras-chaves: Educação de Jovens e Adultos; Princípios Pedagógicos; Legislação

Princípios Pedagógicos

Para definirmos alguns princípios pedagógicos na Educação de Jovens e Adultos é preciso refletirmos sobre três questões fundamentais: quem são os jovens e adultos atendidos por essa modalidade de ensino? Por quê educá-los? Como educá-los?

Quem são os/as alunos/as da Educação de Jovens e Adultos?

Em relação às pessoas atendidas na Educação de Jovens e Adultos, identificamos três

especificidades: a etária, a sociocultural e a ético-política.

ƒEtária (Não-Infância):

A educação de jovens e adultos apresenta uma especificidade etária porque tem o olhar para jovens, adultos e idosos, que não tiveram acesso à escola, na faixa etária da chamada escolarização (dos 07 aos 14 anos) ou foram «evadidos» ou «expulsos» da escola. Não são crianças, mas pessoas jovens, adultas e idosas com experiência de vida e profissional.

1 Doutora em Educação: Currículo pela PUC-SP. Mestra em Educação pela UFPb. Professora Titular da

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Existe uma complexidade nesta especificidade etária que precisa ser considerada. No âmbito das práticas pedagógicas há diferenças de interesses, de motivações e de atitudes face ao processo educacional entre os jovens, os adultos e os idosos.

O jovem tem um olhar para o futuro. Na transição da infância para a fase adulta está ligado às inovações tecnológicas, aos modismos dos meios de comunicação, ou seja, às mudanças que ocorrem no mundo. O adulto está interessado na vida profissional, em ser inserido no mercado de trabalho, olhando para a sua situação de vida presente. O idoso busca ser cidadão, viver a sua vida em sociedade sendo respeitado como pessoa e pelo seu passado, pela sua história de vida. Almeja viver na sociedade com dignidade.

ƒSociocultural:

A educação de jovens e adultos apresenta uma especificidade sociocultural, na medida em que concentra suas atividades educativas predominantemente em determinados grupos de pessoas de uma determinada classe social e cultural, ou seja, jovens, adultos e idosos de uma classe economicamente baixa. De modo geral, são trabalhadores assalariados, do mercado informal ou do campo, que lutam pela sobrevivência na cidade ou no interior, apresentando em relação à escola uma desconfiança, por não terem tido acesso à escola ou já terem sido evadidos. Jovens, adultos e idosos «marginalizados» pelo sistema econômico - social, vistos como «analfabetos» e muitas vezes considerados «incapazes de aprender».

Segundo OLIVEIRA:

O adulto, no âmbito da educação de jovens e adultos, não é o estudante universitário, o profissional qualificado que freqüenta cursos de formação continuada ou de especialização (...) Ele é geralmente o migrante que chega às grandes metrópoles proveniente de áreas rurais empobrecidas, filho de trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muito freqüentemente analfabetos), ele próprio com uma passagem curta e não sistemática pela escola e trabalhando em ocupações urbanas não qualificadas, após experiência no trabalho rural na infância e na adolescência, que busca a escola tardiamente para alfabetizar-se ou cursar algumas séries do ensino supletivo (1999, p.59).

ƒÉtico-política:

A educação de jovens e adultos também se caracteriza por uma especificidade

ético-política, porque está no centro da relação de poder existente entre os escolarizados e

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através de representações e práticas discriminatórias e excludentes. E também porque as pessoas rotuladas de «burras», «mobral», etc., manifestam um «sofrimento ético-político»(2)

de injustiça perante os escolarizados e um sentimento de inferioridade e de incompetência, inclusive com a perda da auto-estima frente a sua família e ao seu grupo social.

O sofrimento ético-político retrata a vivência cotidiana das questões sociais dominantes de cada época histórica, especialmente a dor que surge da situação social de ser tratado como inferior, subalterno, sem valor, apêndice inútil da sociedade (SAWAIA, 1999, p.104).

Assim, para compreendermos a Educação de Jovens e Adultos precisamos saber as suas especificidades em relação a quem são os jovens, adultos e idosos atendidos por essa modalidade de educação. Devemos ter consciência de sua condição de «pessoas humanas» e de sua condição social: «não-crianças», «excluídos» e «membros de determinados grupos e classes sociais». Torna-se, ainda necessário, considerar-se os jovens, os adultos e os idosos em suas situações concretas existenciais, sociais, econômicas e políticas.

Por quê educar o jovem e o adulto?

A sociedade contemporânea regida pela lógica da racionalização dos recursos financeiros focaliza o olhar para a educação da criança e não para os adultos e os idosos. Há uma racionalização do tempo de trajetória escolar por idade, estabelecendo-se a faixa etária escolarizável, para a educação básica dos 07 aos 14 anos.

Esse olhar para a criança e não para o adulto está pautado em duas representações: 1) Uma visão essencialista de mundo que pressupõe a criança estar em processo de

desenvolvimento físico, racional, moral e social, enquanto o adulto já está pronto em seu desenvolvimento bio-psico-social.

2) Uma visão pragmática de mundo, de caráter utilitarista, que considera a educação de adultos inútil, porque eles já viveram a vida toda sem serem alfabetizados. Desta forma o tempo considerado para a aprendizagem é a infância, que tem uma perspectiva de futuro (ser produtor na sociedade) e na fase adulta esse tempo de preparação

2 Conceito usado por SAWAIA (1999, p.11) para «incorporar a ética, a felicidade e o humano como critérios que

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para o futuro já passou. E, quem não teve acesso à escola ou não concluiu sua trajetória escolar nessa faixa etária, passa a ter dificuldades em iniciar ou prosseguir os seus estudos.

A atenção do sistema educacional é para a criança considerada em processo de desenvolvimento bio-psico-social e com perspectiva de futuro. O adulto é secundarizado pelo sistema educacional porque é considerado como pronto em seu desenvolvimento bio-psico-social e sem perspectivas de futuro.

Esse olhar essencialista e utilitarista da educação em relação ao adulto é questionado por Freire que analisa a educação a partir do significado de «sujeito» expresso através de

aportes teóricos filosófico-antropológicos, epistemológicos e ético-políticos(3). 1) Aporte Filosófico-antropológico:

O ser humano é um «ser de busca». É um ser «inconcluso», inacabado e incompleto, que por perceber “que não sabe tudo”, busca o saber, o conhecimento e o seu aprimoramento enquanto humano. Por saber-se inacabado é que busca a perfeição.

2) Aporte Epistemológico:

O ser humano é um «corpo consciente», cuja consciência é «intencionada ao mundo; consciência de algo» (de si e do mundo), pressupondo que a consciência se constitui através da intenção à realidade objetiva, em uma dimensão dinâmica, na medida em está direcionada ao mundo para captá-lo, objetivá-lo e transformá-lo. O ser humano «está no mundo e com o mundo».

A consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de busca (...) É neste sentido que, para mulheres e homens, estar no mundo necessariamente significa estar com o mundo e com os outros (FREIRE, 1997, p. 64).

O ser humano é «sujeito gnosiológico», porque em suas relações uns com os outros no mundo e com o mundo conhecem e comunicam-se sobre o objeto conhecido. Nesta relação comunicativa ensaiam a experiência de assumirem-se como seres sociais e históricos, como seres pensantes, comunicantes, transformadores, criadores e realizadores de sonhos. Assumirem-se como sujeitos implica na não negação ou exclusão do outro.

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Para FREIRE (1997, p. 46), «a assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros. É a "outredade" do "não-eu" ou do "tu", que me faz assumir a radicalidade de meu

eu».

Ao afirmar que ninguém sabe tudo e tampouco ninguém é ignorante de tudo, colocando o conhecimento num processo dialético e de constante superação, Freire pressupõe uma relativização no processo de conhecimento.

O ser humano é um «sujeito que se comunica e dialoga com o outro». Na visão de Freire o diálogo e a comunicação são fatores primordiais da relação humana e a condição para o ser humano formar-se como pessoa.

O diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso histórico do caminho para nos tornarmos seres humanos (FREIRE e SHÖR, 1986, p.122;123).

O diálogo é o momento em que homens e mulheres se encontram para refletir sobre sua realidade, sobre o que sabem e o que não sabem, como sujeitos conscientes e comunicativos que são. Além da dimensão existencial o diálogo em Freire apresenta um caráter ético-político, ao possibilitar ao outro, aos oprimidos a «dizerem sua palavra» expressando seu pensamento, suas opções e seu modo de ser.

Foi exatamente porque nos tornamos capazes de dizer o mundo, na medida em que o transformávamos, em que o reiventávamos, que terminamos por nos tornar ensinantes e aprendizes. Sujeitos de uma prática que se veio tornando política, gnosiológica, estética e ética (FREIRE, 1993b, p.19).

3) Aporte Ético-Político:

O ser humano é um «ser de relações» ( reflexivo, conseqüente, transcendente e temporal), que estabelece uma relação dialética homem-mundo.

É um ser «concreto», que existe no mundo e com o mundo, enquanto “corpo

consciente”, cuja consciência é intencionada para fora de si, para um mundo que não é mero

objeto de contemplação, mas tem a marca de sua ação. Nesta relação com o mundo o ser humano é concebido como «ser de práxis» (reflexão-ação) e, assim como o mundo, é também compreendido como «histórico-cultural», «na medida em que, ambos inacabados, se encontram numa relação permanente, na qual o homem, transformando o mundo, sofre os efeitos de sua própria transformação» (FREIRE, 1980, p.76).

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Para Freire, mulheres e homens situados em um contexto histórico-social estabelecem relações dialéticas com os outros seres, sendo capazes de refletir sobre a sua própria realidade fazendo-a objeto de seus conhecimentos bem como de transformá-la.

O ser humano é, naturalmente, um ser da intervenção no mundo à razão de que faz a História. Nela, por isso mesmo, deve deixar suas marcas de sujeito e não pegadas de puro objeto (FREIRE, 2000, p. 119).

O ser humano é um «sujeito que pergunta e problematiza a realidade». O perguntar faz parte do processo de existir humano, sendo fundamental para a sua compreensão e formação. A

pergunta como parte do existir humano está vinculada à curiosidade, à problematização de

homens e mulheres sobre si mesmo e sobre a realidade social, à sua formação humana, ética e política e à relação dialógica entre os seres humanos. O ser humano, portanto, problematiza a si mesmo.

O ato de perguntar, instigado pela curiosidade eminentemente humana, faz parte da construção de sua autonomia, como sujeito.

A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não haverá criticidade sem a curiosidade que nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando algo a ele que fazemos (FREIRE, 1997, p.35).

Além do existencial o ato de perguntar caracteriza-se como político, porque o perguntar é um ato democrático. Permite ao outro contestar, optar e dizer a sua palavra, não aceitando o saber feito, as respostas prontas, possibilitando-lhe ser sujeito e assumir o risco de sua intervenção.

O ser humano é um «sujeito histórico-social, ético, político e cultural». «Sujeito de escolhas (opções) e de decisões». Freire pressupõe que homens e mulheres possuem capacidade de pensar, de conjeturar, de criticar, de comparar, de escolher, de decidir, de projetar e sonhar uma nova sociedade.

Assim, o ser humano consciente de seus condicionamentos sociais, mas não fatalisticamente submetido aos destinos estabelecidos, abre o caminho à sua intervenção no mundo. A escolha e a decisão são atos ético-políticos do sujeito.

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Que a nossa presença no mundo, implicando escolha e decisão, não seja uma presença neutra. A capacidade de observar, de comparar, de avaliar para, decidindo, escolher, com o que, intervindo na vida da cidade, exercemos nossa cidadania, se erige então como uma competência fundamental. Se a minha não é uma presença neutra na história, devo assumir tão criticamente quanto possível sua politicidade. Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas para participar de práticas com ela coerentes (FREIRE, 2000:33).

Na visão de Freire, a consciência crítica torna-se um processo “libertador”, pois exercitando a práxis (reflexão-ação), os seres humanos se descobrem como pessoas e, deste modo, o mundo, os homens e as mulheres, a cultura e o trabalho assumem o seu verdadeiro significado. O processo de desvelamento crítico da realidade realizado entre mulheres e homens em sua relação de comunicação consiste na conscientização. Pelo exercício da práxis homens e mulheres se descobrem pessoas situadas no mundo, como seres produtores da cultura e sujeitos da história.

A história para Freire é um processo dialético humano, porque «não apenas temos história, mas fazemos a história que igualmente nos faz e que nos torna portando históricos» (FREIRE, 2000:40) e de possibilidade, na medida em que considera a mudança difícil, mas possível.

A História é tempo de possibilidade e não de determinações. E se é tempo de possibilidades, a primeira conseqüência que vem à tona é a de que a História não apenas é mas também demanda liberdade. Lutar por ela é uma forma possível de, inserindo-nos na História possível, nos fazer igualmente possíveis (FREIRE, 1993b, p. 35).

Neste processo histórico de formação do sujeito o sonho e a esperança de modificação da sociedade fazem parte constitutiva. Para Freire não há perspectiva de intervenção nem de mudança social sem um projeto, sem um sonho possível.

Sonhar não é apenas um ato político necessário, mas também uma conotação de forma histórico social de estar sendo de mulheres e de homens. (...) Não há mudança sem sonho como não há sonho sem esperança (FREIRE, 1993a, p. 91).

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Desta forma, o «sujeito» Freireano está situado historicamente no mundo e com o mundo e, nesta relação com o mundo e com os outros seres humanos, conhece, forma-se como pessoa humana, problematiza e intervém na realidade social.

A partir dessa compreensão de sujeito, Freire considera que:

ƒA educação faz parte do existir humano.

A educação passa a ter sentido para o ser humano, porque o seu existir é um «estar sendo», constituído por projetos de vida. «A educação tem sentido porque, para serem, mulheres e homens precisam de estar sendo. Se mulheres e homens simplesmente fossem não haveria porque falar em educação» (FREIRE, 2000, p. 40).

A educação passa a ter sentido ao ser humano porque o seu existir se caracteriza como possibilidade histórica de mudanças.«Somos ou nos tornamos educáveis porque, ao lado da constatação de experiências negadoras da liberdade, verificamos também ser possível a luta pela liberdade e pela autonomia contra a opressão e o arbítrio» (FREIRE, 2000, p. 121).

ƒA educação é um processo de humanização de homens e mulheres, na medida em

que rejeita toda forma de manipulação humana e dimensiona os homens e as mulheres como o sujeitos da educação.

ƒA educação é problematizadora da realidade social, ao estimular o diálogo, a

curiosidade e o ato de perguntar.

ƒA educação é uma ação de comunicação entre os sujeitos, ao possibilitar a

articulação entre os saberes: erudito/científico e os experienciais, do senso comum e a convivência ética com a diferença.

ƒA educação é uma ação pedagógica de co-participação e co-responsabilidade,

cabendo ao educador e ao educando buscarem, pesquisarem o conhecimento, para que a aula seja, de fato, um espaço democrático.

ƒA educação é crítica, um instrumento de desalienação e de libertação dos

oprimidos que, ao refletirem sobre a sua condição de excluído, se engajam numa luta para libertarem-se de sua opressão. Educação centrada em experiências de liberdade e estimuladoras da decisão e da responsabilidade dos seres humanos.

ƒA educação deve ser compromissada com a transformação social, com o sonho

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opressão, a alienação e os discursos ideológicos dominantes e anunciar um novo discurso e novas práticas libertadoras e includentes.

ƒA educação é um direito do ser humano. O exercício da cidadania implica a

intervenção de homens e mulheres na vida social, como seres de observação, avaliação, escolha, decisão e de práxis.

CAMPELLO ressalta que:

A inutilidade da Educação de adultos, tese tantas vezes apregoada significa, no concreto, dizer a muitos jovens que não sonhem em aprender, que não sonhem em melhorar de vida..., que na medida em que não aprenderam enquanto eram crianças, não têm mais nem chance, nem capacidade para verem concretizado esse sonho. Ou esse direito? (1990, p.35).

Esse direito à educação está fundamentado em duas dimensões:

ƒético-existencial, como um direito de existência do ser humano no mundo com

dignidade e em uma dimensão

ƒsócio-política, como um direito ao exercício da cidadania.

O direito à educação nessas duas dimensões está focalizada na escolarização que se apresenta como indicativo de uma relação social de poder, na medida em que o acesso ao saber escolarizado torna-se referencial de diferença social entre os alfabetizados (escolarizados) e os analfabetos (não-escolarizados).

O termo «analfabeto» é utilizado como «ausência de instrução», entretanto, como afirma LEWIN:

(...) mesmo que se possa conceituar o analfabetismo como uma questão de escassez educacional, insuficiência ou inexistência de escolaridade, é esta, dentre várias formas possíveis de definir o analfabetismo. Porém, é mais do que isso. É sobretudo, um fenômeno de exclusão social e de marginalização econômica; de compulsório afastamento político e de subtração do gozo dos benefícios sociais e dos direitos civis; de impedimento ao acesso às várias formas de expressão da cultura erudita e, paralelamente, de desvalorização do popular e do seu patrimônio cultural (1990, p.25).

Os que não tem acesso à escola, os que não permanecem nela completando os diversos níveis escolar passam a ser tipificados socialmente como «analfabetos» e, em conseqüência,

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excluídos, marginalizados na sociedade e negados no seu direito ético à formar-se como ser humano e no seu direito político de participar efetivamente da vida social.

É a sociedade letrada que cria o analfabeto como tipo social e, simultaneamente, o estigmatiza socialmente gerando uma relação conflitual e contraditória entre o «eu» e o «outro» - o analfabeto e o alfabetizado – dotado cada qual de sinal inverso de identificação cultural e de reconhecimento social (LEWIN, 1990, p.27).

A educação de jovens e adultos, portanto, está no cerne do debate sobre a exclusão

social e da questão da democratização do ensino, do acesso e permanência de todos os

indivíduos à escola pública. Do reconhecimento dos excluídos, por fatores de idade e de classe, ao direito à educação, ao direito de «ler e de escrever; de questionar e de analisar; de ter acesso a recursos e de desenvolver e praticar habilidades e competências individuais e coletivas».(4)

As Diretrizes Curriculares Nacionais contidas no Parecer CEB 11/2000 e Resolução CNE/CEB 1/2000 definem como princípios na educação de jovens e adultos no Brasil.

1) A educação como direito público subjetivo, compreendido como aquele pelo qual o titular de um direito (de qualquer faixa etária que não tenha tido acesso à escolaridade obrigatória) pode exigir imediatamente o cumprimento de um dever e de uma obrigação. Direito que pode ser acionado por qualquer cidadão, associações, entidades de classe e o Ministério Público (Parecer CEB 11/2000 e Art. 5º da LDB/96).

2) Educação como direito de todos, através da universalização do ensino fundamental e médio. A Constituição Federal de 1988 expressa ser dever do Estado a garantia do ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria (art. 208) e a Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional estabelece a obrigatoriedade e gratuidade do ensino fundamental e a progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio (Art. 4º).

O acesso ao saber escolar é viabilizado pela oferta de cursos regulares presenciais e a distância e exames supletivos feita por instituições de ensino públicas ou privadas credenciadas. Exige-se dos jovens e adultos serem maiores de 15 anos para conclusão do ensino fundamental e maiores de 18 anos para conclusão do ensino médio. O direito à

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realização de exame supletivo é extensivo às comunidades indígenas. (Art. 37 e 38 - LDB796).

3) Educação permanente, que considere as necessidades e incentive as potencialidades dos educandos; promova a autonomia dos jovens e adultos, para que sejam sujeitos da aprendizagem; educação vinculada ao mundo do trabalho e às práticas sociais; projeto pedagógico com flexibilidade curricular e conteúdos curriculares pautados em 3 princípios: contextualização, reconhecimento de identidades pessoais e das diversidades coletivas (Parecer CEB 11/2000).

Em função destes princípios novas funções são estabelecidas para a Educação de Jovens e Adultos:

ƒReparadora - ao reconhecer a igualdade humana de direitos e o acesso aos

direitos civis, pela restauração de um direito negado;

ƒEqualizadora - ao objetivar propor igualdade de oportunidades de acesso e

permanência na escola e,

ƒQualificadora - ao viabilizar a atualização permanente de conhecimentos e

aprendizagens contínuas (Parecer CEB 11/2000)

O princípio norteador da educação de jovens e adultos passa a ser a eqüidade compreendida como:

forma pela qual se distribuem os bens sociais de modo a garantir uma redistribuição e alocação em vista de mais igualdade, consideradas as situações específicas (...) Neste sentido, os desfavorecidos frente ao acesso e permanência na escola devem receber proporcionalmente maiores oportunidades que os outros (PARECER CEB 11/2000. In: SOARES, 2002, p. 39).

A educação de jovens e adultos, portanto, é considerada um direito, o de acesso a educação escolar pela universalização do ensino fundamental e médio, sendo compreendido o acesso à leitura e à escrita um bem social.

As Diretrizes Curriculares Nacionais apresentam alguns avanços do ponto de vista pedagógico, existindo uma preocupação com a especificidade etária e sociocultural dos jovens e adultos atendidos no sistema educacional.

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Destacam a necessidade de formulação de projetos pedagógicos próprios e específicos para a Educação de Jovens e Adultos, que leve em consideração na sua organização:

• o perfil e a situação de vida do aluno(Parecer CEB 11/2000);

ƒas necessidades e disponibilidades dos jovens e adultos, buscando garantir aos

alunos trabalhadores condições de acesso e de permanência na escola. (Art. 4º, Inciso VII - LDB/96);

ƒa experiência extra-escolar, validando-se os saberes dos jovens e adultos

aprendidos fora da escola e admitindo formas de aproveitamento de estudos e de progressão nos estudos mediante verificação da aprendizagem. (Parecer CEB 11/2000 e Art. 3º - LDB/96);

ƒOrganização curricular através da transversalidade, sendo destacado o trabalho

como tema transversal (Parecer CEB 11/2000).

Enfatizam, ainda, a relação entre o ensino médio e a educação profissional de nível técnico, que pode ser efetivada de modo concomitante ou seqüencial (Parecer CEB 11/2000) e a valorização da formação e da prática educativa de jovens e adultos no sistema educacional. Formação qualificada e contínua para o docente, ofertada por Instituições de Ensino Superior e associada à pesquisa.

Entretanto, apesar de estarem presentes nas Diretrizes Curriculares Nacionais a ampliação do conceito de ensino, com o significado de instrução, para educação e os princípios do direito subjetivo e a educação permanente, o ensino fundamental obrigatório, iniciado aos 7 anos pelo processo de alfabetização, tem sua terminalidade na faixa etária dos 14 anos. O prosseguimento do estudo da população com mais de 15 anos é efetivada em cursos específicos e exames supletivos, sendo considerada a Educação de Jovens e Adultos uma modalidade da educação básica, com isso, desenvolve uma ação educativa inserida, mas secundarizada ou marginalizada no sistema regular de ensino.

A própria LDB/96 (§2 do Art.5º) determina que o Poder público deve assegurar em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, antes dos demais níveis e modalidades de ensino, que pode ser interpretada como prioridade na destinação dos recursos da União para esse ensino em detrimento da Educação de Jovens e Adultos.

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O Parecer CEB 11/2000 supera a visão de compensação de um déficit do sistema educativo, mas a nova função reparadora, a que busca restaurar um direito negado, mantém a idéia de correção, de reparação de uma situação educacional excludente.

Essas Diretrizes apontam a preocupação com a formação específica e de qualidade do educador de jovens e adultos, visando superar a prática leiga e voluntária. e o desenvolvimento de ações pedagógicas que valorizem os saberes e as experiências de vida e profissional dos educandos e o seu contexto sociocultural. Ações pedagógicas que se aproximam do pensamento educacional de Paulo Freire, mas que ainda estão distanciadas de sua concepção de jovens e adultos numa perspectiva popular: democrática, dialógica e participativa. Por isso passa a ser importante explicitarmos a questão de como trabalhar pedagogicamente com os jovens e adultos na educação Freireana.

Como educar os Jovens e Adultos?

Tendo como referência os aportes teórico-metodológicos do pensamento educacional de Paulo Freire consideramos que a prática da educação de jovens e adultos precisa ser desenvolvida:

ƒDe forma dialógica. O educador deve estimular aos educandos a participarem

efetivamente da sala de aula, expressando de forma oral e escrita os seus conhecimentos, dizendo a sua palavra e interagindo dialogicamente com o professor no processo ensino-aprendizagem.

O diálogo Freireano apresenta um caráter: existencial, (faz parte da própria compreensão do homem como ser comunicativo e de conhecimento) metodológico ( faz parte do processo pedagógico) e político (é um processo democrático e participativo, pois implica em reconhecer nos outros o direito de dizer a sua palavra).

ƒOs conteúdos escolares trabalhados a partir da realidade social dos jovens e

adultos, por meio de temas e palavras geradoras, de forma integralizada e

globalizada.

A relação do educador com a realidade contextual do educando não se coloca apenas para o melhor exercício da atividade docente, mas sobretudo, para o educador aprender, adquirir conhecimentos por meio dessa relação. Essa relação mútua de aprendizagem por parte dos educadores e educandos constitui um dos pontos básicos para a efetivação de uma prática educativa democrática.

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ƒCriar situações variadas de aprendizagem, de modo que o estudo seja ao mesmo

tempo trabalho - lazer, esforço - prazer e que favoreça ao educando ser o sujeito do conhecimento.

Devem ser priorizadas atividades que fazem o educando pensar, descobrir, recriar, possibilitando-lhe avançar no conhecimento do mundo e na instrumentalização da leitura e escrita;

ƒDesenvolver técnicas diversificadas, trazendo para sala de aula, o cotidiano, o

belo, o colorido, os problemas e as contradições sociais.

Utilizar nas atividades da sala de aula as variadas formas de linguagem (verbal, escrita, colagem, desenho, dramatização, música, etc) e de instrumentais da escrita (livros, jornais, revistas, cartazes, embalagens, etc)

Prática educativa que considere:

ƒA permanente reflexão sobre a prática;

ƒO processo formativo de construção do saber-fazer pedagógico dos educadores no

cotidiano social;

ƒA valorização da pessoa do educador e do educandos (vistos como sujeitos do

conhecimento);

ƒA interação intersubjetiva com o outro, as pessoas e suas diversidades culturais,

sociais e pessoais;

ƒAs representações, as ideologias e os imaginários envolvidos na prática docente; ƒA realização de atividades investigativas e de intervenção social.

Prática que pressupõe uma pedagogia dialógica com uma nova cultura a da

solidariedade, capaz de redimensionar os papéis tradicionalmente estabelecidos e a superação de práticas individualistas para um trabalho coletivo e solidário, envolvendo a comunidade.

Prática que possibilite na vivência coletiva com o outro, o aprendizado do sentimento de respeito à pessoa humana e à cultura do outro.

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Considerações Finais

O direito à universalização do ensino escolar apresenta-se caracterizado pelo acesso ao saber escolar visando inserir jovens e adultos no sistema educacional para continuarem seus estudos. Essa visão de democratização escolar precisa ser ampliada, não ficando restrita ao acesso à escola, como um direito básico, mas também que esses jovens e adultos das classes populares sejam efetivamente participantes do processo de construção do saber e da escola. Isso significa desenvolver-se novos projetos e práticas pedagógicas nas quais esses jovens e adultos sejam sujeitos críticos da educação.

Os avanços nos princípios legais estabelecidos pela política educacional devem estar coadunados com as práticas de gestão e pedagógicas nas escolas. Não se pode deixar de se considerar que a educação de jovens e adultos se situa no debate ético-político da exclusão social e na luta pela educação pública e gratuita para todos, com um ensino de qualidade e democrático, envolvendo a participação das classes populares, o que implica na interação no ensino escolar entre os saberes (o erudito e popular) e a escola e a comunidade.

A educação de jovens e adultos exige uma prática pedagógica fundamentada em princípios éticos-políticos de valorização da pessoa humana, de suas experiências de vida e cultural. Prática educativa dialógica e solidária que possibilite a formação e o desenvolvimento dos educandos como seres humanos e cidadãos.

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Referências Bibliográficas

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Referências

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