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A vedação ao acúmulo de aposentadoria com outros benefícios previdenciários durante o exercício de atividade laboral paralela: uma análise da sua constitucionalidade e dos meios para sua impugnação

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

FILIPE DE MELO BRASIL

A VEDAÇÃO AO ACÚMULO DE APOSENTADORIA COM OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS DURANTE O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL PARALELA: UMA ANÁLISE DA SUA CONSTITUCIONALIDADE E DOS MEIOS

PARA SUA IMPUGNAÇÃO

FORTALEZA 2018

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FILIPE DE MELO BRASIL

A VEDAÇÃO AO ACÚMULO DE APOSENTADORIA COM OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS DURANTE O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL PARALELA: UMA ANÁLISE DA SUA CONSTITUCIONALIDADE E DOS MEIOS PARA

SUA IMPUGNAÇÃO

Monografia apresentada à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Previdenciário.

Orientador: Profª. Drª. Theresa Rachel Couto Correia.

FORTALEZA 2018

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FILIPE DE MELO BRASIL

A VEDAÇÃO AO ACÚMULO DE APOSENTADORIA COM OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS DURANTE O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL PARALELA: UMA ANÁLISE DA SUA CONSTITUCIONALIDADE E DOS MEIOS PARA

SUA IMPUGNAÇÃO

Monografia apresentada à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Previdenciário.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Profª. Drª. Theresa Rachel Couto Correia (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Me. Eduardo Marcelo de Negreiros Freitas

Centro Universitário Unifanor Wyden

_________________________________________ Mestranda Lara Dourado Mapurunga Pereira

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela Sua infinita magnitude e pelo amor incondicional às minhas qualidades e defeitos.

À Nossa Senhora das Graças, cujo manto recobre meu ser e ilumina meus pensamentos desde a mais tenra idade.

Aos genitores Brasil e Regina, e ao meu irmão, Túlio, por serem a representação da bússola que me guia em todos os momentos da minha existência, além de fornecerem alento e apoio gratuito em quaisquer precisões. Também à Celinha, que desde a infância me tem como protegido e muito contribuiu à minha formação.

À Lya, cujo companheirismo foi muito além da simples relação entre primos e se firmou como uma parte integrante do meu próprio ser, e aos amigos construídos durante o período escolar e que permaneceram presentes em todos os altos e baixos da minha vivência. Em especial à Ádria, Adrielle, Aninha, Brenda, Bruno, Bebeto, Celina, Ellen, Erica, Gabriel, Haynah, Ícaro, João Lucas, Sueslley, Tainah e Thaís.

Às amizades propiciadas pela Faculdade de Direito, que se tornaram a base da minha vida acadêmica e cuja ausência teria me privado de alguns dos melhores momentos dessa jornada. Não obstante o risco de cometimento de injustiças em relação às amizades inominadas, é preciso destacar os grupos: Sapateadores (Julia, Juliana e Tales), pela presença, risadas, afeto, união e admiração cultivados desde o primeiro mês na Instituição de Ensino, e Família que viaja unida (Adriana, Davi, Rayssa e Walber), pelo engrandecimento pessoal constante e pelo ensinamento de como as diferenças pessoais são necessárias e capazes de unir quem menos se espera. Também à Nycole e Marina, sempre presentes e dispostas a fornecer um ombro amigo, tornando-se elementos imprescindíveis à minha estadia na faculdade e por quem cultivei um carinho incomensurável, e à Ana Paula, pela demonstração de caráter e parcimônia em todas as nuances da sua vida.

À orientadora Profª. Theresa Rachel, que prontamente aceitou a árdua tarefa de auxiliar na composição deste trabalho e forneceu ensinamentos essenciais à sua finalização, além ter me apresentado ao Direito Previdenciário de forma vibrante e singular.

Ao Prof. Eduardo Marcelo de Negreiros Freitas, que não somente acatou o convite para participar da banca examinadora, mas foi, durante os 10 meses nos quais estagiei em seu Ofício na Defensoria Pública da União, um exímio parâmetro a ser seguido em âmbito pessoal e profissional, ensinando-me diariamente como exercer um munus de forma justa, caridosa e responsável.

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À mestranda Lara Dourado, por aceitar compor a banca examinadora e por gentilmente sempre ter me apoiado no quesito acadêmico, seja no Grupo de Estudos em Direito Processual Civil, seja neste Trabalho de Conclusão de Curso.

À Defensoria Pública da União, por ter demonstrado como uma instituição pública pode ser humana, eficiente e atuante. Agradeço especialmente aos estagiários e terceirizadas do terceiro andar, que abrilhantaram minha experiência no local e por quem nutro sentimentos de mais pura gratidão e afeto. Registro, ainda, os defensores Walker e Vanessa como peças fundamentais ao meu saber jurídico.

Ao Dr. Gérson Marques, pela demonstração diária de sabedoria humana e jurídica e por ensinar como a gentileza possui um papel crucial ao bom andamento da profissão.

Por último, à Universidade Federal do Ceará, onde pude vivenciar numerosas situações que contribuíram basilarmente à minha evolução pessoal e acadêmica. Sem ela, uma grande lacuna intransponível seria em mim instaurada. Agradeço a todos os professores, servidores e terceirizados por manterem esse ambiente tão vívido e acolhedor.

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“Porque se chamavam homens Também se chamavam sonhos

E sonhos não envelhecem”

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RESUMO

A continuidade ou retorno ao exercício laboral após aquisição de aposentadoria é medida adotada por uma coletividade de pessoas que assim o fazem motivadas por razões plurais. Considerando que a legislação previdenciária impõe a compulsoriedade contributiva incidente sobre os proventos adquiridos no trabalho paralelo ao mesmo tempo em que veda, no art. 18, parágrafo segundo, da Lei 8.213/91, o gozo da maior parte dos benefícios previdenciários a essa classe específica de trabalhadores, vislumbra-se um patente malferimento de princípios e regras concernentes à Previdência. O STF, instado a se manifestar sobre a dicotomia relatada, proferiu entendimento pela constitucionalidade do artigo em foco, mas assim procedeu impulsionado pelos adeptos da desaposentação – uma das práticas vedadas no fragmento legislativo analisado -, de maneira que há margem para impugnação dos outros âmbitos de aplicabilidade normativa. Ademais, a sistemática constitucional permite que o controle de constitucionalidade seja realizado por modos diversos, que serão devidamente demonstrados no decorrer deste trabalho mediante o suporte bibliográfico e jurisprudencial, utilizado também para evidenciar a dissonância entre o estatuto legal analisado e o regramento da Previdência.

Palavras-chave: Previdência Social. Aposentadoria. Continuidade laborativa. Acúmulo de

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ABSTRACT

The continuity or return to work after retiring is a measure adopted by a group of people who do it motivated by many reasons. Considering that the social security legislation imposes the tax liability on the payment acquired in parallel work at the same time as it prohibits, in art. 18, paragraph 2, of Law 8213/91, the enjoyment of most of the social security benefits to this specific class of workers, it is possible to see a patent disrespect of principles and rules concerning Social Security. The Brazilian Supreme Federal Court, urged to express its opinion on the dichotomy reported, expressed an understanding of the constitutionality of the article in focus, but this was driven by supporters of desaposentação - one of the practices prohibited in the legislative section analyzed -, in a way that there is scope for challenging the other spectrum of normative applicability. In addition, the constitutional system allows the constitutionality control to be carried out in different ways, which will be duly demonstrated in the course of this paper through bibliographical and jurisprudential support, also used to highlight the dissonance between the legal status analyzed and the systematic regulation of Social Security.

Keywords: Social Security. Retirement. Continuity of work. Accumulation of benefits. Seal.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art Artigo

CLT Consolidação das Leis do Trabalho INSS Instituto Nacional do Seguro Social LBP Lei de Benefícios Previdenciários RGPS Regime Geral da Previdência Social RE Recurso Extraordinário

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 O POSICIONAMENTO DO STF FRENTE AO ART. 18, PARÁGRAFO 2º, DA LEI 8.213/91 ... 14

2.1 Panorama que levou à apreciação do tema... 14

2.2 Considerações acerca do embasamento jurídico utilizado ... 17

2.3 A vedação à desaposentação e suas implicações ... 21

3 A REAPRECIAÇÃO DE DISPOSITIVO JURÍDICO CONFRONTADO PELA SUPREMA CORTE ... 25

3.1 Os diversos sentidos das normas jurídicas ... 25

3.2 Efeitos do controle de constitucionaliadde ... 27

3.3 Técnicas para adequação constitucional das normas ... 31

4 PONDERAÇÕES ACERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ACÚMULO DE APOSENTADORIA COM OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS ... 36

4.1 O retorno à atividade laboral após aquisição de aposentadoria ... 36

4.2 Princípios constitucionais enfrentados ... 39

4.2.1 Art. 201, §11, da Constituição Federal ... 40

4.2.2 Princípio da Universalidade de Cobertura e Atendimento... 41

4.2.3 Princípio da Isonomia... 42

4.2.4 Princípio da Solidariedade... 44

4.2.5 Princípio do Equilíbrio Financeiro e Atuarial ... 45

4.3 Benefícios cumuláveis ... 46

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 50

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1 INTRODUÇÃO

A aposentadoria espontânea possui papel protagonista dentre o rol de benefícios previdenciários. A quantidade de beneficiários cresce progressivamente a cada ano como decorrência lógica do envelhecimento populacional, e, por conseguinte, são acirradas as controvérsias relativas aos seus mais distintos aspectos.

O retorno ou continuidade na atividade laborativa após a aquisição do benefício é, sem dúvida, uma realidade permeada por notáveis pontos controvertidos. Com o aumento do número de aposentadorias concedidas, é natural que mais e mais aposentados pelo Regime Geral da Previdência Social perpetuem essa prática.

Seja pela necessidade de complemento financeiro, seja pelo mero desígnio de manutenção da atividade profissional, existe uma parcela populacional que permanece no labor ativo mesmo após fazer jus à benesse, principalmente quando adquirida por pessoas de idade não tão avançada e capazes de empregar sua força de trabalho.

Ocorre que, pelo fato de a atividade laboral ser exercida em concomitância ao proveito da aposentadoria, a legislação previdenciária impõe limitações ao segurado que estiver nessa situação. O parágrafo segundo do art. 18, da Lei 8.213/91, expressamente veda que o aposentado que continuar ou retornar ao labor faça jus aos demais benefícios previstos no Regime Geral da Previdência Social, exceto à reabilitação profissional e ao salário-família. Essa diferenciação inexoravelmente lesa o interesse de uma coletividade. Ao exercitar a profissão, o segurado aposentado obrigatoriamente deve verter contribuições ao sistema previdenciário, como todos aqueles que laboram hodiernamente o fazem. Porém, a legislação criou um fenômeno atípico, no qual a presença da aposentadoria se torna um impedimento objetivo para aferição dos préstimos que habitualmente seriam devidos caso presentes determinados riscos sociais.

Portanto, o indivíduo aposentado que permaneça no exercício laboral, se, por exemplo, for acometido de grave moléstia, não poderá fazer uso do auxílio-doença, ocasião na qual seu contrato será suspenso devido à incapacidade laborativa, mas sem percepção de ganhos, ainda que as contribuições incidam obrigatoriamente sobre seus proventos.

Em confronto aos princípios que norteiam a legislação previdenciária, esse dispositivo jurídico é passível de severas críticas. E assim o fizeram diversos setores da sociedade, que promoveram acaloradas discussões acerca da sua constitucionalidade.

O Supremo Tribunal Federal, observando as demandas jurídicas para pacificação da polêmica, recentemente proferiu entendimento, nos RE 381.367/RS e 661.256/SC no qual

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declarou constitucional o art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91. Dessa forma, buscou inviabilizar as impugnações referentes à inadequação do excerto legal, estabelecendo um fim teórico ao assunto.

Todavia, a atuação jurisdicional do STF foi instaurada para mitigar os conflitos provenientes da desaposentação, que seria apenas uma das vedações criadas por aquele dispositivo jurídico. A abrangência normativa, entretanto, vai além do singular impedimento à praxe, atingindo situações diversas e em face das quais a regularidade constitucional referida não foi devidamente contraposta.

O Direito é uma ciência complexa e dinâmica, em constante movimento e mudança. Uma decisão exarada em panorama específico pode ser completamente diferente se encarada sob pontos de vista distintos. Portanto, o objetivo deste trabalho é destrinchar a casuística que levou a Suprema Corte a firmar a tese mencionada, bem como expor os mecanismos criados para compatibilizar uma norma ao texto constitucional e os princípios que contraditariam a existência da norma em relato.

Para tal fim, o primeiro capítulo versará sobre a decisão pronunciada pelo STF, analisando-se os aspectos fáticos que oportunizaram o surgimento da desaposentação e como a discussão acerca da sua regularidade se agravou a ponto de impulsionar a atuação da Corte. Serão expostos, ainda, os principais efeitos decorrentes da obstaculização dessa criação jurídica.

O segundo capítulo realizará a diferenciação entre os mais diversos sentidos presentes em uma norma, abordando como eventuais impugnações constitucionais podem ser efetuadas em face de cada um deles. Indo além, serão expostos os efeitos provenientes do controle de constitucionalidade e como eles se relacionam com reiteradas oposições frente a uma mesma prescrição legal, desaguando-se, ao final, nos modos criados para conformar uma norma às disposições da Carta Maior.

Já o terceiro e último capítulo será responsável pela análise direta da constitucionalidade do art. 18, § 2º, da LBP, perpassando, ainda, pelas repercussões sociais e jurídicas oriundas da permanência laboral após o gozo de aposentadoria e pelo estudo de quais benesses seriam compatibilizados com a percepção simultânea do benefício em questão.

Em suma, a apreciação do tema será realizada do histórico que o levou à discussão firmada na Suprema Corte ao conhecimento analítico dos motivos que ocasionariam sua inconstitucionalidade, fazendo-se o uso de extensa pesquisa bibliográfica e análise jurisprudencial.

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2 O POSICIONAMENTO DO STF FRENTE AO ART. 18, PARÁGRAFO 2º, DA LEI 8.213/91

Para melhor ambientação, faz-se necessária a análise do mais recente entendimento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no que tange à constitucionalidade do excerto legal em apreço. A opinião exarada pela Suprema Corte adveio do julgamento relativo à viabilidade prática da desaposentação – instituto jurídico sem previsão legislativa e recorrentemente utilizado pelos segurados da Previdência -, no qual houve o confronto do artigo ora analisado.

Imprescindível, pois, debruçar-se nos pormenores fáticos e jurídicos que influenciaram o posicionamento adotado, tendo em vista a relação intrínseca entre a desaposentação e o dispositivo que veda o acúmulo de aposentadoria com outros benefícios previdenciários.

2.1 Panorama que levou à apreciação do tema

No sistema previdenciário atualmente em vigor, é possível a aquisição de aposentadoria caso preenchido o requisito etário ou contributivo. Quando por idade, poderá ser requerida após se atingir o marco temporal de 65 anos (para homens) ou 60 anos (para mulheres), desde que se configure a carência de 180 contribuições mensais.

Entretanto, é possível o gozo de aposentadoria relativa ao tempo de contribuição à Previdência, sendo despicienda, nesse caso, uma idade específica para se adquirir o direito. Após 30 ou 35 anos de contribuições (para mulheres ou homens, respectivamente), o benefício poderá ser concedido àqueles que preencherem as exigências legais para tal.

É comum, entretanto, que aposentados continuem ou retornem a exercer atividade laboral após o gozo do benefício. Por inúmeros fatores, dentre os quais se destaca a necessidade de complementação de renda, muitos beneficiários fisicamente capazes continuam empregando sua força de trabalho e obtendo a contraprestação devida, permanecendo, assim, na parcela populacional laboralmente ativa.

Natural, também, o exercício de duas atividades laborativas concomitantes para melhor suprir as necessidades financeiras do trabalhador, que, com frequência, obtém o direito de se aposentar em uma delas e permanece na outra, tendo em vista a importância dos proventos obtidos conjuntamente para a mantença do padrão de vida por eles estabelecido.

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Somente em 2017 foram concedidas cerca de 20.018.851 aposentadorias (INSS, 2017), uma quantia considerável na qual se demonstra o crescimento do gozo dessa classe de benefício. O acréscimo de aposentados que retornam ou permanecem no labor seria, então, uma decorrência lógica do próprio aumento na concessão da benesse.

A desaposentação surgiu das reivindicações desse fragmento de beneficiários, que, muitas vezes, são agraciados com ocupações profissionais mais vantajosas que a atividade pela qual foi instituída a aposentadoria (MARTINEZ, 2018). Todavia, por ausência de previsão legal que permita a modificação deste benefício, os segurados não podem usufruir das possíveis benesses da permanência no labor.

Conceituando o instituto, Martinez (2018, p. 33-34): "Desaposentação é ato administrativo formal vinculado, provocado pelo interessado no desfazimento da manutenção das mensalidades de aposentadoria, que compreende uma adbdicação com declaração oficial desconstitutiva."

Em visão similar, Ibrahim (2013, p. 728) indica que a desaposentação seria uma “reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou mesmo em Regimes Próprios de Servidores Públicos, como objetivo exclusivo de possibilitar a aquisição de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário”.

Pode-se definir, portanto, a desaposentação como a renúncia, sem previsão legal específica, a uma aposentadoria regularmente instituída para que os elementos formadores desta sejam reconsiderados e somados a fatores supervenientes, que, por sua vez, contribuirão para a aquisição de benefício mais vantajoso.

Essa criação jurídica não surgiu de modo arbritrário ou infudado, mas decorreu de severas mudanças legislativas que lesaram os interesses dos segurados da Previdência Social. Tem-se, por exemplo, a extinção do pecúlio e do abono de permanência - benesses criadas para incentivar a permanência do trabalhador em sua atividade laboral mesmo após preenchidos os requisitos para se aposentar - como um dos principais motivadores da desaposentação. (MARTINEZ, 2018).

O pecúlio seria a devolução dos valores vertidos a título de contribuição por parte dos aposentados que permaneceram exercendo atividade laboral, tendo como data limite as contribuições pagas até 16/04/1994, quando foi extinto. O abono de permanência, ainda presente no Regime Próprio da Previdência Social, possibilitaria a retenção dos valores devidos como contribuição previdenciária por aqueles que satisfizessem os requisitos para a aposentadoria, mas optassem por continuar trabalhando. (MARTINEZ, 2018)

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A criação do fator previdenciário é também elencada como importante elemento ensejador do almejo à desaposentação, tendo em vista que essa característica ocasiona uma redução nos proventos de muitas aposentadorias e potencializa as dificuldades econômicas dos beneficiários, estimulando-os a retornar ou permanecer no mercado de trabalho e, por consequência, vivenciar uma realidade propiciadora do instituto jurídico (GOMES, 2014).

Vê-se, pois, que essa prática foi embasada no reconhecimento da situação de parcela considerável de pessoas que, por necessidades financeiras e pela lacuna legislativa configurada após as alterações legais delineadas, restaram desamparadas no que tange às possibilidades oriundas da continuidade no exercício de atividade profissional após aquisição de aposentadoria.

Contudo, a desaposentação teve suas bases fundadas em previsão legislativa. Martinez (2018) cita a aposentadoria do juiz classista como notável influência dessa criação jurídica, pelo que se depreende do art. 9º da Lei 6.903 (BRASIL, 1981)1.

Apesar de atualmente revogada, essa disposição possui forte semelhança com a prática em análise, evidenciando que seu surgimento, ainda que na ausência de norma regulamentadora particular, foi alicerçado em disposição jurídica preexistente.

Porém, como instituto sem previsão legal específica, a desaposentação gerou diversas controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais. Não obstante a opinião majoritária ser favorável (BRAMANTE, 2015), muitas foram as ações tendentes a consolidar posicionamentos acerca dessa prática. De fato, após o tema ser submetido ao crivo do STF, 101.319 ações foram sobrestadas (CNJ, 2016).

Em breve histórico, Sousa (2017) aborda a pluralidade de discussões concernentes à desaposentação em diversos órgãos jurisdicionais brasileiros, bem como a propositura de projetos de lei que objetivavam viabilizar a novação da aposentadoria, o que destaca o acirramento de debates recaídos sobre o tema.

Dentre os críticos do instituto jurídico, a vedação imposta no art. 18, § 2º, da Lei 8.213 (BRASIL, 1991), tornou-se fundamento basilar ao seu desestímulo (MARTINEZ, 2018). Veja-se a redação legal:

Art. 18 (...)

§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.

1

Art. 9º: Ao inativo do Tesouro Nacional ou da Previdência Social que estiver no exercício do cargo de Juiz Temporário e fizer jus à aposentadoria nos termos desta Lei, é lícito optar pelo benefício que mais lhe convier, cancelando-se aquele excluído pela opção.

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Por essa razão, o Supremo Tribunal Federal foi instado, reiteradamente, a analisar a constitucionalidade da desaposentação, objetivando consolidar ou obstar a prática em definitivo. Atente-se para os RE 381.367/RS e 661.256/SC, visto terem sido estes os recursos nos quais foi a Corte consolidou o posicionamento final após o reconhecimento da repercussão geral inerente ao assunto.

O conceito de desaposentação não parece possuir correspondência exata ao que foi legalmente vedado. Todavia, a ausência de previsão legal apta a legitimar concretamente a inovação permite que amplos sejam os argumentos empregados em seu favor ou desfavor, de maneira que o artigo supracitado se configurou como uma das bases fundantes dos pareceres adversos à prática.

Malgrado as divergências opinativas sobre a relação do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91 com a desaposentação, o cerne do julgamento proferido pela Suprema Corte girou em torno da vedação legal dele proveniente, o que fomenta maiores considerações acerca da base legal e doutrinária utilizada na apreciação do tema.

2.2 Considerações acerca do embasamento jurídico utilizado

Como já demonstrado, a proposta da desaposentação é marcada por severas dicotomias fáticas e jurídicas desde o seu surgimento. A vedação imposta no artigo em foco possui acentuada controvérsia no que tange à sua relação com esse instituto jurídico, razão pela qual o Supremo Tribunal Federal apreciou a constitucionalidade do dispositivo quando analisou os recursos extraordinários pertinentes.

Objetivando melhor destrinchar o embasamento que serviu de alicerce à opinião da Suprema Corte, veja-se a ementa do RE 661.256/SC:

Constitucional. Previdenciário. Parágrafo 2º do art. 18 da Lei 8.213/91. Desaposentação. Renúncia a anterior benefício de aposentadoria. Utilização do tempo de serviço/contribuição que fundamentou a prestação previdenciária originária. Obtenção de benefício mais vantajoso. Julgamento em conjunto dos RE nºs 661.256/sc (em que reconhecida a repercussão geral) e 827.833/sc. Recursos extraordinários providos. 1. Nos RE nºs 661.256 e 827.833, de relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, interpostos pelo INSS e pela União, pugna-se pela reforma dos julgados dos Tribunais de origem, que reconheceram o direito de segurados à renúncia à aposentadoria, para, aproveitando-se das contribuições vertidas após a concessão desse benefício pelo RGPS, obter junto ao INSS regime de benefício posterior, mais vantajoso. 2. A Constituição de 1988 desenhou um sistema previdenciário de teor solidário e distributivo. inexistindo inconstitucionalidade na aludida norma do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91, a qual veda aos aposentados que permaneçam em atividade, ou a essa retornem, o recebimento de qualquer prestação adicional em razão disso, exceto salário-família e reabilitação profissional. 3. Fixada a seguinte tese de

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repercussão geral no RE nº 661.256/SC: “[n]o âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à „desaposentação‟, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8213/91”. 4. Providos ambos os recursos extraordinários (RE nºs 661.256/SC e 827.833/SC). (STF, 2016, online)

Constata-se que o princípio da solidariedade e o caráter distributivo do sistema previdenciário foram os argumentos fundantes da declaração de constitucionalidade da norma impugnada. Ainda que diversas sejam as linhas argumentativas envidadas pelos ministros julgadores, essas duas características - devidamente ementadas - possuem relação direta com a constitucionalidade do art. 18, § 2º, da LBP, e por elas se inicia a análise jurídica da causa.

Sobre a solidariedade, Ibrahim (2013, p. 65):

Sem dúvida, é o princípio securitário de maior importância, pois traduz o verdadeiro espírito da previdência social: a proteção coletiva, na qual as pequenas contribuições individuais geram recursos suficientes para a criação de um manto protetor sobre todos, viabilizando a concessão de prestações previdenciárias em decorrência de eventos preestabelecidos.

Castro e Lazzari (2008, p. 99), a seu turno, dispõem acerca do princípio da distributividade nos seguintes termos:

(...) O princípio da distributividade, inserido na ordem social, é de ser interpretado em seu sentido de distribuição de renda e bem-estar social ou seja, pela concessão de benefícios e serviços visa-se ao bem-estar e à justiça social (art. 193 da Carta Magna). (...) O segurado, ao contribuir, não tem certeza se perceberá em retorno a totalidade do que contribuiu, porque os recursos vão todos para o caixa único do sistema, ao contrário dos sistemas de capitalização, em que cada contribuinte teria uma conta individualizada (como ocorre com o FGTS).

Os ideais da solidariedade e da distributividade permeiam todo o sistema jurídico previdenciário. São eles os norteadores de incontáveis preceitos ínsitos à Previdência Social, de maneira que as contribuições a ela vertidas devem ser utilizadas não para proveito singular do contribuinte, mas para abarcar as necessidades dos segurados como um todo.

Desta feita, firmou-se o entendimento de que o segurado que busca a desaposentação, ainda que realize contribuições previdenciárias como qualquer outro, estará custeando o sistema de maneira solidária e em proveito dos contribuintes em geral. Não poderia, dessa forma, dispor da aposentadoria como quisesse, visto que as prestações previdenciárias supervenientes seriam destinadas ao suporte securitário da coletividade, não mais servindo aos préstimos individuais do segurado.

Todavia, tal supedâneo principiológico deve estar em harmonia com as outras disposições constitucionais que tangenciam as normas e benefícios previdenciários. Em voto

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vencido no RE 661.256/SC, o ministro Luís Roberto Barroso abordou aspectos distintos no que se refere à solidariedade e distributividade dos benefícios (STF, 2016), em trechos a seguir reproduzidos:

(...)

A segunda dimensão da seguridade em geral, e do sistema previdenciário em particular, é marcada pelo princípio da solidariedade. Em termos abrangentes, essa dimensão pode ser reconduzido ao próprio dever estatal de proteger a dignidade humana, no que se inclui a criação de uma rede social mínima que impeça as pessoas de caírem em situações de indignidade. De forma mais específica, esse aspecto pode ser extraído da previsão de que a seguridade deve ser custeada por toda a sociedade, e não apenas pelos seus beneficiários imediatos. Isso ganha conteúdo concreto com a já mencionada possibilidade de emprego de recursos dos orçamentos públicos e, sobretudo, pela autorização constitucional para a criação de outras fontes de custeio, em paralelo com as contribuições sociais 8 . Como se sabe, a solidariedade foi um dos fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal para assentar a validade da cobrança de contribuições previdenciárias dos servidores inativos.

(...)

Isso não significa, contudo, que o legislador disponha de liberdade absoluta para formatar o sistema segundo quaisquer critérios de conveniência. Em vez disso, há pelo menos dois limites principais à sua atuação. Em primeiro lugar, a falta de uma comutatividade absoluta ou rígida entre contribuições e benefícios não significa que a correspondência possa ser inteiramente desprezada. Ao contrário, a Constituição deixa claro que os salários de contribuição compõem a base de cálculo para a definição das prestações previdenciárias e que estes, assim como os próprios benefícios resultantes, devem ser atualizados a fim de que preservem a sua expressão econômica. Essas circunstâncias têm levado este Supremo Tribunal Federal a destacar a existência de uma relação necessária entre os aportes dos segurados e as prestações estatais.

Em segundo lugar, e com maior relevância, o modelo concebido pelo legislador precisa ser compatível com o princípio da isonomia, repartindo de forma equitativa os ônus e bônus do sistema previdenciário. Essa é uma exigência expressa do art. 201, § 1°, da Constituição, que impõe a adoção de critérios uniformes para a concessão de aposentadorias11. Daí a necessidade de que a legislação institua uma fórmula estável de correspondência entre contribuições e benefícios, aplicável a todos os segurados. Essa fórmula conterá, inevitavelmente, algumas variáveis indeterminadas a priori, desde a maior ou menor extensão do período de fruição dos benefícios até a existência ou não de pensionistas. É de se notar, porém, que essas incógnitas aplicam-se ao conjunto de segurados de forma impessoal, e não seletivamente.

A interpretação dada pelo ministro pugnou pela necessidade de flexibilização das características previdenciárias supra referidas, que não podem coadunar situações exageradamente discrepantes dentro do sistema previdenciário. Assim sendo, a desaposentação possuiria plena aplicabilidade prática, haja vista propiciar um retorno contributivo que, caso fosse obstaculizado, estaria em desconformidade às finalidades congênitas da Previdência Social.

Entretanto, a discussão proposta perante o Supremo Tribunal Federal, não obstante versar sobre essa prática, abrange diversos aspectos a ela extrínsecos. Como se sabe, o art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91, não veda a desaposentação de modo explícito, mas foi utilizado para impugnar sua permissibilidade. Todavia, a análise da constitucionalidade desse

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dispositivo também envolveu sentidos normativos que iriam além daqueles especificamente utilizados para embasar o instituto em referência.

O cerne da norma em destaque se relaciona com o impedimento de gozo concomitante da aposentadoria com outros benefícios previdenciários - além dos que forem expressamente permitidos - por parte daqueles que permaneçam ou retornem para atividade abrangida pelo Regime Geral da Previdência Social. Ao julgarem a desaposentação, contudo, alguns dos ministros perpassaram questões específicas acerca da idoneidade do estatuto legal, que não necessariamente possuíam relação com o objeto principal da análise.

Exemplificando, tem-se trecho do voto do ministro Marco Aurélio Mello, proferido no RE 381.367/RS, cujo teor se mostra a seguir:

Uma coisa é se concluir pela inexistência da dupla aposentadoria – aliás, afastada pela própria ordem natural das coisas, no que dificilmente alguém viria, após aposentar-se por tempo de serviço, o que se dirá quanto à idade, a perfazer novo período de trabalho, porquanto, para a contagem relativa a outra aposentadoria, fica excluído o tempo utilizado na anterior, não cabendo, portanto, a sobreposição. Algo diverso é proclamar-se, conforme se verifica no § 2º do artigo 18, que, mesmo havendo a contribuição como se fosse primeiro vínculo com a previdência, o fenômeno apenas acarreta o direito ao parco saláriofamília e à reabilitação profissional. Além de o texto do examinado § 2º implicar restrição ao que estabelecido na Carta Federal, acaba por solapar a feição sinalagmática e comutativa decorrente da contribuição obrigatória, não correspondendo mais a esta última o que previsto constitucionalmente. Em síntese, ao trabalhador que, aposentado, retorna à atividade cabe o ônus alusivo à contribuição, devendo-se a ele a contrapartida, os benefícios próprios, mais precisamente a consideração das novas contribuições para, voltando ao ócio com dignidade, calcular-se, ante o retorno e as novas contribuições e presentes os requisitos legais, o valor a que tem juz sob o ângulo da aposentadoria. Essa conclusão não resulta na necessidade de declarar-se inconstitucional o § 2º do artigo 18 da Lei nº 8.213/91, mas em emprestar-lhe alcance consentâneo com a Carta Federal, ou seja, no sentido de afastar a duplicidade de benefício mas não o novo cálculo de parcela previdenciária que deva ser satisfeita. É como voto na espécie.

É notável, assim, que não foram todos os ministros que se filiaram à interpretação restritiva do princípio da solidariedade para julgar em desfavor da praxe. De fato, a possibilidade de contraprestação é, também, uma característica essencial do sistema previdenciário, pois não haveria sentido na exigência de contribuições vertidas pelos segurados caso estes não pudessem usufruir das benesses provenientes.

Tomando por base o voto acima destacado, pode-se interpretar a solidariedade como princípio justificador de situações nas quais o segurado realiza contribuições previdenciárias, mas, por ausência de necessidade, não obtém retorno. Distinto se torna o panorama quando há a obrigação de custeio securitário, mas uma vedação legal impede que, mesmo em situações de precisão, o contribuinte obtenha retorno contributivo, ocasião na qual se questiona a validade do obstáculo.

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Apesar de o impedimento à aquisição de nova aposentadoria ser apenas uma das possíveis nuances da norma cuja constitucionalidade foi analisada, ensejou reflexões que foram além de meras considerações acerca do objeto inicial dos recursos, abrangendo mais a fundo as questões relativas à concretude da norma como um todo.

Por essa razão, o embasamento jurídico empregado pelo STF possui importância crucial no estudo relativo à constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91. Tendo sido proferido entendimento, ainda que desfavorável, é importante a exposição dos argumentos utilizados no posicionamento da Corte, objetivando melhor elucidar os pontos controvertidos do fragmento legal.

2.3 A vedação à desaposentação e suas implicações

A decisão proferida pelo STF no Recurso Extraordinário supra colacionado pôs fim à longa discussão acerca da consolidação da renúncia à aposentadoria com o fito de obter novo benefício mais vantajoso. Pelo entendimento majoritário dentre os ministros da referida Corte, a desaposentação foi abolida da praxe dos órgãos jurisdicionais brasileiros.

Esse posicionamento reverberou além da mera pacificação de controvérsia instaurada no seio jurídico do país. Como propriamente explanado, a desaposentação surgiu após numerosas circunstâncias levarem uma notável parcela populacional a reivindicar ações administrativas e jurídicas aptas a sanar um estado de omissão legislativa danosa ao interesse público.

Por conseguinte, o óbice em comento causou forte impacto social, pois impediu que diversas pessoas que vivenciavam situações propiciadoras ao requerimento da construção jurídica obtivessem nova e melhor aposentadoria. Abordando as decorrências do posicionamento adotado pela Suprema Corte, Martinez (2017, p. 694):

Quem detém a sensibilidade da observação reclamada notou o constrangimento geral ao ser negado aos 182 mil velhinhos um alento pecuniário no final da vida. Em momento algum lhes passou pela mente a falácia de que a concessão custaria 7.7 bilhões de reais e ofenderia o equilíbrio atuarial e financeiro de um orçamento de 770 bilhões (ou seja, de apenas 1%!).

É possível verificar, portanto, que o fim da desaposentação representou também o fim da esperança em se ampliar a renda de grande número de pessoas, que, em sua maioria, possui faixa etária avançada. Questiona-se, então, a aplicabilidade do art. 230 da Constituição

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Federal2 (BRASIL, 1988), cujo objetivo principal é a proteção ao idoso, quando lhes é retirada uma possibilidade de melhora considerável no seu panorama socioeconômico.

Em análise ao entendimento firmado pelo STF, Martinez (2017) ressalta o sentimento de surpresa oriundo da tese solidificada. Conforme o autor, o tema já havia sido exaurido em frequentes e numerosos debates e obtido o endosso de eminentes órgãos jurisdicionais, como o Superior Tribunal de Justiça. Considera-se, pois, que houve verdadeira quebra de expectativa.

Interessante destacar que práticas similares à desaposentação são aplicadas naturalmente em diversos sistemas previdenciários. Países como Portugal, Canadá, Estados Unidos e Chile preveem abertamente a possibilidade de incremento da aposentadoria daqueles que continuarem laborando após o gozo do benefício. (GOMES, 2014)

Pode-se aduzir, portanto, que a melhora superveniente da aposentadoria é uma decorrência cuja aplicabilidade parece advir logicamente das disposições previdenciárias concernentes ao benefício, de modo que, em países como os citados, a melhoria daquela ocorre naturalmente após a permanência em atividade profissional concomitante. Dessa forma, a chancela desta prática em âmbito brasileiro era medida esperada por grande parte dos estudiosos sobre o assunto, bem como da população interessada.

Dentre as mais significativas implicações oriundas do impedimento à desaposentação, constata-se iminente estado de insegurança jurídica instaurado junto aos que foram por ela beneficiados. Como amplamente noticiado (GLOBO, 2018), inúmeras ações de cobrança estão sendo manejadas com a finalidade de reverter aos cofres do INSS as diferenças pecuniárias entre as aposentadorias originais e os novos benefícios adquiridos após a judicialização das demandas.

Em breve digressão e para melhor exposição de raciocínio, veja-se a aplicabilidade do princípio da segurança jurídica em seara administrativa, de acordo com os ensinamentos de Di Pietro (2016, p. 116):

O princípio se justifica pelo fato de ser comum, na esfera administrativa, haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a consequente mudança de orientação, em caráter normativo, afetando situações já reconhecidas e consolidadas na vigência de orientação anterior. Essa possibilidade de mudança de orientação é inevitável, porém gera insegurança jurídica, pois os interessados nunca sabem quando sua situação será passível de contestação pela própria Administração Pública. Daí a regra que veda a aplicação retroativa.

2 Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua

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A postura adotada pelo INSS, ao cobrar a restituição de valores obtidos após vitória judicial que possibilitou a aquisição de aposentadoria mais proveitosa, parece deturpar o princípio mencionado. Os segurados, após acreditarem na estabilização das decisões que lhes agraciaram com o instituto jurídico em comento, não somente tiveram retirados de si os benefícios mais vantajosos, mas ainda terão de arcar com a devolução das importâncias recebidas a maior.

O princípio da segurança jurídica não torna imutável a interpretação de uma lei; apenas inviabiliza que esta norma retroaja para situações já consolidadas com embasamento em interpretações anteriores e que, no momento da sua aplicação, eram consideradas válidas (DI PIETRO, 2016).

A desaposentação, como extensivamente indicado, possuía opinião favorável por grande parte dos seus estudiosos e requerentes. Portanto, à época da concessão dos novos benefícios, era-se esperado que ela fosse pacificada e confirmada judicialmente. A decisão proferida pelo STF foi uma virada jurisprudencial impactante que norteou as cobranças efetivadas pelo INSS, por mais que o panorama jurídico fosse favorável à prática quando foi estabelecida a novação das aposentadorias.

Depreende-se da situação, portanto, que houve provável ofensa à segurança jurídica anteriormente vivenciada pelos beneficiários da desaposentação, visto terem sido surpreendidos com a exigência de devolução pecuniária e cancelamento dos benefícios anteriormente gozados.

Ainda além, é possível constatar uma piora generalizada das possibilidades conferidas aos aposentados, em especial aos idosos, visto que, além de não poderem usufruir de importantes benefícios previdenciários caso exerçam atividade laboral após a aquisição de aposentadoria, também serão obrigados a permanecer no labor paralelo se desejarem manter o padrão de vida estabelecido pelas duas fontes de renda.

Entretanto, o efeito mais importante, para os fins propostos neste trabalho, foi o novo parâmetro interpretativo firmado junto ao art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91. De fato, o Supremo Tribunal Federal expressamente o reputou constitucional, encerrando, para muitos, eventuais impugnações relativas à sua constitucionalidade.

Não obstante a discussão instaurada dentro do próprio STF no tocante à conformidade constitucional do preceito, a tese predominante deve desestimular a opinião jurídica contrária à sua aplicabilidade, por mais que a vedação imposta possua fortes controvérsias referentes aos mais diversos princípios norteadores da legislação previdenciária.

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O instrumento normativo examinado não necessariamente representaria um óbice à desaposentação, pois suas disposições não correspondem intrinsecamente às previsões desta prática. Com efeito, a verificação de constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei de Benefícios Previdenciários, impulsionada por instituto jurídico não expressamente vedado, não parece mitigar de maneira efetiva as incompatibilidades referidas, pois o âmbito de atuação normativa vai além do que foi julgado.

Portanto, há premente risco de se impor um posicionamento sem que tenham sido abordadas outras nuances imprescindíveis à sua consolidação. Salutar, então, uma análise pormenorizada acerca dos efeitos jurídicos provenientes da posição adotada pela Suprema Corte, bem como dos modos remanescentes para impugnação de uma norma cuja constitucionalidade foi, em tese, pacificada.

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3 A REAPRECIAÇÃO DE DISPOSITIVO JURÍDICO JÁ CONFRONTADO PELA SUPREMA CORTE

Considerando as finalidades principais deste trabalho, dentre as quais a análise da constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91 é ponto fundante, faz-se necessária a exposição de comentários relativos a determinados assuntos estruturais concernentes ao tema.

A existência de decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, na qual se realizou o exame dos aspectos constitucionais do dispositivo jurídico em estudo, é realidade que desestimula novas ponderações sobre o assunto. Contudo, não obstante os efeitos reconhecidamente derivados do controle efetuado por esse órgão julgador, deve-se atentar à situação ensejadora da atividade judicante, cuja cognição, como a seguir será exposto, foi incitada por motivos distintos daqueles que motivam o presente estudo, e que, por consequência, podem ocasionar nova apreciação jurídica da norma.

Portanto, a abordagem das particularidades conceituais regentes da atividade jurisdicional ínsita à defesa da Constituição, em especial no que toca ao artigo supradito, é de importante acréscimo à elucidação da aplicabilidade prática advinda da concretização dos objetivos propostos neste trabalho acadêmico, que, longe de ser mera produção afastada da realidade, deve propor mudanças efetivas ao panorama evidenciado.

3.1 Os diversos sentidos das normas jurídicas

As normas são os principais meios de exteriorização da atividade jurídica, que faz uso desses instrumentos para consubstanciar o Direito aos casos que necessitam de apreciação judicial (BOBBIO, 2003).

Em se tratando da reanálise de uma norma cuja constitucionalidade foi previamente confirmada pelo órgão jurisdicional competente, é preciso abordar conceitos aptos a demonstrar diferenciações práticas entre as hipóteses que foram enfrentadas no julgamento da sua conformidade constitucional e os elementos que, em tese, podem levar a novo questionamento nesse mesmo sentido.

Inicialmente, ressalte-se que existe uma pluralidade de normas que permeiam a sociedade. De acordo com Bobbio (2003, p. 26):

Todas essas regras são muito diversas pelas finalidades que perseguem, pelo conteúdo, pelo tipo de obrigação que fazem surgir, pelo âmbito de suas validades, pelos sujeitos a quem se dirigem. Mas todas têm em comum um elemento característico que consiste, como veremos melhor em seguida, em ser proposições que têm a finalidade

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de influenciar o comportamento dos indivíduos e dos grupos, de dirigir as ações dos indivíduos e dos grupos rumo a certos objetivos ao invés de rumo a outros.

Depreende-se desse conceito que muitos são os tipos normativos componentes das relações sociais hodiernas, diferenciando-se estes, basicamente, pelas suas finalidades. Tendo em vista que o artigo 18, § 2º, faz parte da Lei 8.213/91, uma norma jurídica, alguns comentários acerca dessa espécie devem ser tecidos. Nas palavras de Arnaldo Vasconcelos (2006, p. 28):

A vocação especial da norma jurídica é realizar o Direito. E só há Direito a partir de uma norma, que o preveja. O campo de incidência das normas jurídicas constitui o mundo do Direito. Entretanto, sempre haverá normas para todas as hipóteses possíveis. Se não se encontram explícitas no ordenamento, com certeza nele estão implícitas.

A lei, como modalidade de norma jurídica, pode ser vista como o meio utilizado pelo legislador para concretizar determinados valores que permeiam a sociedade e norteiam as disposições de certos atos e fatos (SCHMIEGUEL, 2010).

Dessa forma, entende-se a lei como uma norma jurídica essencialmente marcada por aspectos valorativos e cuja tendência, em acepção simplista, é nortear as ações daqueles por ela regidos, objetivando o fim precípuo de preservação dos valores sociais que foram defendidos na sua confecção.

Assim, determinados aspectos de cunho valorativo são corporificados em prescrições normativas, que, sob certos ângulos e ideias, podem ensejar diferentes interpretações pelos aplicadores e destinatários das normas. Os valores sociais defendidos pelo art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91, por exemplo, poderão calcar uma gama de considerações a depender do prisma em que suas disposições sejam colocadas.

Abordando as falhas de uma literal e simples interpretação gramatical, Magalhães Filho (2013, p. 56) defende o papel da hermenêutica na desmistificação dos diversos sentidos de uma norma, porquanto não é possível extrair sua significação apenas pela estrita leitura; havendo uma pluralidade de sentidos, é preciso que estes sejam confrontados de acordo com os critérios adequados para sua escolha no caso concreto.

Vê-se, pois, que uma norma possui um feixe de sentidos cuja aplicação, caso a caso, influi diretamente na realidade prática a ser regida. Unindo-se as conceituações expostas, é possível afirmar que os diferentes sentidos de uma norma jurídica podem abarcar valores plurais dentro de um excerto legal abrangente de variadas situações.

Se o dispositivo em comento for confrontado com os ideais que permeiam a desaposentação, o resultado desse encontro será decorrência direta da argumentação

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valorativa utilizada para obstar ou permitir o instituto. Entretanto, caso a norma seja apreciada em paralelo a fatores que extrapolem a valoração jurídica defendida por essa prática e que adentrem em méritos que com ela não estejam intrinsecamente relacionados, a conclusão interpretativa pode ser completamente diversa.

É por essa razão que o art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91 pode ter sido reputado constitucional no que concerne à inaplicabilidade da desaposentação, cujos valores, de acordo com a interpretação empregada pelo Supremo Tribunal Federal, não foram aptos a desnaturar sua vedação, mas isso não significa que, em face de outros argumentos e sentidos interpretativos, a norma também seja legitimada, pois haveria o ensejo a ponderações não realizadas por conta dos limites valorativos presentes naquele instituto jurídico.

O estatuto em análise, quando visto sob um aspecto literal, não parece dar margem a discussões referentes à desaposentação, que, como mencionado, é criação jurídica sem previsão específica. Todavia, isso não impediu que os ministros julgadores da Suprema Corte estendessem o alcance do artigo para utilizá-lo como óbice à perpetuação dessa prática (STF, 2016).

Portanto, o fato de o art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91 ser declarado constitucional, na esfera em que veda a desaposentação, não necessariamente também o torna em relação a outros contextos. Enquanto os aspectos valorativos utilizados no cotejo de determinado âmbito de incidência da norma podem ser constitucionais, talvez não o sejam em face de outras acepções.

Desta feita, o julgamento proferido pelo STF não irá forçosamente encerrar o tema em definitivo, pois a constitucionalidade da norma no que se refere à desaposentação não implica que ela também o será em todas as suas essências.

3.2 Efeitos do controle de constitucionalidade

Apesar da exposição supra, na qual se demonstra a possibilidade de apreciação constitucional de sentidos normativos não devidamente confrontados na análise prévia do STF, não se pode ignorar que, independentemente das motivações, há confirmação formal da constitucionalidade do artigo 18, § 2º, da Lei 8.213/91.

É salutar, pois, que sejam abordadas as características do controle de constitucionalidade, objetivando a melhor compreensão dos seus efeitos e das possibilidades de impugnação de normas cuja higidez foi teoricamente firmada.

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Em abordagem inicial, Bulos (2015) expõe que o controle de constitucionalidade é a maneira pela qual se obtém a adequação de dado comportamento aos postulados da Lei Maior. Por meio dessa atividade jurídica, obtém-se o restabelecimento do estado de higidez constitucional maculado pela inconstitucionalidade do comportamento desconforme à Constituição.

Tendo em vista o caráter hierárquico dos atos jurídicos brasileiros, a Constituição Federal deve ter suas disposições observadas por todo o corpo que compõe o sistema jurídico pátrio (BONAVIDES, 2018). Pode-se, então, imputar ao controle de constitucionalidade a função de conformar as disposições jurídicas, legislativas e administrativas ao que é previsto na Carta Maior.

Dois são os tipos clássicos de controle constitucional: um em abstrato, cuja instauração dispensa eventuais conflitos provenientes de uma lide e é exercido por um órgão a quem compete seu julgamento, e um em concreto, que advém de situação prática na qual a análise da norma foi suscitada para garantir a fruição do direito de uma das partes.

Diferenciando os dois modelos, Mendes e Branco (2016) lecionam que o controle concentrado de constitucionalidade é realizado por meio de um órgão jurisdicional específico para tal fim, enquanto o controle difuso permite que qualquer órgão jurídico tenha a prerrogativa de afastar a aplicabilidade de leis inconstitucionais.

O Brasil, ao adotar as duas modalidades de controle, permite que a atividade exercida pelo Supremo Tribunal Federal seja acionada originariamente, no controle concentrado, ou em grau recursal, nas hipóteses em que a constitucionalidade de lei ou ato normativo for questionada em um litígio concreto.

Não obstante a finalidade principal desses dois tipos de conformação constitucional ser a mesma – a análise da constitucionalidade de elemento normativo -, algumas diferenças podem ser observadas em seus efeitos.

Um atributo essencial do controle concentrado é o efeito vinculante e erga omnes proveniente do seu julgamento. De fato, após o exame meritório proferido pelo STF, a decisão deverá ser acatada e seguida pela Administração Pública e pelos órgãos judiciais, produzindo eficácia geral perante quaisquer dos possíveis afetados pela interpretação dada (BONAVIDES, 2018).

O controle difuso, a seu turno, apresenta efeitos ínsitos ao modo pelo qual é instaurado, ou seja, objetiva que o entendimento do órgão que decretar sua (in)constitucionalidade possa reger, primariamente, o confronto fático do qual adveio a controvérsia (BULOS, 2015).

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Nesse sentido, Didier Jr (2008, p. 3):

No controle difuso, a “inconstitucionalidade da lei” é questão que será resolvida incidenter tantum, como um fundamento a ser examinado pelo magistrado para a solução da questão principal a ser resolvida naquele processo. Em razão disso, a decisão sobre a constitucionalidade da lei não terá aptidão para a produção de coisa julgada, que torna indiscutível apenas a decisão sobre a questão principal, resolvida no dispositivo (conclusão) da decisão. Não obstante, a decisão sobre a inconstitucionalidade pode ser utilizada como um precedente, a ser seguido em outros casos semelhantes. Como não há coisa julgada, a decisão sobre a inconstitucionalidade, sendo mero precedente judicial, poderá ser revista em outros processos, valendo-se o órgão jurisdicional das técnicas de overruling. A lei reputada inconstitucional tem a sua eficácia afastada para a solução de um caso concreto, cuja solução se torna indiscutível pela coisa julgada, mas cujo fundamento (a inconstitucionalidade da lei) apenas pode servir como precedente a ser seguido em caso similar.

Restam patentes, assim, as diferenças entre as implicações oriundas de cada modalidade de controle, que dependerão, principalmente, do modo pelo qual for incitada a análise da constitucionalidade de determinada norma.

Dessa forma, considerando que o exame do art. 18,§ 2º, da Lei 8.213/91 foi realizado por meio de um recurso extraordinário, que, como se sabe, é instrumento hábil à aferição de constitucionalidade normativa em sede difusa, não deveria haver óbice à reapreciação da norma destacada, pois os efeitos da decisão proferida pelo STF teriam sido, em tese, restritos às partes interessadas na lide.

Contudo, sucederam consideráveis mudanças interpretativas em relação ao modo pelo qual o controle de constitucionalidade difuso repercute na esfera jurídica do país. Pode-se apontar, inicialmente, que o requisito da repercussão geral, imposto pela Emenda Constitucional nº 45 (BRASIL, 2005) como exigência para admissibilidade de recursos extraordinários interpostos na Suprema Corte, indica a necessidade de relevância social da matéria a ser por ela enfrentada e busca solidificar os efeitos provenientes dessa forma de julgamento.

De fato, “(...) a Emenda Constitucional n. 45 instituiu a repercussão geral como forma de resgate da feição do recurso extraordinário como elemento de uniformização, buscando, com isso, contornar o problema da crise numérica.” (MENDES e BRANCO, 2016, p. 1155). Tendo em vista que o controle de constitucionalidade difuso exercido pelo STF é consubstanciado nessa cognição, a repercussão geral provê um feitio generalizado à matéria que será firmada pela Corte, indicando uma possível extrapolação dos seus efeitos para relações além das que compuseram o julgamento meritório inicial.

(30)

Ressalte-se, ainda, a possibilidade de concessão de efeitos erga omnes às decisões proferidas em sede de controle difuso, conforme previsão contida no artigo 52, X, da Constituição da República3 (BRASIL, 1988), que dá ao Senado a prerrogativa de suspender, no todo ou em parte, a execução de leis declaradas inconstitucionais pelo STF. Tal prerrogativa seria um indício dos efeitos mais restritos do controle difuso, que dependeria da ratificação de outro órgão para influenciar as relações entre partes não envolvidas na lide originária.

Entretanto, muito se discute acerca da atualidade desse dispositivo em um panorama no qual se observa uma crescente abstrativização dessa modalidade de controle. Em verdade, há crescente entendimento pelo qual se interpreta o artigo citado sob um viés distinto, proveniente de uma mutação constitucional que retirou a necessidade de atuação do Senado para que seja fornecida eficácia erga omnes a essas decisões.

Sobre o assunto, Mendes (2004, p. 17):

Assim, parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, esta decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. (...)

Por conseguinte, infere-se que o controle difuso adquiriu uma abrangência muito maior do que a inicialmente fornecida pela Constituição, o que relativiza as disposições concernentes aos seus efeitos e engrandece sua aplicabilidade.

Ademais, os Recursos Extraordinários ganharam ainda maior força com o advento do Novo Código de Processo Civil (BRASIL, 2015), que prioriza a uniformização jurisprudencial e reforça a importância dos precedentes judiciais (DIDIER, 2017). Dessa forma, os entendimentos firmados pelo STF, ainda que em âmbito incidental, servirão como parâmetro para discussões futuras relacionadas a uma mesma norma que tenha sido anteriormente questionada.

Por tudo que foi exposto, é de se cogitar que a declaração de constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91, ainda que proveniente de controle difuso, obteve efeitos gerais e possui observância obrigatória, desencorajando análises supervenientes acerca da sua conformação constitucional.

3

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

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Contudo, é preciso atentar para o fato de o posicionamento adotado pelo STF se referir à declaração de constitucionalidade da norma, pugnando pela sua permanência no ordenamento jurídico. Se assim o é, não é viável que se obste a reanálise posterior da sua concordância aos ditames constitucionais, pois inúmeros fatores supervenientes podem modificar a interpretação primeiramente aferida. Caso contrário, haveria o risco de engessamento do corpo normativo brasileiro, que seria definitivamente limitado a um entendimento circunstancial da Suprema Corte.

Sendo cabível a reanálise de norma que foi declarada constitucional de maneira concentrada (BULOS, 2015), não parece haver maior obstáculo para que a mesma medida seja tomada em contexto difuso, haja vista a similitude entre as finalidades e efeitos de ambas as formas de controle de constitucionalidade.

Em resumo, constata-se não haver impedimento para que o artigo 18, § 2º, da Lei 8.213/91 tenha sua constitucionalidade novamente ponderada pelo Supremo Tribunal Federal, dessa vez por motivos diversos da permissibilidade ou não da desaposentação.

3.3 Técnicas para adequação constitucional das normas

Pelo que foi previamente explanado, pode-se concluir que a atividade jurisdicional concernente à declaração de constitucionalidade das normas não é algo rígido, pois há margem para novas apreciações e mudanças de entendimento, desde que argumentos e fatos inovadores sejam apresentados.

Especificamente no que tange à constitucionalidade do art. 18, § 2º, da LBP, não se busca, na exposição ora realizada, questionar a decisão do STF. Ainda que a possível inconstitucionalidade da norma seja o principal motor das reflexões propostas, o eventual acerto ou desacerto do Supremo quando julgou os recursos extraordinários referentes à desaposentação não é assunto relevante para as finalidades ora almejadas.

Não é prudente, contudo, ignorar por completo uma importante decisão que versou sobre diversas nuances salutares à elucidação da razão de existência da norma em apreço, motivo pelo qual foram pincelados alguns pontos polêmicos que marcaram a discussão acerca da validade daquela praxe.

É por isso que, em respeito ao princípio da segurança jurídica e à primazia das decisões proferidas pelo STF (AMORIM, 2015), mister se faz discorrer acerca de potenciais métodos para rediscussão de constitucionalidade normativa sem que isso vá de exato encontro

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ao que foi proferido pela Corte Constitucional em avaliação prévia, tornando desnecessária a mudança de entendimento já consolidado.

O princípio da parcelaridade é uma das principais formas adotadas pelo Supremo Tribunal Federal para impugnação parcial de uma norma, conservando-se sua aplicabilidade residual. Por meio deste, o Pretório Excelso tem a prerrogativa de considerar inconstitucional apenas uma palavra ou frase da prescrição legal analisada, mantendo a integridade geral do texto. (BULOS, 2015)

Tem-se, portanto, ser plenamente viável o desmembramento normativo para que sejam declaradas inconstitucionais apenas algumas vertentes dentre o espectro de aplicabilidade do preceito questionado, enquanto este é mantido na regência de situações que não afrontam a Constituição.

A referida base principiológica, entretanto, somente é empregada nos casos onde a inconstitucionalidade do ato normativo provém de vício gramatical, visto tal medida consistir na retirada de frases ou expressões maculadoras da integridade da norma. Porém, quando a deformidade ultrapassa a mera deficiência literal e atinge sentidos extrínsecos ao texto impugnado, necessária se faz a correção da falha por outros métodos.

Em vista de o STF ter reputado a constitucionalidade do art. 18, § 2º, da LBP, para impedir uma prática sem previsão nessa lei, a simples reflexão gramatical acerca da constitucionalidade do artigo não é suficiente para satisfazer as controvérsias que o permeiam.

A mera supressão textual de frases ou expressões não parece ser capaz de sanar a possível inconstitucionalidade do artigo, cuja integralidade pode ser questionada - como o foi nos recursos extraordinários destrinchados - por meio de sólida argumentação jurídica. Portanto, seria preciso que a legitimidade constitucional da norma fosse interpelada de outras maneiras.

Desse tipo de necessidade é que nasceu a possibilidade da declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto. Ainda de acordo com a doutrina de Bulos (2015, p. 371):

O princípio da declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto é a técnica decisória que possibilita à Corte Suprema excluir determinadas hipóteses de aplicação de um programa normativo. Sem empreender qualquer alteração gramatical dos textos legais, permite que o Supremo aplique uma lei, num determinado sentido, a fim de preservar sua constitucionalidade. Ao afastar parcialmente a aplicação da norma, o instituto busca a clareza dos textos normativos e a existência de decisões judiciais abalizadas e coerentes.

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Nesse esteio, "(...) se limita o Tribunal a considerar inconstitucional apenas determinada hipótese de aplicação da lei, sem proceder à alteração do seu programa normativo" (MENDES e BRANCO, 2016, p. 1346).

Ao permitir que o Supremo declare a inconstitucionalidade da norma somente para determinadas hipóteses, o referido princípio busca salvaguardar a aplicabilidade do ato normativo em situações que não tenham sido viciadas pela falta de compatibilidade com a Lei Maior. Ou seja, mantém-se a regência normativa em alguns casos, preservando-se parcialmente a vontade legislativa, ao mesmo tempo em que o ato impugnado tem sua observância vedada para finalidades inconstitucionais.

Fazendo uso dessa técnica, seria absolutamente possível que o Pretório Excelso mantivesse o óbice à desaposentação com base no artigo supracitado, mesmo o declarando inconstitucional no tangente à vedação da percepção simultânea de benefícios previdenciários com aposentadoria. Dessa forma, não haveria contradição ao que foi anteriormente decidido pela Corte, pois seu entendimento seria preservado.

Esse mecanismo, contudo, prescinde de qualquer alteração textual do ato normativo vergastado, pois há unicamente a pacificação de controvérsias interpretativas, onde se indica quais serão constitucionais e quais não o serão, sem demandar reformas estruturais do seu objeto.

Em se tratando de formas para adequação constitucional de dispositivos jurídicos, cumpre informar que há certa semelhança entre a técnica acima citada e a interpretação conforme a Constituição. Este método interpretativo busca selecionar, dentre um feixe de possíveis sentidos normativos, aquele que mais corresponda ao ideário constitucional, em detrimento de hipóteses que estejam destoantes da Lei Maior.

Segundo Xavier (2013, p. 21), a interpretação conforme é o modo pelo qual, havendo mais de uma acepção constitucional para determinada norma, é escolhida a opção que apresente a melhor aplicabilidade dos valores constantes da Carta Magna.

Por englobar uma escolha interpretativa dentre as possibilidades aferíveis pela leitura de um texto normativo - o que representa uma premissa comum a esses dois meios de consubstanciação do controle de constitucionalidade -, a interpretação conforme é frequentemente confundida com a declaração de nulidade parcial sem redução de texto (MACIEL, 2008). Todavia, algumas características as distinguem.

Diferenciando os institutos, Mendes e Branco (2016) consideram que a interpretação conforme à Constituição busca a declaração dogmática de que uma lei é constitucional a partir da interpretação dada pelo órgão julgador, ao passo em que a

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