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Família e Espaço público: Organização doméstica e conflito na reprodução de grupos pertencentes as camadas médias recifenses

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Academic year: 2021

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(1)

3^

A66 3f ^

fec/Pr

T-r'V" ^ ^ yir^c.

lJh4IVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE FILOSOFIA E

CIÊNCIAS HUMANAS

f a m í l i a E espaço PUBLICO:

ORGANIZAÇRO DOMÉSTICA E CONFLITO NA REPRODUÇÃO DE

GRUPOS PERTENCENTES AS CAMADAS MÉDIAS RECIFENSES

DissertaçSo apresentada ao Mestrado 'em Antropologia - ÜFPE para obtençSo do Grau de

M e s t r e

-ORIENTAÇÃO 5 Profa. Judith Chambliss Hoffnagel CO-ORIENTACAOs Prof. Russel Parry Scott

KATIA MEDEIROS DE ARADJO

(2)

í 'ríiJ T ^ AIJIP1A-=? 'V- " < I J ^ / f-"í - ^ ; .V.^1 "i J I HAaílÜ

yi ' r / , • i t a o i i i n a

PE-o 0022812-0

UnlvBrs/dad# Federal de Pamambuc»

BIBLIOTECA CENTRAL

CIDADE universitária

gO-739 - Recife -Pernambuco -Sraafl

(3)
(4)

ÜFP E

Biblicl. .1 -.^satrdj

AGRADECIMENTOS

Inicialmente, é fundamental dizer que as angQstias vividas no decorrer deste trabalho foram bastante amenizadas diante do apoio dos amigos e da família.

Deposito aqui meus sinceros agradeícimentos à professora Judith Hoffnagel pela orientaçêío respeitosa e pela confiança expressadaii ao professor Russel Scott, com quewme iniciei nos estudos sobre "família"; às professoras Maria E^rayner, Gisélia Potengy e Maria do

.

cXuAkcCMM. (Xe £U^ttO

^

Carmo Brandcío os seus empenhos junto ao Mestrado em

Antropologia

-

UFPE.

'^s profas Josefa Balete,

pela

leitura

da

primeira versêto do trabalho, e Lia Parente, p e 1 o$ e:: r.:: f. .i n t (ü> i- e tii íi: q . Ao prof. Marcos Lima, pelas preciosas referências bibliográficas, e à professora Mariza Correia pela atenciosa e oportuna conversa no i n i c i o da pesquisa.

Aos meus pais, irmSos (Clélio, Célio e Stélio), á tia Nilda e principalmente às minhas irmàs (Eneida, Isolda e Mercês), agradeço pelo atcnçb-D b empenho que dedicaram para que eu pudesse concluir o mestrado, e por tudo o mais, que seria aqui d i f í c i l de relatar. Um

agradecimento

especial ao irmào Délio,

por suas provo^caçües.

E

a

tio oJ^ccvwrs

Ana Costa e Antônio F-'ernambuco, afriigoo do—t o d a 0 a üü- h k I'" a o 1

juA4 .

Aos companheiros do Mestrado em Antropologia, meus con temporàneos, c-ígradeço a oportunidade de dividir minhas dúvidas e u[:i!pii^'aç''?iíic!!!!-. Em especial às amigas Grazia Cribari, Zuleika Dantas, Odete Vasconcelos, Clélia Moreira, Lady Selma Albernaz, Glaucia

(5)

Borattoj Silvia MartinS;, Rosalira Oliveira e Marion TeodósiOj e aos

amigos

Ulisses Rafael e Adriano Campeio,

solidários no esforço

de

relacionar o objeto de nossos estudos ao senso comum que todos temos da vida e da sociedade. A E^rigitte Fourastie, Philippe Joron e a Ivson Bezerra, por suas presenças em diferentes momentos, nas

" o c a s i S e s " onde tudo i s s o e r a d i s c u t i d o .

Agradeço ainda ao amigo Flávio Teixeira pela indicaçêío de textos da área de história, e aos integrantes do grupo de "Gênero e Família", o primeiro fórum onde apresentei recortes de minha dissertação.

Agradeço fortemente a Marta Marinello, responsável pela digitação da dissertação, e Sávio Assunção, que acompanhou os momentos finais da redação desta.

.Agradeço finalmente á CAPES pela concessão de um ano e meio de bolsa de estudas e ao do Mestrado em Antropologia —

dissertação?

bem como ao^f uncionáriosVFTete, Dora e Sóstenes,

pelo

apoio burocrático.

Aos inf oriTiantes, que rrie permitiram penetrar um pouco erri suas

vidas,

e aprender com suas experiências, esses merecem

meus

mais

(6)

-f a m í l i a e espaço PÜBLICÜs

OrganizaçS[D Doméstica e Conflito na Reprodução de Grupos

P e r t e n c e n t e s à Camadas Médias R e c i f e n s e s

KÃtia Medeiros de Araújo

RESUMO

Este trabalho investiga a organização doméstica de famílias formadas no fin^tl dos anos 60, e situadas nos níveis econômicos e de p r e s t i g i o mais elevados das camadas médias do Recife» Enfocamos aqui, a relação dessa organização com o mundo do trabalho extra-doméstico e outras esferas de contato entre a família e a sociedade

mais

ampla,

tais

como

a

escola,

os

serviços

de

assistência

psicológica, a religião e o mundo da política»

A

família

é vista como um domínio voltado

ã

reprodução

dos

grupos sociais. Uma das preocupações envolvidas com este estudo situa-se na compreensão das transformações ocorridas na dinéímica dessas famílias, particularmente no tocante ás relações de gênero e ás caracterlsticas da socialização dos filhos, diante do movimento concreto de salda ás ruas empreendido pelas mulheres da geração em questão.

Uma segunda preocupação reside na intenção de^ mens>urar como

as

disposições colocadas pela origem faniiliar,

e por outro lado,

pela

relação das famílias com as rE?feridas instituições,

influenciam

as

práticas e representações do universo social considerado.

.pa

(7)

í n d i c e

INTRODUÇPíO „ » , 01

1. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS 12

1.1, DEFINIÇ/AO DO UNIVERSO SOCIAL TRATADO 12

1 . 2 . COLETA DE DADOS IS

2 . CAMADAS MÉDIAS E TRABALHO 29

2.1. A DEGRADAÇAO DO TRABALHO NAS CAMADAS MÉDIAS DA

SOCIEDADE 30

2 . 2 . ESPECIFICIDADE DAS PROFISSÕES LIBERAIS . . . 40

2.3. UMA INCURSÃO AO UNIVERSO DAS REPRESENTAÇÕES DAS

CAMADAS MÉDIAS BRASILEIRAS 43

3 . DUAS PALAVRAS SOBRE OS BAIRROS 63

4 . CONTEXTUALIZANDO OS GRUPOS EM QUESTÃO 76

4 . 1 . f a m í l i a s DESCENDENTES DE GRUPOS DE ELITE . . . . 76

4.1.1. Situação Social das Famílias de Origem . . . 76

4 . 1 . 2 . T r a j e t ó r i a s P r o f i s s i o n a i s do Homens . . . 85 4 . 1 . 3 . T r a j e t ó r i a s P r o f i s s i o n a i s das Mulheres 93 4 . 2 . f a m í l i a s EMERGENTES NO NÍVEL DOS PROFISSIONAIS

LIBERAIS . . . 105

4.2.1. Situação Social das Famílias de Origem . . . 105

4 . 2 . 2 . T r a j e t ó r i a s P r o f i s s i o n a i s dos Homens 113 4 . 2 . 3 . T r a j e t ó r i a s P r o f i s s i o n a i s das Mulheres 121

5. SOCIALIZAÇÃO, CONFLITO E MARCAS DISTINTIVAS 130 5.1. A FORÇA DO "HABITUS" ENTRE OS DESCENDENTES DA ELITE . . 134

5 . 2 . f a m í l i a s EMERGENTES E A BUSCA DE INDICADORES DO NOVO

STATUS . . . 157

6 . CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . 191

7. BIBLIOGRAFIA . . . 204

(8)

INTRODUÇRO

A organizaçcto dos diversos grupos familiares presentes na sociedade b r a s i l e i r a é uma temática que vem merecendo um r e l a t i v o destaque na nossa produçáo Antropológica» A preocupaçcto em relacionar a família, no sentido r e s t r i t o , com redes mais amplas de parentes, inclusive extrapolando~se essas redes para se delinear contornos da própria estruturação das sociedades, e s t á presente em todas, ou quase todas, as monografias antropológicas clássicas. (1)

Isso nos leva a crer que os estudos de família constituem

n a t u r a l m e n t e um i n s t r u m e n t o de a n á l i s e b a s t a n t e r e v e l a d o r da

sociedade, tanto sobre o aspecto estrutural, quanto sobre as características particulares dos muitos grupos existentes dentro dessa. Esta idéia está, em parte, assentada na perspectiva de que a estrutura social exerce influência sobre a conformaçáo do ethos e das disposiçóes mais gerais dos grupos sociais específicos

(portanto também das características específicas das famílias em cada segmento). Assenta-se, igualmente, na compreensão da importância que têm as famílias sobre a reprodução social, em cujo seio váo se realizar as experiências mais marcantes na formação da visáo-de?-mundo dos indivíduos, condicionando uma reprodução segmentada do conjunto da sociedade, através da reprodução dos seus grupos primários.

(i) No Artigo "Rural, Urbano, Tribais Antropologia e hamília" CORREIA (1988) a s s i n a l a esse aspecto.

(9)

o objetivo de penetrar no âmbito da compreensão da familia enquanto elemento, ao mesmo tempo, estruturado e estruturante da çiociedade, nos remete a uma aproximação para com as concepções de Pierre BQURDIEU (1937,1989), especificamente para com o conceito de "habitus"» Tal conceito representa uma instrumenta1izaçâo das suas preocupações em relação à necessidade de apreenscío do "aspecto ativo da prática", ou seja a necessidade de apreensáo da dimensão pragmática da reprodução dos grupos sociais, configurando-se como uma noçáo que designa um "sistema de disposições adquiridas, permanentes e generativas" (cf» ROMANO, 1987 s 45)

Seguindo essa linha de raciocínio, penetramos no âmbito da compreensão das relações de gânero na familia, das demais relações inerentes à familia e das relações da familia com a sociedade, enquanto relações de poder»

Falamos, aqui, de um poder que está relacionado à capacidade de reprodução dos grupos sociais. Ou seja, o poder que se encontra imbricado com a capacidade que têm t a i s grupos para prosseguir levando suas vidas da forma que melhor lhes convier, assegurc^ndo simultaneamente essa capacidade aos seus descendentes» Um poder que é construído tendo por base as relações fundamentais dentro da familia (relações de sexo e entre gerações), bem como as relações materiais g simbólicas da familia com o todo s o c i a l . A noção de

poder

referida,

pode ser compreendida também através da

idéia

de

"campos de poder simbólico",

concebida por Pierre BOÜRDIEU

(1989),

enquanto campos de conhecimento e de comunicação, através dos quais

(10)

S0 processam relaçòes de poder estruturantes3 considerando-se tratarem-se, t a i s campos, de estruturas estruturadas» Raciocinamos, desse modo, em torno de um sistema agregador, onde figuram a familia e outras instituições sociais, no qual se

processam

relações

objetivas e subjetivas, através das

quais

se

reproduzem os grupos na sociedade. (2)

Dentro da mesma linha de pensamento, concordamos com Lourdes Bandeira na idéia de ques

"Compreender a articulação existente entre produçê(o e reproduçêío, trabalho assalariado e trabalho doméstico significa pensar, simuitaneamente sobre dois grupos de relações sociais fundamentais, isto é, relações de sexo e relações de classe, significa compreender seus significados, diferenças, antagonismos, efeitos e sobretudo as relações de poder (nem sempre visiveis, transparentes), que permeiam aqueles espaços."

(BANDEIRA, 1989 2 12).

A familia é vista aqui como uma instituição voltada à reproduçcío dos grupos sociais, atrawés da produçõo e reprodução de um patrimônio que se configura em termos materiais e, principalmente, de valores, pela via da socializaçSo. Essa reprodução abrange a idéia de uma constante atualização de estratégias e padrões familiares, ou seja, de uma atualização do

(2) Aqui, pensamos no conceito de Reprodução Social, tal como o concebe SARTI (1983') no Artigo "Cotidiano Femininos Lugar dos Outros". Para a autora, nas sociedades industrializadas, a

reprodução dos indivíduos envolve, além da familia,

as instituições

piAblicas, numa relação cuja dinâmica vai definir os limites do

trabalho

doméstico,

ou seja, a

parte da reprodução que é

restrita

(11)

"habitus", face ás t r a n s f orrriaçfóes econômicas e de costumes con cretamente vividas» Pensamos, entSo, que a estruturaçê(o da

família

se objetiva em torno do sentido de manuten ç^'d

dos

grupos

sociais específicos, assumindo, em cada camada, caracteristicas

peculiares para atender a esse propósito básico. Utilizamos,

deste

modo,

a noçáo de hábitos,

enquanto estruturas de um campo de açáo e

representação subjetivo,

no qual

se insere a

família,

cuja operação

(ou função) fundamental consiste na construção de (e na participação em) um sistema simbólico que "integra" e "distingue" os grupos sociais, nas relações destes com seus pares e com o todo

da s o c i e d a d e .

O interesse que motivou a realização deste trabalho partiu da constatação de que, dentre os estudos sobre famílias brasileiras, as camadas médias são muito menos abordadas que outras categorias. Pode-se dizer ainda que os trabalhos que lhes dizem respeito, em geral, possuem uma preocupação constituída em torno da

•»

subjetividade de t a i s grupos (ou dos seus integrantes enquanto indivíduos), menosprezando~se quase sempre os aspectos mais concretas da organização familiar e suas implicações para com a estruturação da sociedade de forma mais ampla. Valoriza—se o subjetivo, ficando para segundo plano a dimensão inter-subjetiva, ou, restringe-se a tentativa de apreensão da inter-subjetividade ao ambiente doméstico, relevando-se o desempenho do grupo familiar no âmbito extra-doméstiCO. Desse modo, torna—se impossível fazer a conexão dos indivíduos com o todo social e a conexão do cotidiano

(12)

Eiciste., por parte de alguns autores dedicados ao estudo da família em camadas médias brasileiras, a intençâío de u t i l i z a r o instrumental teórico da fenomenologia. 3^"o exemplos fundamentais os trabalhos de Gilberto VELHQ (1975-1981-1983) e Tânia SALÉM (1979-1985) . Tais autores se preocupam em apreender a visêío de mundo e as caracteristicas principais do Ethos dos grupos médios do Rio de Janeiro, As abordagens, todavia, privilegiam os valores e as t r a j e t ó r i a s individuais, nsi medida em que é enfatizada principalmente a dimensêío consciente da atividade humana, através da noção de "projeto". Este "projeto" é concebido dentro de um "campo de possibilidades socialmente condicionado", e parece e x i s t i r mais fortemente no cotidiano dos grupos médios que para outras camadas sociais, no entender desses autores. Nesses trabalhos, alguns elementos de análise sSSo tomados da obra de

Alfred SCHUTZ (1979).

De fato, as preocupações fenomenológicas com a questão da realidade cotidiana e as móltiplas realidades mais subjetivas, t a l como abordados por Schutz, contemplam a noçáo do Projeto, cuja possibilidade de existência se dá no cotidiano. Dentre as considerações do referido autor, existe, porém, uma forte recomendação no sentido da existência de uma hierarquia através da qual vivenciamos as diversas províncias de conhecimento, ou dimensões da realidade, cujas influências váío moldar as identidades dos indivíduos e dos grupos sociais. Ele afirma que, dentre todas

(13)

também reterida como "mundo da vida cotidiana" e caracterizada pela vivência do trabalho, seria uma realidade mais importante em relaçcío às demais realidades nSío pragmáticas. Para Schutz, a vivência do trabalho é uma experiência fundamental e uma forma de espontaneidade que leva o indivíduo a "vivenciar o próprio Eu", ou seja, a vivenciar "o Eu que trabalha como o Eu Total" (SCHUTZ,

1979 : 2 5 0 ) .

Essa atençáo ao mundo do trabalho, todavia, nâo parece ser relevante nas abordagens de OELHD e SALÉM- Nelas, o mundo do trabalho figura, quando miuito, como um niero pano de fundo, ao qual se confere pouca importância. As temérhicas a que t a i s autores se

dedicam ~ ^inârni ca das famílias flEsaáànsffl, comportamento desviante e

identidcudca de grupos assxscss» - parecem e x i s t i r nessas obras de

forma um t a n t o i s o l a d a da base m a t e r i a l da s o c i e d a d e .

A justificativa da presente investigação encontra-se, pois, na necessidade de uma maior elucidação da dinâmica das relaçóes familiares nos segmentos médios de nossa sociedade, considerando-se

que essa discusscío nas camadas de- baixa renda já se encontra melhor

esboçada.

A

ampliação dessa discussão para o âmbito

das

camadas

médias

traz

em seu bojo dois aspectos fundamentais.

Em

primeiro

lugar, representa uma tentativa de contribuir para a construção

de

(14)

estudo das famílias brasiltíiras (3). Nesse sentido, uma maior elucidaçêío acerca da posiç/ào dos grupos médios na divisão social do trabalho, e a interferência dessa posiçê(o no âmbito da familia, se apresentam como instrumentos que poderê(o se prestar a essa comparabi1 idade n

Em segundo lugar, busca-se também fazer uma contribuição ao debate sobre as relações de gênero e a condição da mulher neste universo, através de uma investigação sobre su£t posição na familia, diante da maternidade, e enquanto sujeito que também atua no espaço e?x tradomésti CO. E finalmente, é também propósito dessa investigação, cotejar as caracteristicas da educação dada aos filhos entre as famílias estudadas, bem como as caracterlsticas da interação de t a i s famílias com algumas instituições públicas que se relacionam diretamente com o domínio privado.

Nesse sentido, foi escolhido para o estudo um segmento social onde as mulheres efetivamente entrètram na vida pública exercendo atividades profissionais socialmente legitimadas, algumas inclusive em situação bastante semelhante á de seus cônjuges, se pensarmos no aspecto da instrução e profissionalização, ou seja, da educação formal, até o momento anterior ao nascimento dos filhos. No Brasil, trata-se de uma condição peculiar aos estratos médios empregados nas funções mais bem re-muneradas do campo das profissões liberais,

(3) A necEíssidade de se realizar estudos comparativos entre os diversos segmentos sociais presentes na sociedade brasileira, no •âmbito da família, foi fortemente enfatizada por CORREIA (1988) e SCOTT (1988,1993). Esse segundo autor situa a importância das

(15)

sensíveis ao apelo ideológico dos cânones do movimento feminino (mais evidentes èi pantif da década de óO) ^ bem como â pr"ópr'ia necessidade de potencialisaçâo do nivel de s t a t u s e consumo das famílias na fase do "milagre econômico b r a s i l e i r o " .

O nível de legitimidade da "salda às ruas" empreendido por essa geração de mulhere-s, fica patente na forma como se dá a delegação de certos aspectos do trabalho doméstico, anterioremente assumido por elas no seio da família, a outras instituições e serviços sociais (á escola, á Igreja, ás clinicas de psicologia, aos espaços de lazer e recreação e outras instâncias da esfera

pública).

Trata-se,

portanto,

de um grupo que pode pagar,

a

outras

instituições pela realização de algumas tarefas bastante sutis, ligadas á reproduçáo da famlliat, ficando, as esposas como administradoras (e náo como e>;ecutantes) desse tratbalho. Isso se observa, mesmo para os casais onde atividade feminina náo resulta

num efetivo retorno econômico ao grupo—fami1iar»

Esse último dado nos faz pensar que o fato das mulheres sairem

ás

ruas para trabalhar,

e a

própria delegação de

algumas

funções

anteriormente atribuídas à família, ao mundo público, figuram como

elementos cujo peso simbólico é

t/áo forte para o segmento

estudado

quanto o que possam significar em termos de estratégias econômicas.

A relaçáo processada entrE? essas famílias e

tais

instituições

parece imprimir á feição das mesmas, principalmente no tocante à

formação

afetiva

e

á

preparação profissional

dos

filhos,

urna

(16)

«iLito-sufi ciente - Surge, freqüentemente, no diecurso dos cônjuges a idéia de que o domínio da família, enquanto núcleo agregador das tarefas de reproduçSío, pode ser substituído por outras instâncias sociais. E em conseqüência, a idéia de que a preparação para o casamento nâo é a prioridade principal da vida dos jovens. Essas considerações parecem colocar em cheque o próprio conceito de família enquanto lugar privi1iegiado da reprodução social.

Por outro lado, os próprios depoimentos obtidos na pesquisa assinalam a idéia"de que os filhos dessas famílias est^o voltando a se casar cada vez mais cedo, tal como os pais de seus pais, fazendo

cair

por terra a

idéia de que essa formação para

a

independência

poderia

apontar para uma deses"truturaçâo da instituição

familiar.

Sobre os casamentos desses jovens, parece e x i s t i r (por parte dos

pais

e

deles mesmos)

uma perspectiva de

orientaçâ'o

tradicional,

onde a união conjugai deve ser efetuada entre pessoas que comungam em "termos de nível social e de aspirações, e destinada a durar "até

que

a morte os separe",

é; claro que esse dado coexiste,

de

fato,

com

um

grande número de separações conjugais, que a cada

dia

se

realizam

mais precocemente em relação ao padrão

cristalizado

nas

famílias de origem, freqüentemente referidas nos próprios discursos

d o s i n f o r m a n t e s .

Do

quadro acima, nos interessa resgatar uma problemática

que

^ partir da relaçáo das familias estudadas comi

alguffias

outras

instituiçõeís

da sociedade,

observando-se

atentamente

as

possíveis modificações substanciais que se processam

no modelo

de

(17)

empiricas desse modelo, cujas características principais são implementadas com a redefinição do papel das mulheres no mercado de trabalho» Trata-se, pois, de uma problemática que está imbricada com a questão da identidade e das representações das famílias, dos indivíduos, e de modo mais amplo, do grupo social abordado. Ao nosso ver, a forma assumida pelo conflito entre orientações e valores repassados aos filhos, em parte decorrentes da configuração do processo relacionai a que se submetem as famílias em parte fruto das orientações advindas do seio das próprias famílias estudadas e seus grupos sociais de origem, vão caracterizar os

s i n a i s demarcadores de i d e n t i d a d e s d e n t r o do u n i v e r s o s o c i a l

t r a t a d o .

Tentaremos, então, cotejar algumas das expressões que consideramos fundamentais para o entendimento dessa problemática.

(18)

1 . METODOLOBIft

Neste capitulo, 5erâ'o discutidos os aspectos concernentes às estratégias metodológicas adotadas no trabalho- A primeira parte contém uma definição do universo social pesquisado. Em seguida são tecidas considerações em torno da forma de obtenção dos dados

u t i l i z a d o s e s u a a n à l i s e

-1-1 DEFINIÇPíO DO UNIVERSO SOCIAL TRATADO

Uma das perguntas iniciais de qualquer investigação sobre a temática da familia situa-se precisamEí'nte na delimitação da

conjunto s o c i a l abordado- âsxsasáafeawiHes» o f i o condutor desta

delimitação foi a questão teórica do pertencer a determinado segmento profissional da "classe média", precisamente o setor dos profissionais l i b e r a i s mais qualificados e melhor remunerados na escala de poder e? prestigio dessas profissões, um grupo que figura

e n t r e o s mais a l t o s n i v e i s de r e n d a e s t a t u s em R e c i f e . E s s e

primeiro deiineamento foi traçado sob o ponto de vista da situação •^sastasstissdása dos cônjuges das famílias em questão.

A busca de um conjunto de famílias que, para além da integração a essa grande categoria, pudesse ser entendido enquanto grupo que possui certo nivel de coe-jsão ideológica, foi operacionalizada empiricamente através da construção de outros dois indicadores. Isto é, buscamos famílias que, afora uma situação média comum em termos de profissionalização e ocupação,

(19)

cotidiana» Desse modo., tornamos também como aspectos relevantes, o local de moradia dessas famílias (na SLiposiç'ào de que essa vivência comum promove uma participaç'ào quase que obrigatória, e não necessariarnente intencional , das mesmas em c e r t a s redes de relaçóes especificas. Por exemplo, o consumo de certos certos serviços t a i s como o supermercado, as lojas comerciais e padarias locais, o trânsito por ruas da localidade, etc)? bem como a posição dessas familias no "ciclo de vida do grupo doméstico".

Explicando mais detalhadamente o percurso metodológico que levou à definição do universo social tratado, podemos dizer que as familias pesquisadas pertencem a um determinado segmento que pode ser identificado pelos c r i t é r i o s enumerados abaixo.

Em primeiro lugar, em todos os casais investigados, pelo menos um dos cônjuges (muitas veezes ambos), pertencem ao grande grupo dos profissionais liberais. Isto é, integram uma faixa profissional que desempenha atividade não manual, contam com instrução superior, e na maioria das vezes estão enquadrados no setor das atividades improdutivas (ou seja, não se empregam diretamente nas atividades de produção, b sim nas atividades de ordenamento sistemático do campo produtivo, ou ainda em atividades ligadas à prestação de serviços no campo humanistico).

Esse aspG5cto, entretanto, não pode ser tomado como o único condicionante na vinculação ideológica e social desse grupo, uma vez que a categoria dos profissionais liberais abrange uma vasta h€?terogeneidadGí em termos de ocupações, faixas de rendimento e

(20)

situações profissionais o de s t a t u s . Por sua vez j. essas diferenciaçSes d'à'o lugar a uma enorme diversidade em termos de visties-de-mundo, traduzidas em uma grande heterogeneidade com relação a afiliaç'Òes religiosas e políticas, formas de organização familiar e outros aspectos» Assim, nos restringimos a lidar com um determinado setor dos profissionais liberaiss especificamente, aqueles profissionais cujas atividades guardam ainda uma certa referencia ás noçtíEí-s de autoridade e independência no

trabalho-Para o grupo com o qual lidamos, o indicador de renda e poder

aquisitivo i Jh «i i»» i desempenha uma

importante função no sentido de sua dei imitaç'à'o, na medida em que o mesmo figura como um dos scatores mais bem remunerados no universo das ocupaçbes médias. O mesmo podemos dizer em relaç"à'o à situaçà'a

profissional

(ou

' i I ii [[_,sas» dQ traba 1ho^jt^-ni gá ) ,

tanto

sobre

o

aspecto pragmático do poder concreto que essa situação envolve, quanto sobre o simbolismo da superioridade implicado com o campo de t a i s ocupaçües. Queremos fazer mençcío à própria imagem (ou representação) da profissêto liberal, que é dada como uma ocupação de e l i t e . A gama das ocupaçbes compreendidas no universo das profissbes propriamente liberais podem ser identifiçadas como profissbes de e l i t e , tanto pela própria natureza da profissão, quanto pela forma de eMercicio tipicameínte liberai- No primeiro caso, temos em mente as primeiras profissóes tidas como l i b e r a i s em nossa sociedade - a advocacia e a medicina, por exemplo. No segundo caso, nos referimos às atividades de consultoria, ao magistério superior e às atividades projetuais, mesmo quando aplicados a

(21)

profissCJes mais recentesj, t a i s como a informática e outras» (1)

G segundo c r i t é r i o indicador de pertencimento a um determinado universo social foi construído em torno da questão do local de moradia. Ao nosso ver? a referência ao aspecto da localidade

abrange^ náo somente a dimensáo da\ distribuição geográfica da malha

socialj^

mas incorpora elementos da história particular dos

grupos

locais, incluindo a questáo dos movimentos de urbanizaçc(o da cidade, que por sua vez j á sáo influenciados pelos movimentos econômicos da sociedade (numa s i n t e s e e n t r e natureza, cultura e

economia) .

A terceira preocupação que tivemos em mente na seleçáo das famílias investigadas, relaciona-se, desta vez, à idade e à estruturaçáo dos grupos familiares. Resolvemos tratar com famílias que estivessem em duas situaçÓE^s Gísp&íCificas dentro do ciclo de vida do grupo doméstico. Especificamente a fase onde a família j á t i v e s s e f i l h o s (adolescentes ou jovens) residentes no núcleo familiar, e a fase onde os filhos j á estivessem adultos prestes a s a i r de casa, alguns já casados. E>íetuaram~se, nessa escolha, casais recém-casados sem filhos, ou com filhos recém nascidos (o que nos levaria no geral a tratar com casamentos mais recentes),

bem como famílias em fase de? substituiçê(o (cônjuges bastante idosos

(1) Acrescente-se? que a atividade de consultoria pode efetivamente se dar nos consultórios e e s c r i t ó r i o s p a r t i c u l a r e s , bem como nas próprias empresas públicas ou privadas. Aqui, para além da forma de remuneração ou vinculaçáo do profissional a uma empresa, conside-ra-se a natureza de sua intervenção, que se dá em termos de consulta ou projeto.

(22)

onde já náo houvessem filhos a serem criados em sua companhia) (2)» Essa exclusáo justificou-se, na medida em que se pretendia investigar casais que ainda vivessem a situaçáo de residência com sua prole, uma vez que um dos elementos fundamentais de nossa análise recaiu na quesfáo da socialização e orientação profissional dos filhos, bem como na orientaçáo em relaçáo à concepçáo de

f a m í l i a e c a s a m e n t o .

Esse c r i t é r i o , por outro lado, permite delimitar a faixa de idade do grupo familiar, bem como as faixas de idades individuais dos membros das famílias. O que nos levou a t r a t a r náo só com grupos que vivem atualmente situaçóes domésticas semelhantes, como também com indivíduos que viveram e vivem fases semelhantes de suas vidas em um mesmo momento histórico, compartilhando percepçóes e vivências espeíclficas de uma determinada época*.

Os critérios acima mencionados^, "prepararam o terreno" para uma coleta* de elementos que permitiu a reconstrução da base de socia^l izaçáo a* que os indivíduos?, pertencentes ás famílias pesquisadas fora^m submetidos. Entenda-se que, enquanto base de E>ociail iza*ç'à'D, queremos elucidar o processo que se desenvol ve na*s famílias e? na*s redes de relaçáo em que estas estáo envolvidas, no ssentido de possibilitar aos indivíduos uma^ vivência* integrada aos padróes maxteriais e valorativos do grupo que os circunscreve, formulada através da comunháo de determinados valores, que advêm de uma vivência b de uma linguagem comuns. Essa linguagem é

(2) Esse raxcioclnio está baseado na idéia de ciclo de vida do qrupo

(23)

c o n s t i t u í d a de elementos que decorrem de uma determinada forma de

relaçèio das famílias com o mundo do trabalho, com o mundo da política, com a dimiens^ào da religi'è(o e com outras instituições, dentro do espaço pCiblico, bem como de uma determinada forma de organização familiar, em sintonia com as perspectivas ideológicas

recorrentes no segmento social tomadOn

Definidos esses indicadores e após iniciado o trabalho de STTãTise? dos dados, verificarmos que a população pesquisada apresentava certa coesão Evm termos de compartilhar algunias vivências, mas apre^sentava nuances bastante significativas em relação às percepções acerca de alguns aspectos fundamentais da vida, por e>íempio, acerca das t r a j e t ó r i a s profissionais de homens e mulheres, e de diversos aspectos concernentes à socialização dos fi1hos, entre outros.

No decorrer desse processo, nos demos conta de que o eixo fundamentador de algumas dessas distinções perceptivas poderia estar relacionado ao aspecto da origem familiar dos indivíduos cônjuges f-Hini i i um-, ui. i r pi. i i .1 .hLh i:__ mais precisamente às distintas situEiçÕes s o c i a i s das suas fartiilias de origem, e consequentemente às distintas condições dE? vida que experime-ntaram na infância, adole?scência e juvEsntude, uma ve?z que quanto ao aspecto da situação econômica e de trabEilho com que contami atualmiente, não existem grandes difereínciações E?ntre os indivíduos e oeí grupos familiares p e s q u.i Ei a d o s ,

(24)

esperado que a lógica da anéiliseí empreendesse uma agregaçêío dos dados de modo a ordenó-los em t r ^ s blocoss informaçóes sobre as famílias onde ambos os cônjuges descendem de grupos de elite? inforrnaçóes sobre famílias onde ambos os cônjuges descendem de

camadas de baixa renda? e informações r e l a t i v a s às f a m í l i a s onde um

cônjuge descende da e l i t e e o outro descende das camadas de baixa renda. Poderíamos cotegar ainda os casos onde os cônjuges advém de famílias que estào integradas e estabi1izadas em situações médias (em termos econômicos e de status) há mais de uma geraçào; bem como poderiaíTios matizar as situações onde o cônjuge feminino advém da e l i t e (e nào o masculino), sendo o seu par oriundo das camadas de baixa renda, e vi ce-v6;-rsa.

A nossa análise, entretanto, aborda os dados de forma

simplifiçada,

por

considerar

luz

das

próprias

informações

colhidas) que a tendência das famiilias onde exista um cônjuge

Oi*. oriundo da e l i t e (sendo o outro oriundo das camadas de baixa rencT^r) se apresenta de miodo a assumir o status do grupo de maior poder aquisitivo e social. Do mesmo modo, as informações relativas às famílias oriundas de grupos estabi1izados em "situações médias" há mais de uma geraçào, tenderam a uma equalizaçào simbólica (ou de habitue) para com as famílias oriundas dos grupos de elite. Em

todas

as categorias sociais mencionadas acima,

identificamos

uma

perspectiva

de

açào que pode ser

esquematicamente

traduzida

em

termos de? manutençào do nível de status e poder aquisitivo jà

•QSSSX^^

procurando-se garantir que este nào seja rebaixado.

Por outro lado, nas representações

(traduzidas em

estratégias

de

açàü concretas)

encontradas no universo das famílias que

estào

(25)

ingreBS-ando no nível das camadas médias (cujos cônjuges têm por t. ante

X*\CAÀ»V

6tO>lW>VULZA^ -C.

portanto^ origem nas camadas de trabalhadores de situaçcto^V^^ocial " 3 identificamos uma perspectiva de ação que pode ser representada, a grosso modo^ emi termos de estratégias de ascensão s o c i a l , i s t o é, estratégias para galgar uma situação econômica e de s t a t u s superior à de suas famílias de origem.

(í/> CoAÒi^ pucU. ço

/vi'íuaUÍW

6U^

rei ação á questão de discutir se o parentesco coíti grupos de

e l i t e se dã através do cônjuge feminino ou masculino, nosso pensamento é o de que t a l nível de consideraçtíes seriai de grande importância, dado à força reveladora das relaçtíes de gênero contidas em tal argumento. Todavia, procuramos considerar t a i s aspesctoB no bôjo t o t a l da a n á l i s e , e não como assunto especificamente topificado, o que viria a fragmentar por demais o esquema einalitico do nosso estudo.

A partir dessas constatações, nossa análise empreendeu um tratamento aos dados de forma a agregá-los em dois blocos, segundo a origem familiar dos informantes, analisando separadamente as informações relativas às famiilias onde existe pelo menos um dos cônjuges descendentes de grupos de e l i t e , e as informações relativas ás famílias cujos cônjuges descendemi ambos de camadas

a s s a l a r i a d a s de b a i x a r e n d a .

1 - 2 . COLETA DE DADOS

A maior parte dos dados utilizados foram conseguidos através dei entrevistafi semi-estruturadas com as famílias, onde procuramos colher depoimentos sobre as rtilaçõtis entre os cônjuges, seus filhos

(26)

e pessioas outras residentes ou nSto nas unidades domésticas (famílias de origem e outros parentes^ empregados, e nc(o-parentes) .

Procuramos também tomar depoimentos que versassem sobre a relaç'à'o dos indivíduos com seus trabalhos extra-domésticos e outras redes de relaçcto externas, t a i s como Igrejas, partidos políticos, clubes sociais, e t c . . . Nosso objetivo foi o de entender em que medida se dá a interferéncia\ das prescriçtíes de t a i s i n s t i t u i ç õ e s na dinâmica das famílias, e em que medida a organização familiar dos grupos se choca com tais prescrições. Desse modo, visamos apreender os aspectos conf 1 ituais que se esboçam necessaria,mente no cerne? de t a i s re?!ações.

Junto aos nQcleos familiares foram realizadas 22 entrevistas, abrangendo um total de 13 famílias, das quais apenas 18 entrevistas foram utilizadas mais d i r e t a m e n e ? 1 o ^^fato destes informantes Kse enquadrarem usasss perfeitamente nos critérios de idade, ou situação conjugai requerida. Os entrevistados foram basicamente os dois c;ÔnjugG?s de cada grupo familiar. Em quatro das famílias, porém, sò foi possível entrevistar um dos cônjuges. (Ver anexos 1 e 2). Através dos depoimentos, pudemos t e r acesso ás informações ligadas tanto à vida a n t e r i o r ao casamento dos indivíduos e suas relações

com

as

famílias

de

origem

,

quanto

à

base

estrutural

de

funcionamento das familias que constituíram pòs-casamento.

Realizamos,

l'r/7rt.. uma única entrevista com uma mulher

chefe

de família,

embora essa tenha sido também pouco utilizada, uma

vez

que

nossas atenções se voltaram mais precisamente para a

dinâmica

(27)

das famílias consideradas» completas (cônjuge masculino, cônjuge feminino e f i l h o s ) , por imaginarmos que a problemática das famílias

que viveram separações conjugais mereceria um estudo próprio,

o que

viria a arnipliar por demais o âmbito de nossa investigação. Essa e n t r e v i s t a , todavia, foi utilizada como uma fonte r e s t r i t a de dados

d e c o n t r o l e .

Em

algumas situações,

tomamos

o depoimento

de

pessoas

representantes de outras instituições (sempre relacionadas às famílias, especificamente estudadas). Em tais casos, diferentemente das entrevistas com os cônjuges (que foram realizadas de forma bastante sistemática e de cuja estrutura falaremos mais tarde),

essas

entrevistas foram mais restritas e

informais,

muitas

vezes

versando sobre assuntos especificas previamente deiineados. Nessas circunstânci.as, forami entrevistados um piadre, algumas senhoras participantes do movimento pastoral ligadas à paróquia de um dos bairros, bem como um diretor de clube social, três profissionais de saóde (incluindo duas psicólogas & um médico) e três profissionais de educaçào, sendo dois deles professores universitários, e a t e r c e i r a , uma professora do Estado. 0 diretor de clube social, bem como os profissionais de saóde cí educaçào acima referidos sào integrantes das próprias famílias pesquisadas, que foram Gff-itrevistados também na qualidade de representantes dasV-^^pectivas éireas profissionais , sggBsqsasGass^sesiÉèeÉAsceisa. Nessas ocasiSZò, foram tratadas com eles questões que objetivavam alcançar suas concepçõe?s, do ponto dei- vista do profissional, acerca de algumas

problemáticas familiares-

(Ver quadro demonstrativo no anexo 1).

(28)

e n t r e os discursos dos membros das famílias (quando versavam sobre suas relações com t a i s instituiçtíes) , o discurso desses representantes de outras instituiç&es, mais aproximado de um

d i s c u r s o i n s t i t u c i o n a l n o r m a t i v o e formai 1 .

O c o n t a t o com e s s e s i n f o r m a n t e s f o i i n v a r i a v e l m e n t e

intermediado por terceiras pessoas (afora o pesquisador e o entrevistado) u Essesi intermediários desempenharam o papel de agentes de contato, devido ao fato de se relacionarem ás famílias em questáo, nêi qualidade de amigos ou rrremíbros, e á nós, nai qualidade de amigos, conhecidos, ou simplesmente pessoas ligadas ao meio acadtímico que aceitaram contribuir com o estudo» A eles foi pedida a indicaçáo de famílias residentes nos bairros escolhidos que se enquadrassem nos demais critérios adotados, outras indicaçóes foram f e i t a s por inforniantes j á entrevistados.

Através dessas indicaçóes (acompanhadas de telefonemas dos agentes de contato aos possíveis entrevistados), pudemos desfrutar de uma aproximação um pouco maior com as famílias pesquisadas. De nossa parte, fazíamos também em contato telefônico i n i c i a l , onde •espondiamos^tÜBK algumas questftes sobre a natureza da pesquisa, e marcávaíTiDs um horário para o G?ncontrG.

Ainda assim, alguns informantes se mostraJ?*ani bastante

r e t i c e n t e s ao f a l a r s o b r e a v i d a f a m i l i a r wni'1 i MUNir, pi.iin m. nui mi,

•ixsasasSí I ti I h M'I iiii, limitando-se a responder as questóes de maneira formal. Mesmo no contato com famílias junto ás quais j á érarcios conhecidos e desfrutávamos do status de amigos (particularmente o

(29)

casQ de t r ê s familiar a que chegamos indicados por membros das mesmasy •> - j' - as relaç&íes estabelecidas na situaçãío de entrevista foram substancialmente diferentes das anteriormente mantidas j conf igurando-se como espaços de interaçê(o pouco confortáveis. A presença do gravador, nestes contextos, acentuam o caráter de pouca intimidade e a a r t i f i c i a i idade do momento de entrevista. Todavia, houveram também informantes que se envolveram com os assuntos, fizeram confissões, chegando alguns ao desabafo, principalmente após desligarmos o gravador.

A maioria dos entrevistados, com exeçáo do padre e de outras poucas pessoas, fizeram referências á questáo da prEíservaçêío de

suas

identidades^

como

uma

condiçáo

indispensável

para

que

aceitassem colaborar com a pesquisa. Nessas situações, que geralmente ocorreram no inicio das entrevistas, colocávamos que náo

e r a nosso o b j e t i v o r e v e l a r os nomes dos informantes em nenhum

momento do trabalho, e que as entrevistas seriam utilizadas com t o t a l discriçáo. (3).

O roteiro das entrevistas com os cônjuges foi estruturado de modo a abranger as atividades que podem ser consideradas como as

miais

importantes

da

vida

familiar.

Ou

seja_,

aquelas

que

se

commo

VMO

dc

dxi'

fjàtr imônío,

do nível de status e dos valores do grupo. A operaçáo

de

reificar

algumas atividades fundamentais

dentro

da

dináíTiica

(3)

BOTT

(1976

s

35), emi "f-amília e

Rede

Social",

um

estudo

realizado com famílias inglesas de camadas sociais diversas, faz

( - ^

exigência

do anonimato como

condiçáo

essencial

á

colaboraçáo dos informantes; bem como á utilizaçá-o de

instituições

que prestam serviços as famílias,

como "agentes de contato entre os

(30)

fõfTiiliar promove uma aprox imaçãtD para com a dimensão do "funcionamento" do grupo doméstico. Para a apreensão dessa "dimensão funcional" da familia^ utilizamo-nos de um esquema teórico proposto por WILK e NETTING (1984) e modificado em alguns elementos por 3C0TT (1988), que apresenta uma relação de cinco esferas básicas de atividades ligadas ao grupo doméstico.

Essas esferas de atividades, t a l como mencionadas na referida literatura, são: 1. a esfera da produção, que compreeende a relação da família com o mundo dos trabalhos extra-domésticos, ou melhor, as atividades necessárias para se conseguir os recursos que possibilitam o atendimento da demanda material da família? 2. a

esfera

da

distribuição,

OLt

seja,

a

aplicação

interna

desses

recursos segundo a demanda da unidade doméstica? 3, a esfera da transmissão, que abrange as idéias dei repassar e poupar (ou acumular) à família o que é necessário ao seu funcionamento, compreendendo-se desde os ig.dii. I i i'; materiais e subjetivos para com a

foríTiação dos mais jovens,

até a

formação de um patrimônio, quer

em

termos materiais,

quer em termos do que Pierre Bourdieu chamaria de

"capital cultural"? 4. a esfera da socialização, que diz respeito á

inserção

dos

mais jovens em certas redes de

relação

familiar

e

social

(por exemplo,

Igreja,

clubes sociais, o consuma

de

certas

informações televisivas, etc), através das quais se processa o aprendizado de uma linguagem c « r a c t e i " i a ao grupo, e cujo

docíinio

pior

parte dos integrantes conferem a

legitlcjadade

desse

grupo perante a sociedade? b. e por Qltimo, a esfera da c6—

(31)

funcionamento doméstico^ abrangendo as relaçfóes interpessoais entre-os indivíduos na unidade doméstica e, nessa perspectiva;. as relações de intimiidade entre os cônjuges e os membros da família como um todo, os cuidados para com os filhos menores, a relaçõo com os empregados, e t c . . .

ü objetivo desse esquema analítico das atividades da família, que funcionou como uma base sob a qual estabelecemos o nosso roteiro de entrevistas, foi a apreens^'o dos mecanismos pelos quais se processaria reproauçêío dos grupos faniiliares investigados.

üm outro nível de atenç'è(o objetivado na construção de t a l roteiro foi a apreensão da dimens'â(o conflitual subjacente às relações dos membros da família entre s i , e da famiilia para com a sociedade mais ampla. SIMMEL. (.1.933) chama a atençào para a presença disseminada de algum nível de conflito na relaçào entre pessoas e/ou grupos, afirmando que o foco das investigações da sociologia deveria ser centrado nos aspectos conflitivos das relações s o c i a i s .

Essa vertente da análise se constitui à medida em que o autor compreende a necessidade de t e r , a sociologia, um objeto próprio, uma ves que nem tudo o que acontece na sociedade merece o nome de social ou pode ser por ela interprEítado e compreendido. Acreditando que o processo básico de "sociaç^o" (que seria para ele a dimensào absolutamente dinâmica da sociedade, ou se-:?ja, o constante fazer, desfazer e refazer das relações sociais) é constituído, ' por um lado, pelos impulsos dos indivíduos, e por outro lado, pelas formas conflituais que essas motivações assumem em sociedade, SIMMEL

(32)

constituir o objeto próprio da sociologia. Do mesmo modo, a natureza dos impulsos em s i (ou o conteódo fundamentador das

relaçóes) ,

serve

mais-

propriamente

como

objeto

para

outras

"ciências da moral" (4). Esta distinção é fundamental no arcabouço da "sociologia formal" desenvolvida pelo autor. Ds impulsos, porém,

sempre se apresentarão de modo a gerar situaçóes de conflito,

pois

para o autor,

a sociedade é

conflitiva.

Para i l u s t r a r a dimens'ào do antagonismo estrutural de todas as

formas de relaçóes humanas,

a

"sociologia do conflito" de SIMMEL se

utiliza da distinção entre conflito e indiferença. O conflito seria a essência e o fundamento de qualquer relaç^'o social, sinônimo de

interação. Mesmo quando ele

Eie

apresenta

de

forma

radicalmente

antagônica,

ainda

assim significa interaçcío.

Eííiste

sempre

uma

tensão que liga dois pólos antagônicos, integrando-os. Em contraste, a indiferença representa a negação pura de uma interação, ou a n'èio interaçãío.

VELHO (1981) se u t i l i z a de uma confessa inspiração na teoria do conflito simeliana, mais propriamente na idéia de fragmentaçê(o

da

€?;íperiência

dos indivíduos expostos a

uma

multiplicidade

de

relações, nas sociedades complexas. Para este autor, o conflito

gerado

pela

simultaneidade

dessas

experiências

é

passível

de

soluçê(o em dois níveis.

No primeiro,

o

"individualismo",

precedido

(4) Cabe acrescentar que SIMMEL propõe uma distinç'á-o entre forma b

c o r"i t e ú. ci o a p e ri s

c o mi o i..i ma e s t r a t é g i.a que visa facilitar o acesso

a o

social,

distinguindo-o do campo da psicologia, da filosofia

e

de

outras ciências irmi^s. MesEi&? Eientido, e?ssa distinção significa uma

g?st.ratégia d(B abordagemi,

e nê(o a concepção de? que essas

realidades

s e? r i a m s e g me n t a <j a s o i..i esta n q u e s .

(33)

pela formulação de um projeto individual, ee apresenta como a l t e r a n t i v a . No segundo nivel, a solução para t a l ambiência c o n f l i t i v a v i r i a através de um "mergulho radical" em um tipo de "experiência tota1izadora", a partir do qual ocorre a identificação com determinado grupo» Em ambas as posiçães, entretanto, a atenção do autor parece se voltar quase que exclusivamente para o limite do indivíduo» O conflito do qual se dá conta com maior clareza, parece ser o conflito interpessoal, tratando com certa indiferença a interferência das relaçfóes de poder existentes entre os grupos constituídos na sociedade, bem como a mediação das instituições sociais nessas relações de poder.

De nossa parte, o que nos interessa apreender é o conflito gerado, na relação entre? a i n s t i t u i ç ã o familiar e outras instituiçõesj a e l a reiacionadcis, pela superposição de papéis e atividades entre t a i s i n s t i t u i ç õ e s na sociedade, mesmo quando a expressão deste conflito é apreendida no nivel interpessoal.

Desse mcjdo, lançantJo mão das concepções da sociologia formal e tentando instrumenta1izar o principio básico da teoria do conflito, resolvemos observar atentamente todos os elementos esboçados no discurso dos E?n trevistados, que viessem a revelar interações,

portanto

conflito,

entr'e

as

famílias

e

outros

agentes.

Principalmente?

quando

o

discursa de tais

agentes

representa

o

discurso o f i c i a l de outras i n s t i t u i ç õ e s .

Assim, sobre cada uma das esferas de atividades da vida f a mi lia r , f o r a m e? 1 a b o r a d a s cju e s t Õe s c o ni o o b j e t i v o d b a p r e e n d b r o

(34)

conflito envolvido nessas situagCíes. Ou seja, no dominio privado

buscou-se apreender o conflito interno à unidade doméstica e o conflito r e l a t i v o a outras relaçtjes de intimidade (incluindo as relaçdes afetivas) dos indivíduos e grupos. No dominio da vida pública, objetivou-se apreender o conflito posto na relaçêía da familia com o mundo do trabalho de seus membros, e de modo mais amplo, nas relaçdes entre familia e algumas instituições cuja atuaçêío se volta a um dominio bastante práoíimo ao âmbito privado.

Uma certa atenção foi dada ao conflito emergente da relaçâío entre os grupos familiares e os agentes produtores de idéias, ou seja, da relaçõo de consumo de produtos da midia e de outros produtores intelectuais (por exemplo, a leitura de jornais, revistas e outros tipos de leitura, e ainda a audiência de programas de t e l e v i s ã o ) .

Contudo, essa invest igaç<?5o limitou-se ao registro das percepções dos entrevistados sobre os conteúdos veiculados por t a i s instâncias, nõo sendo possível se proce^der a uma investigação mais ampla, onde se observasse mais objetivamente os próprios conteúdos veiculados por t a i s instrumentos.

A apreensõo da forma de expressão dos conflitos que envolvem a familia, e que em essência estõo imbricados com a relaçõo entre os domínios público e privado da socieídade, é para nossa investigação de fundamental importância, uma vez que compreendemos, seguindo as pisstas deixadas por SIMMEL, que a configuraçcto da identidade dos

grupos na sociedade está fortemente relacionada ao nivel e ao

modo

pelos

quais

se

dáo as inte-rações

entre

indivíduos,

grupos,

e

(35)

instituiçfôeB sociais^ bem como à forma pela qual se expressam os c o n f l i t o s advindos dessa relaçSo- A organizaç&'o doméstica (ou familiar) nc(o poderia, de outro modo, fugir às influências dessas i n t e r a ç õ e s .

Deste modo, preocupa--nos aqui compreender as c a r a c t e r í s t i c a s próprias a cada um dos dois conjuntos de famílias tratados, por exemplo, em relaçào às formas diferenciadas de consumir certos serviços oferecidos pelas i n s t i t u i ç õ e s forEi da familia, em relaçào às diferentes representações que fazem deste consumo, entre outros aspectos.

(36)

2 . CAMADAS MÉDIAS E TRABALHO

Escrever sobre camadas médias, seja sob o ponto de v i s t a da família ou sobre outro qualquer aspecto, requer necessariamente uma incursêto aos perfis paradigmáticos historicamente constituídos desta categoria, e ainda uma forte ênfase ao aspecto do desenvolvimento c a p i t a l i s t a na situaçáo histórica particular do contexto investigado.

Este capitulo está dedicado à apreciaçáo da questáo das camadas médias de forma estrutural, compreendendo-as como categorias sociais que emergiram no processo de desenvolvimento c a p i t a l i s t a e cuja presença intensificou-se e diversificou-se com a eKpans'á'o da Industriali;í;aç'áo na era do capital monopolista.

Com o objetivo de traçar um esboço do aparecimento e da trajetória dos grupos que se denominam de modo genérico como camadas médias da sociedade, teceremos inicialmente algumas considerações sobre tais categorias e suas relações com o trabalho, com base nos dados da experiência norte?~americana, que representa um importante mocjelo de desempenho desses grupos (1). Procederemos, nessa apreciaçáo, a um resgate de conceitos fundamentais para a compreensão do assunto, t a i s como a idéia da "antiga classe média norte americana" e sua relaçáo com a

(1) Par£\ tal apreciaçáo usaremos informações contidas em C. Wright

Millss

"A nova classe média White Gol lar",

1979 (escrita em

1951),

bem como em Harry Braverrnans "Trabalho e Capital Monopolista. A degradaçáo do trabalho no século XX", 1987,

(37)

propriedade^ a Idéia da "nova classe média"^ seu longo processo de expropriaçSo e achatamento social e sua moderna relação com o

trabalhOp e á categoria dos "profissionais liberais" e suas características em termos de atividades profissionais e inserçê(o

s ó c i a 1

-Em seguida p teceremos consideraçtíes a respeito sId apare cimento

\M3 BA<^0

das camadas médias •{j'ru:.:i loirao^ discutindo as peculiaridades de suas t r a j e t ó r i a s sociais, tendo em vista os dados de nossa história econômica e p o l í t i c a , e dando atenç/èfo particular a alguns processos vividos por estas à partir do finai da década de óO, cujos acontecimentos podem ser tomados como fatos particularmente significativos para o segmento social estudado„ (2)

2.1. A DEGRADAÇRO DO TRABALHO DAS CAMADAS MÉDIAS DA^BOCIEDADEÔ

ü aparecimento e decadência de uma sociedade de pequenos proprietários rurais nos EUAj, a "antiga classe média americana", e por outro lado a emergência de uma "nova classe média de colarinhos brancos", mais ligada ao espaço urbano e mais próxima do que conhecemos no Brasil como camadas médias, foi objeto de exaustivos estudos por parte de C. Wright Mills.

Diferentemente do que ocorreu com a chamada "classe média

(2) Esse resgate será empreendido basicamente através das obras de Décio Saess "Classe Média e Sistema Político no Brasil", 1985, & Luiz Roberto Lopess "História do Brasil Contemporâneo, 1991„

(38)

européia", originada a p a r t i r das tradiçCJes feudais, e onde a massa de camponeses que ocuparam a terra jamais chegaram a se transformar em empresários rurais, a "antiga classe média americana" teve como origem um conjunto de fazendeiros dispersos, que compraram lotes de t e r r a s relativamente baratos, frutos de propriedades confiscadas no processo da revolução amEíricana» (Z-:) Formaram, desse modo, o chamado "mundo do pequeno proprietário", que floresceu entre o periodo do mercanti 1ismo/agricu1tura de subsistência e a era dos monopólios das grandes firmas, numa curta t r a j e t ó r i a de tempo, considerando-se que j á nos anos 30 desse século as c a r a c t e r i s t i c a s monopolistas evidenciaram-se na América Inglesa. Naquele momento, os pequenos proprietátrios rurais já estavam impossibilitados de tocar seus negócios de forma autônoma, pois não conseguiam r e t i r a r da terra o suficiente para pagar os serviços de infra estrutura de que necessitavam (impostos, eletricificação e t c . . . )

Paralelamente, monopolistas rurais e urbanos atacavam o mercado, definindo os preços e exercendo controle sobre a sociedade através da penetração na vida política.

Durante seu breve período de hegemonia, duas características fundamentais se apresentavam no perfil da "sociedade dos pequenos proprietários norte-americanos", A primeira consistia no fato de que a propriedade incutia-lhes um sentimento de liberdade e

(3) Wright Mills usa o termo Revolução Americana ao referir-seí á

guerra

civil

ou

"Guerra de

Secessão"

(ISól-lSóS)

posterior

á

(39)

çr>egurança. Por volta de 1800, aproximadamente quatro quintos dos trabalhadores livres eram proprietários (MILLS, 1979 s 29) e os indivíduos que ncío possuíam t e r r a tinham a idéia de que poderiam vir algum dia a viver tal situação.

A segunda caracteristica, também relacionada è questão da propriedade, residia no fato de que tal sociedade se apresentava para seus integrantes corno um conjunto de equilíbrio automático, regulada unicamente pela força individual de seus membros, que podiam conduzir os movimentos da e^conomia segundo as demandas de seus próprios interesses. A não existência de uma tradição feudal, ou de um estado burocrático, colocava para os indivíduos a visão de que era possível se fazerem a s i próprios. A liberdade individual, assentada na propriedade da terra, parecia ser o principio da ordem

s o c i a l . Nisso r e s i d i a a base da i d é i a de democracia.

Mas a transforrnação dessa situação de propriedade, no século XX, vai modificar de forma efetiva a perspectiva de auto-regulação da sociedade, ü cenário social, no âmbito rural, começa a ser ocupado por nómeros cada vez menores de proprietários e cada vez maiores de arrendatários, indivíduos que, entre 1925 e 1935 foram obrigados a vender suas terras (4).

(4) Parai i l u s t r a r t a l situação, C. Wright Mills coloca que em 1880 os agricultores proprietários eram metade da população ativa dos Estados Unidos. Em 1949 e s t e s passaram a representar não ma\is que um oitavo desta população. A perda efetiva das terras deu-se em geral através das hipotecas e dos Ônus de juros (MILLS s 1979

(40)

o processo de concentraçãío da propriedade fez com que muitos dos antigos empresários e seus filhos passassem a ocupar os estratos sociais inferiores dos náo proprietários, transformando-se em meieros ou meros assalariados nas grandes fazendas comerciais e empresas agrícolas. Outros tomaram o caminho da cidade. Ouanto aos que foram desde o inicio arrendatáriosrealmente muito poucos chegaram a possuir alguma t e r r a .

No 'âmbito dais cidades,, o pequeno empreséirio urbano,, que se limitava ao pequeno negócio no setor de serviços e comércio varejista,, ao contrário do agricultor, jamais formou uma camada

social

numeírosa que pudesse desempenhar um papel

determinante

na

esfera ecorvômica. Quanto cios fazendeiros falidos que imigraram para

a

cidade,

esses raramente adquiriram

propriedades

comerciais

e

tornararn-se comerciantes e produtores li'vres. E para o homem urbano

comum, restava-1 he5apenas trabalhar como artesáotj^ sob o controle de

um capitáo da i n d ú s t r i a .

Desde

antes

da

guerra

civil,

quando

uma

nova

rede

de

transportes uniu algumas regióes em um mercado nacional, os artesáos começaram a trabalhar para grandes comerciantes. Da mesma forma, os pequenos produtores independentes passaram a concorrer com emipresas de muito maior porte, e as necessidades de matéria-prima, de capital e de infra--estrutura para a dis'tribuiçc(D foram

c o l o c a n d o - o s sob o domínio de homens mais r i c o s .

No espaço rural,

a

crise capital is'La americana iniciou-se para

o

pG?queno

produtor

na década de 1920-1930,

durante

a

qual

os

(41)

produtos agrícolas sofreraírVf^inosa queda de preços. Essa queda tem

como causas principalmente a contração do mercado interno (que sofreu as conseqüências geradas pela estabi 1 izaçâfo da população e

pela emergência dos produtos industriais), e ainda a redução dos mercados estrangeiros por influência da concorrência de outras áreas econômicas do mundo, então em desenvolvimento- A concentração das propriedades rurais e a aplicação de tecnologias às indústrias somaram-se a esse processo, levando a uma evidenciação paulatina das características monopolistas na sociedade dos pequenos

propr ieté.r i o s .

MILLS assinala ainda que a expansão tecnológica em curso nas

primeiras

décadas

do

século

XX

(e

seu

emprego

crescente

ás

indústrias)

acarretou

um grande aumento na

produção.

Por

outro

lado,

o

mercado continuava estagnado como

conseqüência

do

pós-guerra.

Como forma de viabilizar sua sobrevivência,

os capitães

da

indústria

se

reuniram e

criaram as primeiras

estruturas

do

que

viria a se tornar posteriormentE^ um monopólio

anônimo-Com o processo de concentração das empresas, surgem os grandes

homens

de

negócios, repre?sentados pela imagem do

indivíduo

cuja

caracteristica

principal é a habilidade em usar dinheiro

publico,

ou

de

outrem,

para

seu

próprio

lucro,

colocando—se

estrate?gicamente sob o abrigo das

leis.

Essa concentração leva, a um aumeínto de complexidade no modo

(42)

dif erenciaçêto nas c a r a c t e r i s t i c a s da relação entre os trabal hadores e as suas t a r e f a s , e na relação e n t r e os trabalhadores e as i n s t i t u i ç õ e s ,

Analisando~se de um modo geral as transformações ocorridas na esfera do trabalho, no século XX, observa-se que a mecanização e a aplicação da racionalidade tecnológica aos processos produtivos acarreta aumento de produtividade. Com isso, cresce necessariamente tambéni o setor de distribuição e faz-se imprescindível, tanto ao nivel da produção quanto ao nivel da distribuição, a ampliação das funções de coordeínação (5)- A conformação da divisão do trabalho

decorrente

desse

processo

implica

numa

especialização

de

competências

até então desconhecida^ que abrange a manipulação

de

símbolos abstratos e as tarefas de controle e acompanhamento do trabalho de terceiros. E pelo fato de se empregar esta mecanização e esta racionalização, mais efetivamente ao âmbito de produção, e menos ao âmbito da distribuição, verifica—se um número cada vez menor de indivíduos que manipula objetos e um número cada vez maior de indivíduos que mianipula símbolos e administra pessoas.

A emergência e o crescimento numérico desta categoria de ocupações mais subjetivas — a administração e a manipulação de símbolos - assinala o crescimento das novas ocupações médias.

(5) Esse raciocicio e s t á contido tanto nas considerações de MILLS (1979), quanto em BRAVERMAN (1987).

(43)

esfera que mobiliza enormes volumes de trabalho improdutivo (6)„

Representam, portanto, categorias profissionais de c a r a c t e r í s t i c a s bastante d i s t i n t a s da antiga classe média, cujo

apo0eu deu-se no âmbito rural, Ü aparecimento da "nova classe média

white

collar",

tal como referida por C. Wright Mills^de

e>:traçê(o

efetivamente urbana, é um fenômeno próprio da sociedade baseada em instituiç&SG?s, que emerge no século XX. Surgirarri para desempenhar funções técnicas e burocráticas de controle e acompanhamento da produçáo no mundo das empres-as privadas para seus cada vez mais amplos mercados, No âmbito governamental, sua presença fez-se igualmente imprescindível nas esferas administrativas, jurídicas e outras instâncias da burocracia do Estado. Suas oportunidades de sucesso prof issional , que consistemi em receber uma renda, exercer

(6) Usamos o conceito de trabalho improdutivo tal como o concebe Harry Etraverman, enquanto o trabalho necessário á "concretização" e ó7propriaçáo", pelo capital, de um valor excedente de produção, embora não diretamente envolvido com a produção desse valor

excedente. O autor aifirma ques

"G trabalho pode pois ser improdutivo simplesmente devido ao fato de que ocorre fora do modo capitalista de produção, ou devido a que, enquanto ocorre dentro dele, é utilizado pelo capitalista, em seu impulso parHi acumulação, para funções improdutivas mais que

produtivas", (BRÁVERMAN, 1937s351)

Encontra-se ai a idéia de que ao mesmo tempo em que o trabalho improdutivo declinou fora do alcance do capital (o que é expresso, por exemplo, pelo declínio numérico e posterior desaparecimento das antigas classas médias norte-americanas de proprietários rurais), aumentou dentro de seu âmbito, com a expansão da d i s t r i b u i ç ã o e o

aparecimento

dos

"white collars".

Deste modo,

a grande

massa

de

trabalho que era tida como improdutiva porque não trabalhava para o

capital, na fase monopolista foi transformada em massa de

trabalho

improdutiva,

porque trabalha para o capital, uma vez que o modo

de

produção

capitalista

subordinou

a si mesmo todas

as

formas

de

t r a b a l h o .

(44)

FPE BiblicU.,; i Ccnírc ''

poder interpessoal na relação de trabalho, gozar de prestigio e u t i l i z a r habilidades, sS(o determinadas pelo mercado de trabalho, pela grande estrutura de instituições públicas e privadas que constituem seu espaço de interesse profissional, e nas quais não poderão ser mais do que meros integrantes das folhas de pagamento.

A redução numérica dos antigos setores independentes da classe média norte-americana, evidenciada nas primeiras décadas deste Eiéculo, significa apenas a 6?xpressão do fenômeno de concentração da propriedade. E por outro lado, a grande ascensão numérica dos novos empregados assalariados deve-se aos mecanismos industriais que deram origem às novas ocupações da classe média, funções especificas dentro de uma nova divisão social do trabalho.

O fato de que a nova classe média, desempenhando seu trabalho improdutivo, atue principalmente em ocupações ligadas à manipulação de símbolos e controle do trabalho de terceiros, não significa que esteja desempenhando um trabalho intelectual. BRAVERMAN, (1987 s

267) dá como exemplo o próprio trabalho em escritório,

considerado

como

uma atividade expressiva dentro do universo das ocupações

de

gerência

exercidas

pelas

camadas médiaxs

do

inicio

do

século.

Modernamente

este

trabalho

sujeitou—se

a

um

alto

nivel

de

racionalização,

onde as funções pensantes e de planejamento

ficam

centradas em grupos cada vez menores dentro do escritório, enquanto

as demais atividades deste,

tornam-se funções tão manuais quanto os

trabalhos

ligados

à produção propriamente

dita.

Elabora-se

uma

redução

do trabalho mental à execução repetitiva de uma

série

de

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