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PRÁTICAS CULTURAIS E A EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL NO AMBIENTE ESCOLAR

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 49

PRÁTICAS CULTURAIS E A EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL NO AMBIENTE

ESCOLAR

Adriana Carla dos Santos Graduanda em Serviço Social pela UNISUAM dricadeiapbi@gmail.com

Flavia Cristina Professora do curso de Serviço Social UNISUAM

flaviacsilva@yahoo.com.br

RESUMO

As práticas culturais são consideradas verdadeiras interações sociais, que promovem a ação entre os grupos e fortalecem laços entre os participantes. Sabe-se que o contexto escolar favorece e muito a compreensão de opiniões e pensamentos e facilita aceitar o que é diferente. Este trabalho visa refletir sobre as práticas culturais no ambiente escolar, como ações sociais que fortalecem a cultura indígena e africana nestes espaços. A partir da análise e discussão sobre o ambiente escolar foi possível compreender que a sala de aula é um lugar de interação social que através das práticas de ensino e aprendizagem, cria conceitos e compartilha diferentes olhares culturais, por este motivo trabalhar as práticas culturais neste espaço é muito importante.

Palavras-Chave: Escola. Cultura. Lei 10.639. Lei 11.645. Serviço social.

CULTURAL PRACTICES AND EXPRESSION OF SOCIAL ISSUE IN THE SCHOLAR ENVIROMENT

ABSTRACT

Cultural practices are considered true social interactions that promote action between groups and strengthen ties between participants. It is known that the school context greatly favors the understanding of opinions and thoughts and facilitates accepting what is different. This paper aims to reflect on cultural practices in the school environment, as social actions that strengthen indigenous and African culture in these spaces. From the analysis and discussion about the school environment it was possible to understand that the classroom is a place of social interaction that through teaching and learning practices, creates concepts and shares different cultural perspectives, for this reason work the cultural practices in this space. It’s very important.

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 50 1 INTRODUÇÃO

Práticas culturais, segundo Skinner (1991) e Glenn (2004), são conteúdos comportamentais e ambientais transmitidos através de gerações. Trata-se de um subconjunto de contingencias entrelaçados de reforçamento.

É a partir das práticas sociais dentro dos espaços escolares que se fortalece a reflexão entre educadores e alunos acerca da heterogeneidade da cultura de nosso país. Através de datas comemorativas, festas, ensino de costumes indígenas e africanos, é possível fortalecer tais culturas no processo de ensino-aprendizagem.

As leis 10.639, de 2003, e a 11.645 de 2008, bem como os Parâmetros Curriculares Nacionais, PCNs, reforçam a importância do fortalecimento de estudos das matrizes africanas e indígenas nos espaços escolares. O principal objetivo da Lei 10.639 de 2003 e da Lei 11.645 de 2008 é ampliar o conhecimento sobre a cultura brasileira e compreender que em vez de uma há muitas culturas brasileiras.

A produção cultural na escola é algo constante e se fortalece diariamente, neste sentido, o presente trabalho visa compreender como as práticas culturais promovem o resgate cultural nas escolas? Para a realização desse estudo, foi utilizada como metodologia a pesquisa bibliográfica e pesquisa descritiva de Gil (2002).

2 AMBIENTE ESCOLAR E CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS

Sabe-se que o espaço escolar é um lugar de interações sociais e culturais cotidianas, ou seja, um lugar de troca de conhecimentos e práticas sociais. Para tanto, vale repensar a escola como um ambiente de divergências ideológicas, políticas, sociais e culturais sendo muito comum o fortalecimento de paradigmas que formam cidadão.

É na escola o primeiro contato com estereótipos culturais oriundos da sociedade. No caso da cultura negra estes são cotidianamente fortalecidos no que diz respeito às funções de apoio como: faxineira (o), cozinheira (o), zelador e porteiro ou vigia, todas ligadas a indivíduos negros.

O ambiente escolar é um local que agrupa diversos seres humanos com as mais variadas divergências. Emergindo assim um grave problema: Já que somos

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considerados racionais, atribuímos a nossa personalidade um tom de verdade. E quando vislumbramos o outro como diferente ao nosso comportamento, criamos obstáculos e discriminamos este ser, achando que ele se torna uma ameaça a nossa integridade. Tal situação tem como suporte no etnocentrismo. Ou, ainda poderia se dizer que etnocentrismo é: “visão de mundo que considera o grupo a que o indivíduo pertence o centro de tudo. Elegendo como o mais correto e como padrão cultural a ser seguido por todos, Considera os outros, de algumas formas diferentes, como inferiores. (ROCHA, 2007, p. 19).

O racismo, criado por tais preceitos, leva a um padrão estético idealizado pela sociedade. Desta maneira, as construções culturais fortalecem-se diariamente, o que inferioriza os demais indivíduos gerando dificuldades de aceitação e ameaçando sua integridade, tal realidade exprime-se no contexto escolar.

De acordo com a lei n. 11.645/2008 (BRASIL, 2008), que estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura indígena no ensino básico, a educação brasileira se viu diante de um difícil desafio: modificar sua matriz monocultural para considerar a riqueza e a contribuição da diversidade indígena para a compreensão da cultura e história nacional.

Neste sentido, as Leis 10.639 e 11.645 permitem a apresentação destes em temas transversais no contexto escolar e a aplicação das culturas africana e indígena nos materiais didáticos.

A Constituição Federal Brasileira de 1988 é o primeiro documento que reconhece aos índios o direito à prática de suas formas culturais próprias. O Título VIII – “Da Ordem Social” Capítulo VIII – “Dos Índios” Art. 231:

São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. (BRASIL, 1988, não paginado).

A cultura indígena, antes vista como transitória, fadada à extinção, passa agora a ser vista não apenas como uma referência ao passado com diferenças culturais que sobreviveram após 500 anos, mas como parte do nosso futuro.

Segundo Ribeiro (1995), o que define um povo não é a demarcação territorial, mas sim um conjunto de características que faz dele um grupo identitário, diferenciando-o de outros grupos. As três matrizes étnicas que seriam as formadoras da identidade do povo brasileiro são o colonizador branco, no caso os portugueses, os índios e os negros africanos.

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O surgimento de uma etnia brasileira, inclusiva, que possa envolver e acolher a gente variada que aqui se juntou, passa tanto pela anulação das identificações étnicas de índios, africanos e europeus, como pela indiferenciação entre as várias formas de mestiçagem, como os mulatos (negros com brancos), caboclos (brancos com índios) ou curibocas (negros com índios). (RIBEIRO,1995, p. 35).

Assim, a escola é um espaço de interação social e cultural que tem um papel de grande relevância sobre a visão do outro, bem como espaço de interação das diferenças culturais.

3 DAS PRÁTICAS CULTURAIS AFRICANAS E INDÍGENAS NO CONTEXTO ESCOLAR

Segundo Munanga (2004), apesar de considerarmos que o Brasil vive uma diversidade cultural, é notório que a escola ainda não se sente preparada para lidar com certas situações de racismo que, segundo a acepção do Dicionário Aurélio, é a doutrina que sustenta a superioridade de certas raças.

A partir da realidade cultural brasileira que é muito influenciada pelas matrizes europeias, compreende-se que muito se menosprezou a cultura indígena e africana, pois houve uma construção efetiva dos hábitos e costumes portugueses suplantando as peculiaridades culturais de outros povos que formaram nosso país. Cabe entender que a cultura brasileira possui múltiplas interpretações e conceitos, que varia tanto dos europeus, índios e africanos, construindo valores étnicos que precisam ser reforçados cotidianamente.

A escola, por tratar-se de espaço de extensão público, é também palco de múltiplas culturas e realidades sociais, que são reproduzidas pelas falas e representações simbólicas. De acordo com Braga (2003), nos últimos anos, a valorização das práticas culturais tem impulsionado o aumento das produções artísticas brasileiras. Como a cultura é uma prática social que envolve pessoas e fortalece vínculos, faz-se necessário compreender sua relevância no contexto escolar. Nos anos que se seguem a tecnologia muito tem favorecendo o reconhecimento da tradição cultural brasileira. As práticas sociais interagem com as expressões culturais que muito tem aumentado nos últimos anos em nosso país.

Mas apesar do uso da tecnologia nas tradições populares (cds, celulares, home-page, etc), a cultura popular ainda é vista como subcultura, a geração de trabalho nesse campo ainda possui um certo preconceito. Muitas cidades contratam profissionais de outras

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 53 regiões para se exibirem ou cantarem, como atrações, em vez de valorizar os artistas locais. Há ainda, uma certa exclusão com os fazedores da cultura popular. (BRAGA, 2003. p. 55 ).

Cabe à escola fortalecer a cultura popular, a fim de manter conceitos e valores que fortaleçam a identidade plural brasileira. Conforme Rocha (2007, p. 23), multirracial sugere pluralidade de heranças por várias gerações. “[...] na realidade brasileira, podem ser encontrados indivíduos negros, asiáticos, brancos, indígenas. A maior parte da população, sem dúvida, resulta de mestiçagens várias de todos os grupos entre si, em maior ou menor grau”.

4 O PAPEL DO ASSISTENTE SOCIAL JUNTO ÀS PRÁTICAS CULTURAIS

O profissional de serviço social desempenha relevante papel na fomentação cultural, uma vez que este orienta pessoas que necessitam de inserção na sociedade. No que se refere à prática da educação popular, o profissional de Serviço Social poderá orientar o docente em suas áreas de atuação como: instituições públicas, federais e privadas para que juntos em articulação, promovam a construção social dos grupos. Neste caso o ambiente escolar é um espaço de interação social repleto de demandas que muito necessita da inserção do assistente social, que busca dialogar com o contexto em que está inserido.

Diante das práticas culturais que ocorrem no meio escolar, cabe ao profissional de serviço social desenvolver ações, projetos educativos que valorizem a cultura indígena e negra, com o apoio da Secretaria de Educação, de maneira que viabilize o fortalecimento da comunidade escolar, na descoberta de sua identidade social e cultural, ou seja, vemos a grande importância do Serviço Social na educação, como promover ferramentas emancipatórias.

Este profissional, ao planejar um projeto, busca identificar as manifestações culturais oriundas de comunidades locais, a fim de capacitar lideranças comunitárias como agentes multiplicadores de organização dos bens culturais advindos da sociedade.

Diante de tal realidade, a expressão “questão social” em concordância com o posicionamento de Iamamoto (2012, p. 160) que diz tratar-se de conjunto de desigualdades econômicas, políticas e culturais, “mediatizadas por disparidades nas relações de gênero,

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 54 características étnico-raciais, formações regionais, colocando em causa amplos seguimentos da sociedade civil no acesso aos bens da civilização”.

Desta maneira, o racismo é compreendido como uma das mudanças da “questão social”, haja vista que afeta uma grande parcela da população brasileira. Portanto, se faz necessário o enfrentamento do preconceito para que se tenha uma sociedade mais equânime e justa. Em meio ao contexto de formação sócio histórico da realidade brasileira, é preciso que desmistifiquemos um mito, que por vezes, acredita na inexistência do racismo. Assim, percebemos que o “mito da democracia racial”, que se encontra imerso no imaginário da nossa sociedade, camufla o preconceito racial existente no Brasil. Entendemos tal mito de acordo com Santos:

[...] uma narrativa ideológica que nega a desigualdade racial, consequentemente o racismo, afirmando que entre negros e brancos existe uma igualdade de oportunidade. Ao negar o racismo, ele perpetua os estereótipos e preconceitos sobre os grupos étnicos marginalizados, pois somos levados a pensar que se existe igualdade de tratamento, e as desiguais posições socioeconômicas são resultado da incapacidade de negros e índios que possuem culturas subalternas. (SANTOS, 2012, p. 3-4).

Assim, nota-se que o racismo, no Brasil, encontra-se mascarado pelo mito supramencionado, que esconde e julga os brasileiros como pessoas de “boa consciência” que negam o preconceito racial ou o reconhecem de forma branda.

Tomando por base o mundo moderno, Nogueira (2004) ressalta quatro grandes modalidades de participação: assistencialista, corporativa, eleitoral e política. De modo geral, a participação assistencialista é aquela de natureza filantrópica ou solidária; a corporativa dedica-se à defesa de interesses específicos de determinados grupos sociais ou de categorias profissionais; a eleitoral é a que não visa apenas à defesa de interesses particulares, mas interfere diretamente na governabilidade e tem efeitos que dizem respeito a toda a coletividade, e a política inclui, complementa e supera tanto a eleitoral, quanto a participação corporativa. Ela se realiza tendo em vista a comunidade como um todo, a organização da vida social em seu conjunto, ou seja, o Estado.

Por intermédio da participação política, indivíduos e grupos interferem para fazer com que diferenças e interesses se explicitem num terreno comum organizado por leis e instituições, bem como para fazer com que o poder se democratize e seja compartilhado. Em vista disso, esse tipo de participação consolida, protege e dinamiza a cidadania. O tema

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 55 da participação tem, portanto, "forte conteúdo ideológico e comporta diferentes conceitos e definições." (NOGUEIRA, 2004, p. 129).

A demanda por reparações visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas para ressarcir os descendentes de africanos negros dos danos psicológicos, materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de manutenção de privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulação de políticas, no pós-abolição. Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda sorte de discriminações.

De acordo com Brasil (1988), cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre ao disposto na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou profissional. Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas, romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por critérios de exclusão, fundada em preconceitos e manutenção de privilégios para os sempre privilegiados.

Existem políticas de reparações voltadas para a educação dos negros que devem oferecer garantias de ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de condições para alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como para atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem com qualificação uma profissão.

A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente apoiada com a promulgação da Lei 10.639/2003, que alterou a Lei 9.394/1996, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas. Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que compõem a

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 56 população brasileira. E isto requer mudança nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras.

Requer também que se conheça a sua história e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se especificamente desconstruir o mito da democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de que, se os negros não atingem os mesmos patamares que os não negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os negros.

Reconhecimento da presente Lei 10.639/2003 requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade étnico racial presente na educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de ensino.

Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em preconceitos que desqualificam os negros e salientam estereótipos depreciativos, palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos de superioridade em relação aos negros, próprios de uma sociedade hierárquica e desigual. De maneira a valorizar, divulgar e respeitar os processos históricos de resistência negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por seus descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais até as coletivas.

Durante muito tempo a cultura fora relegada na agenda pública como uma política de segundo plano, com baixos recursos financeiros e humanos e com a preferência pelo campo das artes. Essa postura adotada inúmeras vezes tendia ao favorecimento do mercado rejeitando o compromisso social para parcelas da população cada vez mais alijadas de seus direitos sociais e culturais.

Esses apontamentos servem para destacar minimamente como a cultura, enquanto prática social é importante para a sociedade em geral. No entanto, antes de discorrer sobre as transformações recentes no seu campo cabe aqui destacar qual concepção estamos contemplando. Para Pestana,

[...] a cultura não [deve ser entendida] como um elemento exterior à sociedade, de modo a completá-la, tampouco reduzida às manifestações artísticas, embora seja esta uma de suas dimensões, ou apenas como representação de determinado

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período histórico ou sociedade, mas sim como todas as manifestações dos homens relativas à práxis social. (PESTANA, 2011, p. 90).

A inserção do assistente social na política de cultura é um desafio à categoria profissional por dois motivos, quais sejam: o trato da cultura como direito e a questão da ampliação dos campos de inserção do profissional de Serviço Social. Talvez exista outros motivos ainda não encontrados neste momento, mas, isso por si só, já garante atenção por parte de qualquer assistente social.

No entanto, essa inserção deve ser motivo de bastante atenção, uma vez que A relação entre o Serviço Social e cultura é pouco reconhecida pelos profissionais e pelo Estado, este, pouco discute a importância e ligação do Serviço Social com a cultura, já que o assistente social em sua prática profissional elabora, coordena, executa programas e projetos que venham viabilizar os direitos culturais dos cidadãos, partindo de uma ação conjunta entre os assistentes sociais e a comunidade. (CUNHA et al, 2012, p. 01).

De acordo com o Conselho Federal de Serviço Social – CFESS (2012) as atividades o assistente social poderia desenvolver:

- Realizar atividades de apoio aos demais profissionais que compõem a equipe de trabalho; - Garantir o acesso dos usuários e familiares aos programas, projetos e serviços da Política de Cultura;

- Realizar orientações sociais aos usuários, familiares e agentes culturais; - Desenvolver atividades técnicas inerente ao Serviço Social;

- Fortalecer os vínculos familiares através de quaisquer instrumentais, inclusive utilizando a arte como forma de mediação;

- Formular estratégias de intervenção profissional e subsidiar a sua equipe quanto as informações sociais dos usuários sempre resguardando as informações sigilosas; - Assessorar os movimentos socioculturais na identificação de suas demandas, fortalecimento do coletivo, formulação de estratégias para a defesa e acesso aos direitos culturais;

- Mobilizar condições para os usuários usufruírem dos equipamentos socioculturais públicos ou da sua entrada de seus serviços em comunidades periféricas; Note-se quantas atividades sumariadas podem ser desenvolvidas na política de cultura pelo assistente social e isso, de imediato, nos remete minimamente condições objetivas para reivindicar a inserção deste profissional. (BRASIL, 2012, p. 45).

Desta maneira o Serviço social tem um papel relevante no apoio e reafirmação cultural das comunidades negra e indígena, a partir do desenvolvimento de políticas públicas que desenvolva práticas culturais de apoio a tais culturas.

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 58 5 SOBRE OS REFERENCIAIS CURRICULARES

Tecer considerações a respeito das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 é, antes de tudo, observar que ambas pertencem à própria LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei 9.694/1996, que teve o artigo 26-A modificado para a inclusão do ensino da cultura afro-brasileira e indígena. Até então, ele determinava que os conteúdos pedagógicos deveriam contemplar a pluralidade por meio das contribuições de diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente [as] das matrizes indígena, africana e europeia”. A partir de 2003, sete anos depois, portanto, a preocupação com uma prática pedagógica voltada para estas colaborações assumiria teor sintonizado com os ideais das ações afirmativas, através da especificação de que, ao currículo escolar, deveriam ser incorporadas a luta dos negros, no Brasil, bem como a sua “contribuição nas áreas social, econômica e política.

Segundo Jung (1971), ao pensarmos a Formação do Professor diante dos desafios da implementação das Leis 10.639 e 11.645 temos que, sobretudo, atentar para o desmonte destas e de tantas outras construções, que não se encontram apenas no passado colonial, sendo extensivas aos dias atuais.

O exame de possíveis causas à resistência do trabalho, nas escolas, com os conteúdos antirracistas podem indicar lacunas nas formações dos docentes, - os quais não tiveram contato com estes conteúdos no currículo -, mas igualmente permitem evidenciar rejeições motivadas por aspectos internalizados urdidos no inconsciente coletivo, que não se desenvolvem individualmente, sendo herdados e definidos como um conjunto de sentimentos, pensamentos e lembranças compartilhadas por todas a humanidade por um imaginário de caráter perversamente eurocêntrico.

Talvez seja por isso que, em algumas instituições dos ensinos fundamental e médio, estas ações ainda se apresentem poucas e isoladas, tendo como protagonistas alguns docentes ou ocorrendo ainda presas às datas comemorativas do calendário escolar (Dias do índio, de Zumbi, do Folclore...), distanciadas de uma prática pedagógica cotidiana.

Apesar de não ser consenso, em muitas ainda observam-se a repetição de conceitos deturpados, como o que prevê a história do indígena iniciada com o “descobrimento do Brasil” e a do povo negro surgido somente a partir dos navios negreiros ou na senzala.

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 59 Concepções pré-concebidas reiteradas cotidianamente nos meios de comunicação, segundo as quais estes povos seriam sem história, sem pluralidade e oriundos da miséria salva pelas benesses da civilização. A falta de referências positivas da educação racista impossibilita o reforço da autoestima das crianças não brancas, prejudica o processo de ensino aprendizagem e culmina na repetência e na evasão.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise e discussão envolvendo autores que abordam sobre as práticas culturais e sobre o ambiente escolar foi possível compreender que a sala de aula é um lugar de interação social que através das práticas de ensino e aprendizagem, cria conceitos e compartilha diferentes olhares culturais. Por este motivo trabalhar as práticas culturais neste espaço vale a pena para se revalorizar as culturas das matrizes africanas e indígenas.

Compreende-se que historicamente as visões preconceituosas a respeito de tais culturas ainda pairam dentro das escolas, uma vez que a inserção da população negra ao ensino trata-se de algo contemporâneo, pois o direito ao ensino de afrodescendentes iniciou no Brasil a partir do século XX, uma vez que a raça negra era vista como inferior e que, portanto, não necessitava de instrução.

Através do presente artigo foi possível compreender que o profissional de Serviço Social exerce influência nas práticas culturais de comunidades excluídas socialmente e economicamente e desenvolve projetos que revalorizem tais culturas, seja no espaço escolar, ou em outras organizações sociais.

REFERÊNCIAS

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Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.24 | n. 48 | p. 49-60 | jul./out. 2019 60 bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a

obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Brasília, DF: Presidência da República, 2008. Disponível em:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=10101-lei-11645-10-03-2008&Itemid=30192. Acesso em: 12 abr. 2019.

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____________________ Submetido em: 11/10/2019 Aprovado em: 21/10/2019

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