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P0RTUGAL
S0CIAL
de
A a
7.
TEMAS
EM ABERTÍI
Orgønizøção de
José
Luís
Cardoso
Pedro Magalhães
José
Machado
Pais
Uma edição Comemorativa:
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I
C S urY
07
NOTADEABERTURA.JOSÉ LUÎS C,¡'i.RDOSO, PEDRO
MAGALHÃES Ë.IOSÉ MACHADO PAIS
166 177 r91 206 227 233 245 261 27r 285 296 306 319 331 NAçÃO E NACTONALTSMO ANTÓ.NIO COST,{ PINTO
Comentário: itr¡¿no Seueriano 7þixeira
ORÇAMENTO DE BSTADO
PAULO'I'RIGO PERÐIR,{
-Comentário: A¿tónio Bagõo Félix
POBREZA
C¡\RLOS FARINHA RODR]GUES
Comentârio: M an u e I a Si lu a QUALIDADE DA DEMOCRACIA PEDROMAGAT-HÃES E LUÍS DE SOUSA Comentário:,Rzi Tauares RELIGIÕES CRISTIANA BAS'IOS
E JOÃO VASCONCET.OS (ORGS.) Comentiârio: "fosé Tolentino de Mendonça
SEXUALIDADE
SOFIAÂ,BOIM
Comentârio'. Mi c he I ß o z on
TERRITÓRIO
JOÃO FERRÃO
Comentário:,4ntónio Munuel Figueíredo
UMVBRSIDADE
ANTÓNIO SAMPÂiO DÀ NÓVOA
Comentário: "Io lø Lol¡o Anttnes
VAIORES
CÍCERO PEREIR.A E AI,ICE RAMOS
Comentário: Jb ão Ferre iru de Almeida
WEB
HERMíNIO M,A.RTINS
E JOSÉ LUÍS GARCIA
Comentário: -Iosê Vítor M ¿t I heiros
XADREZPOLÍTICO
M.ARIN,A COST,q, LOBO
Comentário: Vnsco Barreto
YES! WE ARE! QUEM SOMOS?
UMA IDENTIDA-DE NACIONAL
JOSÉ MANUEL SOBRAL
Comentário: Aagusto Santos Silaa
ZONAEURO
PEDRO LAINS
Comentário: An ttini o Afo n so
BIOGRAFIAS
Autores e Comentadores
Uma obra editada para:
lmpresa Publishing I Expresso Rua Calvet de Magalh-aes,242
2770 - 022 Paço de Arcos www.expresso.sapo.pt
09
AMBIENTEI,UíSA SCHMIDT
Comentário: Filipe Duarte Santos
2I
BEM-ESTARJORGE VAI-A
Comentário: Jo sé An tó n io Pe re ìï in ha
35
CIDADANIAITILIPE CARREIRA DA SILVA
Comentário: Ë/ís io E stan q ue
45
DESEI{VOLUMENTOJOSÉ LUÍS CARÐOSO
Comentário: .Io õo Ferreit'a do Amaral
57
EDUCAçÃOANANUNES DE ÂLMEIDA
E MARIÂ M.A.NUEI, VIEIRA
Comentário: Ed¡nrdo Marçal Grilo
70
FAMfi.IAKARIN WALL, VANESSA CUNHA
E SUSANAATAI,AIA
Comentátrio; Maria das Dores Guerreíro
82
GERAçÕESMANUEL VILLAVERDE CABBAL
Comentário:,4n a Alexandre Fernandss
94
HISTÓRIAEMEMÓRIA RUIRAMOSComentário: Ped ro Mexia
1O5 IMPÉRIOS
NIJNO GONÇÂLO MONTEIRO
Comentârio : Pe d¡' o C ar d im
118 ruSTIÇA
NUNO GAROUPA
E SUSANA S,A,NTOS
Comentário: A¿ tón io Araúio
l3o
KITSCHJOSÉ MACHADO PA.IS
Comentário: Maria do Carnto Serén
r47 LAZERES
VITOR FERREIRÂ ]i RUI TELMO GOMES
Comentário: Vito r Bela ncian o
154 MIGRAçÕES
JOÃO PEIXOTO
Comentário: Gilberta Pauão Nunes Rocln
Título: Portugal Sociaf de A a Z - temas em aberto
Organização editorial: José Luís Cardoso, Pedro Magalhães, José Machado pais
Direção de Projetos Editoriais lmpresa Publishing: Henrique Monteiro
Direção Expresso: Ricardo Costa
Direção de Marketing: Mónica Balsemão
Gestora de Marca: Susana Freixo
Revisão editorial: lnês Versos
Apoio editorial: Mafalda Vieira e Frederico Silva
Capa e paginação: Rita Múrias e Paulo Barata Corrêa lmpressão e acabamento: Norprint
ISBN: 978-989-20- 4232-9
Depósito legal: 365002/13
Família
A Refere-se, noção de família emprimeiro
é usada em vários sentidos.lugar, ao conjunto deKørin
Wøll,
pessoas que possuem entre si laços de sangue ouVUnesSg
CUn/lA
de aliança, que se estabelecem, respetivamente,e Susan(t
Atqlgig
com o nascimento e o casamento. Neste sentido, família é sinónimo de "parentesco>, na medidaem que é constituída pelos nossos <parentes>.
Já o conceito de família utilizado pelo Instituto Nacional de Estatística
designa o conjunto de pessoas que vivem na mesma casa, formando um lar
ou "agregado doméstico>. Neste caso enfatiza-se o critério da residência,
baseado na partilha de alojamento e de recursos. O agregado doméstico pode
ser formado por uma pessoa só, por várias pessoas sem laços de parentesco
ou porvárias pessoas possuindo entre si laços de sangue ou de aliança. É importante salientar que o conceito mais conhecido de
"família
nu-clearo se refere a um tipo específico de agregado doméstico, formado por um
casal heterossexual, casado ou em união de facto, a viver com um ou mais
fi-lhos. Embora náo seja predominante em termos estatísticos, este tipo de agre
gado está no centro das representações mais comuns de família. Pesa como
elemento explicativo desta centralidade o facto de o sistema de parentesco das
sociedades ocidentais atribuir um lugar de relevo ao casamento e à filiaçáo.
Por último, a noção de família pode ser mais abrangente, designan-do o conjunto de pessoas que, do ponto de vista do indivíduo, fazem parte da sua família. Neste caso, a família pode extravasar o (parentesco>, ao
incluir uma diversidade de laços de afinidade baseados na amizade, nos
afetos ou na vizinhança. É também mais eletiva, na medida em que os <parentes" podem até ser excluídos desta noção de família.
As famílias são uma realidade dinâmica. As mudanças sáo sentidas
ao longo da vida pelos indivíduos, mas também pelas gerações sucessivas,
inseridas em contextos políticos, sociais e históricos específicos.
Famílias
em
mudança: conjugalidade,
fecundidade,
estrutura
farniliar
Na sociedade portuguesa, a década de 7o do século XX marca o início de
um período de viragem na vida familiar. São os indicadores demográficos
que nos fornecem os indícios mais sugestivos das mudanças em curso (ver quadro r). A taxa de nupcialidade (celebração de casamentos), depois de
subir regularmente desde 1960 até meados dos anos 70, entra em
acen-tuada queda, atingindo os 3,4o/oo habitantes em 2011. Também a
percen-tagem
de
casamentos católicosnáo
tem
parado de
diminuir,
mais acentuadamente nos anos 2ooO. Em contrapartida, o divórcio temau-mentado desde a década de 70, sobretudo nos últimos vinte anos, os
ca-sais vivem cada vez mais em coabitação antes do casamento e nascem
mais crianças fora do casamento. Estes indicadores apontam para modos
alternativos e variados de viver a conjugalidade: as
"uniões de facto", a
su-cessáo de relações temporárias com coabitação, a vida a dois sem
coabi-tação. Quanto
à
idade média aoprimeiro
casamento, sempre maiselevada para os homens, baixa entre os anos 70 e Bo, para voltar a subir
até aos dias de hoje: é uma realidade que se prende com o alongamento
da formação escolar e a entrada mais tardia no mercado de trabalho, e
também com o facto de o início da vida conjugal ser cada vez menos
mar-cado pelo casamento, que, quando ocorre, tende a ser alguns anos depois
da entrada na conjugalidade ou mesmo após o nascimento dos filhos.
No que se refere à fecundidade, as mudanças são radicais. De elevada
ainda no início dos anos 70 (3,o filhos por mulher), a fecundidade reduziu
para metade no decurso dos anos 90 e manteve a tendência de declínio no
início do século XXI, atingindo o valor mais baixo de sempre em2o12 (r,z8).
Esta evolução evidencia como as práticas contracetivas se generalizaram,
em resposta às novas formas de encarar a conjugalidade e o lugar dos
filhos: por um lado, viver em casal já não implica necessariamente ter filhos
ou tê-los logo; por outro lado, a criança é alvo de investimentos elevados no
plano dos afetos, do bem-estar material e dos percursos escolares longos que as gerações anteriores não tiveram, consubstanciando um ideal de
ti (, ll fi ll t< ¡.. M N t: F '{ 1; T t"l x Y 7
:
i:
. aPortugal Social de A a Z:
Temas em aberto
Família
Karin Wall, Vanessa Cunha
e Susana Atalaia
infância privilegiada e protegida. Apesar de Portugal ter, no contexto
euro-peu, um dos níveis mais baixos de "infecundidade" (mulheres que chegam
ao final do período iértil sem ter filhos), este cenário parece estar a mudar para as mulheres (e homens) atualmente em idade reprodutiva.
Duas outras transformações ocorridas dizem respeito à presença das
mulheres no mercado de trabalho e à evolução das estruturas familiares, isto é, das formas de viver em família. Desde 1960 que a taxa de atividade feminina não tem cessado de aumentar. Em 2On exerciam atividade profis-sional 4T,4Vo das mulheres portuguesas, mas estes valores são bem mais
elevados para a faixa etária 25-54 anos (BB,B7o). Como fatores explicativos
deste forte aumento da participação feminina no mercado de trabalho
des-tacam-se a emigração masculina, a guerra colonial, a terciarização do
teci-do económico e, mais recentemente, a evolução dos níveis de escolaridade
feminina, bem como as políticas de igualdade de género e de apoio à
conci-liação entre o trabalho e a família. O impacto desta mudança na divisão do
trabalho pago no casal é importante: em 2o1o, nos agregados de casais (18-65
anos) com ou sem crianças, a maioria (g87o) eram casais "duplo emprego>,
em que os dois trabalhavam a tempo inteiro; os casais em que só o homem
trabalhava representam 187o, eneuânto os casais em que só a mulher
traba-lhava representavam t'/o/o. O número de casais em que só a mulher trabalha
fora de casa tem vindo a aumentar, em grande medida devido ao
desempre-go gerado pela crise económica, que tem atingido alguns setores
profissio-nais tradicionalmente masculinos.
Todas estas mudanças ao nível dos comportamentos demográficos
e dos papéis de género tiveram um impacto significativo nas formas de
viver em família. A análise da evolução das estruturas familiares ao longo
das últimas décadas, recorrendo aos dados dos recenseamentos da
popu-lação, revela quatro grandes tendências (ver Quadro r).
r)Verifica-se, em primeiro lugar, que as famílias são significativa-mente mais pequenas, passando a dimensão média de 3,8 indivíduos em
1g6O para e 2,6 em 2Oll. Por seu lado, a percentagem de famílias com
mais de cinco pessoas diminui expressivamente, representando, em 2011,
somente 2o/o dos agregados, comparado comlz,lo/o em 1960.
2)Um segundo aspeto é
o
aumento das pessoas sós. Apesar deoutros países europeus registarem valores mais elevados, em Portugal
esta tendência acentuou-se sobretudo ao longo das duas últimas décadas,
o que se pode
atribuir
não só ao envelhecimento da população mastam-bém a mudanças na vida privada de indivíduos em idades mais jovens, sobretudo solteiros e divorciados.
3)Um terceiro elemento diz respeito ao decréscimo dos casais com filhos. Ainda que um número elevado das famílias continuem, em 2011, a
encaixar-se neste tipo (S5ø¡, são os casais sem filhos e as famílias
mono-parentais que registam variações positivas face a 1991 e a 2oo1: o
envelhe-cimento populacional, o adiamento da parentalidade e
o
aumento do divórcio são importantes para explicar estes desenvolvimentos. Mesmoassim, é de salientar que, em 2011, a vida em casal está presente em 597o
das famílias. De notar, também, o aumento dos casais <recompostos>,
onde existem filhos de anteriores casamentos, que duplicaram face a
2oo1, passando de 2,'/o/o pàÍà 6,6% do total de casais com filhos.
4)Finalmente, as famílias complexas, em que a uma família simples
(de casal com ou sem filhos ou pai/mãe com filhos) se juntam outras
pes-soas aparentadas dentro do mesmo lar, têm decaído significativamente,
sobretudo ao longo das duas últimas décadas. Esta tendência reflete a
maior autonomia dos casais e dos indivíduos, que têm vindo a dispor de
acrescidas possibilidades de independência económica
e
residencial.No entanto, devido ao impacto da crise económica, podemos
vir
averifi-car alguma inversão nesta tendência.
A evolução
dasrelações familíares:
diversídades
edesigualdades
As expectativas, os valores e as relações familiares mudaram radicalmente
ao longo das últimas cinco décadas. Do ponto de vista do significado da
fa-mília no passado e no presente, são vários os retratos traçados.
Alguns autores falam da passagem de uma família "institucional", centrada no casal como unidade de sobrevivência económica e de
procria-ção, desigual em termos de poder, estatuto e papéis, para uma família
"companheirista", centrada nos afetos, na democracia e numa maior
igualdade de género; a violência dentro da família (violência doméstica,
maus tratos) passou, na família companheirista, a ser considerada como
socialmente reprovável e mesmo juridicamente punível. Outros
referem--se à família "relacional" dos nossos dias, enquanto lugar onde se
concen-tram expectativas de felicidade pessoal e de pertença, conjugadas com princípios de solidariedade, proteção e cumplicidade. Outros ainda refe-rem-se à maior liberdade individual para organizar a vida privada nos
nossos dias, menos submetida às convenções sociais, o que reforça a
di-versidade das formas de viver em família: às famílias nucleares clássicas
(de casais heterossexuais, casados e com filhos), somam-se as famílias
re-compostas com filhos de relações anteriores e atuais (os .meus,,, os
ß
r
D F G t-'l I J t( l_ M N o P a It S I U X Y 7,ou+
de casai
Portugal Social de A a Z:
Família
Karin Wall, Vanessa Cunlta e Susøna Atalaia Temas em aberto Quadro r I Indicadores de escolarização, PT eUE27,196o e 2011 CONJUGALIDADE Taxa de
ldade média ao I s casamento
Homens
Fonte: INE, Recenseamentos da População, Estâtísticas Demográficas, Inquérito
ao Emprego
* Nq idosos (¿ 65) por 1oo jovens (s 14)
Mulheres
Casamentos católicos (%)
Recasamentos
Casamentos c/ residência anterior comum
Casais em
Casais recompostos (/total de núcleos de casais com filhos)
DIVÓRCIO
Taxa bruta de divorcialidade (%o)
FECUNDIDADE
Total de nados vivos
ice sintético de fecundidade
ldade média da mulher ao 1o filho
Nados vivos fora do casamento
LONGEVIDADE
de nados vivos)
Es de vida à nascença HM
de envelhecimento È
MERCADO DE TRABALHO
Taxa de atividade (pop. ativa > 1 4 anos/total pop.)
Masculina Feminina Feminina Taxa desem HM Homens 1 5-24 anos
EVOLUçÃO DAs ESTRUTURAS FAMTLTARES
Número de domésticos
residente a viver em AD
Dimensão média dos AD
com+de5pessoas
PRINCIPAIS TIPOS DE AGREGADO DOMÉSTICO
AD SEM NÚCLEO FAMILIAR
.pessoas sós
.várias pessoas
AD DE FAMíLIAS SIMPLES
. casats
casal sem filhos
casal com filhos
pai com filhos
com
AD DE FAMíIIAS COMPLEXAS
. múltiplos
Portugal Social de A a Z:
Temas em aberto
Família
Karin Wall, Vanessa Cunha
e Susana Atalaia
<teus, e os <nossos"), as famílias de casais homossexuais, as famílias mo_
noparentais de mães ou pais que vivem sozinhos com os filhos, as famílias
de casais sem filhos ou, ainda, as famílias transnacionais, em que os dois
elementos do casal vivem em países diferentes. são, por outro lado,
for-mas plurais de se relacionar e viver em família: algumas famílias adotam
um estilo ,.fusionalo, onde o mais importante é o coletivo e fazer tudo
juntos; enquanto outras adotam um estilo mais .associativoo, onde o
bem-estar familiar passa também pela autonomia de cada um. Em
portu-gal, dados de tggg e de 2Oll mostram que não existe um modelo único ou
predominante. os relacionamentos e as trajetórias familiares dos
indiví-duos são mais plurais e menos previsíveis (sair de casa dos pais, casar, ter
o tq filho, ter o 2a filho, etc.). Variam bastante, isso sim, em função dos
meios materiais e culturais dos cônjuges: quanto mais elevados, mais tar-dia é a constituição da vida familiar e mais ênfase se coloca na individua-lidade, na autonomia e na qualidade da relação, e menos no compromisso <para a vida". No entanto, o divórcio e as recomposições familiares são
acontecimentos que marcam frequentemente as trajetórias dos
indivídu-os, constituindo fenómenos transversais a todos os meios sociais.
Apesar da maior fragilizaçáo dos laços conjugais que decorre das
transformações referidas, a família é paradoxalmente mais importante do
que nunca do ponto de vista da realizaçã.o e da estabilidade emocional. Mais de 7oo/o dos portugueses continua a associar a felicidade à vida em
casal, daí se compreendendo a incidência da recomposição familiar: o fim
de uma relação náo põe em causa esse ideal de realização da vida a dois.
De facto, num mundo mais imprevisível, competitivo e anónimo, os laços
conjugais e familiares constituem, para a maioria das pessoas, o referencial
privilegiado de pertença e construção identitária. E os filhos ocupam aqui um lugar central. Embora seja consensual que ter filhos constitui, hoje em
dia, uma escolha privada
-
e de facto há quem escolha não os ter porvaria-das razões
-
os estudos continuam a revelar uma forte predisposição para aparentalidade na sociedade portuguesa, mesmo nas gerações mais jovens.
ser pai/mãe permanece enquanto elemento chave dos projetos de vida
adulta. Esta centralidade dos filhos na vida dos indivíduos revela-se de
dife-rentes modos: na vigilância contracetiva aliada ao planeamento dos
nasci-mentos, de modo a garantir que estejam reunidas as condições para ter um
filho; no investimento pessoal e familiar que é feito em cada filho, em prol
do seu bem-estar; na expectativa de gratificação afetiva que se coloca nesta
relação, aliada à natureza indissolúvel do laço parental.
Se esta centralidade dos filhos constitui, sem dúvida, um traço forte
da evoluçáo das relações familiares, o lugar dos idosos na família também
tem vindo a mudar nas últimas décadas. O aumento da esperança de vida e a melhoria das condições de vida e da proteção social desta população têm
fomentado a convivência das gerações e os idosos desempenha.m hoje um
papel chave nas solidariedades familiares, na medida em que podem ser um
importante suporte no quotidiano de filhos, netos e, por vezes, bisnetos.
As mudanças nos papéis dos homens no quotidiano familiar não sáo menos relevantes, nomeadamente as que se referem ao seu papel enquanto pai. Com efeito, os ideais democráticos emanados do 25 de abril
e da Constituição de tg76 foram, em grande medida, responsáveis pela gradual democratização da vida familiar, tanto no que respeita à relação entre homem e mulher, como à relação entre pais e filhos. Anteriormente
baseada em relações hierárquicas, assimétricas e com papéis de género
definidos, a vida familiar decorria sob a autoridade do homem, chefe de
família, pai distante e disciplinador, bem diferente do pai íntimo, presente
e cuidador dos nossos dias. Este envolvimento masculino no quotidiano dos
filhos, apoiado por algumas políticas públicas recentes, tem permitido aos
homens construir novos laços com os filhos: seja pela partilha com a mãe
da licença parental aquando do nascimento de um bebé, seja pela
possibili-dade de, tal como a mãe, viver com os filhos após o divórcio ou a separação,
num regime de guarda conjunta com residência alternada.
Se os filhos são a grande <porta de entrada" dos homens na vida familiar
-
conferindo uma maior igualdade entre homens e mulheres naesfera parental - já o trabalho doméstico persiste como um dos domínios
da vida familiar onde há maiores desigualdades. Com efeito, apesar de ter
havido alguma aproximação nas horas de trabalho doméstico feminino e
masculino, estatísticas recentes revelam que as mulheres ainda fazem em média mais 1o horas semanais de trabalho doméstico do que os homens.
Outro domínio de desigualdade na vida
familiat
diz respeito àsdesigualdades sociais. Traço emblemático da sociedade portuguesa, este
tem sido um elemento de diversificação dos valores e modos de viver em
família, mas também um marcador de oportunidades e constrangimentos socialmente ancorados. Durante algum tempo pensou-se que, à falta de
um Estado Social forte, as famílias destituídas economicamente tinham
redes familiares mais densas, que funcionariam como almofada privada compensatória. Mas vários estudos têm vindo a revelar o inverso, i.e., que
as solidariedades reforçam as desigualdades sociais: as famílias mais
.'-.-.. {:. l) i: (:ì lt F t< i [4 N l.) a tì :; {,_} IJ Y
Portugal Social de A a Z:
Temos em aberto
Família
Kari¡t Wall, Vanessa Cunha e Susana Atalaia
desfavorecidas também contam com menos apoios privados. Importa
acrescentar que, atualmente, as famílias com crianças dependentes apre-sentam uma taxa de risco de pobreza superior à média da população, tanto maior quanto o número de crianças no agregado.
As transformações recentes no que diz respeito à família em
Portu-gal seguem, nas suas tendências gerais, linhas de evolução semelhantes às
encontradas nos outros países europeus. É verdade que os ritmos de
mu-dança não são os mesmos: tal como nos outros países da Europa do Sul, os
indicadores demográficos alteraram-se mais tardiamente, sobretudo ao
longo das duas últimas décadas. No entanto, podemos também assinalar
algumas características que nos diferenciam. Face aos países da Europa do
norte e central, regista-se uma tendência mais acentuada para viver em
famílias complexas que juntam debaixo do mesmo teto parentes de
gera-ções diferentes; em contrapartida, e apesar de estarem a aumentar, há
menos pessoas a viver sozinhas. No contexto da Europa do sul, distingue-se
a maior participação das mulheres no mercado de trabalho,
aproximando--nos das taxas de atividade dos países escandinavos e distanciando-nos da
Itália, da Espanha e da Grécia. Quanto ao trabalho doméstico, estamos, em Portugal, distantes quer de uns quer de outros: o desfasamento entre as
horas de trabalho doméstico feminino e masculino é bem maior do que nos
países nórdicos mas menor do que na Grécia ou na Espanha.
R
eferências
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