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Políticas públicas de saúde: a influência dos atores no processo de implementação e atuação do Poder Judiciário do estado do Rio de Janeiro no fornecimento do medicamento Alprazolam

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE DE MACAÉ DEPARTAMENTO DE DIREITO

NYCHOLAS TRENTO LESSA DE CASTRO

POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE: A INFLUÊNCIA DOS ATORES NO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO E ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO DO

ESTADO DO RIO DE JANEIRO NO FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ALPRAZOLAM

MACAÉ 2020

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NYCHOLAS TRENTO LESSA DE CASTRO

POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE: A INFLUÊNCIA DE ATORES NO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO E ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO

RIO DE JANEIRO NO FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ALPRAZOLAM

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora:

Profª Drª Letícia Virginia Leidens

MACAÉ 2020

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NYCHOLAS TRENTO LESSA DE CASTRO

POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE: A INFLUÊNCIA DE ATORES NO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO E ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO

RIO DE JANEIRO NO FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ALPRAZOLAM

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no Curso de Direito de Macaé, da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________________ Profª. Drª. Letícia Virgínia Leidens – UFF

Orientadora

_________________________________________________________ Profª Mestre Daniele Lovatte Maia - UFF

__________________________________________________________ Profª Mestre Anna Carolina Guimarães de Souza - PGERJ

MACAÉ 2020

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RESUMO

A definição de uma agenda para políticas públicas de saúde é um processo complexo que recebe inúmeras influências dos mais variados tipos de atores, sejam eles estatais ou privados. O Administrador possui certa discricionariedade na tomada de decisão, mas esta não é ilimitada. Observa-se que o processo de desenvolvimento de uma política pública é permeado pela atuação de vários grupos, capazes de modificar o curso de ação inicialmente pensada e adotada para a consecução do direito à saúde da população. Deste modo, busca-se evidenciar quais as razões que embasam o movimento para o Judiciário, ao invés da Administração Pública, especificamente para o fornecimento do medicamento Alprazolam no âmbito do Estado do Rio de Janeiro e por via de consequência, quais os efeitos institucionais desse processo inverso, tendo como base, o estudo de casos e procedimentos judiciais naquele âmbito.

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ABSTRACT

The definition of an agenda for public health policies is a complex process that receives numerous influences from the most varied types of actors, be they state or private. The Administrator has a certain discretion in decision-making, but this is not unlimited. It is observed that the process of developing a public policy is permeated by the actions of several groups, capable of modifying the course of action initially thought and adopted to achieve the population’s right to health. In this way, it is sought to highlight the reasons behind the movement for the Judiciary, rather than the Public Administration, specifically for the supply of the drug Alprazolam within the State of Rio de Janeiro and by way of consequence, the institutional effects of such a procedure on the other hand, on the basis of case studies and judicial procedures in that area.

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. . . .

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Gráfico 1: Curva de desvio no processo de política pública ... 18

Figura 2 – Dados Obtidos - parte 1...57

Figura 3 – Dados Obtidos - parte 2...57

Figura 4 – Dados Obtidos - parte 3...58

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...6

1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL: ASPECTOS

INICIAIS...8

1.1 Definição de políticas públicas após constituição federal de 1988: inclusão de novos atores e fatores norteadores ...10 1.2 Estado Democrático de Direito e Políticas Públicas: implementações sociais e governamentais no cenário político ...13 1.3 Políticas públicas de saúde no Brasil após a Constituição Federal de 1988: aspectos, evoluções, dificuldades, implementação...18 1.4 A participação social e a escolha de política pública de saúde: aspectos locais, regionais e federais...21 1.5 Orçamento público e políticas públicas de saúde no Brasil...23 2 ATORES ESTATAIS E PRIVADOS QUE INFLUENCIAM NA IMPLEMENTAÇÃO

DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE

SAÚDE...28

2.1 Atuação do Poder Legislativo - do direito à saúde como um direito social: previsão na Constituição Federal de 1988 e em Tratados Internacionais de Direitos Humanos...29 2.2 Influência dos Grupos Empresariais no Tecido Relacional do Estado...34 2.3 A atuação dos movimentos sociais - atores privados - nos Conselhos de Saúde...39 2.4 Poder Judiciário: judicialização da política e garantia dos direitos fundamentais...42 3 ABORDAGEM DE UM ESTUDO DE CASO: EFEITOS DOS BLOQUEIOS JUDICIAIS NAS CONTAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO QUE DEFEREM A COMPRA DO ALPRAZOLAM. ATIVISMO JUDICIAL VS ESCOLHAS DOS LEGITIMADOS POPULARES ...49

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3.2 Apresentação de dados ...54 3.3 Poder Judiciário garantidor do Direito à Saúde? Poder Executivo ineficiente no desenvolvimento de políticas de saúde? ...60 CONCLUSÃO...65

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6 INTRODUÇÃO

O presente trabalho versa sobre o desenvolvimento de políticas públicas, mais especificamente, trata-se sobre aquelas voltadas à saúde pública e os diversos atores que exercem influência nesse complexo processo. Bem como a forte judicialização de políticas de fornecimento de medicamento que, a princípio, deveriam ser dirimidas no âmbito da Administração Pública.

Este trabalho teve como fundamento, o clássico pensamento popular de que o Chefe do Executivo é responsável por todas as ações do Estado, incluindo as políticas públicas. Entretanto, buscou-se discorrer sobre a veracidade de tal assertiva. Trabalha-se, visando prover novas informações para tal entendimento, a partir das políticas públicas de saúde, mostrando que o gestor público é somente mais um ator na complexa peça que é a formação de uma política pública, a qual vem influenciada por diferentes segmentos sociais, econômicos para sua real implementação.

As razões pessoais deste trabalho de conclusão de curso se dão devido à vivência no período de estágio na Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, situação em que foram observadas diversas demandas referentes a medicamentos, o que gerou o questionamento acerca dos seus motivos pelo qual o Estado não compra determinado remédio, consolidando o direito à saúde para indivíduos que necessitam e solicitam tal amparo.

Deste modo, como problema de pesquisa, busca-se evidenciar quais as razões que embasam o movimento para o Judiciário, ao invés da Administração Pública no fornecimento do medicamento tal, e por via de consequência quais os efeitos institucionais desse processo, tendo como pano de fundo a análise de casos e procedimentos jurisprudenciais.

A metodologia de abordagem utilizada foi a indutiva, a partir da estrutura procedimental de estudo de casos que envolvem o pedido do medicamento Alprazolam e como técnica de pesquisa o uso da documentação indireta da revisão bibliográfica sobre o tema de políticas públicas e prestações estatais na concretização do direito à saúde. Também se fez uso de uma pesquisa qualitativa, no uso das informações e dados colhidos dos casos em análise.

A moldura adotada para a delimitação da pesquisa foi desenhada nos seguintes ditames: a- processos no âmbito do Estado do Rio de Janeiro; b- o ERJ deve ser réu; c-

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7 pedido do medicamento Alprazolam; d- distribuição do processo dever ser posterior a data de 04 de maio de 2018.

A pesquisa qualitativa foi realizada com base na busca da palavra “Alprazolam” no site JusBrasil e no banco de jurisprudência do TJ-RJ, após a colheita de dados, os processos foram analisados no site do Tribunal do estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ). Não foi possível realizar a pesquisa totalmente no site do (TJ-RJ), porque o resultado da busca retornou apenas, com dez casos e apenas 2 (dois) deles se enquadravam nos parâmetrosestabelecidos. E usando a palavra “medicamento” retornaram mil resultados, devido a atual conjuntura do país e do semestre em caráter extraordinário, não havia tempo hábil para analisar todos casos. Dos 200 (duzentos) processos encontrados sobre a temática, devido a delimitação estabelecida, apenas 14 (quatorze) processos, se enquadravam no foco da pesquisa.

O capítulo 1 apresenta o tema que será abordado de forma ampla, conceitua-se, na medida do possível, o que seria uma política pública e como ela é desenvolvida. Aborda-se os efeitos da redemocratização do país na formulação das políticas – inclusão de novos atores e fatores norteadores – bem como os referentes a fundamentação do Brasil, num Estado Democrático de Direito. Inicia-se a apresentação de tais mudanças no campo das políticas públicas voltadas para a saúde, as evoluções dificuldades, a participação social e o orçamento público destinado ao setor em questão.

O capítulo 2 é referente aos atores que influenciam no processo de políticas públicas para a saúde. Apresenta-se aqueles que serão objeto de estudo e uma das formas que cada um deles é capaz de atuar na citada peça.

O capítulo 3 trata a abordagem a partir de um estudo de caso. A fim de observar a atuação prática do Ator Poder Judiciário, analisa-se os efeitos provocados por decisões judiciais, que deferem o bloqueio de verbas nos cofres do Estado do Rio de Janeiro para a compra de medicamento Alprazolam que não e padronizado, em detrimento do substituto terapêutico. Estuda-se, se tal curso de ação é realmente capaz de garantir o Direito à Saúde da população, se isso exerce influência no desenvolvimento de políticas públicas e outras questões e quais os efeitos deste movimento.

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8 1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL: ASPECTOS INICIAIS

A atuação do Estado na sociedade sofreu grandes transformações com o passar do tempo, tais mudanças ocorreram por inúmeros fatores distintos, como crises econômicas e movimentos sociais. O Estado passou de um mero garantidor dos direitos de Primeira Geração,1que podem ser entendidos como Direitos de Defesa, visando garantir uma abstenção estatal em uma série de campos na vida privada, ou seja, liberdades pessoais e também igualdade num sentido formal, todos receberiam tratamentos iguais; para um Estado dotado de deveres positivos para com o povo ou garantidor de direitos de Segunda Geração2, que podem ser definidos como prestações positivas, assim, o Estado passa a ser responsável por garantir direitos como saúde, educação, previdência e outros. Esta definição histórica e geral é plenamente aplicável ao Brasil.

Portanto, percebe-se uma evolução da atuação estatal no campo dos Direitos Sociais que são regidos por uma lógica de igualdade3, mas em seu sentido material, que é muito bem exposto por Nelson Nery Junior (1999, p.42) ao afirmar que, seria “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de sua desigualdade”. O Estado não pode ser neutro perante as desigualdades sociais, pelo contrário, deve fornecer guarita aqueles que não conseguiram prover as suas necessidades básicas com os frutos de seu trabalho.

Nesta lógica de expansão de direitos, que as responsabilidades do Estado aumentaram e se diversificaram por várias áreas distintas. Nesse sentido, um setor que ganhou muita importância foi a saúde pública. Todavia esse é um termo vago que comporta vária interpretações, visto que o entendimento do que seria “saúde pública” é fruto da visão dos grupos socioeconômicos e culturais, condicionado por suas ideias de mundo, interesses, crenças e formação socioeconômica4.

Embora o seu conceito possa gerar muitas discussões, dois critérios estão sempre presentes, a vinculação com o Estado e a sua dimensão coletiva. Portanto, saúde pública, pode ser entendida como conhecimentos e práticas organizados e prestados por instituições públicas em

1 Segundo Gilmar Mendes, direitos fundamentais de primeira geração são “postulados de abstenção dos

governantes, criando obrigações de não fazer, de não intervir sobre aspectos da vida pessoal de cada indivíduo. São considerados indispensáveis a todos os homens, ostentando, pois, pretensão universalista” (MENDES, 2018, p. 200).

2 Segundo Gilmar Mendes, direitos fundamentais de segunda geração “são os direitos de segunda geração, por

meio dos quais se intenta estabelecer uma liberdade real e igual para todos, mediante a ação corretiva dos Poderes Públicos. Dizem respeito a assistência social, saúde, educação, trabalho, lazer etc” (MENDES, 2018, p. 200).

3 A ideia de igualdade tratada é a explicitada pela citação do doutrinador Nelso Nere Junior.

4 CASTIEL, Luis David. O que é Saúde Pública? Fiocruz. Disponível em:

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9 uma dada sociedade, com a finalidade de evitar, reduzir, minimizar os agravos à saúde da coletividade, garantindo condições de manutenção e sustentação da vida dos integrantes dessa5. Visando prover tais deveres, dentre eles a saúde pública, uma das formas que o Estado utiliza, são as Políticas Públicas, que podem ser entendidas como:

Mead (1995) a define como um campo dentro do estudo da política que analisa o governo à luz de grandes questões públicas. Lynn (1980) a define como um conjunto específico de ações do governo que irão produzir efeitos específicos. Peters (1986) segue o mesmo veio: política pública é a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos. Dye (1984) sintetiza a definição de política pública como “o que o governo escolhe fazer ou não fazer”. A definição mais conhecida continua sendo a de Laswell, ou seja, decisões e análises sobre política pública implicam em responder às seguintes questões: quem ganha o quê, por que e que diferença faz”. (SOUZA, 2002, p. 4)

Outrossim, salienta-se os ensinamentos de Diogo de Figueiredo Moreira Neto que afirma o seguinte:

A partir de uma nova categorização jurídica das políticas públicas, que passa a ser entendida como um complexo de processos, que, partindo da formulação de atividades estatais coerentes e finalisticamente vinculadas, se desenvolvem pelas etapas de planejamento, de orçamentação e de execução dos cometimentos administrativos postos constitucionalmente a cargo do Estado. (2007, p.15)

Aprofundando, deve-se falar sobre o conceito de Ciclo de Política Pública, que tem como um de seus maiores expoentes D. Easton e H. Laswell, aquele é uma série de crivos, testes pelos quais uma política pública enfrenta no seu momento de planejamento e execução. Ele é compreendido pelos seguintes pontos: “(1) percepção e definição de problemas; (2) formação da agenda decisória; (3) formulação de programas e projetos; (4) implementação das políticas delineadas; (5) monitoramento e avaliação das ações planejadas” (RAEDER, 2014, p.128).

Passados os aspectos iniciais e de definição do que seria uma política pública em sentido geral, é possível começar a falar sobre aquelas que são voltadas especificamente para o setor da saúde pública. Introduzindo a questão, pode-se afirmar que política pública de saúde é sinônimo de uma atuação governamental, que desenvolve ações de forma coordenada visando organizar atos públicos e regular os privados no sentido de alcançar o chamado Conceito Ampliado de Saúde. Este termo foi desenvolvido na 8ª Conferência Nacional de Saúde em 1986 e pode ser entendido como:

5 CASTIEL, Luis David. O que é Saúde Pública? Fiocruz. Disponível em:

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10 Durante muito tempo, predominou o entendimento de que saúde era sinônimo de ausência de doenças físicas e mentais. Nesse sentido, os serviços de saúde privilegiaram na sua organização a atenção médica curativa. Na contramão a Organização Mundial de Saúde definiu saúde como o completo bem-estar físico, mental e social e não a simples ausência de doença. Essa compreensão aponta para um conceito ampliado de saúde e sinaliza a complexidade do tema, sendo necessário aglutinar neste conceito a necessidade de ações intersetoriais e interdisciplinares no sentido de criar condições de vida saudáveis. (LINARD, CASTRO, CRUZ, 2011, p.551-552)

Logo, nota-se que saúde é um tema vasto e complexo que inclui não só pontos ligados a medicamentos, hospitais e cirurgia, mas também aspectos da vida social, trabalho, renda, meio ambiente e outros. Engloba demandas sociais e diversas disputas entre os atores que participam do processo de uma política pública voltada para à saúde.

1.1 Definição de políticas públicas após constituição federal de 1988: inclusão de novos

atores e fatores norteadores

A Constituição de um Estado pode ser definida como a Lei Maior, que organiza e limita o poder político, dispondo sobre direito fundamentais e finalidades que devem ser perseguidas pelo Estado. Portanto, sempre que é editado uma nova constituição é renovado o fundamento legitimador do Estado, bem como é reorganizado as suas estruturas, limitando os poderes políticos e definindo objetivos estatais através das normas programáticas6.

A Constituição da República Brasileira de 1988 assume a importante função de realizar a transição de um regime autocrático para um democrático e assim o fez, sendo um marco no processo de redemocratização do país. Devido a esta importante tarefa de ser uma ponte entre os dois regimes, a Carta Magna deu grande ênfase aos direitos fundamentais, dentre eles, o direito à saúde em seus artigos 6º e 196 a 200, por exemplo. Outrossim, reestabeleceu a inviolabilidade dos direitos, liberdades políticas, liberdades individuais e consagrou um rol de direitos fundamentais amplo (SARLET, 2018, p. 386-387) e não veda a existência de outros, não ali previstos (SARLET, 2018, p.1014).

O catálogo de Direitos Fundamentais é onde se encontra importantes valores morais da Carta Constitucional e estes ainda possuem uma eficácia irradiante por todo o Direito, são

6 “As normas programáticas, igualmente, são subespécie das normas constitucionais de eficácia limitada. Essas

normas impõem uma tarefa para os poderes públicos, dirigem-lhes uma dada atividade, prescrevem uma ação futura” (MENDES, 2018, p.106).

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11 vetores interpretativos7 que condicionam a interpretação de todo o Direito (SARLET, 2018, p.

389).

Adota-se no Brasil o princípio da força normativa da constituição8, logo seus artigos vinculam os três poderes que não podem desrespeitá-los e muitos deles possuem aplicabilidade imediata, por exemplo o artigo 5º da Constituição Federal de 1988, conforme dispõe o §1º Do mesmo (BRASIL, 1988). O referido dispositivo contempla significativa parcela dos direitos fundamentais e devido a sistemática comentada, não cabe ao Estado a discricionariedade de efetivá-los ou não, sendo este obrigado a implementar políticas públicas para efetivar aqueles que as requeiram.

Logo, a Constituição Federal de 1988 alterou significativamente o modo que as políticas públicas são pensadas, desenvolvidas e quais são as suas finalidades, ou seja, a sua definição em um sentido axiológico. Explica-se, o Estado passou a ter um dever constitucional com a implementação dessas, especialmente quanto a área da saúde, vide artigos 196 a 200 da Carta Magna. Portanto, os direitos fundamentais, a força normativa que os dispositivos da Constituição possuem – e outros fatores – são fatores norteadores no desenvolvimento de uma política de estado voltada a promoção da saúde pública.

Entretanto, mesmo a Constituição preceituando um fim, garantir a saúde da população, ela define um objetivo final, mas não define os caminhos, deixando a cargo das maiorias políticas a escolha de qual caminho seguir. Noutras palavras, ela define uma Política de Estado e não uma Política de Governo.

Políticas de governo são aquelas que o Executivo decide num processo bem mais elementar de formulação e implementação de determinadas medidas para responder às demandas colocadas na própria agenda política interna – pela dinâmica econômica ou política-parlamentar, por exemplo – ou vindos de fora, como resultado de eventos internacionais com impacto doméstico. Elas podem até envolver escolhas complexas, mas pode-se dizer que o caminho entre a apresentação do problema e a definição de uma política determinada (de governo) é bem mais curto e simples, ficando geralmente no plano administrativo, ou na competência dos próprios ministérios setoriais. Políticas de Estado, por sua vez, são aquelas que envolvem as burocracias

7 Vetor Interpretativo pode ser entendido como filtro de interpretação, a interpretação de uma norma deve estar

alinhada como ele, “como se fosse uma bússola apontando para uma direção” (MARTINS, 2008, p.266).

8 Força Normativa da Constituição, entendida pelo viés de Hesse, afirma que a Constituição não é apenas um

documento político, mas também normativo. Logo seus artigos são capazes de criar leis por si só e segundo Gerivaldo Alves Neiva (2018, p.n) “a Constituição deverá imprimir ordem e conformação à realidade política e social, determinando e ao mesmo tempo sendo determinada, condicionadas, mas independentes”. JUS NAVIGANDI. Os fatores reais do poder e força normativa da Constituição. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11664/os-fatores-reais-do-poder-e-forca-normativa-da-constituicao. Acesso em: 1 ago. 2020.

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12 de mais de uma agência do Estado, justamente, e acabam passando pelo Parlamento ou por instâncias diversas de discussão, depois que sua tramitação dentro de uma esfera (ou mais de uma) da máquina do Estado envolveu estudos técnicos, simulações, análises de impacto horizontal e vertical, efeitos econômicos ou orçamentários, quando não um cálculo de custo-benefício levando em conta a trajetória completa da política que se pretende implementar. O trabalho da burocracia pode levar meses, bem como o eventual exame e discussão no Parlamento, pois políticas de Estado, que respondem efetivamente a essa designação, geralmente envolvem mudanças de outras normas ou disposições pré-existentes, com incidência em setores mais amplos da sociedade. (ALMEIDA, 2009, p.n)

Diante dessa discricionariedade relativa às políticas de governo, a Constituição legitimou a influência do campo social no controle e desenvolvimento de políticas púbicas. Prioritariamente, ao tratar sobre os direitos políticos, a Constituição de 1988 assegurou o sufrágio universal pelo voto direto, secreto e periódico ao povo, logo é este quem elege os dirigentes públicos que são responsáveis por desenvolverem e executarem as políticas públicas, fim ao cabo, estas são dotadas de legitimidade popular. Além disso, foi incentivado a criação de processos participativos, mecanismos de controle e transparência.

A Carta Magna gerou grande aumento da participação da sociedade civil no desenvolvimento e controle de políticas públicas, visto que ela obriga a criação de organizações representativas para certos setores. Por exemplo, na saúde há a Gestão Participativa em Saúde que é composta pelos Conselhos de Saúde, Conferências de Saúde, Comitês Técnicos e Comitês Técnicos de Equidade em Saúde. A Democracia Participativa no Brasil sofreu grande expansão na década de 90, quando ocorreu a criação de vários conselhos participativos nos municípios e segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2011, já haviam sido realizadas 73 conferências nacionais para debater políticas públicas 9. Percebe-se um exponencial aumento da contribuição popular neste período.

Tal participação, também rende frutos positivos, como constatou um estudo desenvolvido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)10 que analisou a relação entre a

participação popular e a eficácia de políticas públicas nos setores da educação e saúde em cidades com mais de 100 mil habitantes. Os resultados concluíram que as cidades com maior

9 MATEOS, Simone Biehler. Participação Popular – A construção da democracia participativa. Revista Desafios

do Desenvolvimento, Brasília, v. 65, n. 8, p.n, maio. 2011. Disponível em: < https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2493:catid=28&Itemid=23#:~:text=A%20 participa%C3%A7%C3%A3o%20popular%20na%20elabora%C3%A7%C3%A3o,de%20formula%C3%A7%C 3%A3o%20dos%20movimentos%20sociais>. Acesso em: 08 de julho de 2020

10 MATEOS, Simone Biehler. Participação Popular – A construção da democracia participativa. Revista Desafios

do Desenvolvimento, Brasília, v. 65, n. 8, p.n, maio. 2011. Disponível em: < https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2493:catid=28&Itemid=23#:~:text=A%20 participa%C3%A7%C3%A3o%20popular%20na%20elabora%C3%A7%C3%A3o,de%20formula%C3%A7%C 3%A3o%20dos%20movimentos%20sociais>. Acesso em: 08 de julho de 2020

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13 participação obtiveram índices, em proporção à população, 3 ou 4 vezes maior de creches e matrículas no ensino fundamental, número de consultas e leitos do SUS também superiores.

A participação e controle social demandam acesso a informações, portanto, a regra vigente no país é a transparência, sendo o sigilo a exceção. A Lei de Acesso a Informação possibilitou um imprescindível mecanismo de controle popular das ações governamentais, a União, Estados e alguns Municípios já possuem portais da transparência em seus respectivos sites, facilitando o acesso da população às informações sobre os gastos públicos. Ressalta-se que essa sistemática aliada ao Direito de Petição que é entendido como o direito de qualquer pessoa de provocar o poder público sobre defesa de direitos, contra ilegalidade ou abuso de poder, e obrigatoriedade de Motivação que é a demonstração dos pressupostos de fato e direito que deram causa a determinada ação da Administração Pública são fortes instrumentos de fiscalização social de políticas públicas.

1.2 Estado Democrático de Direito e políticas públicas: implementações sociais e governamentais no cenário político

O artigo primeiro da Constituição da República Federativa do Brasil consagra importantes fundamentos para a República Federativa do Brasil, dentre eles, o Estado Democrático de Direito, conforme consta em sua literalidade:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (BRASIL, 1988)

A Constituição Federal de 1988 teve a importante função de realizar a transição entre dois regimes opostos e afirmar, em seu primeiro artigo, que a República Federativa do Brasil se constitui em um Estado Democrático de Direito é peça chave para tanto. “Estado Democrático de Direito se caracteriza por conjugar, a um só tempo, direitos humanos em sucessivas dimensões, comportando também, por isto, uma postura positiva do Estado” (SIQUEIRA, 2008, p.1).

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14 O parágrafo único afirma, sem deixar possibilidade de dúvida, que o povo é detentor de todo o poder e o exercerá por meio de seus representantes eleitos, bem como indiretamente. Se todo o poder emana do povo, este é quem deverá criar todas as leis, gerenciar e coordenar o Estado. Portanto, adotou-se a democracia em sua forma indireta, também chamada de participativa, e a partir disso foi desenvolvida a ideia de Mandato Eletivo – quando uma pessoa é eleita para um cargo político seria como se ela fosse constituída como um procurador(a) do povo na esfera pública. O principal instrumento de participação política da população é o voto sendo o período eleitoral um grande momento de cidadania.

O voto caracteriza-se como exercício do sufrágio, pois é a exteriorização do sufrágio, ou seja, quando o eleitor se dirige à seção eleitoral e exerce o ato de votar, materializado está o sufrágio. Nesse sentido, o voto emerge como verdadeiro instrumento de legitimação para entrega do poder do povo aos seus representantes, tendo em vista que é ato fundamental para concretização efetiva do princípio democrático consagrado pela Constituição Federal (TSE, 2013, p.19)

Sendo os ocupantes dos cargos políticos eleitos pelo povo, cabendo a eles definirem quais e como serão implementadas as políticas públicas, estas são dotadas de legitimidade popular.

Portanto,os legisladores e administradores do Estado devem atuar visando o relevante interesse público coletivo11, assegurando as liberdades individuais e os direitos fundamentais de todos sem fazer distinções e as políticas públicas são essenciais para tanto, visto que a implementação destas foi fundamental para gerar o desenvolvimento do país. Salienta-se que desenvolvimento, aqui, é diferente de modernização.

Para a análise do desenvolvimento é necessário traçar sua definição, separando da modernização ou crescimento econômico. O crescimento da economia sem nenhuma mudança nas estruturas sociais, se trata de simples modernização, o que apesar dos índices de crescimento elevados e o aumento da produtividade, não acarreta transformações profundas e agrava a concentração de renda. [...] Desta feita temos que o desenvolvimento não é somente o crescimento da economia, mas este crescimento aliado a modificações estruturais em todas as searas da sociedade, de modo que ele seja principalmente sustentável. O desenvolvimento deve acarretar na melhora da condição de vida da sociedade, ocasionando a melhor distribuição dos recursos gerados, o que necessita de políticas específicas, já que o mercado por si só não é apto a gerar o desenvolvimento. (MENDONÇA, VASCONCELLOS, 2008, p.213-214)

11 “O interesse público pode ser dividido em duas categorias: a) interesse público primário: relaciona-se com a

necessidade de satisfação de necessidades coletivas (justiça, segurança e bem-estar) por meio do desempenho de atividades administrativas prestadas à coletividade (serviços públicos, poder de polícia, fomento e intervenção na ordem econômica); e b) interesse público secundário: é o interesse do próprio Estado, enquanto sujeito de direito e obrigações, ligando-se fundamentalmente à noção de interesse do erário, implementado por meio de atividades administrativas instrumentais necessárias para o atendimento do interesse público primário, tais como as relacionadas ao orçamento, aos agentes públicos e ao patrimônio público” (OLIVEIRA, 2020, p.47)

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15 Segundo Ricardo Sennes, as políticas públicas realizadas com continuidade nos últimos 20 anos geraram grandes resultados na educação, saúde e no combate à pobreza, utilizando-se de transferência direta de renda. A título de exemplo a expectativa de vida do brasileiro em 2000 era de 69 anos e em 2015 deu um salto para 75,5 anos devido a uma ampla campanha de vacinação, empreitadas para a erradicação de doenças como paralisia infantil, tuberculose e outras, e destaca-se que o Brasil é referência no tratamento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) que já foi considerada como uma “sentença de morte”12.

Entretanto, é necessário fazer alguns esclarecimentos quanto os aspectos sociais e governamentais na implementação de uma política pública, deve-se aprofundar o conceito de Ciclo de Política Pública. A priori, ressalta-se que este não é o único modelo de formulação e análise de políticas públicas, bem como não é livre de críticas, porém é o que melhor se encaixa didaticamente no trabalho porque “permite explorar e investigar o processo das políticas públicas por redução da sua complexidade. A desagregação em etapas ou categorias de análise torna todo o processo das políticas públicas mais facilmente apreensível” (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017, p.18)

O Ciclo de Políticas Públicas se popularizou pelos trabalhos norte-americanos, Laswell foi pioneiro ao propor uma análise estruturada do processo de políticas públicas e partir dessa formulação, Charles O. Jones, organiza uma classificação em dez etapas que subsidiou a atual (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017, p.19). Essa metodologia enxerga o processo de desenvolvimento de uma política pública como um ciclo deliberativo, decompondo-o em vários estágios para formar um procedimento dinâmico e de aprendizado. Esta modalidade de análise tem enfoque na definição da agenda (agenda setting) tentando responder por que algumas questões são incluídas, outras não, e chega em três possíveis hipóteses (SOUZA, 2006, p.29).

A primeira hipótese é focalizada no problema social, ou seja, quando este se torna relevante e necessário o suficiente para que se pense em meios de contorná-lo, logo o reconhecimento e definição destes problemas afetará diretamente a composição da agenda, fazendo com que objetivos sejam revistos, retirados de pauta ou postos em prioridade (SOUZA, 2006, p.30). Segunda hipótese de como a agenda é definidaé referente ao “jogo” político, em como é criada a consciência coletiva que define quais problemas devem ser incluídos. Linhas gerais, é referente ao processo político que define a ideologia que será seguida pelo governo, que com base nessa irá eleger as pautas da agenda (SOUZA, 2006, p.30).

12 SENNES, Ricardo. Políticas públicas que deram certo precisam mudar. Exame. 22/06/2017. Disponível em:

<https://exame.com/blog/ricardo-sennes/politicas-publicas-que-deram-certo-precisam-mudar/>. Acesso em: 07 de julho de 2020.

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16 Anteriormente, já foi explicado que é o povo quem define seus governantes, logo tal consciência coletiva é definida, principalmente, no processo eleitoral. Isso pode desencadear profundas mudanças ideológicas nas políticas governamentais, portanto o tipo de visão de mundo estabelecido pela maioria é fator importantíssimo para a definição da agenda. Por exemplo, a transição de um governo de esquerda para um de direita acarretará inúmeras mudanças e reformulações nas políticas públicas que estavam sendo desenvolvidas.

Comparando as duas hipóteses chega-se à conclusão de que quando a agenda governamental é formada por um viés político, a barganha é muito mais utilizada do que a persuasão e quando é delimitada por um relevante problema, a persuasão toma uma posição de destaque (SOUZA, 2006, p.30). Noutras palavras, se a agenda for formada pela ideologia política do governo da época, esta estará muito mais susceptível a influências externas (políticas, econômicas, sociais e outras) ao governo; diferente de quando é formada por um problema, que é tido como relevante por toda a sociedade, tornando-a mais influenciável pela persuasão argumentativa do que pela barganha.

Terceira e última hipótese coloca os participantes como objeto de estudo, e os classifica como visíveis, vide os políticos, grupos econômicos, mídia, entre outros. E invisíveis por exemplos os burocratas e acadêmicos; tal hipótese diz que a agenda será formada pelos participantes visíveis e os invisíveis fornecerão as alternativas de como implementá-la (SOUZA, 2006, p.30).

Isso possibilita enxergar um ponto que não é claro aos olhos da maioria da população, o administrador/gestor público não define a sua agenda de políticas públicas nem como irá implementá-la de maneira livre e sem influências. Na definição de políticas públicas, o Estado, não reflete somente as pressões dos grupos de interesse – como diria uma corrente simplista do pluralismo – ou as escolhas feitas exclusivamente por que está no poder, como afirma uma corrente, também simplista, do elitismo (SOUZA, 2006, p.26-27).

Na verdade, fala-se na existência de uma “autonomia relativa do Estado” no processo de desenvolvimento de políticas públicas, devido ao atual nível de complexidade da sociedade e do próprio ente político, este detém um ambiente de atuação próprio, mas sofre influência de atores externos (SOUZA, 2006, p.26-27), por exemplo os movimentos sociais, sindicais, coalisões políticas, oposição ao governo, controle exercido pelos demais poderes e outros.

Essa autonomia relativa gera determinadas capacidades, as quais, por sua vez, criam as condições para a implementação de objetivos de políticas públicas. A margem dessa “autonomia” e o desenvolvimento dessas “capacidades” dependem,

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17 obviamente, de muitos fatores e dos diferentes momentos históricos de cada país (SOUZA, 2006, p.27)

Pierre Muller (1998, p.68), citando Éric Monnier, apresenta, de maneira brilhante, a situação de influência dos atores no processo de políticas públicas. Éric Monnier, analisando o desenrolar de uma política pública, afirma que ela toma os contornos de um “fluxo turbulento” com três componentes essenciais. Primeiro é a formulação da ação que é o desenvolvimento de um esboço de solução, chamado pelo autor de “Teoria da Ação” (MULLER, 1998, p.68). Segundo é a chamada “Conduta da Ação” que obriga a uma constante reformulação do curso adotado em função dos recursos disponíveis e das reações dos demais atores, pensando sempre em novas inovações (MULLER, 1998, p.68). Terceiro é a “Observação dos Efeitos” que são as avaliações feitas dos resultados obtidos que levam a reconsiderar as hipóteses adotada na Teoria da Ação ou modificar como estão sendo empregados os meios de transformação (MULLER, 1998, p.68). Com base nisso o autor chega no seguinte gráfico:

Gráfico 1: Curva de desvio no processo de política pública

Fonte: MULLER, 1998, p.68

Analisando a figura, percebe-se que o desenvolvimento não é linear, ele não segue a linha inicialmente pensada pelo gestor. Conforme a política pública é posta em prática, ela vai sofrendo diversas influências que a fazem ser revista, repensada e reorganizada e isso faz com que, muitas vezes, ela não siga o curso inicialmente planejado. Ela oscilará conforme sejam

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18 formuladas novas inovações para o curso de ação, também em função dos efeitos observados e isso levará a uma curva de desvio do plano linear originalmente traçado.

O gráfico, também, deixa claro uma informação que pode passar desapercebida. Qualquer política pública estará inserida na realidade social do local, ou seja, sofrerá a influência das condições do determinado lugar que for implementada. A política pública até pode ser pensada de forma desprendida da realidade, mas a sua implementação fica sempre à mercê do mundo real. Devido ao fato de uma política pública ser uma conjuntura de atos administrativos coordenados, essa constatação é acompanhada pela teoria do Ato Administrativo Autista de Floriano de Azevedo Marques, citando-o Odete Medauar (2014, p.309) afirma que a principal característica deste é o déficit de comunicação com o meio ambiente social, cultural e econômico, sendo indiferente para com os administrados e sociedade, resultando num choque com as dificuldades atuais.

1.3 Políticas públicas de saúde no Brasil após Constituição Federal de 1988: aspectos, evoluções, dificuldades, implementação

A Constituição Federal de 1988, devido ao seu perfil dirigente13e seus objetivos como

Carta Política, garante expressamente o direito a saúde no rol de seus Direitos Sociais e dedica uma seção inteira à saúde – Seção II, Capítulo II, Título VIII - Da Ordem Social. Dá-se destaque ao artigo 196 da Lei Maior, a seguir transcrito:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 1988)

A partir da leitura do citado artigo é possível extrair importantes aspectos sobre a saúde no Brasil. O modelo brasileiro é universal e gratuito, qualquer pessoa pode ter acesso a ele, independentemente de qualquer pagamento ou da sua origem, ou seja, o sistema brasileiro de saúde não requer nenhum tipo de pagamento prévio para o acesso ao serviço, bem como não faz distinção se o requerente é brasileiro nato, naturalizado, estrangeiro residente, turista, apátrida, etc (BRASIL, 2002, p.14). A relação com a saúde se estabelece com o acesso, não o custeio.

13

Constituição Dirigente tem a “a pretensão de impor ao legislador e ao administrador certos deveres de atuação positiva, com a consequente redução do campo reservado à deliberação política majoritária” (BARROSO, 2017, p.65).

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19 Nota-se, também, um caráter impositivo da norma constitucional em relação a posição estatal de fornecimento do serviço, sendo este um “dever” que será garantido através de políticas sociais e econômicas que são espécies do gênero política pública. Por fim, a parte final denota outra característica importantíssima do conceito de saúde adotado, o Estado não pode apenas fornecer meios de tratamento visando reestabelecer a saúde daqueles que adoeceram (recuperação), mas também deve adotar ações para prevenir que a população adoeça (proteção) e para melhorar a condição de vida neste aspecto (promoção) (SARLET, 2018, p. 3549-3551).

Sintetizando, o Estado tem um compromisso proativo com a saúde da população, em seu conceito ampliado outrora mencionado, empregando políticas sociais e econômicas para atingir a promoção, proteção e recuperação da saúde.

Isso é corroborado pela própria Constituição em seu artigo 200 (BRASIL, 1988), que estabelece o Sistema Único de Saúde – SUS, sendo mais tarde regulamentado pela Lei nº 8080/90 (BRASIL, 1990). O SUS é um ponto referencial na história da saúde como direito fundamental no Brasil, somente com ele que se dá um efetivo aumento no acesso à saúde pública, bastando somente dela necessitar, conforme disposto no §1º, art. 2º, Lei nº 8080/90 (BRASIL, 1990).

A constitucionalização desse sistema é fruto das propostas de reforma sanitária que fazia grandes crítica ao modelo vigente desde 1975, este abraçava somente aqueles que faziam parte do sistema de trabalho formal e seus dependentes, os segurados no Instituto Nacional de Previdência (INPS) enquanto o restante da população ficava a mercê de entidades filantrópicas e alguns poucos hospitais públicos (GADIA; JÚNIOR; BORGES, 2012, p.1). O SUS tem como fundamento a universalidade de atendimento por meio de uma administração descentralizada, atendimento integral e participação social, portanto a implementação desse sistema denota uma grande evolução nas políticas de saúde pública, quando comparadas ao modelo adotado anteriormente a 1988. Outro notável avanço se dá na inclusão da população no processo decisório do setor em questão, tema que será abordado em ponto específico.

Saúde pública, portanto, pode ser entendida, também, como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade” (OMS, 1946, p.1) que o Estado deve buscar para todos. O SUS tem a função instrumentadora nessa empreitada, foi o sistema desenvolvido pelo Brasil para atingir tal objetivo.

Dentre os objetivos do SUS há “a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômicos e social, a observância do disposto no §1º do art. 2º” conforme denota o inciso II do artigo 5º da Lei nº 8080/90 (BRASIL, 1990) e isso representa um enorme desafio.

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20 Como já fora demonstrado a definição de políticas públicas de saúde vai muito além do atendimento médico e fornecimento de remédios, a multidisciplinariedade é característica central do tema, não sendo possível delimitar um problema de saúde púbica sem observar e levar em consideração os efeitos relacionados à economia, educação e política.

Deixando um pouco de lado os, já demonstrados, desafios inerentes quanto a formação de uma agenda e desenvolvimento da política pública, outro forte desafio no desenvolvimento da saúde pública é resultante da cultura nacional que tem demasiado enfoque na doença e no tratamento hospitalar, minimizando o impacto da medicina preventiva. Os profissionais da saúde, no Brasil, têm uma formação estritamente biológica e muito pouco holística, eles são excelentes em diagnosticar uma doença e fornecer um prognostico para reestabelecer a saúde física do paciente, mas possuem dificuldade em enxergar uma perspectiva ampla para fornecer um tratamento que leve em consideração a pessoa no seu todo e não como um conjunto de sintomas (GADIA; JÚNIOR; BORGES, 2012, p.2).

Aliando isto com o mau uso do dinheiro público e as diversas necessidades de cada região em um país subdesenvolvido de proporções continentais, resulta-se num desafio de proporções homéricas no desenvolvimento de políticas públicas de saúde (BRASIL, 2002, p.7).

Portanto, é muito mais eficiente o desenvolvimento de políticas públicas que busquem desafogar o SUS por meios da multidisciplinariedade inerente ao ramo da saúde, pois tratar o que causa a doença é mais efetivo do que tratar os sintomas da mesma. Exemplo disso foi a política de tolerância zero em relação ao consumo de álcool e direção de veículos, a conhecida Lei Seca, Lei nº 11.705/2008 (BRASIL, 2008), visto que os acidentes de carro são responsáveis por grande parte do orçamento destinado aos gastos hospitalares, titularizando 32.8% das ocorrências e 41,2% dos gastos14. A Polícia Federal Rodoviária constatou que somente nos dois primeiros meses de vigência da Lei Seca foi economizado o montante de R$48.4 milhões (quarenta e oito milhões e quatrocentos mil reais) devido à redução de mortes em acidentes nas rodovias federais e segundo o Ministério da Saúde houve redução de 23% nos acidentes nas capitais somente nos primeiros 6 (seis) meses de sua aplicação15.

14 RECONDO, Felipe. País deixa de gastar R$ 48 mi com lei seca. Estadão, São Paulo, 21 de agosto de 2008.

Disponível em: <https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,pais-deixa-de-gastar-r-48-mi-com-lei-seca,227994>. Acesso em: 10 de julho de 2020.

15 Óbitos por acidentes de trânsito diminuem após 10 anos de Lei seca. Ministério da Saúde. 2018. Disponível

em: <https://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/43593-10-anos-de-lei-seca-obitos-por-acidentes-de-

transito-diminuem-2#:~:text=%C3%93bitos%20por%20acidentes%20de%20tr%C3%A2nsito%20diminuem%20ap%C3%B3s%201

0%20anos%20de%20Lei%20Seca,-Escrito%20por%20ingrid&text=H%C3%A1%20dez%20anos%20a%20Lei,acidentes%20de%20tr%C3%A2nsit o%20no%20pa%C3%ADs.>. Acesso em: 10 de julho de 2020.

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21 Logo, fica claro que dar prioridade a políticas públicas de saúde voltadas para medicina preventiva, saneamento básico, conscientização quanto a higiene básica, cuidados com o meio ambiente, uso de drogas, educação sexual e levando em conta a realidade social da comunidade, onde será posta em prática a referida política pode gerar uma grande economia aos cofres públicos. Visto que muitas vezes não requerem um grande e complexo aparato ou massivos investimentos.

Consequentemente, ajudarão na melhor adequação aos escassos recursos remetidos a saúde pública no Brasil, bem como no desafio homérico destinado ao SUS de fornecer acesso irrestrito, gratuito e de qualidade à saúde para todos.

1.4 A participação social e a escolha de política pública de saúde: aspectos locais, regionais e federais

A população é responsável por eleger os dirigentes do Estado, aqueles que irão pensar e decidir os rumos que o poder público irá tomar. Entretanto isso ainda é muito abstrato quando o que está em questão é o Direito Social à Saúde e muito longe do usuário final do serviço, logo a participação da sociedade no desenvolvimento de políticas públicas é fundamental para que a sua implementação seja o mais eficaz possível. A coletividade é um dos atores de maior importância neste processo visto que é esta quem irá utilizar os serviços e quem melhor sabe de suas respectivas necessidades.

A Constituição de 1988, em seu artigo 198, coloca as ações e serviços públicos de saúde como um sistema único tendo como uma das suas diretrizes a “participação da comunidade” (BRASIL, 1988) e o mesmo é reforçado na lei que regulamenta o SUS, Lei nº 8080/90, (BRASIL, 1990) em seu capítulo sobre princípios e diretrizes.

Além da importância jurídica do dispositivo constitucional e do infraconstitucional, a garantia expressa de participação popular faz uma inserção direta da população brasileira no processo decisório e avaliativo das políticas desenvolvidas para a defesa do Direito à Saúde. A inclusão do cidadão neste processo o faz perceber que ele não é um mero destinatário final ou simples usuário, mas um ator participativo direto, capaz de gerar mudanças em sua comunidade. Vera Schattan P. Coelho ainda afirma que este movimento de inclusão é anterior a Constituição de 1988: “a partir de meados dos anos 1970, a participação e a deliberação nos ‘novos espaços democráticos’, criados na esfera estatal ou na esfera pública, nos níveis local e nacional, começaram a ser defendidas como fundamentais para tornar o sistema democrático mais inclusivo” (COELHO, 2007, p.77)

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22 A Lei nº 8.142/90 dispõe como será realizada a participação da comunidade, o SUS contará com Conferência de Saúde e Conselho de Saúde em cada esfera de governo (BRASIL, 1990, p.n), ou seja, existem Conferências de Saúde e Conselhos de Saúde Nacionais, Estaduais e Municipais. Por exemplo, há o Conselho Nacional de Saúde, o Conselho Estadual de Saúde do Rio de Janeiro e o Conselho Municipal de Saúde do Rio de Janeiro.

A Conferência de Saúde deve ser representada pelos mais variados seguimentos da sociedade, tendo a responsabilidade de avaliar a situação da saúde e também de propor novas diretrizes para o processo de política de saúde. Deve ser realizada a cada quatro anos, sempre no terceiro ano de governo, logo é um espaço destinado ao debate, formulação e avaliação de políticas de saúde que serão, em tese, mais significativas para o ente político.

Quanto ao âmbito municipal, as Conferências Municipais de Saúde são de relevante importância para os futuros governos estaduais e federais, visto que são responsáveis por desenvolver um diagnóstico detalhado sobre a situação da saúde pública de sua localidade, logo fornece preciosas informações para os entes maiores (LUCCHESE, 2004, p.21).

O Conselho de Saúde por sua vez é um órgão permanente, colegiado e deliberativo, composto por representantes dos usuários, governo, prestadores de serviços e profissionais da saúde e tem atribuição de desenvolver e controlar as políticas de saúde, incluindo os aspectos econômicos e financeiros da mesma, elaborando ata de registro de suas reuniões que ocorrem de forma mensal (BRASIL, 2013, p.5-6). Ainda quanto a composição, destaca-se a Resolução nº 453/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) que diz a proporção de cada seguimento, sendo 50% dos integrantes proveniente do grupo dos usuários, 25% de profissionais da saúde e o restante composto por gestores e prestadores de serviço (BRASIL, 2012, p.n), nota-se forte intenção de favorecer a opinião popular.

As pessoas que compõem os conselhos são denominadas de conselheiros e possuem mandato eletivo fixo que, a princípio, será de 2 (dois) anos. Como cada ente federativo irá dispor sobre seu próprio conselho de saúde este terá certas variações, o Conselho Nacional de Saúde dispõe que será de 3 (três) anos permitida apenas uma recondução somente de “membros das entidades e dos movimentos sociais eleitos cujas entidades tiverem sido reeleitas”, conforme artigo 7º, caput e parágrafo único do Decreto nº 5.839/2006 (BRASIL, 2006). Já o Conselho Estadual de Saúde do Rio de Janeiro disciplina mandato de 3 (três) anos permitida uma recondução de qualquer membro, segundo o artigo 7º da Lei Complementar nº 152 de 2013 (RIO DE JANEIRO, 2013, p.n).

Em regra, os mandatos não devem coincidir com os do Poder Executivo, permitindo que cada Conselho de Saúde defina os deveres de seus conselhos, mas no geral eles tem a atribuição

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23 de representar os interesses e expor as ideias do seguimento que representa, ampliando o debate ao incluir pontos de vista de usuários, articulando-os com os demais interesses, bem como discutir as políticas de saúde, avaliando-as e propondo modificações ou substituições, e acompanhar as decisões políticas sobre saúde para viabilizar o controle e fiscalização social sobre as mesmas.

Além da função de desenvolvimento e controle da implementação da política de saúde, os Conselhos de Saúde ainda têm a importante função de analisar e aprovar, ou não, o plano de saúde, o relatório de gestão e dar ciência a população sobre as suas atividades. Plano de Saúde aqui tem um sentido diferente do usual, é um documento que contém as intenções e fins esperados que devem ser perseguidos no período dos próximos quatro anos, além de demonstrar objetivamente como irá ser feita tal empreitada por meio de objetivos, metas e diretrizes. O Relatório de Gestão é o documento que informa os resultados obtidos com a implementação do programa anual de saúde, ou seja, ele informa o que foi feito, os objetivos alcançados e aqueles que não foram devendo ser apresentado até o dia 30 de março do ano seguinte. Tanto o Plano de Saúde quanto o Relatório de Gestão devem ser entregues aos conselheiros dos Conselhos de Saúde pelo ministro da saúde ou secretário estadual/municipal de saúde, a depender do nível federativo (BRASIL, 2013, p.11-21).

1.5 Orçamento público e políticas públicas de saúde no Brasil

O orçamento público é um ponto crucial no processo de qualquer política pública, se não há recurso disponível, dificilmente poderá ser implementado qualquer curso de ação governamental. Logo, isto é uma das maiores dificuldades no desenrolar de políticas públicas de saúde.

Os processos de planejamento, monitoramento e avaliação das políticas públicas no Brasil têm como referências as ações e metas estabelecidas nos instrumentos legais do setor público brasileiro – Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA), que expressam o ciclo orçamentário brasileiro, conforme Vignoli & Funcia. A partir do PPA (quadrienal), são fixadas anualmente as diretrizes e prioridades por meio da LDO que, por sua vez, serve de referência para o detalhamento das ações orçamentárias na LOA de cada ente governamental (União, estados, Distrito Federal e municípios). Esses instrumentos, por sua vez, devem expressar as programações de saúde que foram detalhadas sob a forma de objetivos e respectivas metas nos Planos de Saúde (que guardam relação direta com os PPA’s) e nas Programações Anuais de Saúde (que guardam relação direta com as LDO’s e LOA’s). (FUNCIA, 2019, p.4406)

Funcia, citando Arretche, afirma que é plenamente possível a ocorrência de situações imprevistas de matéria política, econômica que gerem restrições orçamentárias e financeiras, consequentemente haverá revisão na programação planejada. Especificamente quanto ao SUS,

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24 salienta-se a dependência dos governos locais em relação a transferência de verbas da União para implementação de políticas de saúde (2019, p.4406).

Neste sentido, o desenvolvimento de políticas de saúde, a partir da Constituição Federal de 1988, foi significativamente condicionada ao subfinanciamento do SUS ”que pode ser caracterizado pela alocação insuficiente de recursos orçamentários e financeiros tanto para cumprir plenamente os princípios constitucionais de acesso universal, integralidade e equidade” (FUNCIA, 2019, p.4406).

Não se discute o fato de que construir um hospital, equipá-lo e mantê-lo demanda um investimento maciço. Outrossim, o tratamento dos enfermos requer uma relevante quantia financeira, como demonstrou o Doutor José Luiz Bonamigo em sua tese de doutorado. Este afirma que o custo médio dos pacientes internados no Hospital Municipal Vila Santa Catarina é de R$ 12.629 (doze mil e seiscentos e vinte e nove reais), sendo o desvio padrão de R$ 19.973 (dezenove mil e novecentos e setenta e três reais). Se não houver complicações, o custo cai para R$ 8.228 (oito mil duzentos e vinte e oito reais)16.

Outrossim, deve-se observar o que a Constituição de 1988 dispõe sobre o tema, no seu artigo 198:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

[..]

§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre:

I - no caso da União, a receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro, não podendo ser inferior a 15% (quinze por cento);

II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios;

III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.

§ 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá:

I - os percentuais de que tratam os incisos II e III do § 2º; (BRASIL, 1988)

16 Quanto custa tratar um paciente internado em um hospital público?. ALBERT EINSTEIN Instituto Israelita

de Ensino e Pesquisa. 2019. Disponível em: <https://ensinoepesquisa.einstein.br/fiquepordentro/noticia/quanto-

custa-tratar-um-paciente-internado-em-um-hospital-publico#:~:text=O%20custo%20m%C3%A9dio%20dos%20pacientes%20internados%20sem%20ocorr%C3%A Ancia%20de%20eventos,foi%20de%2013%2C2%20dias>. Acesso em: 12 de agosto de 2020.

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25 Nota-se que o §2º, inciso I constitucionalizou o percentual mínimo de 15% da receita corrente líquida17 da União para a saúde e o §3º, inciso I deixa a cargo do legislador ordinário definir o percentual mínimo, da receita corrente líquida dos Estados Município e DF, a ser investido na saúde, através de Lei Complementar. Isso foi regulamentado na Lei Complementar 141/2012, que estabeleceu o percentual de 12% para Estados e DF e 15% para Estados e DF. A leiainda preceitua que não sendo possível distinguir a arrecadação de impostos proveniente da base estadual ou municipal do DF será aplicado 12%, conforme artigos 6º, 7º e 8º da LC 141/2000 (BRASIL, 2000)

Entretanto, quanto a discricionariedade do gestor em desenvolver uma política de saúde e a influência dos demais atores nesse quesito, não é somente os custos financeiros e disponibilidade orçamentária que chamam a atenção. Mas a definição legislativa do que é considerado política pública de saúde para fins orçamentários.

A Lei Complementar 141/2000, em seus artigos 3º e 4º, define quais ações que serão consideradas para fins de apuração do percentual mínimo e aquelas que não serão, respectivamente. O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) (2015, p.10) afirma que só serão consideradas ações e serviços públicos de saúde que forem voltados para a proteção, promoção e recuperação da saúde, sendo financiados pelos respectivos fundos de saúde que estejam em conformidade com o artigo 7º da Lei 8080/90 e artigo 2º da LC 141, para fins de contagens do mínimo constitucional.

Portanto, de acordo com as normas abordadas, as políticas de saúde devem estar disponíveis a toda a população de forma gratuita, estar prevista no plano de saúde, ser de responsabilidade direta do setor da saúde, seus recursos devem ser provenientes dos fundos da saúde e devem passar pelo crivo do Conselho de Saúde, somente assim, serão contabilizadas como referentes ao mínimo constitucional.

É importante deixar claro que quando se trata de “acesso universal”, não é excluída a possibilidade da política de saúde ser destinada a algum grupo específico, por exemplo a comunidade LGBTQ+, indígenas, quilombolas, presos e etc. Isso permite a existência de políticas voltadas especificamente para grupos de pessoas com necessidades singulares, o

17 Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal o, receita corrente líquida é “somatório das receitas tributárias, de

contribuições, patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também correntes, deduzidos: na União, os valores transferidos aos Estados e Municípios por determinação constitucional ou legal, e as contribuições mencionadas na alínea a do inciso I e no inciso II do art. 195, e no art. 239 da Constituição”, conforme artigo 2º, inciso IV, alínea a da Lei Complementar 101/2000 BRASIL. Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. [S. l.], [2000]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm. Acesso em: 22 jun. 2020.

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26 importante é que ela seja disponibilizada de forma gratuita a todos que fazem parte do grupo destinado a ela (CONASEMS, 2015, p.11). Por exemplo a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra e a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (BRASIL, 2013, p.18).

Quanto às ações que não serão consideradas para fins de adimplemento do mínimo constitucional, nota-se uma evidente preocupação do legislador em afastar as despesas que, embora favoreçam a saúde da população, não se prestam especificamente a este fim.

Diante dessas informações, fica claro outro aspecto de influência na tomada de decisão do gestor. Quando este está na fase de planejamento de uma política de saúde, mais especificamente no seguimento de percepção e definição de problemas, o problema em questão deve obedecer o que o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), em sua Nota Técnica 06/2012, sintetiza como os requisitos que as ações devem ser observados para serem consideradas como provenientes do orçamento público da saúde, sendo estes cumulativos: (a) os princípios do SUS constante no artigo 7º da lei 8080/90 e o artigo 2º da Lei Complementar 141 devem ser respeitados; (b) os recursos que possibilitam o curso de ação serão provenientes dos fundos de saúde; (c) a área de aplicação deve corresponder com as atribuições do SUS dispostos no artigo 200 da Constituição de 1988 e com o seu campo de atuação contido no artigo 6º da Lei Complementar 141/2012. Portanto, para que uma política de saúde seja considerada para fins do mínimo constitucional e possa fazer uso dos fundos de saúde, deve obedecer cada um dos requisitos explanados.

Isso demonstra uma clara preocupação legislativa com o gasto na saúde, visto que se não implementados, o gestor corre risco de ser responsabilizado por crime de responsabilidade, conforme artigo 85, caput da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988, p.n). Todavia, tal disposição legal, pode ser um grande ponto de obstáculo quando a política pública que se mostre mais eficaz para sanar determinada situação, que afeta a saúde da população, não corresponda aos requisitos estabelecidos para fazer uso dos recursos do fundo de saúde. Se o ente político só tiver dinheiro disponível no fundo em questão, ela não poderá ser.

Por exemplo, a seguinte hipótese: é apresentado relatório ao prefeito informando-o que o maior gasto dos hospitais do município é com acidentes automobilísticos e somente a via expressa X concentra 30% dos acidentes devido ao intenso fluxo de carros e o crescimento desordenado da cidade gerou uma comunidade naquele local. O curso de ação com melhor custo benefício seria realizar uma obra de infraestrutura, construir passarelas para a população, e em razão da grave crise econômica que o Município atravessa somente o fundo para saúde tem recursos disponíveis. Mesmo reduzindo os gastos com saúde e beneficiando a saúde da

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27 população local, tal política pública que favoreceria a saúde em última instância não poderia ser implementada devido à falta de recursos, pois o artigo 4º, inciso IX da Lei Complementar 141/2012 não considera obras de infraestrutura como despesas com ações e serviços públicos de saúde, logo o fundo não poderia ser usado.

Portanto, percebe-se um caráter dúplice do orçamento público quanto a formação da agenda de políticas de saúde. Se a política planejada obedecer aos requisitos para fins de contagem do mínimo constitucional, o orçamento público terá um condão de fomento a ela, visto que além de potencialmente resolver o problema, ainda poderá evitar um futuro processo de crime de responsabilidade contra o gestor.

Situação contrária ocorre quando a política de saúde não cumprir os requisitos da Nota Técnica 06/2012 do CONASS. Mesmo que aquela vise garantir a saúde da população por meio de uma ação intersetorial e interdisciplinar objetivando desenvolver condições de vida mais saudáveis, não poderá usar os recursos disponíveis nos fundos de saúde e nem servirá para fins de contagem de mínimo constitucional investido na saúde. Logo, o orçamento público se coloca como um ponto de veto.

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2 ATORES ESTATAIS E PRIVADOS QUE INFLUENCIAM NA

IMPLEMENTAÇÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE SAÚDE

A partir deste ponto, é possível iniciar o aprofundamento no ponto central do trabalho que são os atores que atuam no processo das políticas públicas. O gestor público não tem um papel de livre escolha na definição do curso de ação do Estado, mas agora cabe apresentar alguns dos atores que atuam nesta complexa “peça”.

A título de ilustração, popularmente quando é dito, por exemplo nos jornais ou outros veículos de informações, que o Estado x, Município y ou a União adotou certo curso de ação para resolver o problema z, é comum que o ônus político da decisão tomada recaia totalmente sobre o gestor público, sendo este responsabilizado integralmente pelas consequências positivas ou negativas resultantes da política implementada. Todavia, como fora exposto, isso possui outras perspectivas.

Primeiramente, podem ser divididos em dois grandes grupos distintos, os Atores Estatais e Atores Privados. Aquele grupo é formado por quem tem alguma ligação com a Administração Pública, que está imerso na burocracia da máquina estatal e exemplo clássico são os detentores de cargos no Poder Executivo e Poder Legislativo – aqueles que são naturalmente associados às políticas públicas pelo homem médio18. Os Atores Privados, a contrário sensu, são aqueles que não estão ligados ao Estado, mas conseguem influenciar nos seguimentos do Ciclo da Política Pública, seja por lobby político ou mesmo por instrumentos legais. Integram este grupo, por exemplo, os seguintes atores: (a) ONGs; (b) mídia; (c) grupos políticos; (d) grupos empresariais; (e) movimentos sociais; (f) sindicatos e outros.

Dentre os Atores Privados, destaca-se os Grupos Empresarias devido ao seu poderio econômico, a capacidade de ofertar empregos, gerar riquezas, influenciar o mercado e detenção dos meios de produção.

Diante da impossibilidade de estudar todos os atores neste trabalho, adotou-se a delimitação de dois atores estatais e dois privados, sendo aqueles compreendidos pelo Poder Judiciário e o Poder Legislativo; já este por grupos empresariais e movimentos sociais.

18 “O direito se vale da "Teoria do Homem Médio" na qual este homem médio é um homem razoável, que pondera

a situação, cede e tenta encontrar a decisão mais justa possível” (TJ-AM 02504871920118040001 AM 0250487-19.2011.8.04.0001, Relator: Airton Luís Corrêa Gentil, Data de Julgamento: 01/10/2017, Terceira Câmara Cível).

Referências

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