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Manual de DIREITO CIVIL. Volume único. 2ª edição Revista, atualizada e ampliada

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2021

Manual de

DIREITO

CIVIL

Volume único

2ª edição

Revista, atualizada

e ampliada

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LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS

DO DIREITO BRASILEIRO – LINDB

Sumário • 1. Noções introdutórias e funções da LINDB – 2. Vigência normativa: 2.1. Princípio da Continuidade ou Permanência; 2.2. Repristinação – 3. Obrigatoriedade das normas – 4. Integração normativa: 4.1. Analogia; 4.2. Costumes – 4.3. Princípios Gerais do Direito – 5. Interpretação normativa – 6. Aplicação da lei no tempo ou direito intertemporal: 6.1. Direito adquirido; 6.2. Coisa julgada – 6.3. Ato Jurídico Perfeito – 7. Eficácia da lei no espaço ou direito espacial: 7.1. Estatuto Pessoal; 7.2. Sucessão do Estrangeiro; 7.3. Bens; 7.4. Obrigações Internacionais; 7.5. Pessoas Jurídicas Internacionais; 7.6. Competência e Meios Probatórios; 7.7. Sentenças estrangeiras, cartas rogatórias, divórcios e laudos periciais estrangeiros podem ser cumpridos no Brasil? – 8. interpretação pelos agentes públicos.

1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS E FUNÇÕES DA LINDB

A antiga Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) mudou de batismo, em 2010, por meio da Lei nº 12.376/10, passando a se chamar Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

A mudança, diga-se, veio em boa hora. Isso, porque, consiste a Lei de Introdução em uma norma jurídica autônoma, independente, não sendo um mero apêndice do Código Civil. Sua aplicabilidade, portanto, estende-se a todo o direito, sendo universal, ressalvadas as normas específicas de cada ramo autônomo.

Por sua natureza de norma autônoma a LINDB, datada de 1942, continua vigendo, mesmo diante da publicação do novel diploma civilista em 2002. Esse, obviamente, não teria o condão de revogar uma norma autônoma.

A concepção ampla da LINDB torna-se progressivamente mais clara, ao passo que o seu objeto legislativo apenas se amplia. Veja-se, por exemplo, a Lei 13.655/18, a qual incluiu novos 10 (dez) artigos na norma base, todos dedicados à interpretação pelos agentes públicos. Trata-se da clara constatação de que a LINDB, de uma vez por todas, transborda o seu trata-mento privatístico, emoldurando-se em um diploma interdisciplinar e para além da summa

divisio, rompendo com as absolutas demarcações entre o público e o privado.

Curiosamente, porém, malgrado a LINDB não integrar, de forma dogmática, a Parte Geral do Código Civil, o tema costuma ser abordado no volume da Parte Geral das mais diversas obras dedicadas ao Direito Civil.

Diferentemente das outras normas, cujo objeto é o comportamento humano, a LINDB cinge a sua análise na própria norma, dedicando-se ao tratamento da aplicação das leis no tempo e no espaço, sua compreensão e vigência.

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Nessa linha de pensamento, muitos denominam a LINDB como um código de normas, código sobre as normas, norma de sobredireito ou lex legum. Traduz um verdadeiro

postu-lado normativo, pois é uma norma que se direciona à aplicação de outras normas, sendo

uma verdadeira norma de aplicação, ao regular o modo de aplicação das demais normas. Visitando o aludido diploma normativo, o qual contém 30 (trinta) artigos, verifica-se a sua estrutura e suas funções, as quais ficam representadas da seguinte forma:

Vigência (Arts. 1º e 2º)

Obrigatoriedade Geral e Abstrata das Normas ou do Ordenamento

Jurídico (Art. 3º)

Integração Normativa ou Colmatação de Lacunas (Art. 4º)

Interpretação das Normas ou Função Social das Normas (Art. 5º)

Aplicação das Normas no Tempo ou Direito Intertemporal (Art. 6º)

Aplicação da Lei no Espaço, Direito Espacial ou Direito Internacional

Privado (Arts. 7º a 19)

Interpretação pelos Agentes Públicos. (Arts. 20 a 30)

Verificadas as funções da LINDB, passamos as nos debruçar sobre o seu aprofundamento, tratando-as de forma apartada.

2. VIGÊNCIA NORMATIVA

O devido processo legislativo é tema inerente ao Direito Constitucional, sendo disci-plinado nos arts. 59 e seguintes da Constituição Federal (CF). Em uma visão ampla, após a

elaboração das normas – com casa iniciadora, revisora, quorum de aprovação, parecer das

respectivas comissões, sanção ou até mesmo recusa – a norma será promulgada.

A promulgação é o ato capaz de conferir existência e validade às normas, consistindo em uma verdadeira autenticação normativa. Afirmar que uma norma é válida significa identificá--la como compatível com o ordenamento jurídico nacional. Por outro viés, declaráidentificá--la como inválida é o mesmo que considerá-la incompatível – leia-se, inconstitucional e/ou ilegal.

A invalidade normativa pode decorrer de uma questão:

a) formal, quando referente a vício no seu devido processo legislativo de criação.

Exemplifica-se com a inobservância do quorum de três quintos, em cada casa do Congresso Nacional, para aprovação de Emenda Constitucional. Aqui a norma será inválida por vício de forma, pois há afronta ao seu devido processo legislativo (art. 60, § 2º, da CF/88);

ou

b) material, quando o problema reside na matéria tratada pela norma, a qual não era

de sua alçada ou competência, ou desrespeita conteúdo jurídico material importante. Exemplifica-se com uma norma que desrespeite direitos e garantias fundamentais,

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Pa rt e I – P re ss up os tos

como uma norma que autorize castigos físicos em empregados. Aqui estar-se-á diante de uma invalidade material.

Dando seguimento ao devido processo legislativo, após promulgada, a norma será publi-cada. Mas será que a publicação já será capaz de ocasionar o vigor normativo?

Pela regra geral, não. Com efeito, após a publicação da norma – ato que se segue à promulgação no devido processo legislativo – haverá um lapso temporal no qual a norma já será existente e válida; porém ainda não produzirá os seus efeitos – leia-se: não terá vigor. Trata-se da chamada vacatio legis, estando a norma em um estado de hibernação. Tal vacatio será, em regra, de 45 (quarenta e cinco) dias para o território nacional e de 3 (três) meses para o estrangeiro.

ATENÇÃO!

O prazo geral para a vigência no exterior é de 3 (três) meses e não 90 (noventa) dias, pois a forma de contagem do prazo em meses e dias é diferenciada.

Fala-se que tais prazos são gerais porque o próprio art. 1º da LINDB aduz a possibilidade da norma autodeclarar prazo diverso de vacância. Sendo assim, o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para o território nacional e de 3 (três) meses para o estrangeiro apenas terá aplicabilidade caso a norma, no seu corpo, não remeta a outro lapso temporal.

Plenamente possível, portanto, que uma norma veicule prazo diverso. Apenas para exem-plificar, remete-se à Lei 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência ou Lei Brasileira de Inclusão), a qual, na dicção do seu art. 127, autodeclarou vacatio de 180 (cento e oitenta dias).

E uma mesma norma poderá autodeclarar prazos diversos de vacatio para situações diversas?

A resposta é positiva. Afinal, diante de uma autodeclaração do poder normativo, essa que valerá. Exemplifica-se com a Lei 13.019/14, a qual informa, em seu art. 88, que

Art. 88. Esta Lei entra em vigor após decorridos quinhentos e quarenta dias de sua publi-cação oficial, observado o disposto nos §§ 1º e 2º deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)

§ 1º Para os Municípios, esta Lei entra em vigor a partir de 1º de janeiro de 2017. (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)

§ 2º Por ato administrativo local, o disposto nesta Lei poderá ser implantado nos Municípios a partir da data decorrente do disposto no caput. (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015). E como se dará a contagem deste prazo de vacatio?

A LC 95/98, em seu art. 8º, modificado pela LC 107/2001, estabelece uma forma

dife-renciada de contagem do prazo de vacatio. Trata-se de regra especial em relação à geral do

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Assim, para contagem do prazo da vacatio legis dever-se-á incluir o dia da publicação e o dia da consumação do prazo, entrando a lei em vigor na data subsequente a da consumação prazal. Registra-se que a norma ganhará vigor nesta data ainda que este dia seja um feriado ou um dia sem expediente forense.

E o prazo de vacatio deve ser sempre declarado em dias ou poderá sê-lo em anos ou meses? O debate funda-se na redação do art. 8º da citada LC 95/98, segundo o qual quando a norma autodeclarar o seu prazo de vacatio legis, deverá fazê-lo em dias; não em meses ou anos. Trata-se, entretanto, de premissa legislativa nem sempre seguida no Brasil. Exemplifica--se o desrespeito à fixação do prazo de vacatio em dias pelo próprio Código Civil e, mais recentemente, pelo Código de Processo Civil. Ambos os diplomas fixaram o prazo de vacância de 1 (hum) ano – CC/02, art. 2.044 e CPC/15, art. 1.045.

Tais circunstâncias, registra-se, geraram profícuos debates sobre a exata data de vigor das supracitadas normas – Código Civil de 2002 e Código de Processo Civil de 2015.

Em relação ao Código Civil:

i. O entendimento majoritário – capitaneado por Mário Luiz Delgado1 e Maria Helena

Diniz2, abraçado pela jurisprudência do STJ (REsp 698.195/DF, Rel. Min. Jorge

Scar-tezzini, 4ª Turma, julgado em 04.05.2006, DJ 29.05.2006, p. 254) e pelo Conselho da Justiça Federal (Enunciado 164) – caminha no sentido de ter o vigor se iniciado no dia 11.01.2003. Funda-se a tese na contagem em dias, na forma do art. 8º da LC 95/98, com a inclusão do dia da publicação (11.01.2002) e do último dia do prazo (10.01.2003), ganhando a norma o seu vigor na data subsequente à da consumação prazal (11.01.2003).

ii. Ainda sobre o início do vigor do Código Civil, não se olvida derredor da existência

de entendimentos divergentes. Zeno Veloso3, por exemplo, defende uma simples

contagem do prazo em ano, como determinado pelo art. 2.044 do CC, afirmando a vigência do multicitado diploma legislativo em 12.01.2003: dia posterior ao fecha-mento de um ano de sua publicação (11.01.2002).

iii. Há ainda, como noticia Mário Luiz Delgado4, quem adote a tese da ilegalidade do art.

2.044 do CC, em face do art. 8º da LC 95/98, aplicando a regra geral de 45 (quarenta e cinco) dias, consignada no art. 1º da LINDB, e defendendo uma vigência inicial do Código Civil datada de 25.02.2002.

Com o Código de Processo Civil de 2015 os debates renasceram, na mesma linha dos de outrora referentes ao Código Civil de 2002. Colocando uma pá de cal sobre o assunto, o

Conselho Nacional de Justiça respondeu consulta formulada pela Ordem dos Advogados do

Brasil, firmando como data de início de vigor do CPC o dia 18.03.2016. Tendo sido o Código

1. DELGADO, Mário Luiz. Problemas de Direito Intertemporal no Código Civil: Doutrina & Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2004.

2. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. V. 1, 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

3. VELOSO, Zeno. Quando entrou em vigor o Novo Código? Artigos de Convidados. Disponível em <http://www.

flaviotartuce.adv.br/index2.php?sec=artigosc&id=168> Acesso em 10 out. 2014.

4. DELGADO, Mário Luiz. Problemas de Direito Intertemporal no Código Civil: Doutrina & Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2004.

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de Processo Civil publicado no dia 17.03.2015, tem-se na contagem a inclusão da sua data de publicação e do último dia do prazo, ganhando vigência no dia 18.03.2016.

Seguindo nas dúvidas, pergunta-se: seria possível a norma autodeclarar que ganhará

vigor na data da sua publicação?

Excepcionalmente, sim. Nas pegadas do art. 8º da Lei Complementar 95/98, modificada pela Lei Complementar 107/2001, é viável que a norma já produza seus efeitos desde a sua publicação. Para tanto, mister que seja uma norma de pequena repercussão social. Nesse cenário, a norma não precisará de um prazo de maturação, sendo que na própria norma restará autodeclarado o vigor desde a publicação.

Do aludido, infere-se, de forma cristalina, que a necessidade da vacatio legis não se impõe às normas de pequena repercussão, porquanto desprovidas de maiores consequências sociais. Certo, porém, que apesar do comando legislativo geral impondo a vacatio legis às normas, excepcionadas as de pequena repercussão com autodeclaração, na prática legislativa verifica--se uma série de comandos legislativos, de repercussão social ímpar, com ordem de vigor na data da sua publicação. Isso, porque, o conceito de grande ou pequena repercussão é vago.

Apenas a título ilustrativo, cita-se a Lei 13.769/2018, a qual versa sobre o distrato imobi-liário. Trata-se de tema de repercussão ímpar, já tendo o Superior Tribunal de Justiça o elevado à Repercussão Geral. Entretanto, tal norma, por conta do seu art. 5º, ganhou vigência na data de sua publicação.

Vistas, então, as anotações da LINDB sobre o desenrolar das normas no tempo, com o escopo de organizar as ideias, tem-se:

45 dias (Brasil) VACATIO

LEGIS (Estrangeiro)3 Meses

Autodeclarar PROMULGAÇÃO Existência + Validade PUBLICAÇÃO (Vigor?) Apenas para Normas de Pequena Repercussão Social VIGOR

(

(

E como proceder se a norma for corrigida no curso da vacatio legis?

Havendo norma corretiva, ordena o art. 1º da LINDB que a norma corrigida deverá ser novamente publicada (republicada), tendo novo prazo de vacatio legis reiniciado do zero. Infere-se, portanto, hipótese de interrupção do prazo; ao revés de suspensão.

E se a mudança for parcial?

A LINDB não regula, especificamente, derredor da correção parcial. Entretanto, a

doutrina firma que sendo republicado apenas um trecho da norma, somente este trecho terá

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fora republicado e alterado. Seria uma hipótese ímpar de uma norma fracionada em diversas

vacatios, como advoga Maria Helena Diniz5.

Ainda doutrinariamente, afirma-se que a norma corretiva apenas far-se-á necessária se o erro for relevante, entendendo-se como tal o equívoco substancial capaz de ocasionar divergência de interpretação. Em sendo o erro irrelevante – a exemplo de um erro material – é possível o próprio ajuste por mecanismos de interpretação.

ATENÇÃO!

Ilustrando situação curiosa e interessante de norma na qual há fracionamento de prazos de vigor, com diversas

vacatio, merece atenção a Lei Geral de Proteção de Dados, conhecida como LGPD (Lei nº 13.709/2018). Veja-se as

sucessivas mudanças no art. 65 da Lei:

i. No texto originário da norma, havia notícia de que seu vigor iniciaria no prazo de 18 (dezoito meses) após a sua publicação.

ii. Com o advento da Medida Provisória nº 869/2018, o prazo foi modificado para: a. 28 de dezembro de 2018, no que tange aos art. 55-A até 55-k, e art. 58-A e 58-B;

b. 24 (vinte e quatro meses) após a sua publicação no que diz respeito aos demais artigos da norma. iii. Através da Lei nº 14.010/2020, Medida Provisória nº 959/2020 e Lei nº 14.058/2020, restou unificado o seguinte como

prazos de vacatio e vigor normativo:

a. 28 de dezembro de 2018, no que tange aos art. 55-A até 55-L, art. 58-A e 58-B; b. 1º de agosto de 2021 para os arts. 52, 53 e 54;

c. 24 (vinte e quatro) meses após a sua publicação, quanto aos demais artigos.

Foram tantas as mudanças que, nesta norma, é sempre bom aguardarmos “cenas dos

próximos capítulos”... O consenso, porém, é que com a Lei no 14.058/2020 a LGPD, enfim,

ganhou vigor normativo em 18 de setembro de 2020, com a ressalva supra do art. 65. E se a modificação a norma for após o início do vigor normativo?

Caso, porém, a aludida modificação ocorra após a finalização da vacatio legis e início do vigor, apenas poderá se dar mediante lei nova (art. 1º da LINDB), com novo processo legislativo (elaboração, publicação e vigor), novo número e nova vacatio.

E como proceder em relação às normas parcialmente vetadas pelo Poder Executivo e posteriormente publicadas pelo Poder Legislativo, por recusa do veto?

A questão é interessante.

Considerando o caráter suspensivo do veto, aliado à segurança jurídica, coaduna-se aqui com o posicionamento de Arnoldo Wald6, defendendo-se a ideia de diferenciados prazos de vacatio:

i. um iniciado da sanção presidencial, para aquilo que fora aprovado; e

ii. outro da promulgação do legislativo, quando da recusa do veto, para a parte aprovada

pelo Legislativo.

5. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. V. 1, 31. ed. São Paulo:

Saraiva, 2014.

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Seria mais uma hipótese diferenciada de uma norma fracionada em diversas vacatios. Sobre o tema, afirma Carlos Roberto Gonçalves7, não se olvida da existência de opiniões em contrário.

Aplicar-se-á vacatio para regulamentos e decretos administrativos?

Não. Nestes casos a obrigatoriedade dar-se-á desde a publicação, salvo disposição em sentido contrário e não alterando a data da lei a que se referem.

Ainda nas questões importantes, uma de fundo etimológico ganha bastante relevância. Vigência e vigor seriam expressões sinônimas?

Malgrado o uso corrente como sinônimos – por vezes, até mesmo em provas, livros e julgados –, em rigor técnico, as expressões são diversas.

Tércio Sampaio Ferraz Jr.8 faz tênue distinção entre vigência e vigor. Aquela (vigência)

traduz o período de validade da norma (questão meramente temporal). Já o vigor é a sua real

produção de efeitos (questão de efetiva eficácia), retratando o período em que é impossível

as pessoas se esquivarem do império da norma. Logo, afirma Carlos Roberto Gonçalves9, a

vigência se relaciona ao tempo de duração normativa, enquanto o vigor diz respeito à força vinculante da norma.

Nessa senda, afirma-se que o CC/16 não mais possui vigência, pois ab-rogado pelo Código Civil de 2002. Entretanto, nas excepcionais hipóteses de ultratividade normativa, terá o Código Civil de 1916 vigor. É o que se dá, por exemplo, em relação à partilha de bens de alguém, realizada nos dias de hoje, mas cujo óbito fora à época do Código Civil de 1916 (CC, art. 1.787). Tal partilha seguirá a normatização do Código Civil de 1916. Afinal, a decisão da partilha terá efeito retroativo, em razão do Droit de Saisine. Tanto é assim que a alíquota do Tributo de transmissão será a da época do óbito (Súmula 112 do STF).

E o que seria a eficácia normativa?

Por eficácia, lembram Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona10, entende-se a aptidão genérica

de uma norma produzir os seus efeitos. Essa eficácia pode ser:

a) social: produção concreta de efeitos;

b) técnica: já tem a possibilidade de produzir efeitos, mas não necessariamente os

produz, por haver ausência de aceitação social (ineficácia social). Exemplifica-se com a norma soteropolitana que exige atendimento bancário em no máximo 15 (quinze) minutos: norma vigendo, porém desprovida de eficácia social;

c) de bloqueio: o objeto da norma é bloquear a ocorrência de certas condutas, como

as que vedam certos comportamentos, sob pena de punição;

d) de programa: são as normas programáticas, as quais objetivam atingir um

deter-minado programa do legislador;

7. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. V. 1, 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. 8. FERRAZ JR., Tércio Sampaio. ICM sobre bens importados. Revista Indústria e Desenvolvimento. São Paulo, p.

22-36, ago. 1984. Disponível em <http://www.terciosampaioferrazjr.com.br/?q=/publicacoes-cientificas/30>. Acesso em 20 out. 2013.

9. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. V. 1, 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. 10. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. V. 1, 16. ed. São

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e) de resguardo: normas que visam assegurar uma conduta desejada.

Nesse cenário, para concretização da eficácia a norma pode se configurar como uma norma de:

a) eficácia plena: função eficacial é imediatamente concretizada;

b) eficácia limitada: há necessidade de outra norma para realização da eficácia completa; c) eficácia contida: inicialmente com eficácia plena, mas sendo possível a posterior

restrição de tal fator de eficácia.

Pois bem. Verificada a vacatio e seus desdobramentos, pergunta-se: uma vez em vigor, até quando a norma produzirá os seus efeitos?

2.1. Princípio da Continuidade ou Permanência

Uma vez em vigor, submete-se a lei, em regra, ao princípio da continuidade ou perma-nência. Explica-se: a norma produzirá os seus efeitos até que outra a torne, total ou parcial-mente, ineficaz, pelo mecanismo da revogação (art. 2º da LINDB).

A noção de continuidade é uma regra e, como tal, tem suas exceções. Nessa toada é possível elencar, ao menos, duas espécies legislativas que não se submetem ao preceito da

continuidade. São elas as leis temporárias e as leis circunstanciais. Tais exceções, portanto,

caducam, sendo desprovidas de continuidade.

Leis temporárias são aquelas que possuem prazo de eficácia, com um termo ad quem

previamente ajustado. É o exemplo das normas relativas aos planos plurianuais, cuja duração é de 4 (quatro) anos. Outro exemplo é a Lei 14.010/2020, a qual trata do Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado (RJET), por conta da Pandemia da Covid-19, que produzirá os seus efeitos até o dia 30 de outubro de 2020. Já as leis circunstanciais vigem enquanto durar uma determinada situação, como o congelamento de preços em períodos bélicos ou redução de IPI em tempos de crise.

Outrossim, importante salientar que a retirada da eficácia normativa não quer

signi-ficar completa impossibilidade de aplicação da norma revogada. Isso, porque, há normas

que possuem ultratividade, pós-eficácia ou pós-atividade normativa. São normas cujos efeitos são produzidos mesmo depois de revogadas, pois já incidiram à época da ocorrência do fato – subsunção anterior, nos dizeres de Pontes de Miranda11. Dois são os corriqueiros

exemplos sobre o tema:

a) lei que incide na sucessão – O Código Civil, em seu art. 1.787, afirma que regula a

sucessão a lei da época de sua abertura, a qual acontece com a morte: droit de saisine (art. 1.784 do CC). Logo, a sucessão do falecido à época da vigência do Código Civil de 1916 será regulada por este Código (de 1916), ainda que o inventário seja aberto apenas após a vigência do Código Civil de 2002. Justo por isso que sumulou o Supremo Tribunal Federal (STF) – verbete 112 do STF – que a alíquota incidente do imposto de transmissão é a da época da morte, e não do momento da decisão da partilha, ao passo que essa sentença possui eficácia retroativa (ex tunc);

11. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado. Tomo 1. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Campinas: Bookseller, 1999.

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Pa rt e I – P re ss up os tos

b) leis temporárias e circunstanciais incidindo em eventos daquele período, com

apli-cação posterior. Por exemplo: a avaliação da legalidade da destinação de recursos dar-se-á segundo o plano plurianual do respectivo período; e não o atual.

Ainda nos exemplos de pós-atividade normativa, infere-se que o vigente Código de Processo Civil extinguiu o procedimento sumário, bem como realizou a revogação de alguns procedimentos especiais. Nessa linha, para as ações propostas e não sentenciadas no procedimento sumário e especiais revogados, aplicar-se-á o revogado CPC/73, o qual terá ultra-atividade para tais situações.

Analisando estas interessantes questões temporais, lembra Tércio Sampaio Ferraz Jr.12

que uma norma:

a) pode ser válida, mas ainda não ter vigor: estará em vacatio legis;

b) pode ser válida e vigente, mas não ter eficácia, em vista de uma ineficácia social; c) pode não ser válida, não ter vigência, mas ainda ter vigor em virtude de uma

pós--eficácia normativa.

Entrementes, como visto, a regra geral do vigor normativo caminha no sentido da continuidade até a retirada de eficácia (obrigatoriedade) da norma por outra, a qual ocorre mediante o fenômeno da revogação. Tal retirada de eficácia (revogação) acontece quando uma lei posterior expressamente declara retirar a eficácia da lei anterior, é com essa incom-patível, ou regula inteiramente e de forma diversa o tema tratado pela norma anterior (art. 2º da LINDB). Assim, passa-se a aprofundar tais modalidades de revogação:

a) Quanto à abrangência ou extensão:

i) ab-rogação – revogação total – Ex.: CC/02 ab-rogou o CC/16, mediante a redação

do art. 2.045 do CC, tendo retirado por completo a eficácia da norma anterior. Já o CPC/15 ab-rogou o CPC/73, na forma do art. 1.046 do CPC/15;

ii) derrogação – revogação parcial – Ex.: CC/02 derrogou a primeira parte do

Código Comercial de 1850, conforme se infere do art. 2.045 do CC. Logo, foi reti-rada apenas parcialmente a eficácia do Código Comercial. Já o CPC/15 derrogou o CC/02, a exemplo do art. 456 do CC/02, na forma do art. 1.072 do CPC/15. Tanto a revogação total (ab-rogação) como a parcial (derrogação) podem ser classificadas, ainda:

b) Quanto à forma ou modo:

i) expressa ou direta – quando há comando legislativo expresso na nova norma,

retirando a eficácia de uma norma anterior;

ii) tácita, indireta ou oblíqua – quando há incompatibilidade ou uma nova norma

regula inteiramente a matéria tratada na anterior, de forma colidente. Exempli-fica-se com o art. 2.043 do CC, o qual afirma que até que por outra forma se disciplinem, continuam em vigor as disposições de natureza processual, admi-nistrativa ou penal, constantes de leis cujos preceitos de natureza civil hajam sido incorporados a este Código.

12. FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: Técnica, Decisão, Dominação. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

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ATENÇÃO!

Hodiernamente questiona-se derredor da manutenção, ou não, da revogação tácita. Isto, porque, o art. 9º da LC 95/98, modificado pela LC 107/2001, afirma que a cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis

ou disposições legais revogadas.

Tal premissa levaria a assertiva da negativa de possibilidade da revogação tácita, pois o artigo supracitado fala em deverá, ao revés de poderá. Entrementes, a maioria dos manuais, buscando uma interpretação conforme à realidade prática, afirma a permanência da modalidade tácita de revogação, entendendo, porém, que há uma preferência por sua faceta expressa, ao passo que se coaduna com o fenômeno da segurança jurídica. Justo por isso deve-se evitar em textos normativos a cláusula geral de há muito utilizada, no sentido de que se revogam todas as disposições em contrário com a norma atual. O ideal, em verdade, é que a nova norma indique as leis e dispositivos que eventualmente serão revogados. Ademais, é importante a permanência da modalidade tácita de revogação, a qual visa evitar a manutenção de incoerências e inconsistências no ordenamento jurídico, revogando por incompatibilidade, ou por regular inteiramente a matéria tratada na lei anterior, de forma diversa. Um exemplo elucidativo de revogação tácita fora a revogação do art. 1º da Lei 8.971/94 – o qual exigia o prazo mínimo de 5 (cinco) anos para configuração da união estável – pelo art. 1º da Lei 9.278/96 – o qual não mais exigia tal prazo mínimo. Nesse cenário infere-se que o estudo da modalidade tácita de revogação cresce em importância, ao passo que acaba sendo um mecanismo de acomodação normativa no tempo, solucionando eventuais antinomias ou lacunas de conflito, em função da sucessão de normas.

Verticalizando o estudo da revogação tácita, a doutrina de Norberto Bobbio13 busca

critérios metajurídicos, objetivando solucionar as antinomias e deduzir qual a norma há

de ser aplicada para solução do caso concreto. Dessa forma, enunciam-se como critérios metajurídicos solucionadores de antinomias de primeiro grau – entenda-se: quando o conflito envolve apenas um dos critérios enunciados:

a) lei superior (critério hierárquico: Lex superior derrogat legi inferior) – Uma norma

superior prevalece sobre uma norma inferior;

b) lei especial (critério da especialidade: Lex specialis derrogat legi generali) – Uma

norma especial prevalece sobre uma norma geral;

c) lei nova (critério cronológico: Lex posterior derrogat legi priori) – Uma norma

poste-rior prevalece sobre uma norma anteposte-rior.

Hierárquico Especial Cronológico

Todavia, por vezes há antinomias de segundo grau, as quais consistem em choques entre os próprios critérios metajurídicos enunciados. Afirma Norberto Bobbio14 que na análise dos

critérios anteriores, o cronológico é o mais fraco, o da especialidade é o intermediário e o hierárquico é o mais forte. Tal raciocínio condiz com a pirâmide normativa de validação e

derivação, a qual confere ao Texto Constitucional o paradigma de fundamento de validação

das normas nacionais.

13. BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. Prefácio de Celso Lafer. Apresentação de Tércio Sampaio Ferraz Júnior. São Paulo: Edipro, 2011.

14. BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. Prefácio de Celso Lafer. Apresentação de Tércio Sampaio Ferraz Júnior. São Paulo: Edipro, 2011.

(12)

Pa rt e I – P re ss up os tos Hierárquico Especial Cronológico

Em síntese, na tentativa de resolução dos conflitos de segundo grau, os quais envolvem os critérios metajurídicos, veicula a doutrina meta-regras, afirmando que:

a) no conflito de uma norma especial anterior e uma geral posterior, prevalecerá o

critério da especialidade, sendo aplicável a norma especial anterior, pois o critério metajurídico da especialidade é mais forte do que o cronológico;

b) caso haja conflito de norma superior anterior e outra inferior posterior, prevalece

à primeira, pois o critério hierárquico se sobrepõe ao cronológico;

c) havendo conflito de uma norma geral superior e uma especial inferior, segundo

Bobbio15, vence o critério hierárquico ao da especialidade, aplicando-se a norma

superior.

ATENÇÃO!

Na dicção do art. 2º, § 2º da LINDB, lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par (ao lado) daquelas já existentes, não as revoga nem as modifica. Assim, na revogação pelo critério da especialidade não basta que a lei nova trate da mesma matéria. Também faz-se necessário que traga disposições colidentes com o sentido daquela norma anterior, como afirmado desde o início do tratamento do tema e referendado pela doutrina de Caio Mário da Silva Pereira.16

Destarte, as antinomias até então enunciadas são aparentes, pois passíveis de resolução mediante os critérios referenciados. Consideram-se, porém, reais, aquelas antinomias cujos

critérios postos não são aptos à solução, momento em que deve o operador do direito

utilizar-se dos métodos de integração, tema que será visto em item específico a seguir.16

2.2. Repristinação

A expressão repristinar significa restaurar, renascer. A regra geral no sistema brasi-leiro não admite a repristinação. Explica-se: no Brasil, a revogação da lei revogadora não faz restabelecer os efeitos da lei revogada. Exemplifica-se:

15. BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. Prefácio de Celso Lafer. Apresentação de Tércio Sampaio Ferraz Júnior. São Paulo: Edipro, 2011.

16. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Introdução ao Direito Civil. Teoria Geral de Direito Civil. V. 1, 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

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Lei B (2014) Revogadora Lei C (2017) Lei A (2010) Revogada Revogação Revogação

Pergunta-se: quando a lei “c” revoga a lei “b”, automaticamente restauram-se (repris-tinam-se) os efeitos da lei “a”?

A resposta, em regra, é negativa. Fala-se em uma resposta em regra negativa, pois a LINDB, no § 3º do art. 2º, apenas possibilita tal repristinação se houver previsão normativa

em contrário da lei “c”.

Repristinação e efeito repristinatório seriam expressões sinônimas?

A doutrina diferencia repristinação e efeito repristinatório. Explica-se: ter-se-á repris-tinação quando renascer uma norma, já revogada, por notícia em contrário de um novo ato normativo. O efeito repristinatório, porém, é coisa diversa, pois se configura quando há o renascimento de uma lei já revogada, mas sem a aludida menção em uma nova norma. São dois os exemplos narrados nos livros sobre efeito repristinatório:

a) Repristinação oblíqua ou indireta em controle concentrado de constitucionalidade,

realizado pelo STF – seja em sede de decisão final, ou concessão de medida liminar para suspensão cautelar da norma impugnada (art. 11 da Lei 9.868/1999). Explica-se: a lei “b” (revogadora) revogou a lei “a” (revogada). Caso o STF entenda que a lei “b” (revogadora) é inconstitucional, ou ainda em sede liminar suspenda os seus efeitos, entende-se pela repristinação da lei “a” (revogada), ao passo que se a lei “b” (revogadora) jamais adentrou no ordenamento jurídico, a lei “a” nunca fora revogada.

No particular, infere-se, como efeito oblíquo ou indireto da decisão a ocorrência de repristinação, como asseverou o próprio STF no RE 517.789-AL e o STJ no EDcl no AgRg no REsp: 1344881 RS 2012/0197322-6, Relator: Ministro Humberto Martins, Data de Julga-mento: 23/04/2013, T2 – Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 02/05/2013.

Ressalta-se que a aplicação do dito apenas dar-se-á em controle concentrado de constitu-cionalidade (sistema germânico), seja na sua decisão de mérito, ou em sede liminar, quando da suspensão dos efeitos do ato impugnado. Não há de se falar da aplicação deste pensamento no controle difuso ou abstrato (sistema norte-americano), nem em controle concentrado quando o STF modular os efeitos da decisão.

De mais a mais, relembra-se que há no ordenamento jurídico nacional a prerrogativa do STF modular os efeitos da decisão em controle concentrado de constitucionalidade. Nesse sentido, informa o art. 27 da Lei 9.868/97 que poderá o STF, ao declarar a incons-titucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Aqui não há de se falar em

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repris-Pa rt e I – P re ss up os tos

tinação, pois se a decisão não tem eficácia retroativa, não houve o renascimento, desde a origem, da lei “a”.

b) A reprodução do texto normativo por uma nova lei. Exemplifica-se na seguinte

situação: a lei “a” é revogada pela lei “b”. Posteriormente vem a lei “c” e revoga a lei “b”, sem, porém, declarar o renascimento (repristinação) de “a”. Todavia, a lei “c” reproduz, em seu bojo, todas as disposições normativas que antes constavam na lei “a”, havendo um efeito repristinatório.

Por fim, interessante, ainda, a lembrança de Pedro Lenza18 pertinente ao tema. Informa

o autor, com base em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) – AGRAG 235.800/ RS, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 25.06.1999, 1ª Turma – que uma norma produzida sob a égide do texto constitucional pretérito – 1946, por exemplo –, não recepcionada pela ordem constitucional posterior – in casu, 1967 –, e que se torna novamente compatível com a ordem constitucional vigente – leia-se: 1988 – não repristina automaticamente, salvo disposição em contrário.

3. OBRIGATORIEDADE DAS NORMAS

Na dicção do art. 3º da LINDB, ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece. Impõe o artigo o que usualmente se denomina de obrigatoriedade das normas

ou eficácia geral do ordenamento jurídico.

A doutrina moderna costuma afirmar que o artigo em questão, malgrado a sua escrita, não gera uma presunção absoluta de conhecimento das normas, a qual seria impossível. Nem mesmo os estudiosos do direito, como nós, somos profundos conhecedores de todas as normas. Justo por isso que não se deve afirmar, em uma concepção moderna, que há presunção absoluta (jure et jure) ou uma ficção legal de que todos conhecem as normas em sua integralidade.

O que pretende o artigo, em verdade, é vedar, em regra, a possibilidade de escusa da norma por alegação de desconhecimento, o que poderia ocasionar uma completa ineficácia da ordem jurídica. Seria muito fácil descumprir leis sob o manto de sua ignorância. Nessa toada, adota-se no Brasil a premissa do conhecimento das normas, segundo a teoria da necessidade social17.

Do dito, observa-se que há uma presunção relativa (juris tantum) de conhecimento das normas, fato, inclusive, que justifica a existência da vacatio legis para divulgação do texto normativo. Pode-se afirmar, então, que o artigo em comento insere no ordenamento jurí-dico nacional o que se denomina Princípio da Obrigatoriedade (ignorantia legis neminem

excusat).

Como consequência, em regra, não se faz necessária a comprovação da existência e vali-dade de uma norma em juízo, pois o magistrado deve conhecer das leis, bastando a narrativa dos fatos: dai-me os fatos que lhe dou a lei (iura novit curia). A exceção é se a parte for arguir

direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, quando haverá de comprovar seu teor e vigência, se assim o juiz determinar (art. 376 do CPC).

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PESSOA FÍSICA, NATURAL OU DE EXISTÊNCIA VISÍVEL

Sumário • 1. Uma noção prévia: a personalidade jurídica – 2. Pessoa física ou natural ou de existência visível: conceito: 2.1. Aquisição da Personalidade Jurídica pela Pessoa Natural; 2.2. O Nascituro; 2.3. Natimorto; 2.4. Capacidade – 3. Emancipação – 4. Estado da pessoa física – 5. Extinção da pessoa física ou natural: 5.1. Morte Real; 5.2. Morte Presumida; 5.3. Comoriência ou Morte Simultânea.

1. UMA NOÇÃO PRÉVIA: A PERSONALIDADE JURÍDICA

A Personalidade Jurídica é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair deveres na ordem jurídica. Quem a possui é denominado sujeito de direitos.

Afirma Carlos Ayres Brito (ADIN 3510) que a personalidade jurídica consiste na

quali-dade de ser pessoa. É o atributo jurídico da pessoa1. O pressuposto dos demais direitos.

Sem a personalidade, não se é sujeito de direitos. A pessoa é um ente personalizado. O ordenamento jurídico brasileiro confere personalidade tanto às pessoas físicas, quanto às jurídicas. Da divisão posta, infere-se que os animais não são sujeitos de direitos. No Brasil não recebem nem doação, nem testamento. Certamente por isso é que alguns sujeitos de direito utilizam do artifício de abertura de uma fundação de amparo aos animais, para, indiretamente, atingir tal fim.

Mas quem é a pessoa física?

2. PESSOA FÍSICA OU NATURAL OU DE EXISTÊNCIA VISÍVEL: CONCEITO

A pessoa física é o ente dotado de estrutura e de complexidade biopsicológica, sendo dotado de personalidade jurídica e de capacidade de direito.

Atualmente não mais se fala, conceitualmente, na pessoa física como o ente biologi-camente criado, haja vista as criações por meio dos métodos artificiais. Os ditos métodos artificiais de criação englobam:

a) fertilização in vitro: é aquela que ocorre na proveta (in vitro), fora do aparelho

reprodutor feminino, mediante processo laboratorial de concepção, sendo posterior-mente implantado um embrião concebido laboratorialposterior-mente no corpo feminino. É o popularmente denominado bebê de proveta;

1. GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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Pa rt e I I – Pa rte G er al

b) inseminação artificial: aquela cuja concepção se dá em vivo (in vivo), no próprio

corpo da mulher, mediante a inserção do gameta masculino, por meio de um método artificial de criação.

Tanto a fertilização in vitro, como a inseminação artificial, podem ser: a) homóloga: quando o material genético utilizado é do próprio casal; b) heteróloga: quando houver material genético de terceiro.

Ademais, tais métodos podem acontecer:

a) inter vivos (em vida); b) post mortem (após a morte).

Em ambos os casos far-se-á necessária manifestação de vontade expressa dos envol-vidos, sendo o ato volitivo substitutivo do vínculo biológico, traduzindo o fato gerador

do parentesco.

O Código Civil não regulamentou os métodos artificiais de criação. Entrementes, ao veicular as presunções de paternidade decorrentes do casamento, no seu art. 1.597, afirma que presumem concebidos na constância do casamento, os filhos: [...] III – havidos por fecun-dação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

COMO SE PRONUNCIOU O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA?

Interessante observar que o STJ estende as presunções de paternidade decorrentes do casamento para a União Estável (REsp 1.194.059, rel. Min. Massami Uyeda, j. 6.11.2012, 3ª T. Info 508).

Na análise das presunções ainda é possível verificar que se considera a filiação como sendo do casal, não envolvendo, em nenhum momento, o doador do material genético, cujo anonimato há de ser preservado

No particular configura-se o que nomina o Código Civil (art. 1.593) de parentesco por

outra origem, abrindo os seus poros à outras formas de criação e parentes, como lembra

Luiz Edson Fachin2

Todavia, uma pergunta há de ser feita: o fruto do método artificial de criação tem direito

ao conhecimento da sua origem genética?

À luz dos direitos da personalidade parte da doutrina, a exemplo de Selma Pertele3,

defende que há um direito fundamental ao conhecimento da origem genética. O habeas

genoma poderia ser imaginado como remédio heroico apto a tal finalidade, ante o direito

constitucional ao conhecimento da ancestralidade.

2. FACHIN, Luiz Edson. Comentários ao novo Código Civil: do direito de família; do direito pessoal; das relações de parentesco. Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira. V. 18, 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

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COMO SE PRONUNCIOU O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA?

O Superior Tribunal de Justiça, por mais de uma oportunidade, já assegurou tal direito de conhecimento da origem genética ou ancestralidade, como decorrência de um direito e garantia fundamental e tutela da personalidade. Assim, aduz o Superior Tribunal de Justiça que “o direito à busca da ancestralidade é personalíssimo e, dessa forma, possui tutela jurídica integral e especial nos moldes dos arts. 5º e 226 da CF/1988”. (REsp 807.849-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24.03.2010 – Informativos ns. 257 e 425).

Destarte, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, através do reformado art. 48, desde 2009 permite ao adotado o “direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos”. A norma vai além, ao verberar que “o acesso ao processo de adoção poderá ser também deferido ao adotado menor de 18 (dezoito) anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurídica e psicológica”.

Nesse ponto, porém, uma distinção há de ser realizada. Não se deve confundir direito

à conhecimento da origem genética (ancestralidade), com o direito de reconhecimento de filiação. O que é assegurado pelo art. 48 da Lei de Adoção, bem como pelo supracitado

posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, é o direito subjetivo fundamental de conhe-cimento da origem genética. Isso, porém, não vai assegurar o necessário reconheconhe-cimento da filiação, com os decorrentes direitos a alimentos, sucessões, sobrenome, entre outras questões. Em suma: não se deve impor uma paternidade indesejada ao nobre ato de doação do material genético ou ao pai biológico cujo filho fora adotado por outrem.

2.1. Aquisição da Personalidade Jurídica pela Pessoa Natural

Em que momento a pessoa física adquire personalidade?

O Código Civil, em seu art. 2º, determina que a personalidade “começa do nascimento com vida”. Mas o que seria “nascimento com vida”?

O nascimento com vida ocorre no instante em que principia o funcionamento do aparelho

cardiorrespiratório, geralmente aferido pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno.

Nessas condições, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que faleça segundos depois.

Em suma: respirou, adquiriu personalidade jurídica.

Personalidade

da Pessoa Física Requisitos Nascimento + Vida

Assim, nada mais é necessário para a aquisição da personalidade jurídica da pessoa física; a não ser o nascimento com vida. Não precisa ter forma humana, sobreviver mais do que 24 horas de maneira extrauterina, ter um parecer de vida viável, cortar o cordão umbilical... Nada disto é necessário. A análise é objetiva. Se o recém-nascido – cujo pai já tenha morrido

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Pa rt e I I – Pa rte G er al

na época em que nascituro era – falece minutos após o parto, terá adquirido, por exemplo, todos os direitos sucessórios do seu genitor, transferindo-os para a sua mãe.

Seguindo com o ordenamento jurídico pátrio, após o nascimento há de ser realizado o

registro da pessoa natural. Este se dará no lugar que tiver ocorrido o parto, ou no local da

residência dos pais, dentro do prazo de 15 (quinze) dias. Tal prazo será ampliado em até 3 (três) meses nas localidades que distam mais de 30 (trinta) km da sede do cartório. É o que dispõe o art. 50 da Lei de Registros Públicos (LRP).

Para concursos federais, o mesmo art. 50 da LRP afirma que os índios, enquanto não

integrados, não estão obrigados ao registro do nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio, ficando a guarda sob os cuidados do órgão federal de assistência aos índios.

O art. 54 da LRP elenca os requisitos deste registro civil, a saber: 1º) o dia, mês, ano e lugar do nascimento e a hora certa, sendo possível determiná-la, ou aproximá-la; 2º) o sexo do registrando; 3º) o fato de ser gêmeo, quando assim tiver acontecido; 4º) o nome e o prenome, que forem postos à criança; 5º) a declaração de que nasceu morta, ou morreu no ato ou logo depois do parto; 6º) a ordem de filiação de outros irmãos do mesmo prenome que existirem ou tiverem existido; 7º) Os nomes e prenomes, a naturalidade, a profissão dos pais, o lugar e cartório onde se casaram, a idade da genitora, do registrando em anos completos, na ocasião do parto, e o domicílio ou a residência do casal; 8º) os nomes e prenomes dos avós paternos e maternos; 9º) os nomes e prenomes, a profissão e a residência das duas testemunhas do assento, quando se tratar de parto ocorrido sem assistência médica em residência ou fora de unidade hospitalar ou casa de saúde; 10) o número de identificação da Declaração de Nascido Vivo, com controle do dígito verificador, exceto na hipótese de registro previsto no art. 46 desta Lei; e 11) naturalidade do registrando..

Quem possui legitimação para realizar o registro?

O art. 52 da LRP apresenta os legitimados, a saber: a) pai ou mãe, isoladamente ou em conjunto; sendo que na falta ou impedimento de um destes, o outro terá prorrogado o prazo de declaração em 45 (quarenta e cinco) dias; b) havendo impedimento de ambos, o parente mais próximo, maior e presente; c) o administrador de hospitais ou os médicos e parteiras que tiverem assistido o parto; d) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da resi-dência da mãe e e) pessoas encarregadas da guarda do menor.

ATENÇÃO!

O Provimento 52 do Conselho Nacional de Justiça firma a possibilidade do registro direto de nascimento, nas hipóteses de técnica de reprodução assistida, independentemente de prévia decisão judicial.

Se houver dúvidas do agente estatal quanto à veracidade da declaração de vontade, ele poderá se dirigir à residência do recém-nascido para verificar a existência desse, ou exigir atestado do médico, ou parteira, que tiver realizado o parto, ou, em arremate, o testemunho de duas pessoas, que não sejam os genitores, que tenham visto o menor.

De mais a mais, por força de reforma legislativa realizada em 2019, através da Lei 13.846, ao fazer o registro o Oficial comunicará o nascimento ao Ministério da Economia e ao INSS, através do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (Sirc), ou por outro meio substitutivo (art. 53, p. 3º da Lei de Registros Públicos – Lei 6.015/73)

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O registro de nascimento da pessoa física é ato meramente declaratório. Afinal, a

personalidade jurídica foi adquirida desde o nascimento com vida. Pode-se afirmar que o

registro será mera declaração da aquisição pretérita da personalidade, daí seu efeito ex tunc. Situação diversa dar-se-á no registro da pessoa jurídica, o qual terá natureza

constitu-tiva da personalidade. A pessoa jurídica adquire a sua personalidade jurídica com a inscrição

do ato constitutivo no respectivo registro, precedida de autorização ou aprovação do Poder Executivo, quando necessária (CC, art. 45).

A distinção é importantíssima.

Em suma-síntese: a personalidade da pessoa física subsistirá desde o nascimento com vida até a morte dessa, enquanto a personalidade da pessoa jurídica persistirá do seu registro até a sua extinção.

Voltando à pessoa física, a Constituição Federal de 1988 garante a gratuidade do

registro de nascimento e da certidão de óbito (art. 5º, LXXVI, e Lei 9.534/97) para os reconhecidamente pobres na forma da lei. Lembra-se de que tal norma foi declarada

cons-titucional pelo Supremo Tribunal Federal, especificamente na Ação Direta de Constitucio-nalidade de n. 5, Relatada pelo Ministro Ricardo Lewandowski, em 2007.

COMO O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SE PRONUNCIOU SOBRE O TEMA?

ADI: registro civil de pessoas naturais e ampliação de serviços remunerados

O Plenário, por maioria, julgou procedente, em parte, pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade para conceder interpretação conforme a Constituição Federal (CF) ao § 3º do art. 29 da Lei 6.015/1973 e declarar a nulidade parcial, com redução de texto, da expressão “independe de homologação” constante do § 4º do mesmo artigo (1), no sentido de possibilitar que os ofícios do registro civil das pessoas naturais prestem outros serviços conexos remunerados, na forma prevista em convênio devidamente homologado pelo Poder Judiciário local, em credenciamento ou em matrícula com órgãos públicos e entidades interessadas, podendo o referido convênio ser firmado pela entidade de classe dos registradores civis de pessoas naturais de mesma abrangência territorial do órgão ou da entidade interessada.

ADI 5855 MC-REF/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 10.4.2019.

2.2. O Nascituro

Limongi Franssça, citado por Francisco Amaral, define o nascituro como sendo “o que

está por nascer, mas já concebido no ventre materno”4.

Cuida-se do ente concebido, embora ainda não nascido, dotado de vida intrauterina. A dotação de vida intrauterina é o traço distintivo entre o nascituro e o embrião

labora-torial (excedentário).

A Lei Civil trata do nascituro, ao colocar a salvo, desde a concepção, os seus direitos (art. 2º, CC). Quais são os direitos são postos a salvo desde a concepção? Teria o nascituro personalidade jurídica?

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Pa rt e I I – Pa rte G er al

A questão não é pacífica na doutrina, sendo necessária a análise das teorias que versam sobre a aquisição da personalidade. Vejamos:

a) teoria natalista ou negativista – vem da expressão natal, a qual significa nascimento com vida. Para esta teoria a personalidade só é adquirida do nascimento com vida,

de maneira que aquele já concebido, mas ainda não nascido, não teria

personali-dade. Trata-se de uma teoria negativista para os nascituros. São defensores desta teoria Vicente Ráo5, Silvio Rodrigues6, Eduardo Espínola7 e Arnoldo Wald8;

b) teoria concepcionista – contrapõe-se à anterior. Tem base no direito francês.

Sustenta que a personalidade jurídica é adquirida desde a concepção, de maneira que o nascituro já seria titular deste atributo. São defensores desta teoria: Clóvis Beviláqua9, Francisco Amaral10, Silmara Chinelato11 e Maria Helena Diniz12;

c) teoria da personalidade condicional ou condicionalista – Sufraga o entendimento de

que o nascituro, ao ser concebido, já pode titularizar alguns direitos, em regra, de

caráter extrapatrimonial. Assim, seriam os nascituros dotados, desde a concepção,

de Personalidade Formal, conforme denomina Maria Helena Diniz13.Entrementes,

apenas com o nascimento com vida (condição suspensiva) é que o atributo da perso-nalidade se completaria, sendo possível a conferência de direitos patrimoniais ao

nascituro. É o que Maria Helena Diniz14 denomina de Personalidade Material. Até

o nascimento, os direitos de conteúdo patrimonial ficam sob condição suspensiva.

Defendem a tese Washington de Barros Monteiro15 e San Tiago Dantas16.

Mas, objetivamente, qual seria a teoria adotada pelo Código Civil nacional?

O primeiro norte deve ser a redação do art. 2º do Código Civil, a qual afirma que a aquisição da personalidade se dá desde o nascimento com vida, colocando a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Assim, o Código Civil, preponderantemente, é natalista.

Entretanto, a doutrina cada vez mais afasta-se do debate sobre qual teoria seria aplicável no direito nacional e abraça a distinção da personalidade jurídica em formal e material.

Do dito, indaga-se: quais as hipóteses legais de tutela dos direitos do nascituro?

5. RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 5. ed. anot. e atual. por Ovídio Rocha Barros Sandoval. São Paulo: RT, 1999.

6. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. V. 1, 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

7. ESPÍNOLA, Eduardo; e ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. A lei de introdução ao código civil brasileiro. Atualizada por Silvia Pacheco. V. 1, 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1995.

8. WALD, Arnoldo. Direito Civil: Introdução e Parte Geral. V. 1, 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 9. BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria Geral do Direito Civil. Campinas: Red Livros, 2003.

10. AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2014.

11. CHINELATO, Silmara apud GAGLIANO, Pablo Stolze; e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Parte Geral. V. 1, 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

12. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. V. 1, 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

13. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. V. 1, 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

14. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil. V. 1, 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

15. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Parte Geral. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 16. DANTAS, San Tiago. Programa de Direito Civil. V. 1, 1. ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1979.

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CASAMENTO

Sumário • 1. Notas Históricas, Natureza Jurídica e Conceito: 1.1. Corrente Publicista; 1.2. Corrente Privatista – 2. Modalidades (espé-cies) de Casamento: 2.1. Modalidades Gerais, Comuns ou Típicas; 2.2. Modalidades Especiais, incomuns ou atípicas – 3. Promessa de casamento ou Esponsais – 4. Princípios específicos do Casamento: 4.1. Princípio da comunhão plena de vida; 4.2. Princípio da monogamia; 4.3. Princípio da livre união – 5. Finalidade do casamento – 6. A Existência do Casamento – 7. Da Validade do Casamento. Capacidade para Casar (Capacidade Núbil) – 8. Habilitação para o Casamento: 8.1. O incidente da oposição ao pedido de habilitação; 8.2. Impedimentos matrimoniais; 8.3. Causas suspensivas – 9. Celebração do casamento – 10. Prova do casamento – 11. Casamento nulo – 12. Casamento anulável – 13. Plano da eficácia (efeitos do casamento): 13.1. Eficácia Social; 13.2. Eficácia Pessoal; 13.3. Eficácia patrimonial: regime de bens; 13.4. Espécies de Regime de bens; 13.5. Doações antenupciais – 14. Vênia ou Outorga Conjugal – 15. Extinção do casamento: até que a morte os separe?: 15.1. A separação; 15.2. Divórcio.

1. NOTAS HISTÓRICAS, NATUREZA JURÍDICA E CONCEITO

Originariamente, tanto em Portugal quanto no Brasil, o casamento era realizado entre os católicos e necessariamente celebrado por sacerdotes. A influência da religião sobre o Estado era tão grande que não se imaginava o casamento fora da religião e a família fora do casamento.

Somente em 1861 é que se deu início à regulamentação do matrimônio entre os não católicos. Com o advento da República de 1.889, restou ainda mais clara a separação entre a Igreja e o Estado (fenômeno da laicização). Nasce, então, nas pegadas do Decreto nº 181/1890, o casamento civil.

Entretanto, dado ao costume pelo casamento religioso, o casamento civil não ganhou a simpatia imediata. Assim, criou-se com a Lei 379/1937 o casamento religioso com efeitos civis, posteriormente melhorado com a Lei nº 1.110/1950. O intuito era compatibilizar o costume (casamento religiosos) com o direito (casamento civil).

Ainda a reboque da influência religiosa, por muito tempo no Brasil os princípios do Direito Canônico regiam todo e qualquer ato nupcial, com base nas disposições do Concílio Tridentino e da Constituição do Arcebispado da Bahia.

Curioso, porém, que a influência religiosa sobre o direito em temas familiaristas não é uma exclusividade do Brasil. A análise do matrimônio no direito comparado deixa claro que há inúmeros países que sofreram, ou ainda sofrem, forte influência religiosa, não sendo este contexto exclusivo do Brasil. De fato, a legislação universal sobre o matrimônio subdivide--se em:

a) Países onde só o casamento civil é válido, permitindo-se, ainda, o religioso com

efeitos civis. Isto se aplica ao Brasil, quase toda a América Latina, Alemanha e Suíça;

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b) Países que concedem aos nubentes a liberdade para o casamento civil ou religioso,

em ambos reconhecendo o mesmo valor legal. Tal ocorre nos EUA e Inglaterra;

c) Países onde há preeminência do casamento religioso, sendo o civil acessível apenas

às pessoas de outras religiões, que não a oficial. É o que acontece na Espanha e Escandinávia;

d) Países em que subsiste apenas o casamento religioso, como no Líbano.

Voltando a evolução histórica do instituto no Brasil, depois da República, outra grande mudança atingiu a noção prementemente religiosa do casamento: o advento do divórcio. O art. 175, § 1º, da CF/67, com redação dada pela Emenda Constitucional de nº. 1/69, instituiu o divórcio em nosso ordenamento jurídico, trazendo a dissolubilidade do vínculo e a possi-bilidade de casamentos sucessivos.

Voltando os olhos para o tratamento do casamento na Constituição Federal, percebe-se, inicialmente, que ele apareceu em 1934, perpassando, posteriormente, pelas Constituições de 1946, 1967 e 1969, ocupando espaço central no Direito das Famílias. Hodiernamente, porém, infere-se que o atual texto Constitucional deu menor consideração ao matrimônio, como se vê do seu art. 226, o que também importa na quebra da estrutura familiar imaginada culturalmente e refletida pelo codificador de 1916.

Assim, enquanto a Constituição anterior consignava que a família é constituída pelo casamento (art. 175), o atual texto apenas averba que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado reconhecendo, simultaneamente a isto, de modo expresso, a existência de outras entidades familiares, como a união estável (§ 3º, art. 226, CF/88. A constituição das famílias, nesta evolução constitucional e histórica, não se dá mais apenas pela via do matrimônio.

Ilustre-se o que se deseja aqui afirmar (legitimação constitucional de outras entidades familiares) com o julgamento ocorrido no Supremo Tribunal Federal do Recurso Extraordinário nº 878.694 quando foi reconhecida a inconstitucionalidade do art. 1.790

do Código Civil para entender que os direitos sucessórios do companheiro são os mesmos

do cônjuge. Tais assuntos serão melhor explorados no capítulo específico sobre direito convivencial. Fechado o referido parêntese e demonstrada a legitimação de outras entidades familiares para além do casamento, é tempo de retornar à reflexão do matrimônio em sua perspectiva histórica, agora sob a égide da atual Constituição.

Segundo a vigente Lei Maior, o casamento é civil e será gratuita a sua celebração (§ 1º do art. 226). E não poderia ser diferente. Na República Brasileira, a separação entre o Estado e a Igreja decorre do ordenamento jurídico. Mesmo assim, o Poder Constituinte não ignora a importância da cultura e da tradição social, persistindo a figura do casamento religioso com “efeitos civis”, nos termos da legislação ordinária (§ 2º do mesmo art. 226 da CF/88).

É importante destacar que os princípios da igualdade e da liberdade, postos na Cons-tituição Federal desde seus primeiros artigos, constituíram importantes inovações neste percurso histórico do direito matrimonial, repercutindo sobre a disciplina das famílias (igualdade entre os filhos) e do próprio casamento (igualdade entre os cônjuges). Tanto é assim que o § 5º, do art. 226 ressalta: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.

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O mesmo ocorre com o tema liberdade. Sim, porque a Lex Fundamentalis confere tanto a liberdade para casar, quanto para não casar; ou, ainda, para não permanecer casado. O instituto do divórcio, que em 2010 foi objeto da Emenda Constitucional 66/10, assim pres-creve: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio” (§ 6º, 226, CF). O STJ entende que mesmo em havendo o divórcio consensual homologado por sentença, ainda assim será possível posterior ajuste consensual acerca da destinação dos bens, de modo que isto não violaria a coisa julgada sobre partilha de bens privados e disponíveis1. De igual forma, o

CPC/15 prevê o divórcio litigioso (arts. 693/699, assim como o divórcio consensual (arts. 731 a 733).

E aqui cabe um parêntese: na III Jornada de Direito Comercial ocorrida em 2019 no Conselho da Justiça Federal foi aprovado o Enunciado 93 segundo o qual o cônjuge ou companheiro de titular de EIRELI é legitimado para ajuizar ação de apuração de haveres, para fins de partilha de bens, na forma do art. 600, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

O direito matrimonial também está positivado nos arts. 1.511/1.688; 1.571/1.590, 1.689/1.693 e 1.711/1.722, todos do novo CC c/c, assim como na Lei 6.515/77 – abrange normas concernentes à validade do casamento, capacidade matrimonial, impedimentos, causas suspensivas, celebração, prova, nulidade e anulabilidade do matrimônio. Nesse conjunto de normas se terá também a disciplina das relações pessoais entre os cônjuges, os direitos e deveres recíprocos, as relações econômicas destes (regime de bens) e, finalmente, a dissolução da sociedade conjugal e do vínculo matrimonial.

Mas qual a natureza jurídica do casamento? Identificada a sua natureza, como pode-ríamos conceituá-lo?

A abordagem destes assuntos exige reflexão doutrinária apta a organizar, metodolo-gicamente, as mais diversas teorias explicativas acerca da natureza jurídica do casamento.

1.1. Corrente Publicista

Trata-se de teoria reconhecidamente ultrapassada na atualidade, cujo estudo se mostra relevante tão somente para efeito de posicionamento do tema e aclaramento da sua corrente oposta (a privatista).

Segundo a corrente publicista, o casamento se enquadraria em uma das categorias ou ramos do Direito Público. A explicação disto residiria no fato de que o matrimônio é celebrado pelo Estado, através de autoridade pública. Acrescer-se-ia a isto o fato de existir evidente interesse público por parte do Estado em relação ao casamento.

Deste modo, para os publicistas o casamento estaria enquadrado no Direito Público, ao lado do Direito Constitucional, Administrativo, Processual, etc.

A crítica apta a ser apresentada é evidente. Nada obstante a relevância do matrimônio para a sociedade, e até mesmo para o Estado, isto não seria critério suficientemente apto a retirá-lo do direito privado. Outra crítica a ser considerada, ainda sob o ponto de vista prag-mático, é que todos os demais ramos do direito de família se submetem ao direito privado e ali são sistematizados. Retirar o casamento deste contexto sistêmico vai de encontro ao

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princípio da operabilidade (qualidade de ser operável) do próprio direito civil. Além disto, o casamento não envolve uma relação vertical, mas sim horizontal, entre particulares.

Não se sustenta a tese publicista.

1.2. Corrente Privatista

A doutrina é uníssona em sustentar que o casamento integra o Direito Privado, tendo em vista os próprios argumentos lançados nas linhas anteriores, em crítica à corrente publicista. Dentro da corrente privatista existem várias teorias explicativas que objetivam, justamente, definir a natureza jurídica do casamento. São as mais importantes a contratualista, a insti-tucionalista, a eclética e a do ato-condição. Vamos a elas!

1.2.1. Corrente Contratualista

Fiel à tese privatista, o racionalismo jusnaturalista do século XVIII inspirou o legislador civilista francês de 1804, forte na escola Exegética do século XIX, a entender o casamento como um contrato, cuja validade e eficácia decorriam exclusivamente da vontade das partes. Tal premissa é facilmente identificada na Assembleia Constituinte francesa, após a Revolução de 1789 e no art. 3º do Código Civil daquela nação.

A concepção contratualista representava uma importante reação ao caráter religioso do matrimônio à época, alinhada ao advento da burguesia e do liberalismo. O casamento, portanto, era enxergado como um contrato; uma modalidade de negócio jurídico.

Ainda hoje esta tese encontra importantes adeptos. Cita-se, por exemplo, Silvio Rodri-gues2, para quem o casamento é um contrato especial de direito de família. Na mesma linha

coloca-se a doutrina de Pontes de Miranda3, quem já afirmava ser o casamento “um contrato

de direito de família que regula a união entre marido e mulher”.Logicamente, trata-se de uma corrente liberal, contextualizada sob as lentes dos direitos de primeira geração (ou dimensão) e influenciada nitidamente pelo Código Civil Napoleônico. Naturalmente, os contratualistas irão atribuir grande importância à vontade das partes. Sendo assim, a autonomia privada será a mola propulsora e constitutiva do matrimônio.

A manifestação da autoridade celebrante teria natureza eminentemente declaratória, visando, apenas, homologar o ato.Em termos de positivação, o Código Civil Português harmoniza-se com esta corrente doutrinária ao afirmar em seu art. 1.577 que “O casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código”.

A crítica a esta concepção doutrinária reside no fato de merecer o casamento uma consideração jurídica maior do que a contratual. Não se deveria reduzir o secular instituto do casamento a um mero contrato, máxime diante dos reflexos existenciais para além do patrimônio. Assim, o casamento não deveria ser categorizado ao lado da compra e venda, do comodato, da empreitada, etc.

2. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. 27 Edição atualizada por Francisco Cahali. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 6, p. 19.

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