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Discriminação e preconceito: identidade, cotidiano e religiosidade de travestis e transexuais

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Academic year: 2017

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(1)

Universidade

Católica de

Brasília

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU

EM PSICOLOGIA

Mestrado

DISCRIMINAÇÃO E PRECONCEITO: IDENTIDADE,

COTIDIANO E RELIGIOSIDADE DE TRAVESTIS E

TRANSEXUAIS

Autor: Patrick Thiago dos Santos Bomfim

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Tânia Mara Campos de Almeida

(2)

PATRICK THIAGO DOS SANTOS BOMFIM

DISCRIMINAÇÃO E PRECONCEITO: IDENTIDADE, COTIDIANO E RELIGIOSIDADE DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação

Stricto Sensu em Psicologia da

Universidade Católica de Brasília, como requisito no processo para a obtenção do Título de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Tânia Mara Campos de Almeida.

(3)

B713d Bomfim, Patrick Thiago dos Santos

Discriminação e preconceito: identidade, cotidiano e religiosidade de travestis e transexuais / Patrick Thiago dos Santos Bomfim. – 2009.

132 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2009. Orientação: Tânia Mara Campos de Almeida

(4)

Dissertação de autoria de Patrick Thiago dos Santos Bomfim, intitulada “DISCRIMINAÇÃO E PRECONCEITO: IDENTIDADE, COTIDIANO E RELIGIOSIDADE DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, em 31 de agosto de 2009, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

___________________________________________________________________ Profª Drª Tânia Mara Campos de Almeida

Orientadora - Presidente Mestrado em Psicologia – UCB

___________________________________________________________________ Profª Drª María Eloísa Martín

Membro Efetivo

Departamento de Sociologia - UnB

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Roberto Menezes de Oliveira

Membro Efetivo

Curso de Psicologia – UFG (Campus Jataí)

___________________________________________________________________ Profª Drª Maria Alexina Ribeiro

Suplente

Mestrado em Psicologia – UCB

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(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a DEUS PAI por ter me dado o Dom da Vida, a JESUS CRISTO por me ensinar a caminhar de forma a questionar e me esforçar em busca de respostas diante de tantas questões sociais que a minha própria condição de vida proporcionou, assegurando-me a importância de voltar-me para as causas sociais que também me constituem, ensinando-me a viver em plenitude. Ao Maravilhoso e Doce SANTO ESPÍRITO DE DEUS por me acolher de forma singela e provedora, manifesto como colo, acolhimento e auxílio, como uma mãe que segura nos braços o seu filho. À SANTÍSSIMA TRINDADE por conduzir os meus dias até este momento, se fazendo presente em cada situação de angústia e transformações advindas deste processo, em cada uma das suas etapas. Em meio às angustias que me cercavam surge mais uma pérola, e surge um novo cântico do meu coração em louvor e graças. Agradeço.

Ao nosso Amor, que parodiando ao título do filme, nunca tira férias, e que seja para sempre como na carta de primeira coríntias 13, conforme Bíblia Sagrada.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) que, em parceria com a Universidade Católica de Brasília (UCB), proporcionou a bolsa de estudos para a realização deste projeto, pois sem a mesma eu não seria capaz ou tornaria mais árdua a conquista deste sonho e desta realização profissional.

À UCB e seus profissionais por proporcionarem momentos de reflexão, aprendizagem e prática acadêmico-científica a título de mestrado, contribuindo para a minha formação. Em especial, aos profissionais administrativos e professores do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Psicologia. Aos profissionais da Biblioteca e do Centro de Formação em Psicologia Aplicado (CEFPA) pela atenção e apoio dispensados sempre que preciso.

À Professora Doutora Tânia Mara Campos de Almeida por, em cada gesto, manifestar cuidado, atenção, acolhimento e orientação, fazendo-se presente em cada momento de dúvida e angústia, assim como nas descobertas e alegrias; por abraçar esta jornada e caminhada com profissionalismo, ética e competência; por se tornar uma grande amiga e companheira, a quem aprendi a admirar e em quem aprendi a confiar, que, com o seu jeito, a cada dia, tornou-se agente imprescindível no decorrer da minha formação.

Aos meus familiares e amigos/as por compreenderem a razão de tantas ausências e inquietações do dia a dia, diante de um desafio complexo que se configurou o mestrado, em decorrência de tantos momentos vividos. Por torcerem e apoiarem cada uma das minhas empreitadas mesmo sem compreender as razões que me levaram a cada escolha enquanto projeto de vida.

À minha mãe, figura peculiar da minha vida, que, em nossos encontros e desencontros, auxiliou na minha formação enquanto ser humano e de forma indireta contribuiu para muitas escolhas.

Ao meu irmão Sérgio por ter sido sempre companheiro e parceiro no dia a dia. Nestes anos, entre distâncias e proximidades físicas, ele sempre contribuiu com seu amor incondicional para mais esta conquista.

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no mestrado. Obrigado pelas orações e pelos cuidados especiais, sem os mesmos, a realização deste sonho seria mais árduo.

Em especial aos amigos e irmãos Bruno Limeira Sete e Emanuel Júnior por serem símbolo de amizade e refúgio, em qualquer momento e situação, ajudando-me a enxergar várias outras possibilidades. Por sempre me perguntarem como eu estava e como estava o mestrado.

Aos queridos amigos Karina Cobucci, Débora Flávio, Simone Maciel e Pietro Maciel, juntos construímos uma jornada, entre tantas realizações, mais esta conquista, que nos custaram ausências e desencontros. Mas, também, esta fase nos provou o quanto podemos superar a distância sem esquecermos uns dos outros.

Aos mestrandos do Programa pelo apoio e pela união nas causas estudantis. Em especial, às antigas amigas na jornada profissional: Maristela Munis, Viviane Ferro, Aldenira e Regina Moura. Agradeço por estarmos juntos neste processo, recordando velhos momentos e vivenciando novos, em cada etapa. Como diz a Viviane, a distância muitas vezes aproxima mais do que imaginamos. Saudades dos intervalos de aula e dos dias em que partilhávamos com maior frequência sobre as nossas vidas e formações.

Ao Ministério Nação Ágape e nossos parceiros por, em cada momento, ainda que em quilômetros de distância, fizeram-se presentes nesta jornada e também por meio de orações, palavras de incentivo e aconselhamentos. Ao acreditar que iria auxiliar vocês, em minhas atividades pastorais, recebi mais carinho, afeto e amor do eu imaginava receber. Vocês são maravilhosos e juntos, todos os dias, damos mais sentido ao que acreditamos ser a prática cotidiana da vida: o amor.

Ao Reverendo Márcio Retamero, meu grande irmão e amigo na jornada de fé pelas Boas-Novas do Amor Inclusivo. Além de representar instrumento de bênçãos em minha vida, é inspiração para que eu continue estudando e instrumentalizando a minha prática profissional, a fim de contribuir com a formação de um mundo melhor, onde haja lugar para todo aquele e toda aquela que seja excluído e excluída. Exemplo de amor, fé, ações e práticas que exalam o Amor de DEUS.

À Miriam de Souza Radicchi, figura materna que acolhe os homossexuais como filhos queridos, por todos os seus cuidados e orientações pessoais. Encontro em você exemplo de que o amor é algo que deve ser sempre exalado, compartilhado e ultrapassa várias barreiras. Ao seu lado é fácil ser amoroso.

À Organização Não Governamental Elos pela receptividade, pela motivação, pelo cuidado e pelo incentivo.

Às participantes desta pesquisa, que se colocaram prontamente como colaboradoras, dando a oportunidade para que conheçamos um pouco mais da identidade, do cotidiano e da religiosidade de travestis e transexuais. Pensar em vocês, assim como em tantas outras que conheci no processo, foi, para mim, força e incentivo, na esperança de que cada vez mais ocupem as cadeiras das universidades, como graduandas e pesquisadoras.

À Lílian Beatriz Pereira por me auxiliar na editoração do abstract.

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Travesti é uma, uma... Você não vai ver uma travesti triste. É só alegria, amor, carinho, compreensão. A gente compreende muita gente, mas ninguém compreende a gente.

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RESUMO

BOMFIM, Patrick Thiago dos Santos. DISCRIMINAÇÃO E PRECONCEITO:

IDENTIDADE, COTIDIANO E RELIGIOSIDADE DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS.

2009. 132 folhas. Pesquisa qualitativa de caráter exploratório. Dissertação de Mestrado (Psicologia) – Universidade Católica de Brasília, Brasília – DF, 2009.

Esta dissertação parte de uma breve revisão bibliográfica acerca da relação entre psicologia e senso religioso, da conceituação bibliográfica sobre travestis e transexuais em diversas áreas do conhecimento, bem como de estudos referentes a saúde e religiosidade de grupos homossexuais no país. Com o objetivo de investigar a manifestação da dimensão religiosa no cotidiano de travestis e transexuais no Distrito Federal (DF), contou-se com a colaboração de 06 travestis e 03 transexuais. Trata-se de pessoas de genitália masculina, que se travestem com roupas e acessórios femininos, além de realizarem transformações corporais com o intuito de aparentarem ser mulheres ou por perceberem-se existencialmente do gênero feminino. Utilizou-se o método de estudo descritivo e de caráter exploratório, com base no construtivismo social, configurando-se em uma abordagem metodológica qualitativa, por meio do desenvolvimento de entrevistas individuais, pela aplicação de um roteiro semi-estruturado, e da observação participante em áreas de lazer e pontos de prostituição no Plano Piloto e em Taguatinga (DF). Os relatos das participantes foram registrados por meio de um gravador, sendo que todo conteúdo das fitas foi transcrito para análise e sistematizado por meio de leitura flutuante, com base na teoria da construção das zonas de sentido, as quais revelaram parte das configurações sociais deste público. Os resultados, com seus respectivos indicadores, apontaram eixos de discussões voltados à dinâmica da identidade de gênero, ao cotidiano e à religiosidade. Estes resultados estão marcados por uma última zona de sentido, a qual perpassa todas as outras por referir-se ao meio de enfrentamento do preconceito e da discriminação presentes nas vivências diárias das participantes. As considerações finais afirmam sobre as limitações acadêmico-científicas e religiosas na classificação de travestis e transexuais e com finalidades apenas interventivas. Há também dificuldades no uso das nomenclaturas entre as próprias participantes, por apontar um fenômeno que é fluido, marcado pelo preconceito e pela discriminação das suas respectivas condições humanas. Os relatos apontam para uma sociedade e um cotidiano excludente que interferem no desenvolvimento das participantes, influenciando na construção e na formação da própria identidade e religiosidade. Além disso, também apontam para o fato de que, salvo as diferenças de aceitação social entre travestis e transexuais, o cotidiano e a religiosidade acabam sendo melhor experienciados entre aquelas que melhor se adaptam ou desejam corresponder aos padrões heterossexuais e heteroafetivos hegemônicos, minimizando situações de preconceitos e discriminações, aumentando a aceitação social das mesmas.

(10)

ABSTRACT

This dissertation come from a brief review of the relationship between psychology and religious sense, the concept literature suffers transvestites and transsexuals in different areas of knowledge as well as studies related to health and religious groups of homosexuals in Brazil. Looking for to investigate the expression of the religious dimension of everyday life transvestites and transsexuals in the Distrito Federal (DF), counted with the collaboration of 06 transvestites and 03 transsexuals. These are people of male genitalia, which transvestite women with clothes and accessories, and make body changes in order to appear to be women or understand it existentially female. We used the method to study descriptive and exploratory in nature, based on social constructivism, setting it on a qualitative methodological approach, through the development of individual interviews, by applying a semi-structured script, and participant observation in leisure areas and points of prostitution in the Plano Piloto and Taguatinga (DF). The reports of the participants were recorded by a recorder, and that all contents of the tapes were transcribed for analysis and systematized by reading floating, based on the theory of construction of zones of meaning, which revealed part of the social settings of public. The results, with their respective indicators, identified areas of discussion focused on the dynamics of gender identity, and religion to daily life. These results are marked by a last area of meaning, which permeates all others by referring to the means of confronting prejudice and discrimination present in the daily experiences of the participants. The final say about the limitations of academic-scientific and religious in the classification of transvestites and transsexuals and interventional purposes only. There are also difficulties in the use of classifications between the participants themselves, for pointing out a phenomenon that is fluid, filled with prejudice and discrimination from their respective human conditions. The reports point to a society and a daily excluding interfering with the development of the participants, influencing the growth and development of their own identity and religion. It also points to the fact that unless the differences in social acceptance among transvestites and transsexuals, daily life and religion end up being better experience of those that best suit or wish to match the standards heteroafetivos hegemonic heterosexual and minimizing situations of prejudice and discrimination, increasing social acceptance of them.

(11)

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Diferenças das percepções de identidades por travestis e transexuais... 76

(12)

LISTA DE ABREVIATURAS

ABGLT - Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros AIDS - Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

ANTRA - Articulação Nacional de Travestis, Transexuais e Transgêneros BCE/UnB - Biblioteca Central da Universidade de Brasília

CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEFPA - Centro de Formação em Psicologia Aplicado

CID 10 - Volume 10 da Classificação Internacional de Doenças

CLAM - Centro Latino-Americano de Sexualidade e Direitos Humanos DSM - Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DST - Doenças Sexualmente Transmissíveis

GDF - Governo do Distrito Federal GGB - Grupo Gay da Bahia

GLBT - Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros GLS - Gays, Lésbicas e Simpatizantes

HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana

LGBT - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros ONG - Organização Não-Governamental

OSM - Organização Mundial de Saúde PPA - Plano Plurianual

SCS - Setor Comercial Sul SHS - Setor Hoteleiro Sul SUS - Sistema Único de Saúde

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 14

2. REVISÃO DA LITERATURA ... 21

2.1 PSICOLOGIA, RELIGIÃO, RELIGIOSIDADE E ESPIRITUALIDADE ... 21

2.2 LGBT E OS MOVIMENTOS HOMOSSEXUAIS: “UMA SOPA DE LETRINHAS” 28 2.3 HOMOSSEXUALIDADES, TRAVESTILIDADES E TRANSEXUALIDADES ... 33

2.4 RELIGIOSIDADE E PROMOÇÃO DE SAÚDE: PESQUISAS SOBRE HOMOSSEXUALIDADES, TRAVESTILIDADES E TRANSEXUALIDADES ... 488

3. METODOLOGIA E MÉTODOS ... 54

3.1 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ... 58

3.1.1 Observações de campo ... 59

3.1.2 Entrevistas Semiestruturadas ... 62

3.2 PROCEDIMENTOS DE SISTEMATIZAÇÃO, DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS DADOS ... 64

3.3. APRESENTAÇÃO DAS PARTICIPANTES ... 66

3.3.1 Perfil sóciodemográfico das Entrevistadas ... 66

3.3.2. Aproximando-se das participantes... 68

4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS ... 71

4.1 EIXO DE DISCUSSÃO A: IDENTIDADE DE GÊNERO DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS ... 71

4.1.1 Identidade de Gênero e Orientação Sexual... 722

4.1.2 Família e Ciclos de Vida ... 78

4.1.3 Recursos Medicamentosos e Alterações Corporais ... 83

4.1.4 Relacionamento Sexual-Afetivo ... 85

4.2 EIXO DE DISCUSSÃO B: SOBRE O COTIDIANO ... 87

4.2.1 Condições de Trabalho ... 89

4.2.2 Código de Conduta Ética da Profissão ... 94

4.2.3 Rivalidade entre os grupos ... 96

4.2.4 Segurança pública e violência ... 98

4.3 EIXO DE DISCUSSÃO C: SOBRE A DIMENSÃO RELIGIOSA ... 100

4.3.1 Religião, Crenças e Valores... 102

4.3.2 Recontando a Experiência Religiosa ... 105

4.3.3 Sexualidade, Religiosidade e Travestilidade ... 109

4.4 EIXO DE DISCUSSÃO D: SOBRE A DISCRIMINAÇÃO E O PRECONCEITO ... 113

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 120

(14)

14 1. INTRODUÇÃO

A presente dissertação de mestrado é resultado de uma angústia pessoal do

pesquisador em refletir sobre a vivência e expressão religiosa dos/as travestis1, uma vez que,

na prática religiosa, não era possível vê-los/as nas comunidades religiosas desde 1987, mesmo

a partir da sua inserção na militância dos direitos humanos pela diversidade sexual desde

2005. Outra questão de angústia frente a este tema relaciona-se com as atividades de escuta,

orientação e aconselhamento pastoral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transgêneros

(LGBT) e heterossexuais por parte do Ministério Nação Ágape. Este, inicialmente constituído

em Brasília, em 2006, com expansão pelo território nacional, pelas possibilidades advindas

dos recursos de ambiente virtual, e com atividades presenciais em Goiânia e Anápolis desde

2008, no sentido de acolher angústias decorrentes da relação entre

religiosidade-espiritualidade e identidades de gênero em paralelo às diversas possibilidades de orientação

sexual, diante das histórias de exclusões recorrentes em organizações denominadas como

cristãs, em especial, as de origem protestante. O Ministério, portanto, possui como intuito

naturalizar e anunciar o evangelho a partir de traduções originais da Bíblia, que não condenam

a prática sexual e a aliança entre pessoas do mesmo sexo, que, até o momento, vêm sendo

confundidas com atos considerados pagãos e de idolatria identificados por abominação, uma

vez que atrelam estas práticas ao culto a outros deuses.

Entre este público, observou-se que as travestis, transexuais e transgêneros eram

considerados/as como o público mais excluído das práticas religiosas, mesmo diante das

atividades propostas pelas chamadas igrejas inclusivas, que acolhem a diversidade sexual e

1Para a execução desta pesquisa, ainda em fase de projeto, optou-se por adotar o uso da concordância “o” e “a”

(15)

15 propõem uma prática voltada para o discurso ecumênico-cristão. Abria-se, então, diante do

pesquisador, o questionamento de como seriam suas práticas e crenças religiosas.

No decorrer de 2005 a 2009, foram muitas as experiências e os relatos em que as

transexuais, travestis e transgêneros começaram a apresentar para o pesquisador, em seu

exercício pastoral, as dificuldades em encontrar comunidades religiosas que os/as incluíssem

efetivamente, sem preconceitos e segregações. Tratados/as como aberrações, o desejo de

buscar Deus ficava cada vez mais distante, necessitando de locais que os/as acolhessem,

vislumbrando o crescimento e desenvolvimento de sua religiosidade e espiritualidade.

Associado a tais vivências, atividades da militância LGBT do Centro-Oeste colocaram o

pesquisador em maior contato com a realidade deste público, até então desconhecido, mesmo

frequentando o meio LGBT desde 2001. A marca da exclusão deste público, em especial

das/os travestis, é tão grande, que não foram encontradas pesquisas que as/os apresentem

enquanto atores sociais ativos no que tange à religiosidade e ao processo de formação de suas

subjetividades frente a este tema, como será exposto no capítulo referente à revisão de

literatura.

A revisão bibliográfica, que será apresentada no próximo capítulo deste trabalho,

conta com a explicação do uso das nomenclaturas adotadas pelos movimentos homossexuais

no Brasil, para melhor apresentar em sua parte posterior considerações sobre os verbetes e

conceitos referentes a travestis e transexuais. Além disso, esse capítulo inclui a discussão

acerca da interface de psicologia com religião, religiosidade e espiritualidade, que justificam o

campo de estudo na formação do Mestrado Stricto Sensu em Psicologia, que começa a se abrir

para discussões antes vistas enfaticamente pelo âmbito psicopatológico. É verdade que, na

atualidade, há um forte e organizado movimento pelo acolhimento dos direitos deste público,

como foi sinalizado na I Conferência Nacional de LGBT, ocorrida em 2008; no I Seminário

(16)

16 Nacional: Políticas Públicas de Trabalho, Oportunidade e Emprego para Travestis e

Transexuais, ocorrido no DF, em 2009. Os eventos citados indicam a futura produção de

conhecimentos na área e a relevância da contribuição do presente estudo não só para a

psicologia, mas, também, para os movimentos homossexuais e para a sociedade como um

todo.

Inicialmente, esta dissertação tinha como objetivo geral investigar as dimensões

religiosas nas vivências cotidianas de travestis do DF. Contudo, no decorrer da pesquisa,

constatou-se, na prática e junto à militância LGBT em Brasília, Anápolis e Goiânia, grande

dificuldade em acessar as travestis, em particular em grupo, como a ideia de reuni-las em

grupos focais, o que levou à realização apenas de observações de campo e entrevistas

semi-estruturadas. Em contrapartida, o movimento das transexuais se mostrou mais articulado

nesses locais e a ambiguidade dos próprios sujeitos, ao se autodenominarem travestis ou

transexuais, mostrou-se uma dificuldade para delimitá-los, apesar da coleta de dados com este

público fugir da proposta inicial do trabalho. Frente à realidade social composta por travestis e

transexuais que sobrevivem à marginalização e aos problemas cotidianos, bem como por se

constituir um tema e um universo pouco conhecidos na Academia, as questões exploradas na

investigação abarcaram ambos, travestis e transexuais, e se referiram às seguintes questões

centrais: há alguma dimensão religiosa ou aspectos religiosos no cotidiano de travestis e

transexuais? Esses aspectos são importantes para a constituição de identidades de gênero?

Além dessas questões, que perfizeram o objetivo geral da dissertação, os objetivos específicos

foram investigar se ocorre enfrentamento religioso por parte dos grupos pesquisados diante de

situações de vulnerabilidade biopsicossociocultural e quais seriam os conteúdos de suas

expressões religiosas. Acredita-se que, ao investigar estas questões, as percepções e os

sentimentos em relação ao preconceito e à discriminação mostram-se como eixo central dos

(17)

17 Ao se levar em consideração que todo o trabalho de campo foi pautado pelas

orientações do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Católica de Brasília

(UCB), bem como o projeto aprovado após qualificação pela banca examinadora organizada

no Mestrado em Psicologia da UCB, mantém-se o anonimato e o sigilo sobre a identidade das

colaboradoras, optando-se por pseudônimos e pela não caracterização detalhada de locais por

onde circulam, conforme será mostrado no capítulo 3.

O contato com elas deveria ter sido iniciado pela intermediação de Organizações

Não-Governamentais (ONG) de Brasília e do Centro-Oeste, mas deparou-se com o fato de que

nem elas têm fácil acesso ao público-alvo. Segundo critérios de recrutamento e triagem para

elaboração e execução da pesquisa, pretendia-se procurar, via ONG, por pessoas residentes no

DF, que se autodeclarassem travestis, com idade superior a 18 anos e que, após conhecimento

do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, se voluntariassem a participar desta

pesquisa. Apesar de apresentarem articulações mais diretas com as transexuais, como no caso

da ONG Elos, que identificaria pessoas a participarem da mesma, não foi possível a sua

atuação nessa parceria. Contudo, as referidas ONG foram solícitas em indicar contatos e se

mostrarem interessadas no desenvolvimento desse tema para subsidiar suas futuras ações.

Em campo, após eleger os locais de observação, a área de prostituição de travestis em

Taguatinga e Plano Piloto, bem como o Parque da Cidade de Brasília Sarah Kubitschek, este

apareceu como o melhor local para acessá-las, uma vez que, na área de prostituição, além dos

riscos que envolvem o cotidiano das travestis, é considerada uma área de trabalho, portanto as

colaboradoras dispunham de pouco tempo e atenção para o pesquisador. Desse modo, o local

de lazer e descontração do Parque possibilitou maior aproximação e primeiro contato do

pesquisador com algumas participantes, já identificadas nas áreas de prostituição por meio da

(18)

18 No decorrer das entrevistas com roteiro semi-estruturado, foram entrevistadas 06

travestis e 03 transexuais, totalizando 09 participantes do DF e entorno. Todas as entrevistas

foram gravadas e transcritas para análise posterior a partir das zonas de sentido, construídas

pelo pesquisador a partir dos indicadores apontados pelas participantes em seus relatos,

obtidos por meio da coleta, da sistematização e do tratamento de dados, tendo por base mestra

a teoria e a metodologia qualitativa de Gonzáles Rey. No capítulo 3, será explicitada a

metodologia e os métodos correlatos em detalhes, ainda que sejam de caráter exploratório.

Nesse mesmo capítulo, serão apresentadas a discussão e as análises preliminares dos dados a

partir das referidas zonas de sentidos e seus respectivos indicadores, os quais se encontram

inter-relacionados e dos quais emergiram outros aspectos e questões secundárias que

enriqueceram o tema central desta dissertação, como relações familiares, escolarização,

segurança pública, entre outros.

O primeiro eixo de discussão, constituinte da primeira zona de sentido, volta-se para

as questões de identidade de gênero e orientação sexual, apontando a família e os ciclos de

vida das travestis e transexuais, assim como os recursos medicamentosos e as alterações

corporais na feminização dos corpos e relacionamentos afetivo-sexuais, integrantes da

construção e do desenvolvimento das respectivas identidades. Apesar do cotidiano e da

religiosidade fazerem parte desta construção, optou-se por apresentar e discutir tais assuntos,

separando-os didaticamente, a partir de eixos temáticos próprios e constituídos por seus

indicadores.

O segundo eixo de discussão, a zona de sentido número dois, forma-se em torno do

cotidiano de travestis e transexuais. Esta tem como indicador basilar as condições e relações

de trabalho que dão sentido e significado para suas respectivas vidas, propiciando reflexões

(19)

19 Além disso, apontam aqui sobre as rivalidades entre os subgrupos de pertencimento e as

relações conflituosas delas com agentes da segurança pública do DF.

O terceiro eixo de discussão ou terceira zona concentra os indicadores acerca da

dimensão religiosa, apresentando relatos sobre religião, crenças e valores das participantes,

resultado do momento em que foram convidadas a recontar experiências religiosas e, então,

apontaram conflitos em vivenciar suas respectivas sexualidades nas tradições religiosas

hegemônicas, especialmente no caso das travestis.

O quarto e último eixo temático de discussão, a quarta zona de sentido, trata-se de uma

revisão de todos os outros eixos e indicadores, uma vez que as falas e os relatos das

participantes apontam para uma construção da identidade a partir de um cotidiano marcado

por ações preconceituosas e discriminatórias. Incluem-se os fatores religiosos, merecendo,

portanto, maior destaque nessa parte por proporcionar a reflexão sobre o tema de investigação

ora proposto.

As Considerações Finais da dissertação trazem uma reflexão sobre a discriminação e o

preconceito, articulando-os à identidade, cotidiano e prática religiosa de travestis e

transexuais. Neste aspecto, optam por uma busca religiosa-espiritual cotidiana em seus

próprios lares, relativizando a prática religiosa aprendida em suas comunidades de origem.

Acreditam que Deus, enquanto força superior suprema, independe das filosofias, dogmas e

preceitos pregados nas religiões tradicionais, em resposta e enfrentamento à rejeição e

marginalização que sofrem nesses espaços religiosos ou em consequência destes. Assim, elas

não legitimam as igrejas como mediadoras desta relação, ainda que tenham vontade de

frequentar alguma nova alternativa que respeite suas respectivas identidades de gêneros e sua

orientação sexual.

A complexidade em discutir sobre este assunto é apresentada na parte final do

(20)

20 transcender a explicação dualista entre gênero e sexo, a partir da complexidade da

performance dada no fenômeno, também as próprias participantes encontram dificuldades e

conflitos em se autonomear, utilizando nomenclaturas que ora as remetem como pertencentes

ao grupo feminino ora ao masculino, enquanto não necessariamente devam se enquadrar em

um dos pólos. Ao considerar, ainda, que as transexuais movimentam-se pela percepção e

inclusão na categoria de mulheres, enquanto as travestis não se preocupam com tais aspectos e

apresentam maior flexibilidade e acomodação com a possibilidade de transitar entre os

gêneros, levando-as a serem vistas às vezes como transgêneros, a discriminação e o

preconceito incidem sobre elas de modo diferente.

A contribuição deste tema de estudo para a psicologia e para os demais campos de

conhecimento é de significativa importância, uma vez que visa contribuir para a quebra de

barreiras e de limites científicos no Brasil. Enfim, pretende-se alcançar dimensões

praticamente ainda não estudadas, podendo influenciar e refletir na criação, frutificação de

futuros trabalhos por pesquisadores, atores ou instituições sociais, com o foco na prevenção e

intervenção de preconceitos e discriminações pela via do conhecimento e promoção da saúde

e direitos de travestis e transexuais, subsidiando o fortalecimento e a proteção à plena

(21)

21 2. REVISÃO DA LITERATURA

Para embasar a revisão bibliográfica, é preciso apresentar a constituição da sigla

LGBT, decorrente dos movimentos homossexuais no país, que são aqui referências, bem

como ideias sobre travesti e transexual. No entanto, antes serão resgatados alguns conceitos

que nortearam a investigação, como religião, religiosidade e espiritualidade, especialmente a

partir da relação destes com o universo científico da psicologia na contemporaneidade.

2.1 PSICOLOGIA, RELIGIÃO, RELIGIOSIDADE E ESPIRITUALIDADE

Para conhecer a religiosidade de travestis e transexuais se faz necessário

compreender a ideia de religiosidade que foi adotada neste trabalho e que é perpassada pela

contribuição de vários autores. Por exemplo, Teixeira (2005) salienta, acerca do que ele

nomeia como grande obra da espiritualidade e da mística, que tem como missão sensibilizar o

sujeito para a captação do “outro lado das coisas” (p.15), das muitas possibilidades, incluindo

a vivência religiosa.

Frei Betto et al (1974, apud Texeira, 2005) relata que a experiência envolve sempre

a relação de um sujeito, que, por sua vez, se volta para a presença de um objeto. Texeira

(2005) realça a busca deste sujeito pela penetração na plenitude de uma presença envolvente e

acrescenta: “Embora absolutamente transcendente, o sentido radical pode ser experimentado e

ganhar expressão na linguagem humana, ainda que seja por alusões, paradoxos e antíteses” (p.

16).

Paiva (2005) afirma que as palavras religião e espiritualidade estão condicionadas à

história, a partir de condições sociais, políticas, econômicas, entre outras. Porém, sua

preocupação está em definir tais construtos enquanto possíveis objetos científicos adotados

(22)

22 religioso, na especulação científica da “experiência religiosa”, expressão muito utilizada e de

influência européia. Não se vislumbrava o termo espiritualidade e nem tão pouco o estudo do

ateísmo enquanto objeto de investigação científica. Paiva (2005) aponta que o termo

espiritualidade foi introduzido nos estudos da Psicologia da Religião pela Escola de

Nijmegen, da Holanda, antecedendo a Psicologia da Espiritualidade. Deste modo, a

espiritualidade passa a ser abordada, em justaposição aos conceitos de “religião” e

“religiosidade”.

Essa fase coincide com o movimento teórico e de pesquisa da corrente

teórico-metodológica da psicologia humanista. O espírito humano iluminista, a partir dos estudos de

Rican (2003, apud Paiva, 2005), deve ser observado pelas suas características intuitivas,

afetivas e de atualizações do seu potencial. O autor afirma, também, que profissionais da

psicologia anglo-saxônica se voltam para instrumentos de medida da espiritualidade. Mas foi

só no ano de 1994 que o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM)

incluiu os chamados “problemas de ordem religiosa ou espiritual”, enquanto revistas

científicas, como a American Psychologist de janeiro de 2003, dedicaram-se aos temas

religião, espiritualidade e saúde.

É interessante salientar que os dicionários de psicologia, mesmo os da década de 90,

como o Dicionário de Psicologia, de Peter Stratton e Nicky Hayes (1994), não abordam os

termos religião, religiosidade e espiritualidade. Também não foram encontrados nos

dicionários pesquisados os verbetes “distúrbio religioso” ou “distúrbio de ordem religiosa”.

Este dado constata o quanto a Psicologia apresenta, ainda nos dias atuais, dificuldades em

dialogar cientificamente com o tema, que, de certa forma, compõe a vivência humana em

sociedade. Segundo Pargament (1999, apud Paiva, 2005), a religião é definida por

organização, rito e ideologia e inibidora do potencial e expressão espontânea humana, em

(23)

23 representando a busca de sentido, unidade, conexão e transcendência. Nesta mesma vertente

de pensamento, Pavel Rican (2003, apud Paiva, 2005, p. 35), salienta que:

(...) religião para muitos significa em primeiro lugar instituições, rituais e formas tradicionais, ortodoxia dos ensinamentos, rigidez enfadonha, falta de sentimento, obsolência, atitude reacionária, moralismo. Em contraste, espiritualidade conta algo espontâneo, informal. Criativo e universal; significa autêntica experiência interior, liberdade de expressão individual, de busca e mesmo de experimentação religiosa.

O mais interessante nesse conceito, além das suas contribuições, é o fato de a

espiritualidade, ainda que apresentada com aspectos relacionados à religiosidade, de certa

forma estar em confronto com o conceito de religião e religiosidade. Seria, portanto, segundo

esses autores, a espiritualidade que guiaria o ser humano para a experimentação religiosa em

seus registros individuais.

Oliveira (2001, p. 135) aborda a religiosidade como a expressão do “conjunto de

disposições referentes ao sagrado antes que estas sejam socialmente elaboradas e

socializadas”; expressando a religiosidade em seu estado original. O autor diferencia a

religiosidade dos chamados fenômenos religiosos, que serão, por sua vez, institucionalizados,

contendo um mínimo de normas e compartilhamento social, tornando-se um fato social. Ele

aborda a religiosidade de forma próxima ao que os autores já citados denominaram de

espiritualidade.

Em Oliveira (2001), continua a ser relatado o construto religiosidade como sendo o

movimento que impulsiona o ser humano ao sagrado, ao transcendente, o ganz andere – o

outro em sua completude. A experiência religiosa pode ser melhor compreendida, segundo o

autor, com o apoio da fenomenologia, muitas vezes transcrita no conflito teórico expressivo,

(24)

24 estabelecida com as outras pessoas e com a natureza, a partir, inclusive, de uma visão

cósmica, podendo se estabelecer a própria divindade.

No que se refere à existência do sagrado, enquanto realidade que se autoapresenta,

como no caso do cosmos, Oliveira (2001) faz referência à Mircea Eliade: o “sujeito da ação

manifesta-se ao ser humano, por sua vez, responsável por desvelar o mistério, despindo-se da

sua condição religiosa” (p.139) e enfatiza o lugar da religiosidade que se expressa em uma

representação, vinculada à condição cultural de um grupo, que não deve ser julgada pelo

observador. Apresenta “a religiosidade como matéria-prima das religiões instituídas”

(OLIVEIRA, 2001, p.139).

Ao concluir o capítulo, Oliveira (2001) salienta a importância de se investigar as

diversidades religiosas - popular, intelectual, ocidental, oriental, brasileira, entre outras -, pois,

antes que fosse observada, a expressão religiosa já havia sido apresentada. Aponta, também,

as grandes contribuições que a antropologia pode oferecer, quando objetiva essa experiência

cultural pela compreensão de instituições religiosas que educam com finalidade socialmente

útil.

Faria (2004) aponta alguns autores com noções próximas das que já mencionadas, a

saber: Lukoff (1992) que distingue religiosidade - adesão a crenças e práticas organizacionais

ou institucionais religiosas - e espiritualidade - a relação estabelecida por uma pessoa com um

ser/força superior em que se crê. Ela relata que, conforme Siegel, Anderman & Schrimshaw

(2001), o construto da religiosidade inclui aspectos individuais e institucionais, e o fenômeno

da espiritualidade é apresentado de forma individual, caracterizado pela transcendência

pessoal, por uma sensibilidade “extra consciente” e fonte de sentido para eventos vividos. Já

Worthington, Kuru e McCullough (1996) detalham que, diferentemente da religiosidade, a

espiritualidade é marcada em pessoas, que não necessitam de crenças religiosas ou

(25)

25 autores que, assim como Paiva (2005), acreditam que não há como dissociar tais condições e

que pesquisas neste sentido não são produtivas.

Faria (2004), em particular, embasa a sua discussão a partir do enfrentamento religioso

coping – ideia que também é retomada nesta dissertação ao se buscar compreender a

religiosidade do grupo pesquisado como uma forma de enfrentamento do mundo cotidiano. A

tradução deste termo para o português demonstra certa carência no que tange a sentido e

significado que a palavra original em seu contexto histórico-cultural pretende expressar. No

primeiro momento, diante de situações estressantes, podem ocorrer mediações cognitivas e,

inicialmente, avalia a situação como desafiadora, prejudicial ou ameaçadora. Em segundo

plano, avaliam-se os recursos disponíveis para enfrentar e tentar modificar a situação ou

emoção que a pessoa viveu.

Faria (2004) parte do Modelo Interativo do Estresse, de Folkman, Lazarus, Gruen &

De Longis (1986, p. 572), que definem enfrentamento da seguinte forma: “esforços cognitivos

e comportamentais voltados para o manejo de exigências ou demandas internas ou externas,

que são avaliadas como sobrecarga dos recursos pessoais”. Segundo Faria (2004),

pesquisadores das ciências sociais têm estudado a relação e o suporte/manejo da religiosidade

e espiritualidade no enfrentamento das situações observadas como problemáticas, como no

caso de Harrison et. al.(2001), denominando o processo deste fenômeno como “enfrentamento

religioso”.

Netto (2004) aponta para o pensamento de Durkheim (1912/1960), ao expor que a

religião é partilhada pela representação coletiva de um grupo social como uma forma de se

conhecer o mundo, sendo a religião contribuinte na formação e no desenvolvimento humano,

e a exteriorização da religião e a proposta de experimentá-la ocasionam a sua (re)criação.

Por fim, o conceito de religião, religiosidade e espiritualidade, que serão manejados no

(26)

26 doadora de sentidos, descoberta de si e dos outros, consciência do limite, o inefável,

expressão da busca e necessidade de explicar a existência, por práticas que abarcam os seres

humanos em diversas situações, manifestando-se por meio da crença, fé, dogmas e atributos

sagrados, que, de uma forma ou outra, são inerentes à vida dos seres humanos, principalmente

em sociedade, pois influencia direta e indiretamente a vida em sociedade. Ainda segundo Leal

(2005), areligião é compreendida entre a condução do sagrado e do profano, pela construção

de códigos morais que se institucionalizam, norteiam a vida daqueles que se dizem religiosos

e, indiretamente, daqueles que não se consideram religiosos ou adeptos de alguma religião ou

mesmo não creem na existência e ação transcendente.

Essa autora afirma que o fenômeno religioso pode ser visto como mais um elemento

que compõe a identidade dos seres humanos, pela explicação de um mundo cheio de enigmas

que, em muitos momentos, fogem de explicação, interpretação ou mesmo realidade. O contato

do ser humano com o sagrado se dá em várias religiões. A fé engloba dimensões cognitivas e

afetivas, expressas no plano da razão e da emoção. A relação com o transcendente implica a

relação com o outro e consigo mesmo. Leal (2005) apresenta, portanto, religião como prática

e histórica, como influência da e influenciada pela cultura, atentando-se para o significado da

palavra religião, que é também “re-ligar” as partes ao todo, religando os seres humanos entre

si, com a natureza e com o transcendente, com o todo. Tudo isto caracteriza parte do papel da

religião com sua contribuição para a composição do fenômeno social na humanidade, sendo a

religiosidade comum a todas as sociedades.

Assim, há três sentidos de religião que norteiam os estudos acerca do tema. O

primeiro sentido é religare, proveniente do latim, que significa “com o intuito de ligar dois

mundos”, o físico, perecível; e o espiritual, imperecível. Este conceito se relaciona com os

valores da humanidade, vinculando-se a história do presente e a do passado, garantindo a

(27)

27 Outro sentido de religião é re-ligare, religando o ser humano a Deus, proveniente do

lactâncio. Com base nos estudos do termo, chega-se a Cícero que teria traduzido este

fenômeno como re-legere, no sentido de reler, reunir ou recolher (WILGES; COLOMBO,

1978).

O terceiro sentido de religião está no fato de o ser humano atribuir nomes a coisas e

fenômenos que o cercam, criando signos e símbolos; reelegendo significados e representantes;

influenciando na produção cultural de objetos de desejo; transcendendo, em alguns

momentos, as explicações chamadas naturais; elegendo como prioridade estas novas

descobertas ou mesmo a vida religiosa-espiritual em detrimento da material (ALVES, 1984).

Assim, para elaboração e desenvolvimento desta investigação, partiu-se destes três

sentidos da religião: religar, reler e reeleger. A religião é vista como um fenômeno que religa

os mundos físicos e materiais aos transcendentais, espirituais e sobrenaturais. A religião nos

possibilita reler as contingências do mundo, dando explicações que vão além dos fenômenos

chamados naturais, assim como reeleger novos significados a partir da absorção de novos

valores e significados, direcionando o sujeito para a religiosidade e a espiritualidade.

O conceito de religiosidade, que foi adotado e privilegiado frente à “religião” para a

coleta e compreensão dos dados gerados nesta dissertação, estará relacionado aos dogmas,

ritos, costumes e valores fornecidos a partir das organizações religiosas apresentados por

seus/suas adeptos/as em suas expressões particulares. Já a espiritualidade foi tomada como a

manifestação de vida espiritual, que não se submete, necessariamente, a dogmas religiosos e

independe de organizações e tradições religiosas específicas. Centraliza-se e focaliza-se a

experiência com o transcendente, em caráter individual, que necessariamente não se trata de

uma fé ou crença institucionalizada, mas embasada no cotidiano das pessoas em sua relação

(28)

28 O presente trabalho buscou observar e refletir sobre a experiência religiosa no

cotidiano de travestis e transexuais. Não teve o intuito de pesquisar exatamente a religião

institucionalizada delas, mas apreender como lidam com situações do dia a dia a partir de

referências, indicações e vivências de religiosidade ou espiritualidade, com base em

explicações ou sentimentos relativos ao transcendente. Deste modo, se fez necessário

apreender noções referentes aos conceitos de travesti e transexual em estudos e pesquisas

relacionadas ao tema,conforme apresentados a seguir.

2.2 LGBT E OS MOVIMENTOS HOMOSSEXUAIS: “UMA SOPA DE LETRINHAS2”

Desde a metade do século passado, tem-se o histórico das lutas sociais acerca da

temática voltada para a homossexualidade. Observa-se uma longa jornada de homossexuais

que se autodenominam gays e lésbicas, porém, nesse movimento de massas, alguns grupos

minoritários são marginalizados, discriminados e quase invisíveis: bissexuais, travestis e

transexuais. Após ganhar certa visibilidade, esses grupos passaram a considerar as

diversidades identitárias – caso de travestis e transexuais - e de orientação sexual – caso dos

bissexuais - dentro do próprio movimento. A partir de então, os movimentos homossexuais no

Brasil têm discutido sua composição para organizar intervenções de cunho político. Até

meados da década de 90, usava-se a sigla GLS significando Gays, Lésbicas e Simpatizantes.

Na categoria simpatizantes, estavam os heterossexuais parceiros na luta, os bissexuais e os

chamados “confusos” (homens que faziam sexo com outros homens e mulheres que faziam

sexo com outras mulheres, mas se percebiam heterossexuais) e os “curiosos” (pessoas que

ainda não tinham certeza sobre sua orientação sexual).

2 A expressão utilizada como tema deste tópico se refere ao exercício de distinguir as particularidades do

segmento LGBT, unindo forças na diversidade em função da exclusão sexual e, em alguns momentos, contra a forclusão. Esta expressão foi absorvida pelos movimentos homossexuais em analogia à “Sopa de Letrinhas da

(29)

29 A partir de fóruns voltados e conduzidos por homossexuais e de discussão política

em espaços públicos, decidiu-se retirar o S da sigla GLS e acrescentar outras possibilidades de

orientação sexual e identidade de gênero. As lésbicas ganharam evidência, marcando o

ativismo contra o machismo social, e deram visibilidade para bissexuais, travestis, transexuais

e transgêneros, criando a sigla LGBT, que significa Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis,

Transexuais e Transgêneros. Esta sigla foi incorporada aos movimentos homossexuais na 1.ª

Conferência LGBT do Brasil, a primeira do mundo com esta configuração, em 2008, em

Brasília - DF, com a presença de delegados e representantes eleitos em Conferências

Estaduais e do DF, com apoio do Governo Federal. Contudo, Tosta e Pelúcio (2008) levantam

questões relacionadas à visibilidade dos grupos minoritários, criticando o fato das travestis,

transexuais e transgêneros aparecerem no final da sigla e não no começo.

Hoje, reconhece-se a grande diversidade existente no movimento homossexual em

relação à orientação sexual composta por lésbicas, gays e bissexuais, as quais são atravessadas

pela identidade de gênero de feminino, masculino,travestis, transexuais e transgêneros. Além

disso, no Brasil, apenas nesta década é que se intensificaram os cuidados e as ações referentes

aos direitos dessa camada social, a exemplo do I Seminário da Visibilidade das Travestis e

Transexuais do DF, promovido em 2009 pela ONG Elos, além do I Seminário Nacional:

Políticas Públicas de Trabalho, Oportunidade e Emprego para Travestis e Transexuais,

promovida em 2009 pela Articulação Nacional de Travestis, Transexuais e Transgêneros

(ANTRA) e pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), em

parceria com a Frente Parlamentar do Congresso Nacional pela Cidadania LGBT.

De 1980 até 2007, houve um total de 2.647 mortes de homossexuais no país,

colocando-o em primeiro lugar no ranking mundial de crimes homofóbicos, de acordo com a

ONG Grupo Gay da Bahia (GGB) (MARTINEZ, 2007). Em 1999, por exemplo, há registro

(30)

30 Mas os dados necessitariam de pesquisa detalhada para se observar as particularidades de

cada ano do período. Ressalta-se que a obtenção de tais dados pelo GGB ocorreu a partir de

notícias veiculadas no meio midiático e que muitas famílias não denunciam os casos por

vergonha da sexualidade do/a seu/sua integrante assassinado/a. Os assassinatos, tão presentes

no cotidiano de um/a travesti, com elevado grau de crueldade, deflagrando traços de

transfobia, silenciam, ainda mais, as vozes de um público pouco reconhecido pela sociedade.

A travesti feminina, para não ser apontada na rua, discriminada e rechaçada,

refugia-se em casa durante o dia. O mesmo refugia-ser humano, que é explorado refugia-sexualmente, é usado para

realizar os sonhos sexuais da sociedade que os/as consideram imorais, o que se chama de

preconceito e pode ser visto como uma forma de exploração. A partir de exposições e relatos

na I Conferência Nacional LGBT, percebe-se no dia a dia de travestis, agressividade e

violência como respostas a uma vida social que lhes é imposta, sem muitas possibilidades e

oportunidades de mudanças, resultado do que se espera em um processo de inclusão social.

No universo da homoafetividade3, ainda é muito desconhecida a visão de mundo

dos/as travestis. O próprio meio científico tem muito a avançar neste tema, pois, como

salienta Passamani (2008), a tentativa de superação dos preconceitos no meio acadêmico se dá

por meio da interação com os sujeitos de pesquisa, por meio do estudo dos ditos objetos

científicos. O autor afirma que o estudo da homossexualidade é recente nas Ciências Sociais e

Humanas e foca o seu estudo de forma interdisciplinar, incluindo história, sociologia,

antropologia, direito e relações internacionais, bem como parte do debate teórico de duas

posições antagônicas acerca da sexualidade, levando em conta as ideias de Butler (2003).

Chega-se a defender a posição teórica que desnaturaliza sexo e critica a categoria gênero, no

sentido de mostrar o quanto a sexualidade humana é fluida e performática, bem como de

3 Durante muito tempo, a homossexualidade foi associada à doença, como será explicado adiante. O termo ora

(31)

31 mostrar que não se trata de gênero ser expressão de qualquer possibilidade ou escolha

aleatória de um grupo, mas uma elaboração subordinada a um discurso cultural hegemônico.

Passamani (2008) traz a reflexão histórica de que a sexualidade era atrelada ao sexo

genital de nascimento e o que fugisse a isto deveria ser readequado. Não se perguntava para

os/as homossexuais sobre sua identidade sexual. A falta de conhecimento nesta área acarreta

preconceitos e deixa muito mais complexas as dificuldades de se ser um/a travesti. Só no

século XX, com a pandemia da AIDS, com um olhar ainda predominantemente médico, é que

se dedica aos estudos da “cultura homossexual”, principalmente após a metade do século XX,

e se percebe que entre as muitas nuances deste movimento, havia grupos e subgrupos, nem

sempre harmônicos entre si.

Passamani (2008) destaca, ainda, que os movimentos homossexuais buscam novos

valores a partir das dificuldades enfrentadas pelos movimentos sociais pró-homossexuais, em

decorrência da divergência direta e indiretamente do exercício da cidadania LGBT, em

detrimento da conservação dos valores cristãos. Na busca de novos valores, por exemplo, o

movimento homossexual, nas últimas duas décadas, conquistou a escolha e a mudança de

sexo, leis contra a homofobia, contrato de parceria civil, adoção, entre avanços em discussões

acerca de herança, plano de saúde, pensão alimentícia, divórcio e direitos sexuais. Em

particular, somam-se a estas conquistas, a mudança de nomes na carteira de identidade ou a

emissão de uma carteira alternativa para travestis e transexuais, adequando o seu nome à sua

imagem feminina ou masculina.

Sobre a vida em sociedade, constituição do mundo e as diferentes

homossexualidades, Passamani (2008), salientando a crítica à hierarquização das diferenças

que acaba por criar juízo de valor e atribuições morais diferenciadas em direitos e deveres,

apresentados na história das culturas e que são entendidas como algo natural, afirma o quanto

(32)

32 importância de se destacar alguns mitos referentes às diferentes homossexualidades na

sociedade brasileira.

Em sua pesquisa, foi constatado que os guetos são vistos como espaço de resistência

ao preconceito, produzindo uma espécie de ambiente que condiciona a homossexualidade

num status de normalidade, em que a diferença deve ser respeitada, subvertendo valores e

preconceitos dominantes. Nos guetos, regidos por regras e normas próprias, se aceitam os/as

travestis, gays pobres, gays negros entre outros que são marginalizados no próprio meio

homossexual, enquanto reflexo de uma cultura segmentarista, configurando o que Passamani

(2008, p. 22) nomeia de “discriminados entre os discriminados”.

Ainda sobre a influência da religiosidade, o autor enfatiza os sentimentos de culpa e

pecado, no sentido de oprimir os homossexuais, atrelados a contingências sociais que os leva

a ocultarem-se, por medo da exclusão, da ridicularização e da marginalização. Já no gueto,

sem as mesmas pressões, o/a homossexual pode experimentar, construir e assumir uma

identidade equivalente e coerente aos seus desejos e impulsos, constituindo em treinos que

podem se expandir para lugares menos restritos a ponto de ser reconhecido como

homossexual nos ambientes que frequenta, apresentando-se em outras áreas do seu convívio

social.

Os resultados apontados por Passamani (2008), de certa forma, reforçam a

necessidade de pesquisa sobre grupos sociais discriminados no próprio meio homossexual,

como no caso dos/as travestis, especialmente no que diz respeito à vivência religiosa e

espiritual. Assim, surge a questão de como travestis vivenciam a religiosidade em suas vidas?

É importante salientar que não foram encontradas publicações acerca de estudos sobre a

religiosidade dos/as travestis em banco de dados de artigos científicos, em livros ou em

(33)

33 2.3 HOMOSSEXUALIDADES, TRAVESTILIDADES E TRANSEXUALIDADES

Como dito na seção anterior, estudos sobre travestis e transexuais ainda são poucos.

Apesar de os movimentos homossexuais terem registro de militância e ativismo desde a

década de 50, somente na década de 90 do século passado é que se começaram estudos e

pesquisas a fim de distinguir as diferentes identidades e orientações sexuais que compõem o

movimento homossexual. Nesta seção, serão apresentados os conceitos de

homossexualidades, travestilidades e transexualidades em suas principais distinções

conceituais, as quais abarcam as discussões de identidade de gênero. Em seguida, serão

apresentadas relevantes pesquisas sobre o assunto com o foco na promoção de saúde,

conjugalidade e cotidiano.

Em certos momentos, algumas pessoas pensam que entendem os/as travestis, mas,

quando se aprofundam no estudo deste grupo social, percebem o quanto estão equivocadas.

Travestis vivem em condições de invisibilidade e, por isso, há poucas informações a seu

respeito. O conceito de travesti está mais diretamente vinculado à ideia de saúde e

prostituição, marcado por estereótipos e estigmas. Mas o cotidiano de travestis vai além destas

áreas e possui muitas dimensões que precisam ser desveladas, em especial pela compreensão

e promoção de cidadania em seu exercício pleno.

Para iniciar os estudos, foram realizadas buscas em uma das duas bibliotecas

universitárias mais antigas de Brasília: a Biblioteca Central da Universidade de Brasília

(BCE/UnB) e a da Universidade Católica de Brasília (UCB). Na biblioteca da UCB, não

existem vastos registros com os verbetes travesti, travestismo e transexualidade, além da

dissertação de Mestrado em Psicologia de Frederico Guilherme Ocampo Abreu, intitulada

Transexualismo: Um estudo sobre a representação de si no Método de Rorschach (2005), que

(34)

34 tese de Doutorado em Psicologia, de Tatiana Lionço, intitulada Um olhar sobre a

transexualidade a partir da perspectiva da tensionalidade somato-psíquica (2006). Dentre os

livros, está a obra de Roberto Freire, Travesti, de1978, que contém duas novelas, O Milagre e

A Cortada, uma obra de literatura, que não é aqui o foco de discussão. Outros livros:

Juventudes e Sexualidade, de Miriam Abramoavy, Mary Garcia Castro e Lorena Bernadete da

Silva (2004); Violação dos Direitos Humanos e Assassinato de Homossexuais no Brasil, de

Luiz Mott, do GGB (2000); Transexualidade: O corpo em mutação, de Edvaldo Souza,

também do GGB (1999); e A invenção do feminino, de Hélio R. S. Silva (1993), muito

utilizado como referência entre os artigos científicos encontrados. Além desses, são poucos os

artigos em periódicos eletrônicos acerca do tema travesti.

Além desse material, os primeiros registros sobre a investigação empírica,

ocasionando produções científicas, ocorreram em 1987, por Mott e Assunção: “Gilete na

Carne: Etnografia das automutilações dos travestis da Bahia” e, em 1999, Mott e Cerqueira

ampliam os estudos em Salvador, mapeando e entrevistando praticamente todas as travestis da

cidade, para produzir o texto: “Travesti da Bahia: Prostituição, silicone e drogas”.

Em confluência com o movimento social e suas reivindicações, observa-se, a partir

de 2006, a retomada do interesse pelo tema e um aumento relevante nas publicações

científicas com esse foco em todo o país, com ênfase para o ano de 2008. Destacam-se a 8ª

edição do evento Fazendo Gênero – Corpo, Violência e Poder, ocorrido em 2008, em

Florianópolis, com trabalhos referentes à travestilidade e questões de gênero, a partir das

homossexualidades e,no DF, o encontro Estudos Feministas e de Gênero em Brasília –

Diálogos Interdisciplinares, em 2009, que contou com a comunicação de quatro trabalhos

(35)

35 Para introduzir o conceito da palavra travesti, foi realizada busca nos dicionários de

língua portuguesa, filosofia, psicologia, psicanálise, moral e teologia. No Dicionário Aurélio

da Língua Portuguesa (2004, p. 1984), o termo travesti é assim apresentado:

Travesti [Do fr., travesti] S. M. Gal. 1. Disfarce no trajar. S. 2g. 2. Indivíduo que, geralmente em espetáculos teatrais, se traja com roupas do sexo oposto. 3. Homossexual (3) que se veste com roupas do sexo oposto.” Já o ato de se “travestir. [Do fr. Travestir] V. Transobj. 1. Colocar fantasia em; fantasiar: Travestiu-a de colombina. P. 2. Disfarçar-se; dissimular-se: Travestiu-se de Mendigo para desvendar um crime .

O mesmo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2004, p 1976) apresenta a

seguinte definição para transexual - “Transexual (secs). [De trans- + -sexual] Adj. 2g. S. 2g

Psiq. Diz-se de, ou individuo movido pelo transexualismo” - e para transexualismo -

“transexualismo (secs). [transexual + -ismo] S.m. Psiq. Desejo que leva o indivíduo a querer

pertencer ao sexo oposto, cujos trajes pode, até, adotar, além de esforçar-se tenazmente no

sentido de se submeter a intervenção cirúrgica visando a transformação sexual”.

Percebe-se que ainda há dificuldade para se definir transexuais e travestis,

principalmente, segundo as especificidades de identidade gênero. Travestis ainda são

inclusos/as no segmento das homossexualidades, correndo-se o risco de perder de vista as

suas particularidades. Transexuais são rotulados de adeptos do transexualismo, que é

caracterizado como um desejo permanente.

Assim como o termo homossexualismo está em desuso devido à associação com

patologias pelo emprego do sufixo “ismo” e às convenções na área de direitos humanos e

saúde, o termo transexualismo pode ser descartado do uso corrente. Esses dois termos devem

ser substituídos por homossexualidade e transexualidade, segundo já vem sendo instituído

pelo movimento LGBT. Os dicionários registram os termos homossexualismo e

transexualismo antecedidos dos termos homossexualidade e transexualidade. Encontram-se,

(36)

36 (cs). [De hom(o)- + sexual] Adj. 2g. 1. Relativo à finalidade, atração, e/ou comportamento

sexual entre indivíduo do mesmo sexo. 2. Que tem essa afinidade e esse comportamento. S.

2g. 3. Pessoa homossexual (2). [Antôn.: heterossexual.].”, e homossexualismo - “Prática do

comportamento homossexual” (p. 1055).

É interessante observar que não há o verbete heterossexualismo no Dicionário

Aurélio da Língua Portuguesa. No entanto, considerando algumas contribuições que serão

apresentadas ao longo deste trabalho, os verbetes “travesti” e “transexual” são os que mais se

aproximam das pesquisas recentes sobre o tema, assim como dos relatos destes atores sociais

no meio midiático e na militância LGBT.

Termo que atualmente, por iniciativa dos movimentos sociais, tem-se expandido para

lesbofobia e transfobia é homofobia, com o intuito de dar visibilidade aos subgrupos

existentes nos movimentos homossexuais (no plural), que também são alvos de violência no

cotidiano. Sobre a homofobia, existem pesquisas com o intuito de explicar os processos

psicológicos sobre o tema, auxiliando no construto do verbete, como os de Deschamps

(2008).

Na 2.ª edição do Dicionário de Filosofia de Abbagnano (1962), não foram

encontrados os verbetes “travesti”, “travestismo” e “transexualidade”. O que orienta para a

seguinte reflexão: Como não se tem este verbete no Dicionário de Filosofia, quando

identidade e representação da sexualidade compõem o discurso oficial? Ou essas questões não

compõem o discurso oficial? Para responder a essas questões, pode-se buscar resposta em

Durigan e Mina (2008), que relatam a tentativa histórica de excluir o tema dos livros por meio

dos movimentos higienistas no início da segunda metade do século XX.

No dicionário Básico de Filosofia, em sua 3.ª edição revista e ampliada, de Japiassú

e Marcondes (1996), não se apresentam os verbetes travesti, transexualidade e

(37)

37 registro dos verbetes “homossexual”, “travesti”, “transexual”, “homem” e “mulher”. No

entanto, paradoxalmente, constam termos utilizados pela psicologia de orientação

psicanalítica como “transferência”, “histeria” e “sexualidade”.

No Dicionário de Psicologia de Stratton (1994), encontram-se os verbetes

“transexual”, “travesti” e “homossexual”, mas não se encontra o verbete “transexualidade”.

No caso do/a travesti, há uma confusão entre o que é da ordem de gênero e da orientação

sexual. Segundo Pelúcio (2006; 2007), as travestis podem buscar por uma performance

feminina no sentido de serem passivas no coito sexual, o que leva a refletir sobre uma postura

de papéis condicionadas à heterossexualidade, mas também podem se colocar como ativas,

principalmente nas relações de prostituição, subvertendo os padrões hegemônicos, além de se

perceberem como homossexuais. Seguem as citações do referido dicionário:

TRANSEXUAL – Uma pessoa que muda de sexo – do masculino para o feminino ou do feminino para o masculino –, através de uma terapia hormonal e cirurgia. Apesar de os transexuais típicos sempre se perceberem a si próprios como sendo realmente do outro sexo, o principal aspecto do transsexualismo diz respeito à aprendizagem de um novo papel sexual. Muitos transsexuais gastam grande parte de sua vida, pelo menos vários anos, vivendo como um membro de seu sexo desejado antes de admitir o tratamento. (p. 238) [grifo meu]

TRAVESTI – Os travestis são pessoas que gostam de se vestir como membro do sexo oposto e fazem isto de modo muito elaborado. Embora o travestismo possa

estar muitas vezes associado à homossexualidade, a maioria dos travestis é

heterossexual. De um modo geral, os travestis tendem a estar contentes com seu próprio sexo e papel sexual e não experimentam problemas de identidade sexual (p. 238).

HOMOSSEXUAL – Aquele que apresenta inclinações sexuais dirigidas para outras

pessoas do mesmo sexo. O prefixo homo vem do grego que significa ‘o mesmo’ e

não do latim que significa ‘homem’. Todavia, o termo se aplica igualmente a

homens e mulheres. Ver também heterossexual. (p. 115).

O Dicionário de Psicanálise, de Roudinesco e Plon (1998), aborda a história da

homossexualidade e do transexualismo. Uma das melhores apresentações sobre a

epistemologia das palavras define basicamente o transexualismo como um “termo introduzido

Referências

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