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Diagnóstico de autismo na rede pública de ensino do DF : um estudo exploratório da situação atual

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Academic year: 2017

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Universidade

Católica de

Brasília

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM PSICOLOGIA

Mestrado

DIAGNÓSTICO DE AUTISMO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO

DO DF: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DA SITUAÇÃO ATUAL

Autora: Marga Aparecida Prestes

Orientadora: Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida

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MARGA APARECIDA PRESTES

DIAGNÓSTICO DE AUTISMO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO

DO DF: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DA SITUAÇÃOATUAL

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da

Universidade Católica de Brasília, como requisito para obtenção do Título de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida

Co-Orientadora: Drª Tânia Maria de Freitas Rossi

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7,5cm

P936d Prestes, Marga Aparecida.

Diagnóstico de autismo na rede pública de ensino do DF : um estudo exploratório da situação atual / Marga Aparecida Prestes. – 2009. 147 f. ; il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2009. Orientação: Sandra Francesca Conte de Almeida

Co-orientação: Tânia Maria de Freitas Rossi

1. Autismo. 2. Inclusão escolar. 3. Psicanálise. I. Almeida, Sandra

Francesca Conte de, orient. II. Rossi, Tânia Maria de Freitas. III. Título. CDU 159.964.2:616.896

Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.

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MARGA APARECIDA PRESTES

Dissertação de autoria de Marga Aparecida Prestes, intitulada "Diagnóstico de Autismo na Rede Pública de Ensino do DF: Um Estudo Exploratório da Situação atual", requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia, defendida e

aprovada, em 23 de março de 2009, pela banca examinadora constituída por:

Prof9 Dra. Sandra Francesca Conte de Almeida - Orientadora UCB

Universidade Católica de Brasília

Prof9 Dra. Tânia Maria Freitas Rossi - Co-Orientadora UCB - Universidade Católica de Brasília

Prof9 Dra. Cynthia Pereira de Medeiros (UFRN) Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Prof3 Dra. Divaneide Lira Lima Paixão UCB -

Universidade Católica de Brasília

Prof8 Dra. Kátia Cristina Tarouquella Rodrigues Brasil (Suplente) UCB - Universidade Católica de Brasília

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à Professora Dra. Sandra Francesca Conte de Almeida pela confiança, dedicação, paciência, coragem para enfrentar desafios, incentivo e apoio que me dedicou no decorrer da sua orientação.

À professora Dra. Tânia Maria de Freitas Rossi, pelo apoio nas discussões e sua inestimável amizade que, acreditando no meu potencial, ofereceu-me os instrumentos iniciais para que eu pudesse levar avante esse projeto de mestrado, há tanto tempo relegado sob outros planos.

À professora Dra. Cynthia Pereira de Medeiros, pela atenção e disponibilidade dedicadas e importantes sugestões dadas a este trabalho, desde o Exame de Qualificação.

À professora Dra. Erenice Carvalho, pelo carinho e apoio na realização desta dissertação.

À professora Dra. Divaneide Lira Paixão por ter aceito participar da Banca e por suas importantes observações.

Aos professores e direção do Mestrado em Psicologia e aos funcionários da UCB, pelo profissionalismo, colaboração e disponibilidade.

À CAPES, pela bolsa de estudos concedida e à SEEDF, por ter permitido a coleta dos dados da pesquisa.

À minha família, pelo carinho, apoio e incentivo para que eu continuasse a busca pelo conhecimento e pela compreensão nos momentos de ausência.

À minha amiga Eunice e sua família, por sua generosidade, acolhimento das minhas angústias, alegrias e consultoria técnica a este trabalho.

Às minhas colegas de grupo de pesquisa sobre autismo, que me proporcionaram reflexões e incentivos, amizade e apoio, neste árduo trajeto.

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RESUMO

Esta dissertação investigou os critérios usados no diagnóstico de autismo em alunos matriculados na rede pública de ensino do Distrito Federal, na categoria de condutas típicas, por meio do mapeamento dos laudos e registros clínicos oficiais. O mapeamento foi realizado por meio da análise de documentos tendo como referência os critérios do DSM IV-TR e os da CID 10 e critérios clínicos diagnósticos, sendo a psicanálise o eixo central da discussão dos resultados. Foram analisados 30 (trinta) relatórios psicopedagógicos, realizados nos períodos de 2004 a 2006, de três (3) escolas da Secretaria de Educação (SEEDF). Observou-se que o relatório psicopedagógico utilizado é padronizado, bem como o processo de avaliação diagnóstica dos alunos com suspeita de autismo. Verificou-se um maior número de alunos matriculados na escola classe especial e uma minoria na escola classe regular, sendo a idade média dos alunos de 09 anos, com predominância maior do sexo masculino. A anamnese realizada pelos profissionais, com os pais, no âmbito da pesquisa, limita-se a recuperar dados da história de vida da criança, não trazendo indicadores de localização da criança na trama discursiva parental. Nos relatórios psicopedagógicos, observa-se que a teoria predominante é de orientação cognitiva- comportamental, que presume a obtenção de dados descritivos e objetivos. Observamos que nenhum diagnóstico foi realizado no processo de atendimento à família. A grande maioria dos diagnósticos de autismo na rede é estabelecida por médicos-psiquiatras e exclui a escuta da família e do sujeito. Nesta perspectiva, a avaliação psicopedagógica perde a oportunidade de exercer plenamente a função terapêutica e de orientação aos pais e professores no processo educativo e de escolarização dos alunos. Foram solicitados exames clínicos e laboratoriais para todos os alunos investigados, sem exceção, embora a grande maioria deles apresentasse normalidade do ponto de vista orgânico. Os dados da pesquisa revelam que a maioria dos alunos utiliza farmacoterapia e que poucas crianças com autismo estão incluídas na escola regular, permitindo concluir que a inclusão é ainda uma questão de direito, mas não de fato. Recomenda-se, ao final desta pesquisa, que os profissionais responsáveis pelo diagnóstico e atendimento de alunos autistas, na rede pública de ensino, se permitam entrar em contato com as contribuições teórico-clínicas da psicanálise, pois inúmeros trabalhos têm demonstrado que os efeitos dessa clínica “não clássica” estenderam-se também às intervenções educacionais, sobretudo à educação especial e às práticas de inclusão escolar que, sob a influência da psicanálise, passaram a apostar na criação de um lugar, uma inscrição social para a criança autista, permitindo a retomada de seu desenvolvimento e de sua estruturação psíquica, supondo que um sujeito possa aí advir e encontrar no mundo um lugar para sua diferença.

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ABSTRACT

This dissertation investigated the criteria used in the diagnosis of autism of students who are enrolled in public schools of Distrito Federal, focusing on the typical conduct category, through the mapping of reports and official clinical records. The mapping was made through the analysis of documents having as a reference the criteria of DSM IV-TR and the ones of CID 10 and diagnostic clinical criteria, being psychoanalysis the core of the discussion of the results. Thirty psycho pedagogical reports from three schools of the Education Secretary (Secretaria de Educação- SEEDF) were analyzed. Such reports took place in the period of 2004 to 2006. It was observed that the psycho pedagogical report applied is standardized as well as the diagnostic evaluation process of the students under the suspicion of having autism. It was verified that among students ranging nine years old or só, a large number of them were enrolled in the special school and a minority of them in the regular school and most of them were males. The anamnesis held by the professionals with these children parents, dealt exclusively with research, and was in charge of recovering historical data of the child's life, not bringing location indicators in the parental discussion scenario. In the psycho pedagogical records, it was observed that predominant theory is the one of the behavioral-cognitive orientation, which presumes the obtaining of descriptive data and objectives. It was observed that no diagnostic was made in the process of assessing the family. The great majority of diagnostics of autism held in the public schools is established by psychiatrists and the hearing of the family and the subject are excluded. In this perspective, the psycho pedagogical evaluation loses the opportunity to plainly execute the therapeutical function and the orientation in which parents and teachers would be reported about the educational schooling process. Clinical and laboratorial exams were required without exception for all students investigated although a great majority of them presented such normality in relation to the organic system. The data researched reveals that the majority of these students make use of pharmacotherapy and that a few of them with autism are included in the regular school. This fact permits to be concluded that the inclusion of these special students in the public system is still a question of right, but not a fact. By the end of this research, it is recommendable that the professionals in charge of the diagnosis and the assessing of autistic students in public schools permit themselves to be in touch with the theoretical and clinical contributions of the psychoanalysis due to the fact that innumerous projects have demonstrated that the effects of this not classical clinic also extended educational interventions to the special education and the practice of schooling inclusion. Both of them are under the influence of the discourse and the psychoanalytical practice and began to focus on the possibility to create a place, a social identity to the autistic child, allowing the boosting of his development and his psychic structure, that is, supposing that the subject could come up with a place in the world for his difference.

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LISTA DE SIGLAS

AECE – Alunos de Escola Classe Especial AECR – Alunos de Escola Classe Regular AIP – Autismo Infantil Precoce

AP3 – Avaliação Psicanalítica de Crianças de Três Anos

CEB/CNE – Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação CID 10 – Décima Classificação Internacional de Doenças

CORDE – Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência

DF – Distrito Federal

DGD – Distúrbio Global do Desenvolvimento

DSM IV – Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders GNP – Grupo Nacional de Pesquisa

IRDI – Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação

SEDF – Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal

SEESP – Secretaria de Educação Especial do Programa de Apoio à Pesquisa em Educação Especial

TGD – Transtorno Global do Desenvolvimento TID – Transtorno Invasivo do Desenvolvimento UCB – Universidade Católica de Brasília

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LISTA DE TABELAS

Diagnóstico do autismo infantil na perspectiva psicanalítica

TABELA 1 – Desfechos Clínicos ... 123 TABELA 2 – Indicadores que tiveram capacidade de predição de risco

Psíquico... 123

Da Análise e Discussão dos Resultados: Caracterização geral dos alunos

TABELA 1 – Sexo dos alunos ... 133 TABELA 2 – Idade dos alunos ... 133 TABELA 3 – Escolarização ... 133

Encaminhamento para avaliação médica

TABELA 4 – Profissionais constantes em laudos... 145 TABELA 5 – Utilização do CID-10 e/ou DSM IV-TR como referência de

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LISTA DE ANEXOS

ANEXO I – Formulário para Coleta de Dados

ANEXO II – 31 Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil – IRDI ANEXO III – Roteiro para Avaliação Psicanalítica de Crianças de Três Anos

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO... 11

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO AO PROBLEMA DE PESQUISA E ÀS QUESTÕES INVESTIGADAS ... 18

1.1 Objetivo Geral ... 25

1.2 Objetivos Específicos ... 25

1.3 Documentos analisados ... 25

1.4 Local ... 25

1.5 Procedimentos ... 26

1.5.1 Dos Instrumentos ... 26

1.5.2 Da coleta de dados ... 26

1.5.3 Análise dos dados ... 26

CAPÍTULO II - AUTISMO: DIFERENTES PERSPECTIVAS TEÓRICAS... 27

2.1 Perspectivas Teóricas Não Psicanalíticas ... 27

2.2 Perspectivas Teóricas Psicanalíticas ... 32

CAPÍTULO III - INCLUSÃO ESCOLAR NO SISTEMA EDUCATIVO BRASILEIRO... 48

CAPÍTULO IV - DIAGNÓSTICO DO AUTISMO ... 65

4.1 Diagnóstico Do Autismo Na Perspectiva Médico-Psiquiátrica... 65

4.2 Diagnóstico Do Autismo Infantil Na Perspectiva Psicanalítica ... 84

CAPÍTULO V - ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ... 100

5.1 Primeira Etapa – Autorização para pesquisa ... 100

5.2 Segunda Etapa – Amostragem para seleção dos documentos ... 100

5.3 Terceira Etapa – Registro das Informações ... 100

5.3.1 Caracterização geral dos alunos ... 102

5.3.2 Anamnese ... 102

5.3.3 Avaliação Psicopedagógica... 110

5.3.4 Encaminhamento para Avaliação Médica ... 112

5.3.5 Investigação clínica e laboratorial/Farmacoterapia ... 113

5.3.6 Conclusão e encaminhamento ... 114

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 117

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 120

(12)

APRESENTAÇÃO

O autismo tem sido identificado como um transtorno precoce do desenvolvimento infantil afetando o desenvolvimento mental da criança por toda extensão de sua vida. Os sintomas se modificam ao longo do ciclo vital, sendo que algumas características só aparecem mais tardiamente e outras desaparecem com o tempo (FRITH, 1996).

No que tange ao diagnóstico e a uma concepção teórica que permita uma sustentação clínica, podemos dizer que o autismo ainda permanece um enigma para muitos profissionais que se ocupam de crianças autistas.

Desde 1994, o autismo integra a categoria de condutas típicas na Política Nacional de Educação Especial do MEC, elaborada pela Secretaria de Educação Especial, com a seguinte designação:

manifestações de comportamentos típicos de portadores de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atendimento educacional especializado” (MEC/SEESP, 2002, p. 14).

Dados fornecidos pela Divisão de Ensino Especial da Secretaria de Estado de Educação do DF (SEDF) indicaram, ao final de 2005, a matrícula de aproximadamente quatrocentos alunos na categoria de condutas típicas de síndrome, em espaços educacionais inclusivos ou segregados. Dentre esses, não estão claramente identificados os casos de autismo, uma vez que grande quantidade de diagnósticos está inconclusa, como verificaram E. Carvalho et al. (2003).

(13)

O presente trabalho, intitulado “Diagnóstico de Autismo na Rede Pública de Ensino do DF: Um Estudo Exploratório da Situação atual”, integra um dos subprojetos da pesquisa “Perturbações do autismo – perfil do alunado e intervenção educacional na rede pública do Distrito Federal”, aprovado pelo SEESP-PROESP e Ministério da Educação, em 2005, e desenvolvido pela Universidade Católica de Brasília, por intermédio do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental Desenvolvimento e Aprendizagem Humana. O projeto visa à construção do conhecimento acadêmico, buscando uma melhor compreensão do espectro do autismo, bem como a investigação das condições e características do atendimento educacional inclusivo dado a essa clientela no sistema público de ensino do DF.

Desse modo, realizamos um mapeamento (identificação e caracterização) dos diagnósticos de autismo, concluídos ou em andamento, classificados na categoria de condutas típicas, por meio de laudos ou registros clínicos oficiais de alunos matriculados na rede pública do ensino do DF.

Parte-se do pressuposto de que o diagnóstico de autismo, na rede, é estabelecido a partir dos critérios usados na avaliação médica-diagnóstica da CID-10, elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1993) e no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM IV-TR (APA, 1995/2004), cujos critérios são apresentados nos Quadros I e II, ao final desta seção. Acredita-se que critérios clínicos usados no diagnóstico psicológico, sobretudo de orientação psicanalítica, não constituem referência comumente utilizada na avaliação diagnóstica de autismo, na rede pública de ensino do DF.

Destarte, a pesquisa visa contribuir para investigar e identificar os critérios utilizados no processo do diagnóstico do autismo em alunos da rede pública do ensino do DF, com o objetivo de auxiliar na construção do conhecimento acadêmico acerca do autismo, produzindo uma análise crítica, baseada em parâmetros clínicos fundamentados na psicanálise, dos critérios de avaliação diagnóstica usados na rede pública de ensino do DF.

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de organismo biológico, se não houver para ele um Outro que sustente o lugar de Outro primordial e que o pilote em direção ao mundo humano, que lhe dirija os atos para além dos reflexos e, principalmente, que lhes dê sentido.

Entretanto, não basta saber se o autismo resulta de falha na relação com o Outro, nem se foi determinado genética ou psicogeneticamente neste ou naquele caso. Será preciso levar em conta que os pais que o trazem também sofrem os efeitos do significante autismo em circulação social. Mais do que isso, será preciso saber que seu filho autista terá sido objetalizado pelo discurso médico. O psicanalista, cuja ética o leva a trabalhar para a emergência do sujeito que não pode advir no autista, verá crescer a sua responsabilidade diante de todos esses obstáculos.

O diagnóstico e a intervenção precoce nos casos de autismo podem auxiliar o alcance de modalidades mais avançadas de desenvolvimento no ciclo de vida, para muitos sujeitos. Contudo, significativo contingente de pessoas encontrará apenas na escola as primeiras aproximações diagnósticas e modalidades de encaminhamentos que esclareçam as peculiaridades de desenvolvimento que as crianças apresentam.

Segundo Kupfer (2000), as particularidades de um atendimento com crianças autistas vêm sendo alvo de muitas pesquisas, a partir das contribuições da psicanálise, sobretudo no âmbito da transferência e da interpretação. Efeitos dessa clínica “não clássica” estenderam-se também às intervenções educacionais, sobretudo à educação especial e às práticas de inclusão escolar que, sob a influência do discurso e da prática psicanalítica, passaram a apostar na possibilidade de criar um lugar, uma inscrição social para a criança autista, permitindo a retomada de seu desenvolvimento e de sua estruturação psíquica, isto é, supondo que um sujeito possa aí advir e encontrar no mundo um lugar para a sua diferença.

A seguir, a apresentação da organização do trabalho em seis capítulos:

O primeiro capítulo apresenta a definição do problema da pesquisa, que é investigar e identificar os critérios do diagnóstico do autismo, na rede pública do DF, através do mapeamento dos laudos e registros clínicos oficiais de alunos matriculados na escola, na categoria de condutas típicas.

(15)

No segundo capítulo são apresentadas as diferentes abordagens teóricas sobre o autismo, com uma breve revisão de literatura sobre as diversas concepções de pesquisa no que diz respeito ao autismo: Teoria Afetiva, Teoria da Mente, Teoria Neuropsicológica e de Processamento da Informação, finalizando com a Psicanálise, que será utilizada como referencial teórico neste trabalho.

O terceiro capítulo irá tratar da inclusão escolar no sistema educativo brasileiro: uma revisão do percurso histórico do processo da inclusão escolar e sua legislação. As políticas educacionais têm apresentado a educação como uma condição básica para o desenvolvimento humano. O processo de educação formal tem percorrido diversos contextos e diferentes momentos históricos evidenciando, muitas vezes, dificuldades no que diz respeito à garantia de um ensino de qualidade para todos.

A educação inclusiva como movimento que busca corrigir uma tradição excludente trouxe como principal proposta a reestruturação escolar no aspecto arquitetônico, conceitual, curricular e de atitude para receber todas as crianças, independente de diagnósticos ou limitações destas, ou seja, não mais se espera que a criança se ajuste aos padrões escolares, mas que estes sejam remodelados de acordo com a população recebida.

No entanto, a escola tem encontrado dificuldades para se modificar e se ajustar às novas demandas advindas não só de crianças autistas, como de inúmeras outras que não se enquadram nas expectativas delineadas no universo escolar.

Assim, para que a inclusão escolar tenha efeito positivo no desenvolvimento da criança autista, é necessário que as intervenções educacionais sejam planejadas levando em consideração as necessidades e características psíquicas das crianças com autismo aliadas aos valores éticos que circulam pela escola, no desejo de ensinar dos educadores, assim como na implicação profissional de cada membro do grupo em melhorar as condições de trabalho.

No quarto capítulo, sobre o Diagnóstico do autismo, serão abordados os

diferentes critérios de diagnóstico do autismo, com as concepções teóricas que os sustentam, com ênfase no diagnóstico do autismo na perspectiva médico-psiquiátrica e psicanalítica e seus critérios norteadores de diagnóstico diferencial.

O quinto capítulo apresenta a análise e discussão dos dados e procurará

(16)

conhecimento acadêmico acerca do diagnóstico do autismo, produzindo uma análise crítica dos critérios de avaliação diagnóstica usados na rede pública de ensino do DF, baseada em parâmetros clínicos fundamentais da psicanálise.

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QUADRO 1 – CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA TRANSTORNO DO AUTISMO –

DSM IV-TR

Critérios Diagnósticos para – 299.00 Transtorno Autista

A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1), um de (2) e um de (3):

(1) comprometimento qualitativo na interação social, manifestado por, pelo menos, dois dos seguintes aspectos:

(a) comprometimento acentuado no uso de múltiplos comportamentos não-verbais, tais como contato visual direto, expressão facial, posturas corporais e gestos para regular a interação social.

(b) fracasso em desenvolver relacionamentos com seus pares apropriados ao nível de desenvolvimento.

(c) falta de tentativa espontânea de compartilhar prazer, interesses ou realizações com outras pessoas (por ex., não mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse). (d) falta de reciprocidade social ou emocional.

(2) comprometimentos qualitativos na comunicação, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos:

(a) atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada (não acompanhado por uma tentativa de compensar através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímica).

(b) em indivíduos com fala adequada, acentuado prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma conversação.

(c) uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem idiossincrática.

(d) falta de jogos ou brincadeiras de imitação social variados e espontâneos apropriados ao nível de desenvolvimento.

(3) padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos:

(a) preocupação insistente com um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse, anormais em intensidade ou foco.

(b) adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos e não-funcionais.

(c) maneirismos motores estereotipados e repetitivos (por ex., agitar ou torcer mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o corpo).

(d) preocupação persistente com partes de objetos.

B. Atrasos ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas,

com início antes dos 3 anos de idade: (1) interação social, (2) linguagem para fins de comunicação social, ou (3) jogos imaginativos ou simbólicos.

C. A perturbação não é melhor explicada por Transtorno de Rett ou Transtorno Desintegrativo da Infância.

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QUADRO 2 - CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO DO AUTISMO (CID-10) (OMS 1993)

Pelo menos 8 dos 16 itens especificados devem ser satisfeitos.

A . LESÃO MARCANTE NA INTERAÇÃO SOCIAL RECÍPROCA, MANIFESTADA POR PELO MENOS TRÊS DOS PRÓXIMOS CINCO ITENS:

1.dificuldade em usar adequadamente o contato ocular, expressão facial, gestos e postura corporal para lidar com a interação social.

2. dificuldade no desenvolvimento de relações de companheirismo.

3. raramente procura conforto ou afeição em outras pessoas em tempos de tensão ou ansiedade, e/ou oferece conforto ou afeição a outras pessoas que apresentem ansiedade ou infelicidade.

4. ausência de compartilhamento de satisfação com relação a ter prazer com a felicidade de outras pessoas e/ou de procura espontânea em compartilhar suas próprias satisfações através de envolvimento com outras pessoas.

5. falta de reciprocidade social e emocional.

B. MARCANTE LESÃO NA COMUNICAÇÃO MANIFESTADO POR PELO MENOS TRÊS DOS ITENS SEGUINTES:

1. ausência de uso social de quaisquer habilidades de linguagem existentes. 2. diminuição de ações imaginativas e de imitação social.

3. pouca sincronia e ausência de reciprocidade em diálogos.

4. pouca flexibilidade na expressão de linguagem e relativa falta de criatividade e imaginação em processos mentais.

5. ausência de resposta emocional a ações verbais e não-verbais de outras pessoas. 6. pouca utilização das variações na cadência ou ênfase para refletir a modulação

comunicativa.

7. ausência de gestos para enfatizar ou facilitar a compreensão na comunicação oral.

C. PADRÕES RESTRITOS, REPETITIVOS E ESTEREOTIPADOS DE

COMPORTAMENTO, INTERESSES E ATIVIDADES, MANIFESTADOS POR PELO MENOS DOIS DOS PRÓXIMOS SEIS ITENS:

1. obsessão por padrões estereotipados e restritos de interesse. 2. apego específico a objetos incomuns.

3. fidelidade aparentemente compulsiva a rotinas ou rituais não funcionais específicos. 4. hábitos motores esterotipados e repetitivos.

5. obsessão por elementos não funcionais ou objetos parciais do material de recreação. 6. ansiedade com relação a mudanças em pequenos detalhes não funcionais do

ambiente.

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CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO AO PROBLEMA DE PESQUISA E ÀS QUESTÕES INVESTIGADAS

O conceito de autismo sofreu várias reformulações ao longo do tempo e, simultaneamente, seu diagnóstico tem variado a partir da busca de uma maior elaboração conceitual, devido ao significativo aumento de pesquisas na área.

A primeira descrição do autismo infantil, realizada por Kanner (1943), referia-se a um quadro bastante uniforme, de características envolvendo basicamente um desligamento das relações humanas, uma falha no uso da linguagem para a comunicação, a manutenção de uma rotina, fascinação por objetos e presença de boas potencialidades cognitivas. Posteriormente, ele reviu sua definição, restringindo-a ao auto-isolamento e à insistência na preservação da rotina (EISENBERG; KANNER, 1956).

Segundo Lampreia (2003), atualmente o termo autismo costuma ser usado para se referir a um espectro de síndromes com características em comum, sendo designado por várias terminologias: Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, de acordo com o DSM IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders); ou Transtornos Globais do Desenvolvimento, de acordo com o DSM IV-TR; ou ainda transtorno do Espectro Autista, conforme vários autores na literatura, como Filipek

et al. (1999), ou a uma dessas síndromes – transtorno Autista, conforme o DSM IV ou Autismo de Kanner, como mencionado em Wing (1985).

Além disso, o próprio transtorno Autista abrange um spectrum muito

heterogêneo de quadros comportamentais. Algumas crianças apresentam uma história de desvio do desenvolvimento desde os primeiros dias ou meses de vida, enquanto outras somente após um ou dois anos de suposta normalidade. Algumas falam, outras são mudas. Algumas apresentam retardo mental, outras não. O quadro é, portanto, bastante heterogêneo.

(20)

1968, se referiam apenas à esquizofrenia do tipo infantil. Foram Rutther e Schopler (1978) que, através de uma vasta revisão da literatura, propuseram que o autismo fosse concebido como um transtorno de desenvolvimento, diagnosticado através da tríade de prejuízos que prevalece até os dias atuais: interação social, comunicação, padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades.

O diagnóstico do autismo conta atualmente com dois instrumentos “oficiais”: a CID 10, elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1993) e o DSM IV, da Associação Norte-Americana de Psiquiatria (APA, 1995/2004).

A discussão sobre o autismo, segundo Kupfer (2001), ainda mantém vivo o histórico acerca da etiologia psicogênica ou organogênica, a despeito das tentativas de superá-lo. Além disso, há divergências acerca da definição do diagnóstico, repartindo o campo entre psiquiatras, neurologistas, psicólogos e psicanalistas, para citar somente estes. Poderíamos apontar que grande parte dessas controvérsias se deve ao fato de se ter por base uma descrição fenomenológica, na qual, apresentando-se este ou aquele comportamento, o diagnóstico é estabelecido. Esse diagnóstico fenomenológico faz com que as taxas de prevalência para o autismo infantil oscilem drasticamente, indo de 1 até 20 em cada 10.000 crianças (MARQUES, 2000).

Segundo Trouvé (2007), o debate a respeito do autismo permanece polêmico. Em primeiro lugar, o estado do nosso conhecimento sobre o funcionamento do psiquismo humano ainda é muito incompleto, e o caráter das teorias que tentam dar conta dele é, por enquanto, extremamente heterogêneo. Em segundo lugar, a própria palavra autismogera problemas, por três razões:

• existem diferentes graus de gravidade, desde a colocação em jogo de

manobras do tipo autístico transitórias, parciais e reversíveis, até evoluções as mais severas, mais raras, mais terríveis, já que os sofrimentos que elas representam para o paciente e seu entorno parecem sem limites;

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reencontrados a posteriori, parecia muito mais próximo do normal. Esta forma secundária seria nitidamente majoritária, e, portanto, o mais freqüente é que a posteriori sinais insidiosos, leves, borrados por outras preocupações, aparecem como sinais de alerta negligenciados;

• fica difícil separar clinicamente o autismo, ou, em todo caso, certos autismos, do grupo mais polimorfo das psicoses infantis, dado que as relações entre essas duas entidades são complexas, tanto em termos dos sintomas quanto da evolução, sem contar com os sintomas autísticos que se imbricam com uma série de outros transtornos neurológicos e sensoriais (TROUVÉ, 2007).

Bosa e Callias (2000) relatam que a comparação das diferentes abordagens psicológicas do autismo infantil obriga que estipulemos critérios bastante gerais na caracterização dessas crianças.

Atualmente, os estudos sobre o diagnóstico do autismo, tanto na área médica quanto na psicanálise, apesar das diversas e conflitantes teorias (CAVALCANTI; ROCHA, 2001), apontam para uma necessidade de compreender a síndrome de Kanner para além do determinismo orgânico na qual está inserida, a exemplo da padronização dos critérios utilizados no Manual de Diagnóstico e Estatístico DSM-IV TR (APA, 1995/2004), visando romper com a visão única e excludente de um tratamento apenas medicamentoso e psicopedagógico.

De acordo com as últimas classificações psiquiátricas como o DSM-IV (1995/2004) e a CID-10 (1993), pode-se fazer um diagnóstico precoce de autismo logo nos primeiros meses de vida, desde que certo número de critérios fenomenológicos seja preenchido. Kupfer (1996) relata que o diagnóstico precoce de autismo, se fornecido aos pais nas primeiras consultas, muitas vezes pode levar a família a um movimento de fuga do tratamento precoce, que é o mais importante para a obtenção de melhores resultados clínicos.

(22)

estruturação do sujeito na infância. No primeiro grupo encontram-se teóricos que se opõem radicalmente a qualquer especificidade do sujeito enquanto criança.

Posicionamo-nos no segundo grupo descrito pela autora, sustentando uma especificidade do sujeito infante. Autores como Soler e Miller (apud BERNARDINO, 2006), apesar de compartilharem com a posição estruturalista, deixam depreender de alguns de seus textos que há uma interferência do desenvolvimento em relação à palavra da criança e a seu modo de gestão de gozo.

O diagnóstico psicanalítico vem com o tempo e é feito sob transferência considerando o modo que a interdição vige no sujeito. Por isso, houve um consenso no último Congresso mundial de autismo de que só a partir dos três anos pode-se fazer um diagnóstico definitivo, de acordo com comunicação oral de Laznik (curso

ministrado no Sedes Sapientiae, em São Paulo, em agosto de 2005). Até essa

idade, podemos apontar apenas casos de suspeição. Porém, já se deve instituir o tratamento mesmo antes do diagnóstico definitivo, visando aos melhores resultados clínicos. De toda forma, se essas crianças não forem autistas, já apresentam um laço frágil com seu agente maternante, que tem riscos de não dar conta de sustentar uma subjetividade a se constituir para elas.

Assim, já que existem indicadores de risco para um futuro diagnóstico do autismo infantil, é possível desenvolver também intervenções que dêem conta destas dificuldades iniciais nestas crianças.

Para Mariotto (2007), considerando que as bases da saúde mental se estabelecem nos primeiros anos de vida e que estão intimamente relacionados com os laços afetivos, simbólico e corporal estabelecidos no par mãe e bebê, entende-se que falhas nesse processo de subjetivação permitem o surgimento de transtornos psíquicos que podem intervir tanto na inserção desse ser na cultura quanto na montagem de sua realidade psíquica. Para especialistas na área de saúde mental, a intervenção precoce pode diminuir ou mesmo eliminar o risco de instalação de distúrbios psíquicos.

A partir dos avanços produzidos por pesquisas que indicam a possibilidade de diagnóstico precoce de patologias psíquicas graves tais como atestam Laznik-Penot (1999) e Baron-Cohen, Allen e Gillberg (1992), é possível confirmar o valor preditivo de sinais precoces de risco para o desenvolvimento infantil.

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iniciaram uma pesquisa para a avaliação de Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil (IRDIs). O pressuposto é que esses indicadores clínicos (IRDIs) podem ser empregados por pediatras e por outros profissionais de saúde de atenção básica em consultas regulares e podem ser úteis para indicar a possibilidade de ocorrerem ulteriormente transtornos psíquicos do desenvolvimento infantil.

Em 2008, Kupfer et al. apresentam e discutem a metodologia e os resultados finais da pesquisa acerca da validação de 31 Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil, observáveis nos primeiros 18 meses de vida da criança, cujos resultados serão apresentados no Capítulo IV deste trabalho, ao discutirmos o diagnóstico do autismo na perspectiva psicanalítica.

Mariotto (2007), em sua tese de doutorado (IPUSP) intitulada “Cuidar, Educar e Prevenir – as funções da creche no desenvolvimento e na subjetivação de bebês”, desenvolveu uma pesquisa com base na interlocução entre psicanálise e educação, utilizando os Indicadores de Risco do desenvolvimento (IRDIs) em duas creches da cidade de Curitiba-PR.

A pretensão do trabalho acadêmico de Mariotto (2007) foi contribuir para a intersecção entre a psicanálise e a creche. Neste sentido, o espaço da creche tem-se aberto para um possível trabalho com bebês, tanto no âmbito clínico quanto no que se refere à detecção e prevenção de riscos psíquicos precoces.

Almeida (2001) coloca que as possibilidades e limites da relação entre a psicanálise e educação constituíram-se, desde há um bom tempo, em um eixo de investigação e de produção de conhecimento. Segundo a autora,

não se trata, obviamente de aplicar a psicanálise ao campo social, mas de utilizar o saber oriundo da teoria e da experiência psicanalítica para construir algumas observações e hipóteses em torno de algumas questões fundamentais do campo educativo, visando produzir novos conhecimentos sobre este campo, especialmente sobre as posições subjetivas do aluno e do professor frente ao objeto de conhecimento e sua mediação (ALMEIDA, 2001, p. 2).

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funcionamento e reconhecimento do sujeito dentro de uma comunidade. Essa inserção delimita o que se pode ou não fazer socialmente, está implicada com a sustentação do mínimo de ser sujeito que nela possa ter emergido. Em função dessas possibilidades, a inclusão do autista na instituição escolar se revela contribuição fundamental para todos aqueles que se dedicam ao estudo do desenvolvimento da pessoa com autismo.

Para que a inclusão escolar tenha efeito positivo no desenvolvimento da criança autista, é necessário que as intervenções educacionais sejam planejadas levando em consideração as necessidades e características psíquicas das crianças com autismo. Torna-se fundamental, então, para que a inclusão escolar possa de fato acontecer, que as ações e intervenções educativas e pedagógicas se apóiem em um diagnóstico diferencial que as norteie, aliadas à sensibilidade educativa do professor.

Nessa perspectiva, a pesquisa busca investigar e identificar critérios utilizados no processo do diagnóstico de autismo em alunos da rede pública do ensino do DF. A teoria psicanalítica orientou a leitura e análise do material pesquisado e a pesquisa documental foi o recurso metodológico utilizado, tendo por objetivo, então, auxiliar na construção do conhecimento acadêmico, acerca do diagnóstico de autismo, com parâmetros clínicos, de modo a promover o atendimento educacional e nortear as intervenções com os alunos com diagnóstico de autismo.

O mapeamento, a identificação e a caracterização do diagnóstico de autismo dos alunos, matriculados na categoria de condutas típicas na rede pública do ensino do DF; serão realizados por meio de análise de documentos, laudos ou registros oficiais, tendo como referência os critérios do DSM IV-TR (APA, 1995/2004) e os da CID-10 (OMS, 1993). Critérios clínicos diagnósticos, pensados a partir da psicanálise, constituirão o eixo central da discussão a ser realizada. Para tanto, será utilizada a pesquisa documental.

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O desenvolvimento da pesquisa documental segue os mesmos passos da pesquisa bibliográfica. Apenas cabe considerar que enquanto na pesquisa bibliográfica as fontes são constituídas, sobretudo, por material impresso localizado nas bibliotecas, na pesquisa documental as fontes são muito mais diversificadas e dispersas. Há, de um lado, os documentos “de primeira mão”, que não receberam nenhum tratamento analítico, como já explicado acima. Nesta categoria estão os documentos conservados em arquivos de órgãos públicos e de instituições privadas, tais como associações científicas, igrejas, sindicatos e entidades educacionais. Incluem-se aqui inúmeros outros documentos como cartas pessoais, diários, fotografias, gravações, ofícios, memórias e boletins. De outro lado, há os documentos de segunda mão, que de alguma forma já foram analisados, tais como: relatórios de pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, entre outros.

A pesquisa documental apresenta uma série de vantagens. Primeiro, há que se considerar que os documentos constituem fonte rica e estável de dados. Como os documentos subsistem ao longo do tempo, tornam-se a mais importante fonte de dados em qualquer pesquisa de natureza histórica.

Outra vantagem da pesquisa documental está em seu custo. Como a análise dos documentos, em muitos casos, além da capacidade do pesquisador, exige apenas disponibilidade de tempo, o custo da pesquisa torna-se significativamente baixo, quando comparado com o de outras pesquisas. Outra vantagem da pesquisa documental é não exigir contato com os sujeitos da pesquisa (GIL, 1994).

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problema ou então, hipóteses que conduzem a uma verificação por outros meios de pesquisa.

O foco da presente pesquisa será, então, investigar e identificar, através dos documentos, os instrumentos utilizados e os critérios de avaliação realizados para o diagnóstico do autismo dos alunos da rede pública do ensino do DF.

1.1 Objetivo Geral

Investigar e identificar os critérios usados no diagnóstico de autismo, por meio do mapeamento dos laudos e registros clínicos oficiais, em alunos matriculados na rede pública de ensino do DF, na categoria de condutas típicas.

1.2 Objetivos Específicos

- Verificar, por meio do mapeamento, quais são os critérios usados no processo de diagnóstico do autismo dos alunos matriculados na categoria de condutas típicas;

- Analisar criticamente os dados encontrados, tendo como referência critérios clínicos de diagnóstico formulados a partir das perspectivas médico-psiquiátrica e psicanalítica;

- Contribuir na construção de um pensamento crítico-reflexivo que leve em conta a constituição subjetiva do sujeito no diagnóstico e atendimento de alunos com autismo.

1.3 Documentos analisados

Foram escolhidos trinta (30) relatórios psicopedagógicos dos alunos da rede pública do ensino do DF, classificados na categoria de condutas típicas, dos sexos feminino e masculino com diagnóstico de autismo, selecionados através da listagem fornecida pela Secretaria de Educação.

1.4 Local

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1.5 Procedimentos

Em um primeiro momento foi realizado o contato com a direção das escolas, com a intenção de solicitar a autorização para a coleta de dados prevista pela pesquisa.

Nesse pedido de autorização foi esclarecido que o nome da escola e a identidade dos alunos seriam preservados. Também foi explicado como o trabalho iria ser realizado (objetivos, método, etc.).

1.5.1 Dos instrumentos

Para investigar o diagnóstico dos alunos na categoria de condutas típicas, foi construído um formulário (Anexo 1) para transcrever as informações contidas nos laudos, uma vez que a Secretaria de Educação do DF não permite que esses documentos sejam retirados da escola.

1.5.2 Da coleta de dados

Primeiramente, foi feita a identificação dos alunos matriculados e classificados na categoria de condutas típicas. Feito esse levantamento, foram coletados os documentos relativos ao diagnóstico desses alunos, quais sejam, laudos ou registros clínicos oficiais, com diagnóstico de autismo.

1.5.3Da análise dos dados

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CAPÍTULO II - AUTISMO: DIFERENTES PERSPECTIVAS TEÓRICAS

Este capítulo tem como objetivo apresentar uma breve revisão de literatura sobre as principais teorias acerca do autismo, dando ênfase às teorias psicanalíticas, que serão utilizadas como referencial teórico no atendimento ou diagnóstico de autismo.

Bosa e Callias (2000) realizaram uma excelente revisão de literatura sobre as principais abordagens no estudo do autismo e é com base em seu artigo que as mesmas são apresentadas a seguir:1

2.1 Perspectivas teóricas não psicanalíticas:

Teorias Afetivas

A tese proposta por Kanner (1943/1997), de que crianças com autismo sofreriam de uma inabilidade inata de se relacionarem emocionalmente com outras pessoas, foi retomada e estendida por vários autores (PENNINGTON, 1998; HOBSON, 1986; BARON-COHEN, 1988). Conforme Bosa e Callias (2000), a teoria afetiva sugere que o autismo se origina de uma disfunção primária do sistema afetivo, demonstrando uma inabilidade inata básica para interagir emocionalmente com os outros, o que levaria a uma falha no reconhecimento de estados mentais e a um prejuízo na habilidade para abstrair e simbolizar. Os déficits no reconhecimento da emoção e na habilidade de utilizar a linguagem de acordo com o contexto social, seriam, então, conseqüências da disfunção afetiva básica, a qual impediria a criança de viver a experiência social intersubjetiva.

Uma outra teoria afetiva (MUNDY; SIGMAN, 1989) enfatiza, tal qual Kanner (1943/1997) e Hobson (1986) o fizeram, as possíveis bases biológicas da síndrome do autismo: “Num sentido muito real, o modelo que aqui apresentamos brevemente está de acordo com a hipótese original de Kanner” (p. 16). Entretanto, de forma diversa desse último, não postula uma primazia de um sistema (afetivo) sobre o outro (cognitivo) e sim, chama a atenção para o papel de ambos no desenvolvimento social infantil. Para as autoras, o comportamento de “atenção compartilhada” (isto é, a capacidade de dividir a experiência com objetos/eventos com o parceiro) ilustra o

1 Todos os autores citados ao longo do item “Perspectivas teóricas não psicanalíticas” são referenciados em Bosa

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processo integrado de fatores afetivos e cognitivos, uma posição já defendida por Hermelin e O’Connor (1970) ao nomearem tal processo de sistema lógico-afetivo.

Teoria da Mente

Bosa e Callias (2000) apontam que os pioneiros no estudo do desenvolvimento da teoria da mente foram Winner e Penner (1983). Suas pesquisas foram realizadas com crianças normais.

Para as autoras, a teoria da mente significa a capacidade para atribuir estados mentais a outras pessoas e predizer o comportamento das mesmas em função destas atribuições (PREMACK; WOODRUFF, 1978). De acordo com esses autores o termo “teoria” foi empregado porque esse processo envolve um sistema de inferências sobre estados que não são diretamente observáveis e que podem ser usadas para predizer o comportamento de outros.

Já para Winner e Penner (1983), inicialmente essa habilidade seria inata, mas o desenvolvimento seria aprendido mediado pela interação com os cuidadores e outras pessoas, através das informações do senso comum oportunizado pela cultura.

Harris (1994) e Wellman (1994) afirmam que para esses teóricos, a teoria da mente operante se refletiria na capacidade da criança em atribuir, a si própria ou a outrem, estados mentais como desejos, crenças e intenções – habilidades já presentes ao redor dos três anos de idade. Nessa época, a criança estaria apta a distinguir estados mentais de físicos, bem como aparência (e “faz-de-conta”) de realidade. Em princípio, a criança faria comentários a respeito dos seus próprios estados mentais para depois comentar a respeito do de outras pessoas e, dessa forma, predizer o comportamento das mesmas. Então, pode-se dizer que o conceito subjacente ao desenvolvimento da teoria da mente é o da representação-expressão de um objeto ou evento através de categorias alheias a esses mesmos objetos/eventos.

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No primeiro ano de vida ocorreriam as representações de nível primário, caracterizadas pela percepção do objeto de forma sensorial. Esse período corresponde ao estágio sensório-motor de Piaget (1966) e ao de representação primária-perceptual de Leslie (1987).

No segundo ano de vida, a criança evolui para um estágio – representação secundária para Penner (1991) – no qual passa a diferenciar o real do faz-de-conta, não necessitando mais da presença do objeto para representá-lo. Para Piaget (1966) corresponderia ao início da capacidade simbólica e para Leslie (1987) meta-representação, isto é, a representação de uma percepção não seria mais uma representação do mundo de uma forma direta (transparente), mas representação da representação (meta-representação).

Portanto, ao dividir as construções de situações imaginárias com as outras, isto é, ao compreender o “faz-de-conta” nas outras, estabelece-se uma forma elementar de compreender o estado mental das outras (nas crenças, desejos e intenções) os rudimentos de uma teoria da mente.

Em Dennett (1978), o desenvolvimento de uma teoria da mente envolveria, então, não apenas uma representação interna a respeito das coisas mas também a capacidade de refletir sobre essas representações.

Happé (1994) indica que esta Teoria procurou identificar os déficits fundamentais responsáveis pelos déficits sociais no autismo, como a falha no mecanismo mental de “metacognição”, aquele que coordena o “pensar acerca do pensamento”.

Tal como postula a definição, em termos gerais, a teoria da mente traduz-se na capacidade que o indivíduo possui de compreender os estados mentais dos outros, incluindo pensamentos, desejos e crenças e que funciona como instrumento precioso, permitindo a compreensão e predição do comportamento dos outros.

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Teorias Neuropsicológicas e de Processamento da Informação

Para Bosa e Callias (2000), os estudos atuais a respeito do déficit cognitivo em autismo inspiraram-se no trabalho pioneiro de Hermelin e O’Connor (1970), que foram os primeiros a testarem, cientificamente, como as crianças autistas processavam a informação sensorial na resolução de testes de habilidades de memória e motoras. Eles concluíram que essas crianças mostravam déficits cognitivos específicos, tais como: problemas na percepção de ordem e significado, os quais não poderiam ser explicados por deficiência mental; dificuldades em usar

input sensorial interno para fazer discriminações na ausência de feedback de

respostas motoras; e tendência a armazenar a informação visual, utilizando um código visual, enquanto as crianças com desenvolvimento normal usavam códigos verbais e/ou auditivos. Particularmente surpreendentes foram as respostas dessas crianças aos estímulos auditivos – a intensa resposta fisiológica a sons contrastava com a passividade geralmente demonstrada por essas crianças em situações envolvendo tais estímulos.

Segundo Bosa e Callias (2000), resultados semelhantes foram descritos em outros estudos e teorias a respeito dos déficits perceptivos em crianças com autismo os quais, apesar de adotarem diferentes terminologias e interpretações, descreveram o mesmo fenômeno: a resposta atípica de crianças autistas a estímulos sociais e não-sociais. Alguns exemplos desses conceitos são: hiperseletividade sensorial (SCHREIBMAN; LOVAAS, 1974); otimização da

estimulação sensorial (HUTT; HUTT, 1968; ZENTALL; ZENTALL, 1983); input

sensorial e modulação da atenção (ORNITZ; RITVO, 1976).

Função Executiva

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autismo: inflexibilidade, perseveração, primazia do detalhe e dificuldade de inibição de respostas. Essas características foram subseqüentemente comprovadas pelos resultados do desempenho de indivíduos com autismo em testes destinados a medir funções executivas, como por exemplo, o Wisconsin Card Sorting Test (HEATON, 1981). Entretanto, uma das limitações desses testes é que eles não possibilitam a decomposição de funções cognitivas complexas em unidades elementares, o que permitiria a identificação de comprometimento em funções específicas e a investigação da associação entre essas funções e diferentes patologias (OZONOFF; PENNINGTON; ROGERS, 1991).

Hughes e Russell (1993) demonstraram que crianças autistas, comparadas às do grupo de controle, apresentaram um déficit maior na capacidade de planejamento para atingir uma meta. Eles utilizaram um experimento no qual a criança deveria aprender a obter bolinhas de gude de dentro de uma caixa, utilizando-se de uma entre duas diferentes estratégias. As crianças com autismo falharam em aprender a forma correta para obter esse fim, demonstrando maior insistência na estratégia incorreta. Do mesmo modo, McEvoy, Rogers e Pennington (1993) demonstraram que o grupo de crianças pré-escolares com autismo, comparado aos grupos de controle, apresentou a mesma tendência de perseveração na estratégia incorreta em uma tarefa de reversão espacial. Além disso, a performance nesta tarefa correlacionou-se com a habilidade no comportamento de atenção compartilhada, isto é, a capacidade de dirigir a atenção do parceiro para um objeto ou evento de interesse, espontaneamente. Isso sugere que tal habilidade pode estar relacionada à maturação dos lobos frontais, e que ambas as habilidades desenvolvem-se no mesmo período, isto é, no segundo semestre de vida do bebê.

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outros dois grupos, reforçando a noção de disfunção executiva na síndrome do autismo.

Coerência Central

Diferenças no sistema de processamento da informação em crianças com autismo é também a base de outra recente teoria em autismo (FRITH, 1989). A falta da tendência natural em juntar partes de informações para formar um ‘todo’ provido de significado (coerência central) é uma das características mais marcantes no autismo. O interessante dessa teoria é que busca explicar não somente os déficits, como também as habilidades que podem estar não somente preservadas, mas inclusive mostrarem-se superiores em indivíduos com autismo, estas últimas recebendo menor atenção na literatura.

A tendência em ver partes, ao invés de uma figura inteira, e em preferir uma seqüência randômica, ao invés de uma provida de significado (contexto), pode explicar a performance superior de crianças com autismo: a) nas escalas de Weshler que envolvem reunião e classificação de imagens por séries, em especial no subteste de Cubos (HAPPÉ, 1994); b) nas tarefas de localização de figuras ocultas (SHAH; FRITH, 1993); e c) nas tarefas de memorização de uma série de palavras sem-sentido ao invés daquelas com significado, comparadas aos grupos de controle (HERMELIN; O’CONNOR, 1970). Evidentemente, há semelhanças entre essa teoria e a de disfunção executiva. Porém, a teoria da coerência central prediz comprometimento somente naquelas funções executivas que estão associadas à integração de um estímulo dentro de um contexto.

2.2 Perspectivas Teóricas Psicanalíticas

Existem diferentes postulados teóricos no campo da psicanálise, que se propõe a explicar o autismo.

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esquizofrenias, o pensamento autístico, que se poderia tratar os esquizofrênicos, utilizando a psicoterapia psicanalítica.

O interesse pelo artigo inaugural de Kanner (1943/1997) sobre o “Distúrbio Autístico de Contato Afetivo” que, no ano seguinte, em novo artigo, o autor passa a denominar “Autismo Infantil Precoce”, não se limita apenas ao seu valor histórico de descrição de uma nova síndrome, mas rompe com a tradição da psiquiatria infantil que procurava na criança o equivalente aos quadros de adultos. O trabalho de Kanner foi qualificado como científico e o “autismo infantil precoce” aparece nos manuais de psiquiatria, desde a década de 1940.

Segue-se, então, um estudo sobre a evolução do pensamento e do tratamento psicanalítico a respeito do autismo onde podem se encontrar divergências de opiniões sobre a questão da interpretação, da transferência e da contratransferência e da importância do uso das palavras pelo analista.

A interpretação, instrumental primordial da técnica psicanalítica, sempre esteve no cerne da experiência clínica e foi Melaine Klein (1930/1981) que reforçou seu uso em relação ao tratamento psicanalítico das crianças autistas desde a descrição de seu ilustre caso “Dick”, uma criança que não brincava e não demonstrava nenhum afeto.

Segundo Klein os obstáculos fundamentais para o começo da análise de Dick foram a falta de interesse pelo ambiente, a ausência de relação afetiva com a analista, a inexistência de relação simbólica com os brinquedos e a incapacidade de expressar sentimentos. Sendo assim, a analista precisou adaptar a técnica psicanalítica clássica, tal como era utilizada com as demais crianças. As interpretações foram inicialmente usadas para criar a relação analítica e não para analisar as associações livres que no caso, eram inexistentes.

Para tanto, Klein se justifica quando modifica na técnica habitual de só interpretar os dados que já tenham sido expressados pela paciente através de várias representações. Com Dick, já que sua capacidade de expressão por meio de representações quase não existia, Klein antecipou simbolicamente o pequeno Dick ao propor interpretações apressadas, trazendo material simbólico antes mesmo que a criança mostrasse o “caminho”.

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Margaret Mahler (1968 apud CAVALCANTI; ROCHA, 2002), por sua vez, identificou diferentes fases no processo do desenvolvimento psicológico normal do bebê. Mahler descreveu o desenvolvimento normal em três fases distintas: autismo primário normal, simbiose e separação/individuação. Para descrever o autismo primário normal, que se entenderia do nascimento até os três meses de vida, tomou de Freud a metáfora do “ovo de pássaro” empregado para ilustrar um tipo de funcionamento psíquico em que o bebê, como o embrião das aves, satisfaz suas necessidades de modo autístico, ou seja, sem levar em conta os cuidados maternos, sem perceber a existência de uma realidade externa, vivendo de forma completamente auto-suficiente.

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Entendido como regressão a uma fase inicial do desenvolvimento, o autismo foi descrito à luz da metáfora do ovo como um estado de fechamento, indiferenciação, auto-suficiência, sem objeto, sem linguagem e impermeável a qualquer contato com o mundo externo. Seria, pois, uma resposta à falha da capacidade perceptual integradora do ego que, ao retirar drasticamente a libido do mundo externo, desenvolve mecanismos de desumanização e desvitalização transformando os objetos em meros autômatos.

Mahler (1968 apud BOSA; CALLIAS, 2000) desenvolveu sua idéia sobre o autismo infantil a partir de sua teoria evolutiva, explicando como sendo um subgrupo das psicoses infantis e uma regressão ou fixação a uma fase inicial do desenvolvimento de não diferenciação perceptiva, na qual os sintomas que mais se destacam são as dificuldades em integrar sensações vindas do mundo externo e interno, e em perceber a mãe na qualidade de representante do mundo exterior.

Posição semelhante foi desenvolvida por Tustin (1981) que também reconhecia uma fase autista normal no desenvolvimento infantil, sendo a diferença entre esta e o autismo (o patológico), uma questão de grau. Para ela, o autismo seria uma reação traumática à experiência de separação materna, que envolveria o predomínio de sensações desorganizadas, levando a um colapso depressivo.

Entretanto, Cavalcanti e Rocha (2001) lembram que Tustin no artigo “A perpetuação de um erro”, abriu mão da idéia de uma fase de autismo primário normal e do conceito de autismo patológico como uma fixação ou regressão a essa fase para enfatizar o caráter adesivo da patologia autística, aproximando-se do pensamento de E. Bick, D. Metzer e D. Anzieu.

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maturativas que encaminhem o seu desenvolvimento psíquico. A criança autista fica presa nessa forma de agir “desmantelada”, onde o ego reduzido a qualidades sensoriais, vagueia sem possibilidades de aprender o objeto em seu aspecto geral. Esse mecanismo de desmantelamento impede a constituição dos espaços internos dos objetos e do próprio self da criança, o que compromete os processos psíquicos de introjeção e de projeção. Essa suspensão da vida mental através do desmantelamento acarreta segundo Meltzer (1975), uma descontinuidade dos acontecimentos vivenciados pela criança.

O estado pós-autístico seria uma seqüela resultante dos episódios autísticos, sendo tanto mais grave quanto mais freqüente for o uso do mecanismo de desmantelamento pela criança. No estado pós-autístico há um tipo particular de identificação descrito por Meltzer como identificação adesiva. Portanto, Meltzer (1975) trabalha com a idéia de que no autismo propriamente dito houve uma falha na função contensora e o ego se desmantelou.

Para Cavalcanti e Rocha (2001), mesmo tentando desconstruir algumas metáforas usadas por alguns autores para significar o autismo (metáfora do “ovo de pássaro”, de MAHLER, da “fortaleza vazia” de BETTELHEIM), Meltzer não escapou da tendência de definir o autismo “como deficiência, como ausência de linguagem e comunicação” (p. 93).

No livro “Pensando sobre crianças”, publicado no Brasil em 1997, estão reunidos alguns dos artigos de Winnicott sobre o autismo e a esquizofrenia infantil, escritos em 1966. Nestes textos, o autismo, para Winnicott, não figura como uma doença, mas como um problema do próprio desenvolvimento humano, na constituição do psiquismo. O autor centra nas relações criativas que o sujeito estabelece com o mundo. Relações estas que são possibilitadas pela maternagem, ou seja, para Winnicott é a mãe que torna possível a experiência da existência desde os primeiros encontros onde se identifica com seu bebê e se adapta à suas necessidades. A mãe é essencial para a compreensão da teoria do desenvolvimento emocional e psíquico de Winnicott (1958/2000), pois ela é o primeiro e essencial ambiente no qual o bebê vai se constituir como sujeito.

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excesso dessas reações por parte do bebê chega a ameaçar o sentimento de continuar a existir, na forma de uma ameaça de aniquilação, que é a mais primitiva das angústias que podem acometer o homem, uma angústia impensável que age como um perigo contra sua própria existência.

Para que o bebê possa evoluir de maneira favorável de um primeiro momento de completa dependência sobre o outro para sua independência, certas condições se tornam necessárias. É preciso um ambiente “suficientemente bom” que inclua a adaptação da mãe às necessidades de seu bebê. A mãe, através de seus cuidados, vai conseguir estabelecer um sentimento de self e de continuidade de ser.

Quando a mãe não atravessa este estado de preocupação materna primária ela se torna incapaz de estabelecer uma empatia com seu bebê e, portanto, não poderá se oferecer como uma espécie de suporte egóico. É como se o bebê fosse deixado por conta própria, sem nada que o amparasse, como se estivesse caindo. Essa “queda” seria o oposto do que Winnicott (1958/2000) propõe como “holding”. Esse conceito envolve todas as particularidades do cuidado materno que antecedem e advêm depois do nascimento do bebê, proporcionando um ambiente compatível com suas necessidades neste momento de completa dependência. O ambiente vai amparando as necessidades do bebê ao mesmo tempo em que vai se tornando confiável pela empatia da mãe. O holding passa a proteger o bebê frente todo tipo de agressão, seja interna como as necessidades e as reações fisiológicas ou pelos estímulos vindos do meio externo.

Winnicott (1958/2000) propõe um importante conceito denominado de “criatividade primária” que se apresenta como um impulso inato em direção à saúde. As raízes da criatividade se situam nos primórdios da vida e no centro da relação mãe-bebê, pois vincula a capacidade demonstrada pela mãe de oferecer uma resposta ao gesto espontâneo do bebê e a necessidade de ilusão que conduz o bebê ao sentimento de onipotência. Esta criatividade primária ocorre quando o bebê sente que criou aquilo que lhe é oferecido e que ele necessita, assim o bebê adquire a esperança de que existe uma relação una entre a realidade interna e externa (p. 237).

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muito pequenas, sem obrigatoriamente pensá-lo como déficit ou deficiência ou transformar essas manifestações de sofrimento em uma entidade psicopatológica, o que amplia perspectivas para pensar o autismo de forma mais ampla, possibilitando novas reflexões. Winnicott chega mesmo a dizer que “o autismo não existe”, quando se refere à descrição de Kanner, que aprisionou as crianças ditas “autistas” em um único e terrível destino.

Para Cavalcanti e Rocha (2001), Winnicott, ao dizer que o autismo não é uma doença e que seus sintomas podem ser encontrados inclusive nas crianças consideradas comuns e sadias, “esfumaçou as fronteiras entre o mórbido e o não-mórbido, entre o normal e o anormal (...) atirou aos ares a necessidade de classificação psicopatológica” (p. 102).

Já Tafuri (2003) destaca uma das maiores contribuições de Winnicott, a noção de ambiente holding, para descrever a relação analítica, privilegiando a criatividade de ambos, analisando e analista. Segundo a autora a transformação do

setting analítico em ambiente holding fez com que a dinâmica de transferência e contratransferência adquirisse uma posição mais abrangente do que a via da interpretação poderia oferecer, em especial no tratamento psicanalítico da criança autista.

Segundo Amy (2001), Ogden (1989) e Haag (1991), influenciados pelo pensamento de Klein, voltaram seus trabalhos teóricos para as primitivas e importantes vivências sensoriais, como elemento essencial da constituição psíquica, onde o autismo figura como uma falha ou uma desarmonia nesta forma elementar e de estar no mundo.

Ogden (1989) caracteriza a posição autista-contígua por sua própria forma particular de relação de objeto, onde o sujeito é uma experiência sensorial. Enfatiza a importância da vivência de continuidade sensorial, onde o outro se faz absolutamente necessário. Portanto, as experiências sensoriais, derivando das necessidades físicas, vão tomando um caráter rítmico que levam a constituir um senso de continuidade de ser que além de ser o berço das experiências do self, permite a posterior relação com os objetos.

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responsabilidade na constituição de mecanismos primitivos de sobrevivência. Descreveu a elaboração pelas crianças autistas, dessa “segunda pele”, que seria um “autocontinente psíquico” defensivo (a criança não tem necessidade de ninguém, basta-se a si mesma) e, por essa razão, uma barreira intransponível entre ela e o outro. Observa o quanto a ausência de continente natural não permite a essas crianças organizar as conexões necessárias à constituição de ligações e daquilo que ela chama “as funções criativas”, que têm a propriedade de fabricar, de alguma forma, a substância psíquica capaz de se “desdobrar” sem ruptura na separação e que permite, portanto, progressivamente o avanço da consciência da separação. Mostra também a necessidade de que sejam propostas às crianças interpretações que lhes permitam se tranqüilizar e perceber progressivamente as capacidades continentes de seus corpos. Enfatiza uma construção ou reconstrução corporal-psíquica como finalidade da primeira etapa do tratamento das crianças autistas, para possibilitar, então, uma progressiva capacidade de individuação.

Alguns autores como F. Dolto (1982), Laznik-Penot (1998), Kupfer (2000), Jerusalinsky (1989), Rocha (2003), Freire (2002), de influência lacaniana, contribuíram sobremaneira para o conhecimento do autismo.

Para Dolto (1982), o autismo seria uma doença simbólica da relação com o meio, em decorrência de uma não resposta, de um mal-entendido, associado a um extravio assustador a uma perda das amarras, do desejo, da relação e dos referenciais sensoriais, relacionados com o risco traduzido por toda separação prolongada e não falada entre o bebê e seu primeiro adulto tutelar de referência sensorial.

O autismo surge como uma ruptura do narcisismo do sujeito, um desaprumo na relação simbólica do sujeito com o seu corpo, a dessolidarização da vida psíquica e do esquema corporal, a dissociação da imagem do corpo e do sujeito.

Laznik-Penot (1997) trabalha as questões do autismo infantil acrescentando uma proposta original sobre essa síndrome, principalmente do ponto de vista da clínica. Segundo a autora,

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o fracasso da instauração da imagem especular e da imagem do corpo, sobre a constituição do circuito pulsional e sobre o funcionamento das representações inconscientes (LAZNIK-PENOT, 1997, p.12).

Laznik-Penot (1997) relata que a sua experiência clínica com as crianças autistas lhe ensinou que é necessária uma escuta analítica de suas produções sonoras, mesmo que inicialmente não tenham uma função de comunicação. Para a autora, pouco importa, no início do tratamento, se estas manifestações sonoras têm o intuito de uma comunicação ou mesmo se há uma intersubjetividade. Esta escuta analítica permite a emergência de uma fala que a criança autista pode a posteriori reconhecer como sua, pois quando o analista aposta que na produção não só sonora mas também gestual desta criança existe um valor significante e, ao constituir a si mesmo como lugar de endereçamento desta mensagem, a criança vai poder se reconhecer a posteriori como fonte dessa mensagem. O analista assume, então, por alguns momentos, o lugar do Outro primordial. Mas ele também antecipa o sujeito a vir, ao interpretar qualquer produção como um ato colocado pela criança, para tentar advir a uma ordem simbólica que lhe preexiste.

O trabalho com uma criança autista se faz ao avesso da cura analítica clássica: o objetivo do analista não é interpretar os fantasmas de um sujeito do inconsciente já constituído, mas permitir o advento do sujeito. Faz-se aqui intérprete, no sentido de tradutor de língua estrangeira, ao mesmo tempo em relação à criança e aos pais (LAZNIK-PENOT, 1997, p.11).

Dando continuidade ao assunto, a interpretação que a transferência permite, nas graves psicopatologias infantis, exige uma suposição de sujeito, pelo analista, antes que haja um. Esse desejo do analista é imaginário, apóia-se numa teoria, num percurso, numa leitura das manifestações da criança como articulação, suportando uma gramática em que ele – o analista – estica os signos em que a criança se atrela, até a produção de uma frase, e de um dizer. É o que leva à hipótese de que o “analista lê a manifestação da criança como seu imaginário. É com um texto imaginário que o analista veicula o simbólico, desabotoando os signos a que a criança aderiu, para fazer deles significantes” (VORCARO, 1999, p. 67).

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Tabela 1 – Desfechos clínicos, respectivos percentuais, riscos relativos e intervalos  de confiança (KUPFER et al., 2008, p
Tabela 2 – Idade dos alunos:
Tabela 4 – Profissionais constantes em laudos.
Tabela 6 – Investigação clínica e laboratorial (Exames)  Identificação Exames  s/alteração  Exames  c/alteração  TOTAL  A.E.C.E
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Referências

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