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O instituto da legítima e os limites ao direito de testar: uma defesa à livre disposição dos bens

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Academic year: 2018

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UNI V E R S I D A D E F E D E R A L D O C E A R Á F A C UL D A DE D E D I R E I T O

D E PA R T A M E NT O D E D I R E I T O PR I V A D O

I T A L O T O M A Z A UG US T O

O I NS T I T UT O D A L E G ÍT I M A E O S L I M I T E S A O D I R E I T O D E T E S T A R : UM A D E F E S A À L I V R E D I S PO S I Ç Ã O D O S B E NS

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IT A L O T OMA Z A UGUS T O

O INS T IT UT O D A L E G ÍT IMA E OS L IMIT E S A O D IR E IT O D E T E S T A R : UMA D E F E S A À L IV R E D IS POS IÇ Ã O D OS B E NS

Monografia apresentada ao programa de Graduaçã o em D ireito da Universidade F ederal do C eará, como requisito parcial à obtençã o do título de bacharel em D ireito. Á rea de concentraçã o: D ireito C ivil.

Orientadora: Profa. Ms. Maria J osé F ontenelle B arreira A raújo

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Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

A936i Augusto, Italo Tomaz.

O instituto da legítima e os limites ao direito de testar: : uma defesa à livre disposição dos bens / Italo Tomaz Augusto. – 2016.

39 f. : il. color.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2016.

Orientação: Prof. Me. Maria José Fontenelle Barreira Araújo.

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IT A L O T OMA Z A UGUS T O

O INS T IT UT O D A L E G ÍT IMA E OS L IMIT E S A O D IR E IT O D E T E S T A R : UMA D E F E S A À L IV R E D IS POS IÇ Ã O D OS B E NS

Monografia apresentada ao programa de Graduaçã o em D ireito da Universidade F ederal do C eará, como requisito parcial à obtençã o do título de bacharel em D ireito. Á rea de concentraçã o: D ireito C ivil.

A provada em: _ _ _ /_ _ _ /_ _ _ _ _ _ .

B A NC A E X A MINA D OR A

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Profa. Ms. Maria J osé F ontenelle B arreira A raújo (Orientadora)

Universidade F ederal do C eará ( UF C )

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Mestrando J ader de F igueiredo C orreia Neto

Universidade F ederal do C eará ( UF C )

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Prof. D r. W illiam Paiva Marques J únior

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A D eus.

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A G R A D E C I M E NT O S

A Profa. D ra. Maria J osé F ontenelle B arreira A raújo pela impecável orientaçã o, sempre realizada por meio de questionamentos construtivos e com base em seu infindável conhecimento jurídico.

A os professores participantes da banca examinadora Prof. D outor W illiam Paiva Marques J únior e B acharel J ader de F igueiredo C orreia Neto pelo tempo, pelas críticas sempre oportunas e pelas valiosas colaborações.

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R E S UM O

A nalisa-se a inconveniê ncia moral e legal do instituto da legítima no direito sucessório brasileiro, instituto responsável por limitar a autonomia privada em relaçã o ao direito de testar. A pesar de o C ódigo C ivil de 2.002 ter previsto a operabilidade como um de seus princípios norteadores básicos, tornou-se evidente a dificuldade de procedimento das causas referentes a direitos sucessórios, tanto no âmbito judicial como no âmbito extrajudicial, o que se dá em virtude do surgimento de diversos limites, conceitos e regramentos que dificultam a aplicaçã o do direito sem necessariamente possuírem uma justificativa jurídica concreta. O trabalho disserta acerca do instituto da legítima, presente no art. 1.846 do C ódigo C ivil de 2.002, o qual limita o direito de testar dos cidadã os brasileiros a 50% ( cinquenta por cento) de seu patrimônio, garantindo a outra parte do patrimônio como direito sucessório básico dos herdeiros necessários. O trabalho realiza a análise de uma noçã o histórica do instituto no direito, buscando os efeitos desse instituto na aplicaçã o prática do direito de testar, inclusive seus conflitos com os novos conceitos de família reconhecidos pela jurisprudê ncia brasileira, bem como questiona a justiça do instituto jurídico e seu embasamento diante do ordenamento jurídico pátrio. O trabalho, ainda, estuda casos práticos nos quais o instituto da legítima se demonstrou injusto e inviável, bem como analisa a viabilidade da modificaçã o deste do ordenamento jurídico pátrio sem prejuízo de outros direitos básicos que a lei civil garante.

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A B S T R A C T

T his work analises the moral incovenience of the L awful succession institute in the brazilian inheritance law, which is responsible to limit the private autonomy on the right of making a last will letter (testament) . B esides the fact that the B razilian C ivil C ode of 2.002 promoted the “operability” as one of it’s most important principles, the dificulty of procedure to inheritance and succession causes became evident in the nowadays legislation, which is noticeable in the judicial scope, as in the extrajudicial scope, what happens due to plenty of limitations, concepts and laws that complicate the law appliance lacking a concrete juridical justification. T his work deals with the “institute of legit succession”, present in the article 1.846 of the C ivil C ode of 2.002, which limits the right to make a last will letter of brazilian citizens to 50% (fifty per cent) of his patrimony, ensuring the other half of the patrimony as a basic right of the necessary heirs. T his article analyses a historical notion of this juridical institute in the law’s system at all, it’s effects on the pratical use of the right to will, including the conflicts with the new concept of F amil y recognized by the brazilian jurisprudence, and also questions about the justice of this institute and it’s theoretical basis related to the brazilian legal order. T his article yet studies pratical cases in which the institute of legit succession has been shown as unfair and unreliable, also analysing the viability of it’s modification from the brazilian legal order without affecting other basic rights guaranteed by the civil law.

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L I S T A D E A B R E V I A T UR A S E S I G L A S

C C C ódigo C ivil

S T F S upremo T ribunal F ederal S T J S uperior T ribunal de J ustiça

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S UM Á R I O

1 INT R OD UÇ Ã O ... 11

2 D IR E IT O S UC E S S ÓR IO E C ONST R UÇ Ã O HIS T ÓR IC A : F UND A ME NT OS E C A R A C T E R ÍS T IC A S ... 13

2.1 Noçã o histórica: a dimensã o do direito das sucessões no B rasil. ... 13

2.2 Os fundamentos do D ireito S ucessório ... 20

2.3 A s famílias que merecem figurar na regra legal sucessória ... 24

3 A S UC E S S Ã O L E G ÍT IMA A T UA L E S E U F UNC IONA ME NT O...28

3.1 Uma crítica que se faça ao direito necessário de herdar ... 28

3.2 O funcionamento atual da sucessã o legítima e o exercício da autonomia privada ... 29

4 R A Z OÁ V E IS C ONS E QUÊNC IA S NE GA T IV A S D O INST IT UT O D A L E G ÍT IMA NO D IR E IT O B R A S IL E IR O ... 31

4.1 A impossibilidade de exclusã o de herdeiros necessários por questões pessoais ... 31

4.2 Outras formas de favorecimento patrimonial diverso ... 33

5 C ONS ID E R A Ç Õ E S F INA IS ... 36

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1 I NT R O D UÇ Ã O

O trabalho trata do instituto da legítima enquanto limite ao direito de testar no direito brasileiro, abordando aspectos de sua historicidade, fundamentos e consequê ncias no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente diante das mudanças legislativas e jurisprudenciais que tem ocorrido nos últimos anos, a exemplo do novo conceito de família.

V erifica-se que, atualmente, a disposiçã o legal de que metade dos bens do testador deverá ser deixada para seus herdeiros necessários sobreviventes (ascendentes, descendentes e cônjuge, conforme art. 1.845 do C ódigo C ivil) nã o pode ser encarada como uma regra universalmente correta, haja vista nã o levar em consideraçã o os aspectos individuais de cada caso.

Percebe-se que a opçã o legislativa pela adoçã o do instituto da legítima pressupõe a existê ncia de um direito concreto dos herdeiros necessários a receberem parte da herança, direito este que é garantido em detrimento do direito de propriedade do testador, o qual foi diretamente responsável pela conquista e existê ncia de toda a propriedade, em si, que será herdada.

C om efeito, por meio do sistema atual o direito de propriedade é sublimado, deixando-se em parte de se levar em consideraçã o as vontades do proprietário que teve todo o mérito e empenho de constituir seu patrimônio, vendo-se juridicamente compelido a render homenagem a herdeiros que a própria lei privilegiou, o que se afigura condenável face à autonomia da vontade do testador.

Nesse contexto, pretende-se discutir as consequê ncias negativas que o instituto da legítima pode causar em alguma hipótese específica, buscando-se evidê ncias concretas e casos havidos nos quais a vontade do testador era legitimamente outra, divergente da imposta pela lei, estando impossibilitado de dispor completamente do patrimônio que gerou.

Neste foco, examinar-se-á a viabilidade da exclusã o do referido instituto do ordenamento jurídico, levando-se em consideraçã o a possibilidade de o testador deixar dependentes escolhidos à custa do seu livre critério, propondo-se, enfim, que sejam harmonizados os direitos de propriedade deste e dos herdeiros que eleger.

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individualidade de seu relacionamento familiar, bem como de seus objetivos de vida, consagrando a liberdade de expressã o, tã o desprestigiada pela legislaçã o atualmente vigente.

Por fim, ainda que fora do escopo da análise a que se destina o trabalho, seus esforços apontam para uma superaçã o dos embasamentos tradicionais do instituto da legítima no direito brasileiro, os quais se baseiam na suposta funçã o social da propriedade ao garantir metade dos bens do testador para a família, o que já se demonstra um grave equívoco, pois nã o há funçã o social em se privilegiar uma forma de uso particular da propriedade em detrimento de outra.

O método a ser aplicado na pesquisa é o indutivo, com a utilizaçã o de premissas específicas visando chegar a conclusões gerais. A técnica a ser adotada será a monográfica, utilizando-se de pesquisa bibliográfica e documental, como ferramentas para conclusões a serem fornecidas pela pesquisa.

R ealizar-se-áampla pesquisa bibliográfica, na doutrina clássica e moderna, nacional e estrangeira pertinente à s teorias do D ireito das S ucessões, com ê nfase no direito de testar, no direito à propriedade privada e nos efeitos práticos que o instituto da sucessã o legítima causa aos direitos analisados.

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2 D I R E I T O S UC E S S ÓR I O E C O NST R UÇ Ã O H I S T ÓR I C A : F UND A M E NT O S E C A R A C T E R ÍS T I C A S

S uceder em direito traz a ideia de substituir, de tomar o lugar do outro numa relaçã o jurídica de índole patrimonial.

Por sua vez, o D ireito das S ucessões é a parte especial do D ireito C ivil que regula os efeitos da morte sob o ponto de vista do patrimônio deixado, dizendo respeito às pessoas físicas. C om efeito, já ressalta Orlando Gomes (1978, p. 1-2) a nota de que a extinçã o de uma pessoa jurídica nã o estava no âmbito desta área do direito, conforme trecho abaixo:

Nã o compreende as disposições de D ireito T ributário, nem as de D ireito Público relativas aos efeitos do óbito do indivíduo na esfera das respectivas competê ncias. R efere-se apenas à s pessoas físicas. A extinçã o de uma pessoa jurídica nã o está no seu âmbito, nem tê m a natureza de disposiçã o de última vontade os preceitos estatutários que regulam a sorte do patrimônio social.

E aduz:

Nã o obstante constituir-se de relações predominantemente patrimoniais, que poderiam determinar seu tratamento juntamente com o D ireito das C oisas ou o D ireito das Obrigações, sustenta-se sua autonomia, para regulaçã o unitária, porque encerra princípios e figuras que, embora conservem afinidade com relações patrimoniais “inter vivos”, distinguem-se e pedem disciplina orgânica.

C om isso, direito das sucessões diz respeito à parte especial do C ódigo C ivil que regula a transmissã o dos bens de um indivíduo para depois de sua morte, sendo a sucessã o um dos modos específicos de aquisiçã o da propriedade admitidos no D ireito B rasileiro.

2.1 Noçã o histór ica: a dimensã o do dir eito das sucessões no B r asil.

Mostra a doutrina de S ílvio R odrigues (1981, p.2) que a possibilidade de alguém transmitir seus bens por ocasiã o de sua morte é premissa que remonta à antiguidade, estando consagrada, dentre outros, nos D ireitos egípcio, Hindu e B abilônico, dezenas de séculos antes da era cristã .

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T odavia, as razões pelas quais a lei agasalha os direitos hereditários tê m variado no correr dos tempos. Por outro lado, nã o sã o poucas as vozes que, hoje como no passado, contestam tanto a legitimidade quanto a conveniê ncia da sucessã o hereditária.

E m outro contexto histórico, qual seja, da civilizaçã o romana, aduz J osé L opes de Oliveira (1982, p. 3) que a liberdade de testar era absoluta, pelo menos no que tangia aos bens do pater famílias:

E ntre os romanos, o direito sucessório do tempo da L ei das X II T ábuas caracterizava-se pela absoluta liberdade do pater famílias na disposiçã o dos bens para depois de sua morte. E sse individualismo se exprimia, sobretudo, na ampla liberdade de testar, que entã o era absoluta.

Orlando Gomes (1978, p. 3) aprofunda o estudo desta época e vai à L ei das X II T ábuas, sustentando que neste direito o “pater famílias” tinha absoluta liberdade de dispor dos seus bens para depois da morte, mas, se falecesse sem testamento, a sucessã o se devolvia, seguidamente, a trê s classes de herdeiros:

1. “sui” 2. “agnati” 3. “gentilis”

E xplica ele:

Heredes sui et necessarii” eram os filhos sob pátrio poder, a mulher “in manu, quia filiae loco est” e outros parentes sujeitos ao “de cujus”. “A gnati”, as pessoas sob o mesmo pátrio poder ou que a ele se sujeitariam se o “pater famílias” nã o estivesse morto. A herança nã o era deferida a todos os agnados, mas ao mais próximo no momento da morte. “Gentiles” os membros da mesma “gens”.

A história registra que é somente com o direito J ustiniano que a sucessã o legítima passa a se fundar no parentesco natural, quando a ordem de vocaçã o hereditária já era 1) ascendentes, 2) descendentes (juntamente com os irmã os bilateriais), 3) irmã os consanguíneos, e 4) outros parentes colaterais. (OR L A ND O GOME S , 1978, p. 04)

V ale dizer, ainda, que já nesse passado distante existia a regra de que os parentes mais próximos excluíam os mais distantes da vocaçã o hereditária.

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religiosa nas antiquíssimas civilizações, nã o havendo castigo maior para uma pessoa do que falecer sem deixar quem lhe cultue o altar doméstico, de modo a ficar seu túmulo ao abandono. C abe ao herdeiro o sacerdócio desse culto. A ssim sendo, a propriedade familial a ele se transmite automaticamente, como corolário do fato de ser continuador do culto familial.

1

No que tange ao direito brasileiro, a historiadora Maria B eatriz Nizza da S ilva 2

examina o assunto a partir do hábito de deixar-se testamento na época do B rasil colônia, assentando que naqueles idos era comum o implemento de atos de última vontade, verbis:

[ ...] homens e mulheres, no fim do período colonial, temendo uma morte inesperada, tomavam as suas precauções antecipadamente e procuravam um tabeliã o para registrar as suas decisões quanto à recompensa daqueles que os tinham ajudado nas suas enfermidades e velhice.

Mostra que isso se dava por questões religiosas, em face da forte presença da Igreja C atólica na cultura popular daquele período, motivo pelo qual os testamentos, inclusive, dispunham também acerca de questões nã o patrimoniais, assim como os cuidados fúnebres, que deveriam recair sobre o espólio deixado, bem como outras manifestações de vontade.

Nesse sentido, S ilva

3

sugere as razões determinantes dos testamentos deixados à quela época, precedentes à codificaçã o do direito sucessório brasileiro:

Nestas disposições testamentárias encontramos duas preocupações: em primeiro lugar, a expressã o de uma religiosidade forte que coloca acima de tudo os cuidados com a alma, nã o só da testadora, mas de todos aqueles a quem ela estava ligada, inclusive os próprios escravos; em segundo lugar, o desejo de proteger os elementos mais desprotegidos da família, ou seja, os membros do sexo feminino, filhas, netas, sobrinhas.

A pesar de comum a prática de testamentos pela populaçã o brasileira durante a história, a legislaçã o passou a evoluir para criar um regramento específico para esse tipo de matéria.

D ir-se-ia que, tanto a ausê ncia de testamentos em diversos casos de sucessões, como o próprio questionamento que se pudesse fazer acerca da validade ou legitimidade deles

1

F oustel de C oulanges (1903 apud Silvio R odrigues, 1981) .

2

Maria B eatriz Nizza da S ilva. A vida Privada e quotidiana no B rasil ( na época de D . Maria I e D . J oã o V I) . S ã o Paulo: R eferê ncia/E ditorial E stampa, 1993, p. 127.

3

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quando nã o contemplassem todos aqueles que tinham expectativa de herdar, seria, por hipótese, motivaçã o bastante para que a lei cuidasse do assunto.

Orlando Gomes

4

explicita a evoluçã o do direito sucessório no ordenamento jurídico brasileiro, esclarecendo que:

No direito pátrio, a ordem da vocaçã o hereditária foi, até o ano de 1907, a seguinte: 1. D escendentes; 2. A scendentes; 3. C olaterais até o décimo grau; 4. C ônjuge sobrevivo; 5. F isco. A L ei nº 1.839 desse ano alterou-a, trazendo para o terceiro grau o cônjuge supérstite e limitando o parentesco transversal ao sexto grau. O C ódigo C ivil observou-a, mas a sucessã o dos parentes colaterais foi reduzida, em lei extravagante, ao quarto grau.

5

T anto a lei nº 883 como a 4.121 modificaram, circunstancialmente, o direito hereditário do cônjuge sobrevivente.

O autor refere-se ao C ódigo C ivil de 1.916, apontando que, com isso, o cônjuge supérstite passou, naquele momento, a ter maior importância na vocaçã o hereditária, dando a lei maior relevância a esta figura nas regras sucessórias.

C abe a F lávio T artuce ( 2015, p. 34) informar que a L ei F eliciano Pena ( D ecreto de nº 839 de 1907) reduziu o alcance da legítima de dois terços para a metade dos bens do falecido, resolvendo em seu art. 2º : “O testador que tiver descendente ou ascendente sucessível só poderá dispor da metade de seus bens, constituindo a outra metade a legítima daqueles, observada a ordem legal.”

6

A esse propósito denota que a reduçã o foi mantida pelos códigos subsequentes, tanto pelo C ódigo C ivil de 1.916, como pelo C ódigo C ivil de 2.002, tornando-se, afinal, regra consolidada no direito brasileiro posto.

T raz mais sua doutrina o aspecto curioso que era o relatado por C lóvis B eviláqua no sentido de que, na tramitaçã o do projeto do C ódigo C ivil de 1.916, a regra da plena liberdade de testar – sem, portanto, impor a legítima – chegou mesmo a ser aprovada no S enado, embora rejeitada na C âmara dos D eputados.

7

Nessa toada, C lóvis B eviláqua (1959, p. 40), em sua obra intitulada “C ódigo C ivil dos E stados Unidos do B rasil comentado – V olume I”, datada do ano de 1959, relata acerca do ocorrido e expõe sua opiniã o contrária a liberdade de testar:

4

Orlando G omes ( 1978) p. 4

5

B R A S IL . D ecreto-lei nº 9.461, de 15 de julho de 1946.

6

B R A S IL . D ecreto nº 839 de 1907. (L ei F eliciano P ena) .

7

(18)

47. A discussã o, na segunda C âmara, fê z surgir algumas questões, que nã o tinham sido ventiladas na primeira, tal a do homestead. A dotou o S enado ê sse instituto, como repeliu o fideicomisso, e proclamou a liberdade plena de testar. O problema da liberdade de testar, interessou, grandemente os Senadores e os que acompanharam a elaboraçã o do Projeto, no segundo ramo do C ongresso. A final venceu o catolicismo aliado ao positivismo, com prejuízo de interesses sacratíssimos da família e da sociedade.

C onclui o autor, acerca da volta do projeto do C ódigo C ivil de 1.916 à C âmara dos D eputados:

“50. D istribuída a matéria do Projeto pelos membros da C omissã o especial, à semelhança do que se fizera em 1901, redigiram-se pareceres parciais, discutiram-se as suas conclusões, e, no parecer geral, deu-se a expressã o à opiniã o vencedora. C ertas emendas do Senado foram rejeitadas, destacando-se, entre elas, a que suprimia o fideicomisso, e a que instituía a liberdade de testar.”

8

A nalisando o autorizado registro, tem-se, pois, que o C ódigo C ivil de 1.916, tratando de maneira mais específica sobre a sucessã o legítima, foi que passou a dispor em seu art. 1.575

9

acerca de sua subsistê ncia dela nas hipóteses de caducidade ou nulidade do testamento.

10

E sse artigo, cujo conteúdo é repetido 11

pelo C ódigo C ivil de 2.002 em seu art. 1.788, afigura-se positivo por se tratar de uma presunçã o razoável da vontade do de cujus, em que pese este jamais ter-se preocupado em deixar disposiçã o acerca de sua última vontade, tendo-se por plausível sejam herdeiros necessários aqueles mais presumíveis entre os que o falecido gostaria que recebessem seus bens, premissa esta que, seja como for, nã o passa de relativa. A final, nã o se saberia mesmo qual fosse a vontade real do de cujus.

T al ressalva é importante para sinalizar-se que a sucessã o legítima decorrente de presunçã o legal nas hipóteses de ausê ncia, caducidade ou nulidade do testamento (com exceçã o da invalidade que se impõe quando ultrapassada a disposiçã o possível sobre de metade dos bens) nã o é o objeto deste trabalho, porquanto se reconhecendo adequada em tais hipóteses, por nã o haver a vontade efetiva daquele que deixou o espólio.

8

C lovis B evilaqua ( 1959) p. 42

9

“A rt. 1.575. A sentença de separaçã o judicial importa a separaçã o de corpos e a partilha de bens.

Parágrafo único. A partilha de bens poderá ser feita mediante proposta dos cônjuges e homologada pelo juiz ou por este decidida.”

10

B R A S IL . L ei 3.071, de 01 de janeiro de 1916. (C ódigo C ivil de 1.916)

11

(19)

A lém disso, a supracitada presunçã o de vontade também é viável em virtude do fato de que, quando existem rixas e desavenças familiares, é mais comum que os indivíduos desta façam disposições de vontade por meio de testamentos excluindo os referidos membros de seu ato de sua sucessã o, pois a regra é que os herdeiros necessários herdem, e nã o o contrário.

T odavia, importa dizer que a retirada de membros familiares da qualidade de herdeiros é bastante limitada pelo ordenamento, como nos casos de deserdaçã o e ingratidã o, nã o permitindo a legislaçã o que herdeiros necessários sejam excluídos em casos diferentes daqueles previstos em lei, mesmo que existam questões individuais do testador que o faça querer fazê -lo, diante de sua rejeiçã o pela família em virtude de sua sexualidade, ou na hipótese de o testador querer beneficiar instituições ou causas que considera mais nobres, conforme casos que serã o estudados adiante.

A tente-se para que os dispositivos referentes à sucessã o legítima enfrentados por este trabalho concernem à limitaçã o objetiva da autonomia da vontade do indivíduo quando constrangido a deixar seu patrimônio para seus herdeiros necessários, mesmo quando pratica ato em contrário, excluindo-os de seu testamento, o que, no atual sistema vigente, gera nulidade parcial ou total do ato de última vontade, nos termos dos arts. 1.966 e 1.967 do C ódigo C ivil de 2.002 e da jurisprudê ncia do S T J

12 :

A rt. 1.966. O remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, quando o testador só em parte dispuser da quota hereditária disponível.

13

A rt. 1.967. A s disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ã o aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

§ 1

o

E m se verificando excederem as disposições testamentárias a porçã o disponível, serã o proporcionalmente reduzidas as quotas do herdeiro ou herdeiros instituídos, até onde baste, e, nã o bastando, também os legados, na proporçã o do seu valor.

12

D IR E IT O C IV IL . A Ç Ã O R E SC IS ÓR IA F UND A D A NO A R T . 485, V , D O C PC . SUC E SS Ã O. D OA Ç Õ E S SUPOST A ME NT E INOF IC IOS A S. INE X IST ÊNC IA D E OF E NS A L IT E R A L A O A R T . 1.176 D O C C B /2002. Preliminar de incidê ncia da Súmula 343/ST F afastada, por maioria. Nã o incorre em ofensa literal ao art. 1.176 do C ódigo C ivil/2002 o acórdã o que, para fins de anulaçã o de doaçã o por suposta ofensa à legítima dos herdeiros necessários, considera preciso observar se no momento da liberalidade o doador excedeu a parte de que poderia dispor em testamento. "Para ser decretada a nulidade é imprescindível que resulte provado que o valor dos bens doados exceda o que o doador podia dispor por testamento, no momento da liberalidade, bem como qual o excesso. E m caso contrário, prevalece a doaçã o" ( SA NT OS, J . M. C arvalho, in C ódigo C ivil B rasileiro Interpretado, vol. X V I, 12 ed., E ditora L ivraria F reitas B astos, R io de J aneiro, 1986, p. 402) . "O sistema da lei brasileira, embora possa resultar menos favorável para os herdeiros necessários, consulta melhor aos interesses da sociedade, pois nã o deixa inseguras as relações jurídicas, dependentes de um acontecimento futuro e incerto, tal o eventual empobrecimento do doador" (R OD R IGUE S , Silvio. in D ireito C ivil - D ireito das Sucessões, vol. 7, 19 ed., E ditora S araiva, Sã o Paulo, 1995, p. 189). A çã o rescisória improcedente ( ST J - A R : 3493 PE 2006/0023348-1, R elator: Ministro M A S S A MI UY E D A , D ata de J ulgamento: 12/12/2012, S 2 - S E GUND A SE Ç Ã O, D ata de Publicaçã o: D J e 06/06/2013)

13

(20)

§ 2

o

S e o testador, prevenindo o caso, dispuser que se inteirem, de preferê ncia, certos herdeiros e legatários, a reduçã o far-se-á nos outros quinhões ou legados, observando-se a seu respeito a ordem estabelecida no parágrafo antecedente.

14

T ais disposições limitadoras da autonomia da vontade passaram a ser previstas no ordenamento jurídico brasileiro já pelo C ódigo C ivil de 1.916 em seu art. 1.721, verbis:

A rt. 1.721: O testador que tiver descendente ou ascendente sucessível, nã o poderá dispor de mais da metade de seus bens; a outra pertencerá de pleno direito ao descendentes e, em sua falta, ao ascendente, dos quais constitui a legítima, segundo o disposto neste C ódigo.

O referido dispositivo do C ódigo C ivil de 1916 vem a eleger certo segmento da família para beneficiar, opçã o legislativa esta que, nos tempos do B rasil C olônia e do Império, existia apenas para os herdeiros considerados mais frágeis, quais fossem, aqueles que nã o tinham meios de prover seu próprio sustento.

Hoje a lei optou por inserir neste rol de herdeiros forçosos os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, sem cogitar do efetivo cabimento desse favorecimento que reputou, a princípio, legítimo. A ssim, nos termos do art. 1.845, determina o C ódigo C ivil de 2.002 quem sejam: “Sã o herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.”

15

A partir daí imagina-se que possam surgir problemas, os quais se concretizam nos casos em que o testador tem preferê ncia por deixar seus bens para aqueles nã o previstos no rol supracitado, a exemplo de seu companheiro (a) com o qual, por muitas vezes, nã o possui relacionamento formalizado, mesmo outra pessoa próxima com quem tenha tido em vida maior afinidade pessoal do que com sua própria família.

O fato é que, invariavelmente, nã o poderá voluntariamente preteri-los ao eventualmente testar.

C om isso o ordenamento jurídico passou a ter a legítima como regra nos casos de omissã o ou invalidade do testamento, como também resguardou para esta a metade dos bens do de cujus, os quais se mostram indisponíveis em sede de testamento, sob pena de anulabilidade

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deste, opçã o legislativa essa que perdura até a presente data.

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B R A S IL . L ei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. ( C ódigo C ivil)

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B R A S IL . L ei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. ( C ódigo C ivil)

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2.2 O s fundamentos do D ir eito S ucessór io

Nã o se pode dizer seja unânime ao longo dos tempos a ideia de sucessã o. D esta exsurge, salvo engano, a busca pela perpetuidade, esperada uma estável relaçã o de continuidade dos interesses da família, bem como a preservaçã o do próprio senso de religiosidade, sempre tã o arraigado na história dos povos da humanidade.

A propriedade sempre foi uma fonte de afirmaçã o de poder, encontrando-se mesmo hoje alçada à condiçã o de direito fundamental, previsto no art. 5º , X X II da C onstituiçã o F ederal de 1988

17 :

A rt. 5º T odos sã o iguais perante a lei, sem distinçã o de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

( ...)

X X II - é garantido o direito de propriedade;

Neste efeito, é uma via de exercício de prestígio pessoal, arrebatando disputa que será mais perfeitamente observada no próprio seio familiar do proprietário.

HE R D E IR O NE C E S S Á R IO D O C Ô NJ UGE QUE PR OC E D E À D OA Ç Ã O D E B E NS PA R A V IND IC A R A

A NUL A Ç Ã O QUA NT O À PA R T E QUE E X C E D E R A D E QUE O D OA D OR , NO MOME NT O D A L IB E R A L ID A D E , POD E R IA D ISPOR E M T E S T A ME NT O ( D OA Ç Ã O INOF IC IOS A ). T R A NS MISS Ã O D E IMÓV E L C OM UT IL IZ A Ç Ã O D E PR OC UR A Ç Ã O, E M QUE PE S E A PR É V IA R E V OG A Ç Ã O D O MA ND A T O. NUL ID A D E D E PL E NO D IR E IT O, QUE NÃ O S E S UB ME T E A PR A Z O D E C A D E NC IA L PA R A O S E U R E C ONHE C IME NT O. 1. O art. 550 do C C /2012 ( sic) estabelece que a doaçã o do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até 2 ( dois) anos depois de dissolvida a sociedade conjugal. C om efeito, a lei prevê prazo decadencial para exercício do direito potestativo para anulaçã o da doaçã o, a contar do término do casamento, isto é, pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. 2. A demais, no tocante ao pleito de anulaçã o da doaçã o do cônjuge adúltero, por dizer respeito à meaçã o da lesada ( genitora do autor), coautora da açã o, fica patente que o filho nã o tem legitimaçã o para este pedido específico - o que só poderia cogitar se tivesse havido o prévio falecimento de sua mã e -, hipótese em que, a teor do art. 1.177 do C C /1916 [similar ao art. 550 do C C /2002], estaria legitimado como herdeiro necessário. 3. No entanto, o caso é peculiar, pois é vindicada pelos autores anulaçã o de doaçã o praticada pelo cônjuge alegadamente infiel, já falecido por ocasiã o do ajuizamento da açã o, sendo certo que consta da causa de pedir e do pedido a anulaçã o de escrituras para que os bens imóveis doados passem a constar do acervo hereditário, em proveito do inventário. C om efeito, em vista do disposto no art. 1.176 do C C /1916 [ similar ao art. 549 do C C /2002] , que estabelece ser nula a doaçã o quanto à parte que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade poderia dispor em testamento, e como o feito foi julgado antecipadamente, sem ter sido instruído, se limitando as instâncias ordinárias a enfrentar a tese acerca da decadê ncia para anulaçã o da doaçã o à apontada cúmplice, é prematuro cogitar em reconhecimento da ilegitimidade ativa do autor. 4. A transmissã o de imóvel efetuada com utilizaçã o de procuraçã o, em que pese a prévia revogaçã o do mandato, por nã o se tratar de vício de consentimento, mas na sua ausê ncia absoluta, nã o se submete à decadê ncia, constituindo nulidade de pleno direito a atingir todos aqueles que nã o agiram de boa-fé. 5. R ecurso especial provido.

( ST J - R E sp: 1192243 SP 2010/0077460-9, R elator: Ministro L UIS F E L IPE SA L OMÃ O, D ata de J ulgamento: 07/05/2015, T 4 - QUA R T A T UR MA , D ata de Publicaçã o: D J e 23/06/2015)

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O direito de herdar, também constitucionalmente concedido (art. 5º , X X da C F /88) à quele nã o se sobrepõe, ao menos implicando em investida que possa subtrair do titular da propriedade a ampla disponibilidade que há de ter sobre o que construiu.

D e fato, a C onstituiçã o F ederal nã o dispõe especificamente acerca das finalidades do direito de herdar, apenas apontando que este é garantido. C om efeito, argumentações que visam embasar os limites ao direito de disposiçã o da propriedade (o que inclui o direito de testar) por meio do direito de herdar demonstram-se, na verdade, interpretações extensivas do referido dispositivo constitucional, assim desviando sua finalidade.

É crível que o direito de herdar tenha sido alçado constitucionalmente com a intençã o apenas de ressaltar que a disposiçã o do patrimônio do de cujus é possível no B rasil, arrebatando qualquer possibilidade do legislador infraconstitucional vetá-lo e visar, por exemplo, estabelecer que os bens deixados deveriam ficar para o F isco. Ou seja, o direito é garantindo, nã o se definindo quaisquer outras limitações deste nã o previstas pela C F /88.

A cerca da discussã o doutrinária acerca do direito de herdar, sua conveniê ncia e legitimidade, leciona a doutrina de S ílvio R odrigues (1981, p. 5):

“A despeito de sua reconhecida vetustez, o direito hereditário encontra opositores que nã o só lhe negam a legitimidade como também a conveniê ncia. D entre esses opositores destacam-se os escritores socialistas. É óbvio que estes, negando a legitimidade da propriedade privada, tê m, como corolário dessa posiçã o, de contestar a legitimidade da transmissã o de bens causa mortis. C ontudo, neste campo sua argumentaçã o se exacerba, pois sustentam que o direito hereditário, por um lado, nã o só cria como incentiva a desigualdade entre os homens, alimentando, desse modo, a injustiça. ( ...) A argumentaçã o em sentido contrário é, igualmente, ardorosa. E la se funda, em primeiro lugar, em que o interesse pessoal constitui um móvel irresistível de progresso. O homem, buscando o seu próprio interesse, visando adquirir a riqueza em seu exclusivo proveito, atua, indiretamente, no sentido do maior interesse social, pois, embora sem o querer, aumenta o patrimônio da sociedade. E sta é, decerto, a principal razã o por que o E stado consagra o direito de propriedade. Ora, a possibilidade de transmitir bens causa mortis constitui um corolário do direito de propriedade, pois, caso contrário, a propriedade ficaria despida de um dos seus característicos, ou seja, a perpetuidade. A lém disso, a admissã o do direito sucessório constitui incentivo à poupança, pois, almejando a assegurar o bem-estar de seus sucessores, o homem busca aumentar seus haveres.”

C oaduna-se, evidentemente, com a segunda posiçã o apresentada pelo autor, inclusive pelos mesmos fundamentos, quais sejam, o progresso e a realizaçã o pessoal dos indivíduos componentes da sociedade.

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sua supressã o pelo poder constituinte derivado. O mesmo se aplica ao direito de propriedade ora defendido.

T odavia, as limitações positivadas ao exercício do direito de propriedade, especificamente no que tange à livre disposiçã o em ato de última vontade, nã o encontram guarida em qualquer norma constitucional, pois as limitações ao referido direito sã o trazidas pela mesma C onstituiçã o F ederal que o assegura e nenhuma destas embasa o instituto da legítima. R episa-se: é, pois, constitucionalmente excessivo.

V ale dizer que os principais fundamentos de limitaçã o ao direito de propriedade sã o firmados pela mesma C onstituiçã o F ederal e possuem o idê ntico status constitucional deste, dentre os quais se pode citar principalmente, a funçã o social da propriedade ( art. 5º , X X III da C F /88), previsto no inciso logo subsequente ao que prevê o direito de propriedade.

A ssim é que, nesta esteira, a C onstituiçã o F ederal indica, em seu art. 186, quando a funçã o social da propriedade estará sendo cumprida para fins de propriedade rural, conforme artigo colacionado abaixo:

A rt. 186. A funçã o social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigê ncia estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilizaçã o adequada dos recursos naturais disponíveis e preservaçã o do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploraçã o que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

18

T em-se que o referido fundamento busca fazer valer, em especial, o uso proveitoso da propriedade no seio da sociedade, seja para a exploraçã o econômica e criaçã o de empregos, seja para o sustento do núcleo familiar do proprietário, com o devido respeito ao meio ambiente e a outros valores que sejam de interesse eminentemente público.

S enã o, a violaçã o à funçã o social da propriedade autoriza, inclusive, a intervençã o do Poder Público na propriedade privada em suas diversas modalidades, a exemplo da requisiçã o administrativa, da desapropriaçã o e da expropriaçã o (A rt. 243 da C F /88).

C elso A ntônio B andeira de Mello (2001, p. 711) ensina que a desapropriaçã o é instituto jurídico com o seguinte conceito:

[ ...] desapropriaçã o se define como o procedimento através do qual o Poder Público, fundado em necessidade pública, utilidade pública ou interesse social,

18

(24)

compulsoriamente despoja alguém de um bem certo, normalmente adquirindo-o para si, em caráter originário, mediante indenizaçã o prévia, justa e pagável em dinheiro, salvo no caso de certos imóveis urbanos ou rurais, em que, por estarem em desacordo com a funçã o social legalmente caracterizada para eles, a indenizaçã o far-se-á em títulos da dívida pública, resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, preservado seu valor real.”

Por sua vez, a expropriaçã o é modalidade de desapropriaçã o considerada obrigatória por lei, ocorrendo quando o exercício da propriedade viola preceitos de ordem pública ou possui grande valor para o desenvolvimento da sociedade como um todo.

T rata-se de instituto similar ao confisco por ser forma de retirada da propriedade sem direito a qualquer indenizaçã o ou pagamento, haja vista a gravidade dos atos cometidos no exercício do direito de propriedade, a exemplo do que ocorre em das glebas de terra onde sã o cultivadas plantas psicotrópicas ou a exploraçã o de trabalho escravo, hipóteses estas que a lei defere o uso da expropriaçã o pelo Poder Público.

Percebe-se, entã o, que a funçã o social da propriedade sempre é utilizada para fundamentar intervenções na autonomia privada visando objetivos que, conforme dito anteriormente, sejam eminentemente públicos, nunca privados.

C om isso, afigura-se que a funçã o social da propriedade nã o se mostra hábil a justificar a legítima, por ser um instituto que privilegia direitos privados, quais sejam, os dos herdeiros necessários, os quais adquirem a preferê ncia na sucessã o de, pelo menos, metade dos bens do de cujus, mas em nada corroboram com objetivos sociais.

V isando preencher essa lacuna argumentativa, alguns autores tentam legiti mar as limitações ao direito de testar impostas pelo legislador ordinário, a exemplo de Miguel Maria de S erpa L opes (2001, p. 81), que assim destaca:

[ ...]procurou-se uma fórmula moderada ou mitigadora, nem liberdade em demasia, nem tantas restrições atentatórias ao direito de livre disposiçã o. D escobriu-se um meio termo que harmoniza o postulado da autonomia da vontade com os interesses públicos de preservaçã o do instituto da família e da expansã o da propriedade.”

2.3 A s famílias que mer ecem figur ar na r egr a legal sucessór ia

A argumentaçã o acima se embasa no preceito constitucional de proteçã o à família. Mas, o que seria, no contexto constitucional atual, o verdadeiro intento de proteçã o à família?

(25)

A rt. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteçã o do E stado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebraçã o.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º Para efeito da proteçã o do E stado, é reconhecida a uniã o estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversã o em casamento.

§ 4º E ntende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal sã o exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

§ 7º F undado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisã o do casal, competindo ao E stado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º O E stado assegurará a assistê ncia à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violê ncia no âmbito de suas relações.

A dmitidas projeções da regra constitucional, percebe-se que nã o existe qualquer disposiçã o acerca da necessária limitaçã o da autonomia privada, no que tange à disposiçã o do patrimônio para a perfeita realizaçã o da defesa da família.

D efende-se que, na verdade, nã o está na C onstituiçã o um tal alcance visando a proteçã o familiar. A liás, importaria mesmo salientar que, nos dias atuais, esse conceito dela é muito mais extenso.

É verdade que o direito brasileiro tem avançado no sentido do mais amplo reconhecimento de outras espécies de vínculos familiares, com lugar destacado para as uniões afetivas e o companheirismo, os quais nã o ficam exatamente elencados no rol dos chamados herdeiros necessários.

D ifícil mesmo imaginar que o legislador disto se ocupasse, preferindo deixar para a construçã o jurisprudencial uma tal defesa de interesses.

C om isso, percebe-se que, a rigor, o instituto da legítima, pelo menos da maneira como está posto, nã o proporciona uma ampla defesa da família em si, mas privilegia a família formal, sendo juridicamente discutíveis disposições testamentárias realizadas em nome daqueles que compõem a família do de cujus por alcance afetivo.

A ssim é que, na hipótese do companheirismo, somente a declaraçã o judicial da uniã o estável servirá a esta habilitaçã o sucessória.

(26)

Por outro lado, a proteçã o à família também é alegada em funçã o da necessidade de garantirem-se direitos básicos, assim o do direito a alimentos, alegando-se que, caso houvesse a liberdade total de testar no B rasil, poderiam ocorrer disposições dos bens que nã o garantissem o custeio de alimentos para dependentes do de cujus.

C umpriria sempre ressaltar que, mesmo havendo plena liberdade de testar da forma como se propugna, esta prerrogativa nã o eximiria o espólio do dever jurídico de arcar com dívidas de alimentos que fossem devidos pelo de cujus, nos termos do que recentemente vem entendendo o S uperior T ribunal de J ustiça (S T J )

19 :

R E C UR SO E SPE C IA L Nº 1.311.564 - MS (2012/0040753-5) R E L A T OR : MINIST R O R A UL A R A ÚJ O R E C OR R E NT E : W D E L B - E SPÓL IO A D V OG A D O : C A R L OS ME L O D A SIL V A R E PR . POR : S C D E O - INV E NT A R IA NT E R E C OR R ID O : N F L A D V OG A D O : A L E SS A ND R E V IE IR A D E C IS Ã O T rata-se de recurso especial interposto com fundamento no art. 105, III, a e c, da C onstituiçã o F ederal, em face de acórdã o do E g. T ribunal de J ustiça do E stado do Mato G rosso do S ul, assim ementado: "E ME NT A - A PE L A Ç Ã O C ÍV E L - A Ç Ã O D E A L IME NT OS - - E SPÓL IO - PR E L IMINA R D E INÉ PC IA D A INIC IA L R E J E IT A D A - C ONT R IB UIÇ Ã O F INA NC E IR A ME S MO A PÓS O D IV ÓR C IO - D IR E IT O IR R E NUNC IÁ V E L - B INÔ MIO NE C E S SID A D E /POSS IB IL ID A D E C OMPR OV A D O - S E NT E NÇ A MA NT ID A - R E C UR SO NÃ O PR OV ID O. A separaçã o judicial nã o encerra automaticamente o dever de mútua assistê ncia, especialmente quando se comprova a necessidade dos alimentos, sendo irrelevante que a ex-mulher os haja dispensado no divórcio, por se tratar de direito irrenunciável."( e-S T J , fl. 182) O recorrente, em suas razões recursais, além de dissídio jurisprudencial, alega violaçã o aos arts. 1.694, 1.696, 1.697 e 1.700 do C ódigo C ivil, sustentando, em síntese, que "inexistindo a condenaçã o, nã o há porque falar em transmissã o do dever jurídico de alimentar, em razã o do seu caráter personalíssimo e, portanto, intransmissível" ( e-S T J , fl. 195). O Ministério Público F ederal, no parecer acostado à s fls. 260/262 (e-S T J ), opinou pelo provimento do recurso especial. É o relatório. Passo a decidir. A C orte de origem, ao dirimir a controvérsia, entendeu que o espólio, mesmo nã o havendo obrigaçã o anterior do de cujus, seria responsável por arcar com os alimentos à sua ex-cônjuge. C onfira-se: "Os alimentos foram fixados em R $. 1.500,00, valor que se revela compatível com as necessidades da apelada, que possuí 57 anos de idade e aufere por mê s R $. 1.079,70, como funcionária pública municipal ( f. 37) e as possibilidades do espólio, eis que o falecido era fiscal de renda do estado com salário aproximado de R $.1 1.000, 00 ( f. 29) . A lém disso, coaduna-se com o entendimento exposto na sentença de que a irrenunciabilidade aos alimentos prevista no artigo 1707 do C ódigo C ivil alcança nã o só os parentes como também os cônjuges. E mbora haja posicionamento contrário, tal direito é inerente à dignidade da pessoa humana e, portanto, indispensável. O só fato de a recorrida ter se divorciado do falecido e, à época, renunciado á pensã o, nã o a impede de pleiteá-la nesta oportunidade, mormente porque indubitável a relaçã o de dependê ncia econômica mantida com ele." ( e-ST J , fl. 184) A S egunda Seçã o desta C orte Superior, contudo, no julgamento do R E sp 1354693/S P, pacificou o entendimento de que a "obrigaçã o, de natureza personalíssima, extingue-se com o óbito do alimentante, cabendo ao espólio recolher, tã o somente, eventuais débitos nã o

19

(27)

quitados pelo devedor quando em vida. F ica ressalvada a irrepetibilidade das importâncias percebidas pela alimentada" ( R el. Ministra MA R IA IS A B E L GA L L OT T I, R el. p/ A córdã o Ministro A NT ONIO C A R L OS F E R R E IR A , SE GUND A S E Ç Ã O, julgado em 26/11/2014, D J e 20/02/2015). C onfira-se a ementa do julgado: "C IV IL . A Ç Ã O OR D INÁ R IA . R E C ONHE C IME NT O E D ISS OL UÇ Ã O D E UNIÃ O E S T Á V E L . C E L E B R A Ç Ã O D E A C OR D O C OM F IX A Ç Ã O D E A L IME NT OS E M F A V OR D A E X -C OMPA NHE IR A . HOMOL OG A Ç Ã O. POS T E R IOR F A L E C IME NT O D O A L IME NT A NT E . E X T INÇ Ã O D A OB R IGA Ç Ã O PE R SONA L ÍS SIMA D E PR E ST A R A L IME NT OS. IMPOSSIB IL ID A D E D E T R A NSMIS S Ã O A O E SPÓL IO. 1. Observado que os alimentos pagos pelo de cujus à recorrida, ex-companheira, decorrem de acordo celebrado no momento do encerramento da uniã o estável, a referida obrigaçã o, de natureza personalíssima, extingue-se com o óbito do alimentante, cabendo ao espólio recolher, tã o somente, eventuais débitos nã o quitados pelo devedor quando em vida. F ica ressalvada a irrepetibilidade das importâncias percebidas pela alimentada. Por maioria. 2. R ecurso especial provido." ( R E sp 1354693/SP, R el. Ministra M A R IA IS A B E L G A L L OT T I, R el. p/ A córdã o Ministro A NT ONIO C A R L OS F E R R E IR A , SE GUND A SE Ç Ã O, julgado em 26/11/2014, DJ e 20/02/2015) Na hipótese dos autos, portanto, descabe falar em fixaçã o dos alimentos em favor da recorrida, uma vez que delimitada a responsabilidade do espólio somente em relaçã o aos débitos nã o quitados pelo devedor quando em vida. A nte o exposto, nos termos do art. 557, § 1º -A , do C ódigo de Processo C ivil, dou provimento ao recurso especial para afastar a obrigaçã o do espólio em prestar alimentos à recorrida. Publique-se. B rasília ( D F ) , 05 de maio de 2015. MINIST R O R A UL A R A ÚJ O R elator. (grifo nosso)

(28)

3 A S UC E S S Ã O L E G ÍT I M A A T UA L E S E U F UNC I O NA M E NT O

3.1 Uma cr ítica que se faça ao dir eito necessár io de her dar

O instituto da legítima tem sido questionado pela doutrina, se nã o como um todo, pelo menos em face de seu percentual, visto a posiçã o de F lávio T artuce (2015, p. 35) quando defende a reduçã o do quinhã o obrigatório aos herdeiros necessários:

E xpostas as argumentações contra e a favor da proteçã o da legítima, o presente autor entende que, de fato, a citada tutela ainda deve ser mantida no D ireito S ucessório brasileiro(...) . T odavia, já é o momento de se debater a reduçã o da legítima, talvez para um montante menor, talvez em 25%, do patrimônio do falecido. Isso porque a legítima deve assegurar apenas o mínimo existencial ou o patrimônio mínimo da pessoa humana, nã o devendo incentivar o ócio exagerado dos herdeiros.

D iscorda-se do autor por entendermos que a parte de premissas equivocadas para defender seu ponto de vista, mesmo que sejam no sentido de se garantir maior liberdade de testar.

S enã o, salienta ele que a legítima existe para assegurar-se o mínimo existencial ou o patrimônio mínimo que a família do de cujus deverá possuir. T odavia, o mínimo existencial, corolário da dignidade da pessoa humana (A rt. 1º , III da C F /88) é direito garantido pelo próprio direito de alimentos, nã o existindo na ordem jurídica a obrigaçã o dessa garantia aos indivíduos após o momento em que adquirem a capacidade de fato e a capacidade laboral.

A lém disso, o autor propõe o limite percentual de 25% (vinte e cinco por cento) do patrimônio a ser legado a título de legítima. S eria de questionar-se a discricionariedade quanto à sugestã o feita, pois, noutra medida, bem que poderia ser de 24,9% (vinte e quatro inteiros e nove décimos por cento), ou de 22% (vinte e dois por cento), por exemplo.

Nada existe indicando a cientificidade do patamar de valor escolhido.

A dvoga-se haver certa arbitrariedade na estipulaçã o do que cabe para gozo em sucessã o legítima, tanto pela lei (50%), como pela ótica dessa doutrina (25%), o que se alega nã o na acepçã o pejorativa da palavra, mas em seu sentido estrito, apregoando-se que tais percentuais nã o passam de estimativas pessoais dos legisladores de cada época, nã o se afigurando exatamente autorizada sob o ponto de vista jurídico, uma ou outra tese.

(29)

de uma pessoa economicamente abastada, na medida em que estes mesmos pois 25% (vinte e cinco por cento) de uma fortuna, nesta hipótese, ultrapassariam o mínimo existencial que supostamente seria o fundamento da legítima que a instituiu.

3.2 O funcionamento atual da sucessã o legítima e o exer cício da autonomia pr ivada

No B rasil, a sucessã o legítima é disciplinada em seus atuais termos pelo C ódigo C ivil 2.002, em assemelhada dicçã o face ao C ódigo C ivil de 1.916, trazidas mudanças visando a eliminar diferenças que eram outrora legalmente afirmadas. C om efeito, exemplificativamente, afastou-se o trato diferente estre os filhos

20

, o que é regido também pela C onstituiçã o F ederal

21 .

Nessa toada, foram trazidos os mesmos fundamentos do C ódigo C ivil de 1.916 para o C ódigo de 2.002, o qual, inicialmente, cria limites ao direito de disposiçã o da herança em seu art. 1.789:

A rt. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

22

T odavia, apenas no art. 1.846 o C ódigo traz a previsã o específica do instituto legal da legítima, verbis: “A rt. 1.846: Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.”

23

C om isso, tem-se por indisponível a metade dos bens daquele que deixará a herança, pois sã o de pleno direito dos herdeiros necessários, os quais, por sua vez, sã o aqueles que a lei considera inarredáveis em seu art. 1.845.

Optando por nã o deixar lacunas legislativas, o C ódigo C ivil de 2.002 possui outra previsã o específica que enfatiza a indisponibilidade da legítima por meio de testamento em seu art. 1.857, § 1

o

, o qual, a nosso ver, é dispositivo legal desnecessário e mesmo demasiado, visto que sua disposiçã o já poderia ser deduzida dos artigos anteriormente citados. E is:

20

B R A S IL . L ei 3.071, de 01 de janeiro de 1916 ( C ódigo C ivil de 1.916)

21

“A rt. 227. É dever da família, da sociedade e do E stado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentaçã o, à educaçã o, ao lazer, à profissionalizaçã o, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivê ncia familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligê ncia, discriminaçã o, exploraçã o, violê ncia, crueldade e opressã o.

§ 6º Os filhos, havidos ou nã o da relaçã o do casamento, ou por adoçã o, terã o os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiaçã o.”

22

B R A S IL . L ei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. ( C ódigo C ivil)

23

(30)

A rt. 1.857. T oda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.

§ 1

o

A legítima dos her deir os necessár ios nã o poder á ser incluída no testamento.

24

( grifo nosso)

A lém de disciplinar os limites relacionados, o C ódigo C ivil de 2.002 também dispõe como se resolverã o os casos em que as limitações ao direito de testar tenham sido infringidas, o que faz em seu art. 1.967, verbis:

A rt. 1.967. A s disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ã o aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

§ 1

o

E m se verificando excederem as disposições testamentárias a porçã o disponível, serã o proporcionalmente reduzidas as quotas do herdeiro ou herdeiros instituídos, até onde baste, e, nã o bastando, também os legados, na proporçã o do seu valor. § 2

o

S e o testador, prevenindo o caso, dispuser que se inteirem, de preferê ncia, certos herdeiros e legatários, a reduçã o far-se-á nos outros quinhões ou legados, observando-se a seu respeito a ordem estabelecida no parágrafo antecedente.

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T orna-se esvaziada, portanto, a disposiçã o de vontade que ultrapassa as partes excedentes da porçã o disponível no testamento deixado, impossibilitando-se de maneira prática a violaçã o das regras da sucessã o legítima.

F inalmente, a lei também traz as únicas hipóteses nas quais o referido direito da legítima poderá ser repelido, conforme previsã o do art. 1.961 do C ódigo C ivil de 2.002:“A rt. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessã o.”

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A exclusã o de herdeiros ou legatários da sucessã o possui previsã o no art. 1.814, o qual dispõe:

A rt. 1.814. Sã o excluídos da sucessã o os herdeiros ou legatários:

I - que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessã o se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III - que, por violê ncia ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

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A lém dos casos acima previstos, dispõem os artigos 1.961 a 1.965 acerca da deserdaçã o. D entre as hipóteses previstas por esses artigos, encontram-se a ofensa física, a

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B R A S IL . L ei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. ( C ódigo C ivil)

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injúria grave, o desamparo do ascendente em alienaçã o mental ou grave enfermidade, dentre outras ofensas diretas à pessoa que deixará os bens a título de herança.

Há de se ressaltar que, além das previsões acima, pode-se imaginar hipóteses nas quais um indivíduo, exercendo seu direito de testar, queira excluir do rol de herdeiros aquele previsto como herdeiro necessário pela lei, seja por diferenças de crenças ou convicções que levem ao completo distanciamento familiar, ou por quaisquer outros motivos individuais que nã o sejam previstos por lei.

Nestes termos, admite-se que a legislaçã o vigente entende que os herdeiros necessários, de certa forma, participaram da aquisiçã o dos bens que deverã o ser deixados pelo autor, assim possuindo expectativa de fato no que tange ao recebimento de bens de seu ente familiar, motivo pelo qual torna legalmente impossível a violaçã o do quinhã o indisponível a título de legítima, tal, certo, um entendimento equivocado.

E m verdade, diante da preservaçã o de tal direito pela lei, termina-se por gerar vantagem em demasia para quem, na condiçã o de familiar, já tem a participaçã o patrimonial assegurada por conta do regime de bens do casamento e as extensões desses regimes à uniã o estável, de modo que se faz desnecessária a previsã o acerca da legítima do art. 1.789 e 1.846 do C ódigo C ivil para amparar-se o companheiro ou cônjuge.

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4 R A Z O Á V E I S C O NS E Q UÊNC I A S NE G A T I V A S D O I NS T I T UT O D A L E G ÍT I M A NO D I R E I T O B R A SI L E I R O

T razidos os fundamentos do direito sucessório brasileiro e da legítima testamentária, suscitadas as discussões doutrinárias e questões que circundam a matéria, bem como feita breve análise do funcionamento das regras sucessórias no que tange ao direito de testar, avança-se para a análise de questões cotidianas acerca do funcionamento desta matéria no ordenamento jurídico brasileiro.

4.1 A impossibilidade de exclusã o de her deir os necessár ios por questões pessoais

C onsoante vem sendo apregoado, sóserápossível a exclusã o de herdeiro necessário da divisã o da herança em casos gravíssimos, a exemplo de quando este é partícipe de homicídio doloso ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessã o se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente, bem como nos casos de acusaçã o caluniosa em juízo ou atos atentatórios à liberdade de testar, nos termos do art. 1.814 do C C /2.002.

A pesar de serem previsões corretas, tem-se que o referido artigo é bastante limitado para regular esse tipo de questã o pessoal, sendo impossível que a legislaçã o acompanhe as muitas vivê ncias individuais das famílias.

A lei sequer cogita da situaçã o de um filho que tenha sido rejeitado pela família por ter se declarado homossexual, o qual passa a viver à parte dela, marginalizado, sem mais ter qualquer contato com esta, quando seria consentâneo pudesse dispor completamente de seus bens em favor de seu companheiro, excluindo a família com a qual deixou de manter qualquer relaçã o.

T ambém nã o permite a lei que o testador exclua herdeiros necessários de seu ato de última vontade por motivos de abandono afetivo, o que tem sido objeto de discussões após a histórica decisã o do S uperior T ribunal de J ustiça (S T J ) que condenou um pai a indenizar sua filha na quantia de R $200.000,00 (duzentos mil reais) em virtude da inobservância de seus deveres de cuidado com a prole:

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nã o com essa expressã o, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinê ncias, como se observa do art. 227 da C F /88. 3. C omprovada que a imposiçã o legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrê ncia de ilicitude civil, sob a forma de omissã o. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criaçã o, educaçã o e companhia - de cuidado - importa em vulneraçã o da imposiçã o legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensaçã o por danos morais por abandono psicológico. 4. A pesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relaçã o à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formaçã o psicológica e inserçã o social. 5. A caracterizaçã o do abandono afetivo, a existê ncia de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes - por demandarem revolvimento de matéria fática - nã o podem ser objeto de reavaliaçã o na estreita via do recurso especial. 6. A alteraçã o do valor fixado a título de compensaçã o por danos morais é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo T ribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7. R ecurso especial parcialmente provido.

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A dmitindo a jurisprudê ncia do S T J que o abandono afetivo é fator que configura a ausê ncia de um familiar na vida do indivíduo, o que tem, inclusive, o condã o de caracterizar ato ilícito que gera direito à pretensã o de indenizações, sugere-se que este fator possa ser determinante, também, no que tange à vontade do testador de dispor ou nã o seus bens a favor de certos familiares.

A penas a título de debate, imagina-se um possível testamento feito por esta filha que fosse a autora da açã o, buscando ela dispor sobre o destino de seus bens a despeito da participaçã o do pai, a quem quisesse afrontar, nã o permitindo participasse de sua sucessã o. Ora, a mesma ordem jurídica que reconhecera o direito dela a discutir o abandono afetivo do pai nã o lhe daria amparo no justo desejo de vê -lo afastado de sua sucessã o!

S aliente-se que o abandono afetivo é grave o suficiente para caracterizar a condenaçã o por danos morais (em valores bastante altos), mas, por meio da legislaçã o vigente, nã o é fator que possibilite a exclusã o de um herdeiro necessário de seu testamento, mesmo que o parente tenha sido completamente ausente na vida do testador, o que ocorre por violaçã o à legítima.

A credita-se, portanto, que o direito de propriedade é alvo de inconveniente investida pelo E stado quando a lei resolve criar normas acerca de sua destinaçã o, assim concebendo o regramento acerca da legítima. A figura-se que invade e resolve sobre o que nã o é seu, quando preestabelece normas para beneficiar os que entende serem herdeiros

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necessários, tomando do verdadeiro titular do bem a livre faculdade de dispor sobre o que é seu.

4.2 A impossibilidade do favor ecimento de questões pessoais e sociais

Outra hipótese curiosa acerca dos efeitos da legítima no ordenamento jurídico brasileiro diz respeito à impossibilidade de testarem-se todos os bens para instituições filantrópicas que favoreçam a caridade, ideia que pode ser assaz comum nos dias de hoje.

E m países nos quais nã o existem o instituto da legítima, a exemplo dos E stados Unidos da A mérica, sã o frequentes os casos de personalidades que constituem patrimônios bilionários e resolvem por deixá-los para instituições de caridade, reservando apenas uma pequena fatia da fortuna para seus familiares e até mesmo para seres nã o humanos.

O exemplo mais famoso é do bilionário W illiam Henry "B ill" G ates III, popularmente conhecido como B ill Gates

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, o qual francamente já assegurou que deixará US $10.000.000,00 (dez milhões de dólares) para cada um de seus filhos, enquanto que doará o resto de sua fortuna avaliada em US $80.000.000.000,00 (oitenta bilhões de dólares) para instituições de caridade, principalmente a que ele mesmo criou, qual seja a Bill and Melinda Gates F oudation, o que totalizará 99,96% de sua fortuna para a caridade.

E m entrevista à R evista F orbes Magazine 30

, o magnata afirmou (traduçã o livre) 31

: [ ...] S erá uma minúscula porçã o da minha fortuna. Isso significa que eles (filhos de B ill Gates) terã o que encontrar seu próprio caminho. E les receberã o uma educaçã o inacreditável... Mas precisarã o escolher um emprego que gostem e irem trabalhar.

C aso fosse efetivada no direito brasileiro, a destinaçã o do patrimônio indicada nã o seria possível da forma como foi feita. Na realidade, metade da fortuna teria que ser mantida com os herdeiros necessários.

R essalte-se que a tese de que a legítima se embasa na funçã o social da propriedade, alegando uma destinaçã o mais positiva da propriedade para a sociedade, também

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"B riefly Noted | E xcellence in Philanthropy | T he Philanthropy R oundtable". D isponível em:http://www.philanthropyroundtable.org/topic/excellence_ in_ philanthropy/briefly_ noted80. A cessado em 15 de Maio de 2016.

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“Microsofts B ill Gates. A rare remarkable interview worlds second richest man D isponível em:

http://www.dailymail.co.uk/home/moslive/article-2001697/Microsofts-B ill-Gates-A

-rare-remarkable-interview-worlds-second-richest-man.html. A cesso realizado em 15 de Maio de 2016.

Referências

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