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Influência da Nutrição Sobre a Programação Metabólica

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Influência da Nutrição

Sobre a Programação

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Carlos Alberto Nogueira de Almeida • Mestre e Doutor em Pediatria pela USP

• Título de Área de Atuação em Nutrologia Pediátrica • Diretor do Dep. de Nutrologia Pediátrica da ABRAN • Professor da Universidade de Ribeirão Preto

Até há pouco tempo, era bem sedimentado o conceito de que o material genético era uma espécie de guia definitivo, que determinava todas as características de um indivíduo, desde a cor de seus olhos até sua propensão a

doenças1. Mudanças nessa determinação gravada nos cromossomos somente seriam possíveis por meio de mutações.

Esses eram eventos relativamente raros e com repercussões restritas às células derivadas daquela que havia sofrido o processo, com exceção das situações que ela ocorria precocemente, no início do período embrionário, mas isso, muitas

vezes, era incompatível com a vida2. Entretanto, ainda em 1933, Kermack e colaboradores, analisando dados

históri-cos ingleses de mortalidade, mostraram que as condições ambientais durante a vida fetal e os primeiros meses de vida

pareciam determinar, em certa medida, e independente da carga genética, a sobrevida das gerações futuras3. Naquele

momento, esses autores já postulavam que a mortalidade infantil poderia ser reduzida atuando-se na saúde materna. Na década de 1960, Neel propôs a hipótese do genótipo poupador, que dizia que o ser humano, durante milhares de anos, havia se beneficiado da presença de um genoma voltado a poupar energia para os momentos de privação, o que

ocorria frequentemente na história da humanidade4. Mas, segundo Neel, nos dias atuais, essa tendência poderia levar

à obesidade e a doenças correlatas. Note-se que esse fenômeno dependia da ocorrência de mudanças no genoma, de mutações adaptativas, dentro do modelo Darwiniano. Ravelli e colaboradores, em 1976, mostraram que filhos de mu-lheres expostas à escassez alimentar durante a “fome holandesa”, ocorrida devido ao cerco da Holanda pela Alemanha na Segunda Guerra Mundial, tinham tendência à obesidade quando haviam se desnutrido no início da gestação;

entre-tanto, o mesmo não ocorria quando a desnutrição materna acontecia no final da gravidez5. Como não poderia haver

mudanças no material genético do feto, que permanecia com o mesmo genoma mas com fenótipo distinto, postulou-se

que poderiam ocorrer mudanças funcionais na expressão gênica5.

Enfim, em 1987, Barker, com base em seus estudos na Inglaterra, envolvendo 5.634 homens nascidos entre 1911 e 1930, correlacionou insultos à saúde ocorridos no começo da vida a problemas cardiovasculares na adultícia

e criou o modelo chamado de fenótipo poupador, em contraposição ao genótipo poupador de Neel6. Basicamente, o

que Barker postulou foi que o material genético poderia ser reprogramado, em fases precoces da vida, a fim de adap-tar o ser em desenvolvimento às condições ambientais. A esse conjunto de novas possibilidades de expressão gênica, Alan Lucas denominou “Programming”, que chamamos em português de “Programação Metabólica”, sobre o qual ele explica como sendo o resultado de “modificações não estruturais do material genético, consequentes de insulto ou

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Faltava explicar o mecanismo para essas mudanças funcionais. E a resposta veio da epigenética, que é definida como “todas as mudanças reversíveis e herdáveis no genoma funcional que não alteram a sequência de nucleotídeos do DNA”11. Vale a pena ressaltar que essas mudanças são reversíveis e herdáveis12, ou seja, é possível, durante os perí-odos de elevada plasticidade, reverter as mudanças mas, uma vez que elas persistam, além de influenciarem a saúde

do indivíduo por toda sua vida, podem ser transmitidas à geração seguinte13. Isso aumenta muito a responsabilidade

do profissional que atende a criança nos primeiros 1.000 dias porque condutas adequadas, nessa fase, podem evitar problemas para a criança e seus descendentes14.

Há três mecanismos epigenéticos principais: a metilação, as mudanças químicas nas histonas e a atuação dos

RNAs não-codificantes15. A metilação é um processo pelo qual radicais metil são adicionados a trechos específicos da

molécula de DNA alterando a expressão de determinado gene. As histonas são estruturas em volta das quais o DNA se organiza e modificações em sua configuração espacial são capazes de controlar a transcrição. Por fim, os RNAs não--codificantes são pequenas fitas de nucleotídeos capazes de modular a expressão dos genes por meio do silenciamento transcricional ou pós-transcricional. A Figura 1 mostra esquematicamente esses mecanismos.

Metilação é o processo pelo qual radicais metil são adicionados a trechos específicos da molécula de DNA alterando a expressão de determinado gene.

Histonas são estruturas em volta das quais o DNA se organiza e, modificações em sua configuração espacial, são capazes de controlar a transcrição.

RNAs não-codificantes são pequenas fitas de nucleotídeos capazes de modular a expressão dos genes através do silenciamento transcricional ou pós-transcricional.

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A demonstração mais evidente de programação metabólica ocorre com a obesidade11, uma vez que fetos sub-metidos à subnutrição intrauterina conseguem se adaptar para sobreviver mas, para isso, são reprogramados para serem conservadores de energia16. Após o nascimento, se a restrição alimentar cessa, o novo perfil fenotípico leva ao acúmulo excessivo de gordura17. Os estudos posteriores às demonstrações de Barker6,16,18 mostraram que não se tratava apenas de uma simples habilidade para conservar energia, mas a todo um conjunto de mudanças no perfil metabólico

essen-ciais na fase intrauterina, mas inadequadas no meio externo19. Várias dessas mudanças acabavam repercutindo na vida

adulta20, gerando diversos quadros, tais como maior pressão arterial, risco elevado de diabetes, dislipidemias, redução na densidade óssea, respostas inadequadas ao estresse, menor elasticidade arterial, mudanças em perfis de produção

hormonal e, até mesmo, maior propensão a algumas doenças mentais21.

Observou-se também que não somente a subnutrição intrauterina poderia reprogramar os genes, mas vários outros agravos, nutricionais ou não, em períodos críticos, de elevada plasticidade, como os primeiros 1.000 dias de

vida2. Hoje, reconhece-se que muitos aspectos ligados à saúde da mãe podem, adicionalmente, interferir nessa

pro-gramação22. Hofman e colaboradores23 propõem que o ambiente adverso, que leva ao insulto inicial capaz de fazer a

programação metabólica, ocorre de forma diferente de acordo com o perfil de nascimento. Nas crianças a termo, mas com restrição de crescimento intrauterino, o agravo ocorreria na fase pré-natal; por outro lado, no caso dos prematuros, aconteceria nos primeiros meses de vida. De fato, vários estudos têm mostrado que o perfil pós-natal de crescimento e ganho de peso acelerados observados em bebês nascidos prematuramente, mas também em bebês a termo quando alimentados inadequadamente, levam à diminuição da sensibilidade à insulina, alterações de padrões de crescimento

e ao aumento da adiposidade15. Cabe destacar que um dos fatores mais relevantes que leva ao crescimento pós-natal

acelerado e à obesidade futura é o excesso de consumo de proteínas nos primeiros meses de vida24, sendo esse um

exemplo clássico de como o profissional pode atuar na prevenção da obesidade, estimulando o aleitamento materno ou, na impossibilidade desse, prescrevendo fórmulas infantis com teor proteico adequado.

O Brasil enfrenta de forma evidente um processo de transição nutricional. Ao mesmo tempo em que a desnutri-ção energético-proteica tem apresentado queda em sua prevalência, o sobrepeso e a obesidade rapidamente se

candi-datam ao posto de maior problema nutricional do país. Dados da última Pesquisa de Orçamentos Familiares25 mostram

que, para as crianças com idades entre cinco e nove anos, a prevalência de sobrepeso/obesidade saltou, entre 1989 e 2009, de 13,8% (meninos) e 10,4% (meninas) para 51,4% e 43,8%, respectivamente e, entre os adolescentes, saltou de 20,8% (meninos) e 18,1% (meninas) para 27,6% e 23,4%, respectivamente. Para a criança, a obesidade representa, muitas vezes, o fator desencadeante para uma série de comorbidades que interferem na saúde atual e podem persistir até a vida adulta. Dentre elas, destacam-se26: dislipidemias, resistência insulínica, problemas ortopédicos, hipertensão arterial, esteatose hepática, infarto do miocárdio e acidente vascular encefálico.

Muitas vezes, a procura por explicações quando a obesidade já se encontra instalada é difícil e leva a resultados

surpreendentes. Nogueira de Almeida e colaboradores27, em artigo publicado em 2015, mostraram que, avaliando-se

um corte transversal, a ingestão calórica e o padrão de atividade física eram semelhantes quando crianças obesas eram comparadas a seus pares eutróficos. Sendo assim, parece que a busca pelos fatores causais precoces pode ser a chave para a melhor compreensão da atual epidemia de obesidade. Nesse sentido, o reconhecimento da programação meta-bólica, que pode ocorrer no começo da vida, é fundamental para que todas as medidas sejam tomadas, tanto do ponto de vista de saúde pública, como no atendimento individual, para que a criança possa viver em um ambiente adequado. Do ponto de vista nutricional, esse trabalho começa com a atuação do pediatra antes do nascimento, junto à gestan-te28. Depois, dentro da proposta da Puericultura, inclusive nos programas de saúde da família29, passa pelo estímulo ao aleitamento materno e, enfim, se completa com a adequada orientação à mãe sobre fórmulas infantis, alimentação complementar, suplementação de micronutrientes e importância da atividade física.

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Ferdinand Haschke

• Mestre e Doutor em Pediatria pela Universidade de Medicina de Viena, Áustria

A ALIMENTAÇÃO INFANTIL PODE INFLUENCIAR

A SAÚDE DAS CRIANÇAS EM LONGO PRAZO?

GANHO DE PESO ACELERADO NA INFÂNCIA E OBESIDADE ADULTA

Os padrões de crescimento para lactentes e crianças até 5 anos de idade publicados pela Organização Mundial

da Saúde (OMS)1 definem o “crescimento saudável” de crianças, predominantemente amamentadas (além de 6 meses

de vida), vivendo em diferentes continentes e ambientes favoráveis. A maioria dos países do mundo utilizam atualmente as curvas de percentis da OMS para o peso, comprimento/altura, IMC e demais parâmetros antropométricos. Cresci-mento rápido (acelerado) significa uma criança que ultrapassa 2 linhas de percentil durante o primeiro ano de vida (ex. a partir do peso ao nascer abaixo do percentil 50, para o peso acima do percentil 75 aos seis meses). O ganho de peso acelerado durante os primeiros meses de vida é altamente associado ao maior risco de obesidade durante a infância e

vida adulta2. Uma meta-análise recente indicou um risco de obesidade de 2 a 3 vezes maior. Portanto, o crescimento

rápido durante a primeira infância pode ter consequências ao longo da vida, como o risco aumentado de doenças crô-nicas não transmissíveis associadas à obesidade (como diabetes tipo II, doenças cardiovasculares, etc.). Além disso, as consequências econômicas de saúde para a população brasileira podem ser substanciais.

A ALIMENTAÇÃO INFANTIL PODE CONTRIBUIR PARA O GANHO DE PESO ACELERADO E PARA A OBESIDADE FUTURA?

Mães com sobrepeso/obesidade. Em todo o mundo, 38% das mulheres estão atualmente acima do peso (IMC entre 25 e 30 kg/m2) e obesas (IMC acima de 30 kg/m2). Assustadoramente, a prevalência correspondente no Brasil

(sobrepe-so + obesidade) é de 58,8%3. Além disso, 14% das meninas e 22,1% dos meninos até 20 anos de idade no Brasil estão

com sobrepeso e obesidade. Houve um aumento drástico na obesidade infantil e adulta durante as últimas 3 décadas. A obesidade materna pode resultar na programação (epigenética) desfavorável pré e pós-natal de genes importantes do descendente. Filhos de mães com sobrepeso apresentam um ganho de peso mais acelerado durante o período fetal (isto

é, maior peso ao nascer) e primeira infância4, mesmo sendo alimentados exclusivamente pelo leite materno durante os

primeiros 6 meses de vida.

Alta ingestão de proteína com fórmulas infantis tradicionais. Muitos estudos indicam que tanto os bebês de mães com sobrepeso/obesas quanto os bebês de mães com IMC normal (18-25 kg/m²) que são alimentados com as fórmulas tradicionais (alto teor de proteína) ganham peso mais rapidamente do que os bebês amamentados. No início dos anos 90, um grupo da OMS documentou ganho de peso e percentual de gordura corporal mais baixos em crianças entre os 5 e os 12 meses de idade que receberam somente a amamentação por 4 a 6 meses, em comparação com crianças

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com-Figura 1. Meta-análise: Escores z de peso em crianças com 4 meses de idade. alimentadas com fórmula a base de soro com 1,8g de proteína/ 100 Kcal em comparação ao padrão OMS(2)

Itália, Palermo 1998 n = 53 Itália, Palermo 1999 n = 108 África do Sul, Joanesburgo 2002 n = 37 Austrália, Adelaide 2002 n = 123 Itália, Palermo 2003 n = 107 França, multi center 2003 n = 224 China, multi center 2003 n = 369 França, Lyon 2005 n = 68 França, Nancy 2005 n = 61 Total dos efeitos fixos n = 1150

-1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0

Peso por idade em escore z (OMS)

Quando comparados com crianças que foram amamentadas até os 6 meses de idade, a ingestão de fórmulas com altos teores de proteína resulta em alterações metabólicas indicadas por biomarcadores (sangue ou urina). Alguns exemplos são a elevação dos aminoácidos de cadeia ramificada (BCAA) leucina, isoleucina, valina, assim como níveis séricos maiores de nitrogênio uréico sanguíneo (BUN), insulina, peptídeo C e fator de crescimento semelhante à

insu-lina I (IGF-I)8,9. A alimentação inadequada, como a ingestão de altos teores de proteína durante os primeiros 2 anos,

pode resultar em alterações desfavoráveis das funções de genes fundamentais para a criança. Qualquer que seja a via principal de ingestão de altos teores de proteína durante a primeira infância, as mudanças são visíveis no metaboloma de crianças que consomem altos teores de proteína, uma vez que os metabólitos (moléculas <1500 Da) são os produtos finais dos determinantes genéticos e epigenéticos, assim como fatores ambientais, incluindo a dieta. Foi demonstrado que os “efeitos de programação” das fórmulas infantis com altas concentrações de proteína são refletidos no metabo-loma e nas vias metabólicas. A elevação do BCAA contribui para os níveis de insulina aumentados e parecem afetar a beta-oxidação dos ácidos graxos. Deste modo, a ingestão de altos teores de proteína e BCAA pode inibir a oxidação de gordura e, portanto, aumentar a deposição de gordura corporal e o risco de adiposidade. A ingestão de altos teores de proteína pode aumentar as concentrações sanguíneas do fator de crescimento semelhante à insulina I (IGF-I). O IGF demonstrou regular o crescimento inicial, a diferenciação do tecido adiposo e a adipogênese precoce. Portanto, uma alta secreção de IGF-1 pode causar o crescimento rápido (acelerado) na primeira infância e posteriormente.

A ingestão de altos teores de proteína não está limitada somente aos lactentes alimentados com fórmulas com alto teor de proteína. Os dados sobre ingestão de proteína por crianças de 3 meses (alimentados somente com fórmula) a 5 anos, indicam que a ingestão contínua de proteína excede de 2 a 3 vezes o necessário. Após os 6 meses, a ingestão de alto teor de proteína de produtos derivados do leite de vaca e outros alimentos complementares com alto teor de

proteína, desempenham papéis dominantes10. Os efeitos da ingestão contínua de altos teores de proteína durante a

idade pré-escolar em países desenvolvidos precisam ser avaliados.

AMAMENTAÇÃO E NOVAS FÓRMULAS COM BAIXO TEOR DE PROTEÍNA PODEM PREVENIR O CRESCIMENTO ACELERADO DURANTE A PRIMEIRA INFÂNCIA

O efeito preventivo da amamentação já foi discutido anteriormente. Em lactentes que não podem ser amamentados ou quando o período de amamentação é curto, fórmulas com baixo teor de proteína são uma alternativa. A primeira fórmula infantil com baixo teor de proteína a base de soro com 1,8 g de proteína/100 kcal foi clinicamente testada em diversos ensaios clínicos randomizados. A fórmula a base de soro tem aminoácidos essenciais similares aos que são encontrados no leite mater-no, e concentrações mais baixas de aminoácidos de cadeia ramificada do que as fórmulas convencionais. Lactentes que foram alimentados exclusivamente com essa fórmula durante os primeiros 4 meses apresentaram biomarcadores (BUN, insulina sérica, aminoácidos de cadeia ramificada) similares aos apresentados por lactentes que eram amamentados exclusivamente. A Figura 1 apresenta uma meta-análise completa, resumindo os resultados de 1150 bebês que foram inscritos em 9 ensaios clínicos11.

A fórmula com baixo teor de proteína a base de soro foi exclusivamente oferecida até os 4 meses de idade. Os dados dos grupos experimentais de fórmulas com baixo teor de proteína foram comparados com os padrões OMS. A meta-análise indica uma diferença muito pequena aos 4 meses, a qual não é estatisticamente significante. Essa meta-análise, portanto, indica que crianças que ingeriram fórmula a base de soro com 1,8 g/100 kcal de proteína de alta qualidade entre 0 e 4 meses de idade cresceram de acordo com o padrão OMS.

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O próximo passo no desenvolvimento de fórmulas infantis veio com as fórmulas com baixo teor de proteína a base de soro (1,9g/100kcal), com a proteína parcialmente hidrolisada. Com segurança comprovada12, a proteína parcialmente

hidrolisada apresenta efeitos benéficos ao lactente, como fácil digestibilidade, rápido esvaziamento gástrico, promoção de fezes mais macias13, além de diminuição do risco de dermatite atópica14,15. Tanto a European Comission Directive, como a

European Food Safety Authority (EFSA), na Europa, assim como a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, aprovam fórmulas infantis com proteína parcialmente hidrolisada como sendo seguras para lactentes saudáveis, e reconhecem sua função na diminuição do risco de dermatite atópica16,17,18.

Recentemente três ensaios clínicos randomizados controlados com modelo experimental similar compararam os resultados de crescimento e metabólicos de bebês que ingeriram fórmulas com um conteúdo maior ou menor de proteína até os 12 meses de idade8,9,19. Os ensaios são interessantes porque também se concentram no período em que as fórmulas de

acompanhamento são recomendadas. Um estudo, o projeto multicêntrico European CHOP acompanhou as crianças até os 6 anos de idade19. A análise de acompanhamento aos 6 anos, indicou um IMC significativamente mais baixo no grupo que

ingeriu a fórmula com baixo teor de proteína (P= 0,009) e uma menor prevalência de obesidade infantil (cálculo de risco - 2,87; 95% de intervalo de confiança - 1,22 - 6,75). Dois desses ensaios8,9 testaram uma fórmula experimental na base de soro

(3-12 meses) com um conteúdo de proteína abaixo do limite mínimo de proteína na UE e nos EUA (1,6 g/100 kcal). Os ensaios indicaram que o nível de proteína de 1,6 g/100 kcal é seguro para os bebês8,9 e que o ganho de peso é menor do que em

bebês alimentados com fórmulas com alto teor de proteína8 (2,7g/100 kcal). Uma meta-análise dos 2 ensaios8,9 atualmente

indica que o peso de crianças que receberam fórmula de baixo teor de proteína durante a primeira infância não é diferente dos grupos de referências de crianças que foram somente amamentadas aos 6, 12, 36 e 60 meses.

Os três ensaios clínicos randomizados8,9,19, portanto, indicam que as fórmulas de baixo teor de proteína diminuem o

crescimento acelerado do primeiro ano de vida em diante. Os biomarcadores da alimentação de proteína refletem a ingestão de menos proteína e são mais similares aos biomarcadores das crianças que foram somente amamentadas.

CONCLUSÕES

O crescimento rápido durante a infância é um fator de risco para a obesidade adulta. Mães com sobrepeso/obesas devem considerar um programa de controle de peso antes da gravidez. Bebês alimentados com fórmulas, em especial aqueles que consomem fórmulas de seguimento com alto teor de proteína dos 6 aos 12 meses de idade, recebem uma quantidade excessiva de proteína. Três ensaios clínicos randomizados indicam que a ingestão de proteína em excesso pode resultar no ganho rápido (acelerado) de peso. Amamentação até 6 meses, ou fórmulas infantis com baixo teor de proteína para lactentes que não são amamentados, retardam o ganho de peso durante a infância, o que ajuda a reduzir o risco de obesidade na idade adulta e gera diminuição de custos com a assistência médica para a sociedade.

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Nota importante:

O aleitamento materno é a melhor opção para a alimentação do lactente proporcionando não somente benefícios nutricionais e de proteção, como também afetivos, demonstrando sua superioridade quando comparado aos seus substitutos. É fundamental que a gestante e a nutriz tenham uma alimentação equilibrada durante a gestação e amamentação. O aleitamento materno deve ser exclusivo até o sexto mês e a partir desse momento deve-se iniciar a alimentação complementar mantendo o aleitamento materno até os 2 anos de idade ou mais. O uso de mamadeiras, bicos e chupetas deve ser desencorajado, pois pode prejudicar o aleitamento materno e dificultar o retorno à amamentação. No caso de utilização de outros alimentos ou substitutos de leite materno, devem-se seguir rigorosamente as instruções de preparo para garantir a adequada higienização de utensílios e objetos utilizados pelo lactente, para evitar prejuízos à saúde. A mãe deve estar ciente das implicações econômicas e sociais do não aleitamento ao seio. Para uma alimentação exclusiva com mamadeira será necessária mais de uma lata de produto por semana, aumentando os custos no orçamento familiar. Deve-se lembrar à mãe que o leite materno não é somente o melhor, mas também o mais econômico alimento para o bebê. A saúde do lactente pode ser prejudicada quando alimentos artificiais são utilizados desnecessária ou inadequadamente. É importante que a família tenha uma alimentação equilibrada e que, no momento da introdução de alimentos complementares na dieta da criança ou lactente, respeitem-se os hábitos culturais e que a criança seja orientada a ter escolhas alimentares saudáveis. Em conformidade com o Decreto nº8552/15; a Lei 11265/06; Resolução ANVISA n° 222/02; OMS - Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno (Resolução WHA 34:22, maio de 1981); e Portaria M.S. n° 2.051 de 08 de novembro de 2001.

MATERIAL DESTINADO EXCLUSIVAMENTE AO PROFISSIONAL DE SAÚDE. PROIBIDA A DISTRIBUIÇÃO AOS CONSUMIDORES.

Referências

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