Programa de formação de professores de químicaparfor/ufba:
breve histórico e referencias teórico-metodológico
Teacher Training Program Of ChemistryParfor/Ufba:
A Brief History and References Theoretical and Methodological
Edílson F Moradillo, Bárbara C. P. da Anunciação, Hélio O. Pimentel, Instituto de Química – Universidade Federal da Bahia 40170-115 Campus de Ondina, Salvador - Bahia, Brasil
edilson@ufba.br
RESUMO
O Parfor é um Programa de formação de professores leigos da rede pública de educação do Brasil, implementado pelo Governo Federal, em parceria com os Estados, Municípios e as Ins- tituições de Educação Superior – IES. Neste trabalho, relatamos, de forma breve, a história da reforma curricular da Licenciatura em Química que gerou o Projeto Político Pedagógico do Parfor de Química, na Universidade Federal da Bahia; assim como os principais referenciais teórico-metodológicos utilizados, a exemplo da Pedagogia Histórico-Crítica, da Psicologia His- tórico-Cultural e do trabalho como princípio educativo, com o objetivo de superar o referencial empírico-analítico dominante nos cursos de formação de professores de ciências/química. O curso está no último semestre, mas já podemos afirmar que a perspectiva crítica de currículo passou a ser uma realidade, levando os alunos a ter outro trato com o conhecimento e alte- rando a sua prática pedagógica.
Palavras-chaves: formação de professores, currículo, ensino de química.
SUMMARY
The Parfor is a program of formation of lay teachers from public education of Brazil, implemen-
ted by the Federal Government, in partnership with the States, municipalities and higher Edu-
cation institutions HEIS. In this work, we report, briefly, the history of curricular reform of the
degree course in chemistry that generated the Pedagogical political project of Parfor chemistry,
at the Federal University of Bahia; as well as the major theoretical and methodological referen-
ces used, the example of the Historical critical Pedagogy, Cultural-historical psychology and
work as an educational principle, with the aim of overcoming the empirical analytical frame in
dominant teacher training courses of science/chemistry. The course’s last semester, but we can already say that the critical perspective of curriculum has become a reality, leading students to have another deal with knowledge and changing their pedagogical practice.
Keywords: teacher education, curriculum, teaching of chemistry.
INTRODUÇÃO
Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em 1996, o Estado brasileiro passou a exigir que todos os professores da rede Federal, Estadual e Municipal da educação básica fossem formados em Licenciatura, para exercer a carreira do magistério. As- sim, a legislação determinou um prazo para que todos os professores leigos tivessem pelo me- nos uma Licenciatura, de preferencia na área que estava lecionando nas escolas. Desta forma, os Estados e Municípios passaram a incentivar, através de programas especiais, a formação em licenciatura dos seus professores leigos. No estado da Bahia o primeiro programa que a Uni- versidade Federal da Bahia (Ufba) assumiu foi em 2005, onde em março de 2008 formamos 39 professores em química.
A partir de 2009 o Governo Federal assume a tarefa de promover a formação de professores a partir de um programa federal, beneficiando assim todos os Estados e Municípios brasileiros.
Esse programa, denominado de Parfor — Plano Nacional de Formação de Professores da Edu- cação Básica, é um programa coordenado pelo Ministério de Educação (MEC) e pela Coorde- nação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), em parceria com os Estados, Municípios e as Instituições de Educação Superior (IES). Tem como objetivo principal a for- mação de professores —1ª ou 2ª licenciatura— da rede pública de educação básica, para que estes profissionais possam obter a formação exigida pela LDB de 1996, proporcionando assim, a melhoria da qualidade da educação básica no País.
A Ufba iniciou esse novo programa em agosto de 2010, com oito cursos, e dentre eles o de Licenciatura em Química. Nesse momento estamos no último semestre do curso, 2013.2.
A experiência acumulada no primeiro curso de licenciatura especial em química, executado
de março de 2005 a março de 2008, nos levou, em 2010, a consolidar uma matriz curricular
para o Projeto Político Pedagógico do Parfor/Química que radicalizasse na perspectiva crítica de
formação de professores, com o objetivo de superar a formação clássica, baseada na perspectiva
empírico-analítica. Portanto, esse trabalho trata da breve história da organização da matriz
curricular e dos principais referenciais teórico-metodológicos adotados no Projeto Político
Pedagógico do Curso Especial de Licenciatura em Química da Ufba, no âmbito do Parfor.
BREVE HISTÓRICO DA CRIAÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO
Com a nova LDB de 1996 o curso de Licenciatura em Química da Ufba passou a ser questionado e analisado por seu corpo docente, principalmente pelo grupo de ensino de química, no intuído de constituir um outro Projeto Político Pedagógico que levasse em conta as novas demandas sociais, a nova conjuntura da economia-política e, acima de tudo, que trouxesse uma conce- pção de formação de professores que radicalizasse na analise da realidade social, a partir da ontologia do ser social (Moradillo, 2010).
A análise da matriz curricular do curso, até então, revelava fragmentações entre as disciplinas específicas e as disciplinas pedagógicas e um distanciamento entre os conteúdos dessas duas modalidades de disciplinas e as questões relativas ao ensino de química. Além disso, apresen- tava uma concepção de processo educativo de caráter idealista, onde a educação é tomada como um complexo social com autonomía absoluta, vale dizer, sem levar em consideração a relação reflexiva com a historicidade do processo social do homem se fazer homem a partir de si mesmo (Lessa, 2007; Lukács, 2012).
Em relação às disciplinas específicas, a dicotomia teoria/prática era explicitada na própria orga- nização curricular, onde as disciplinas teóricas eram mais valorizadas que as práticas, refletindo também na valorização dos professores que inistravam
aulas teóricas ou práticas. Esta dicotomia refletia, a nosso ver, a base material que
sustenta as nossas relações sociais: a sociedade produtora de mercadorias, onde o trabalho intelectual se contrapõe ao trabalho manual e é mais valorizado.
A perspectiva empírico-analítica predominava no curso, reforçando uma concepção de ciência que valoriza a neutralidade axiológica do método científico e da imparcialidade do pesquisa- dor, convertendo a pesquisa e o ensino em técnicas de descrição e explicação de fenômenos, descolando-os dos seus contextos sóciohistóricos.
Assim, os conceitos eram trabalhados sem sua relação reflexiva com o contexto de produção, pu- rificando-o de suas determinações sociais e materiais, proporcionando, dessa forma, uma conce- pção de ciência linear e acumulativa, isto é, sem rupturas (Lôbo, 2004; Oki, 2006; Moradillo, 2010).
Nas nossas pesquisas, o exame do desenvolvimento histórico dos conceitos da ciência/quí- mica revelava as descontinuidades existentes ao longo do tempo. Um exemplo esclarecedor é o do calor, que através do século
xixpassou por substância, forma de energia, transferência de energia interna e transferência de energia cinética corpuscular (microscópica) (Silva; Moradillo;
Penha, 2002). Por isso, para nós, a história da ciência deveria aparecer como conhecimento fun- damental na formação inicial dos professores, cabendo-lhe um lugar de destaque no currículo e abrindo espaço para a crítica e a superação da concepção ingênua de conhecimento/ciência/
química.
A superação do modelo empírico-analítico de formação de professores exigiu uma reflexão mais profunda para que pudéssemos propor ações que não se limitassem
apenas às questões técnicas. Nas discussões sobre a reforma curricular que vinham aconte- cendo na Ufba, priorizavam-se aspectos tais como: carga horária das disciplinas e do curso, tempo de duração, sistema de requisitos — a matriz curricular —, etc. As questões pedagógicas, quando em pauta, eram entendidas como metodológicas e consideradas como pertencendo à esfera da Faculdade de Educação. As questões filosóficas, como por exemplo, dos fundamentos do ser social, nem eram consideradas.
As questões sociais, quando eram propostas, tomavam como base a contribuição que a química poderia dar para resolver tecnicamente determinado problema. O ensino de química, como área multidisciplinar, não vinha merecendo a devida atenção no debate.
Esta forma de conduzir a reforma curricular mantinha uma formação docente tecnicista na qual o produto era privilegiado em lugar do processo.
Tentando redirecionar a reforma curricular da Licenciatura em Química da Ufba, pois entendía- mos que a reforma tinha que ir além da simples mudança de disciplinas, procuramos discutir na comissão de reestruturação curricular as concepções de sociedade, educação, conhecimento, ciência e química que permeavam o currículo e propusemos modificações em algumas disci- plinas em que atuávamos para poder avançar na direção em que acreditávamos pudesse con- tribuir para formar profissionais críticos, que tivessem como referência a emancipação humana.
Foi um lento trabalho de discussão acerca da natureza da profissão de professor, a partir de pontos de vista muito distintos.
Assim, a partir dessas discussões, iniciamos o primeiro curso Especial de Licenciatura em Quí- mica da Ufba, em 2005,
1onde colocamos em execução a nova concepção de formação de pro- fessores e, consequentemente, de currículo. Em 2010
2fizemos novos ajustes no novo programa de formação de professores denominado Parfor, que se encontram em vigor até o momento.
1 A partir de 2007 essas mudanças curriculares foram introduzidas também no curso diurno deLicenciatura em Química da Ufba e em 2009 no novo curso de Licenciatura em Química noturno. Parte dessa experiên- cia também foi agregada, em 2008, no curso piloto de Licenciatura em Educação do Campo da Faculdade de Educação da Ufba.
2 A LDB de 1996 e as Diretrizes Curriculares estabeleceram, para o currículo dos cursos de Licenciatura, o mínimo de: 1800h para os conteúdos científicos e culturais, 400h de estágio, 400h de dimensão práti- ca e 200h de atividades complementares. Portanto, vamos chamar de Dimensão Prática ao conjunto de componentes curriculares (disciplinas e atividades) que foram articulados com o objetivo de produzir uma determinada concepção de homem, natureza e sua relação histórica, incluindo aí a educação, a ciência e mais especificamente a química. Concepções essas, que determinam à concepção de professor, ensino e aprendizagem dos alunos, influenciando na sua prática. Desse modo, “a prática como componente curricu- lar é, pois, uma prática que produz algo no âmbito do ensino” (Brasil, 2001, p. 9).