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LOGÍSTICA REVERSA DE CELULARES: AVALIAÇÃO AMBIENTAL DE CENÁRIOS

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LOGÍSTICA REVERSA DE CELULARES:

AVALIAÇÃO AMBIENTAL DE

CENÁRIOS

Daniela da Gama e Silva Volpe Moreira de Moraes (CTI)

danielamoreir@hotmail.com

Tiago Barreto Rocha (CTI/UTFPR)

tiagobarretorocha@gmail.com

Marcia Regina Ewald (CTI)

marcia.ewald@cti.gov.br

Marcos Batista Cotovia Pimentel (CTI)

marcos.pimentel@cti.gov.br

Jose Rocha Andrade da Silva (CTI)

rocha@cti.gov.br

Resumo O presente artigo é resultado de uma coleta de aparelhos celulares e acessórios sem funcionamento realizada no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), no âmbito do projeto AMBIENTRONIC. O objetivo foi avaliar comparattivamente dois cenários de logística reversa de aparelhos celulares. Para isso, foi utilizada a técnica de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV). O primeiro cenário diz respeito ao que ocorre atualmente no Brasil, no qual as baterias vão para a reciclagem em território nacional e as demais partes são enviadas para o exterior. O segundo cenário refere-se a uma proposta de tratamento totalmente realizada no país. Os resultados apontam menores impactos potenciais para o segundo cenário, com destaque para minimização dos impactos relacionados à acidificação, oxidação fotoquímica, eutrofização e uso de energia não renovável. Além disso, acredita-se que a realização de toda a logística reversa em território nacional possibilitará ganhos sócio-econômicos com a comercialização dos materiais e também com geração de emprego e renda. Abstract This article is a result of a cell phones collection performed at the Center for Information Technology Renato Archer (CTI), under the project AMBIENTRONIC. The objective was to assess two reverse logistics scenarios of cell phones. To evaluate these scenarios, we used the technique of Life Cycle Assessment (LCA). The first one is the currently scenario in Brazil, where the batteries go to recycling in the country and the other parts are outsourced. The second scenario is a proposal related to a treatment fully realized in Brazil. The results indicate less potential impacts to the second scenario, with emphasis on minimization of impacts related to acidification, photochemical oxidation, eutrophication and the use of non-renewable energy. Furthermore, we believe that reverse logistics fully implemented in Brazil will enable social-economic benefits from the sale of materials and also generates employment and income.

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Keywords: reverse logistics; life cycle assessment; analysis of scenarios; environmental assessment

Palavras-chaves: Logística reversa; avaliação do ciclo de vida; avaliação de cenários; avaliação ambiental

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1. Introdução

O aumento contínuo na produção e consumo dos equipamentos eletroeletrônicos, aliado a sua obsolescência planejada, tem levado ao aumento da preocupação com o seu descarte ambientalmente correto.

O descarte incorreto desses materiais gera significativos impactos ambientais, não só pelo volume e pelo tempo que os resíduos eletroeletrônicos levam para se decompor, mas também pela presença de metais pesados em sua composição que são prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente.

Evitar o aumento acelerado desse passivo em todo o mundo tem sido a principal motivação para elaboração de legislações que visam reduzir o teor das substâncias perigosas presentes nos resíduos eletroeletrônicos, bem como viabilizar sua reciclagem e dar-lhes uma correta destinação ao final de sua vida útil. Podemos, por exemplo, citar as diretivas européias WEEE (waste electrical and electronic equipment) e RoHS (restriction of the use of certain hazardous substances in electrical and electronic equipment) que são referências mundiais. Seguindo essa tendência, o Brasil instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), Lei nº 12.305/2010, regulamentada pelo Decreto nº 7.404/2010. A PNRS reúne o conjunto de princípios, instrumentos, diretrizes, metas e ações visando à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.

Verifica-se que diante desta realidade, as empresas começam a buscar novos processos de produção e de gestão sustentáveis, a fim de garantirem sua sobrevivência em tempos de escassez de recursos e demanda por produtos ambientalmente corretos.

Uma iniciativa do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), apoiada pelos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), do Meio Ambiente (MMA) e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) tem como objetivo promover o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis, voltadas à inovação de produtos, processos, modelos de gestão e componentes e materiais eletroeletrônicos. Intitulado AMBIENTRONIC, o projeto, iniciado em 2007, visa criar no país a infra-estrutura necessária para auxiliar o complexo eletroeletrônico nas ações de adequação às normas ambientais e a outros requisitos igualmente importantes para agregar valor aos produtos nacionais.

O presente artigo é resultado de uma coleta de aparelhos celulares e acessórios sem funcionamento realizada no CTI, no âmbito do projeto AMBIENTRONIC, e tem por objetivo avaliar comparativamente dois cenários de logística reversa desses equipamentos no Brasil.

2. Fundamentação teórica

2.1. Regulações ambientais para o setor de equipamentos eletroeletrônicos

As empresas têm se mostrado cada vez mais ativas e atentas para as questões ambientais, apresentando um crescimento substancial deste quesito no que diz respeito à importância estratégica no mercado e na sociedade (SOUZA et. al., 2002).

O desenvolvimento tecnológico propiciou maior velocidade na obsolescência dos equipamentos eletroeletrônicos e, segundo a UNEP (2010), são geradas de 20 a 50 milhões de toneladas desses equipamentos anualmente no mundo.

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4 A preocupação com o tema incitou em um conjunto de regulações específicas relacionadas às questões ambientais. Nesta seção, abordaremos as regulações relacionadas aos equipamentos eletroeletrônicos que vêm sendo consideradas fatores-chave de competitividade.

Uma iniciativa específica ao gerenciamento de resíduos perigosos foi a Convenção de Basiléia, de 1989, que estabeleceu aos países participantes diretrizes sobre o transporte e movimentação de resíduos perigosos e foi promulgada pelo Brasil em 1993.

Durante a década de 1990, a ISO criou um comitê (Comitê Técnico TC 207) com o objetivo de desenvolver normas (série 14000) de caráter voluntário que estabelecessem requisitos para as empresas gerenciarem seus produtos e processos de forma a não agredir o meio ambiente. Discussões sobre o problema na Comunidade Européia culminaram, no ano de 2003, na promulgação das Diretivas WEEE e RoHS, regulações específicas para os equipamentos eletroeletrônicos.

A Diretiva WEEE tem por objetivo prioritário a prevenção dos resíduos eletroeletrônicos e, adicionalmente, sua reutilização, reciclagem e outras formas de valorização, de maneira a reduzir a quantidade de resíduos a ser disposta. Também tem como pretensão melhorar o comportamento ambiental de todos os operadores envolvidos no ciclo de vida dos equipamentos eletroeletrônicos.

A WEEE traz entre seus princípios o da responsabilidade ampliada do produtor, sendo este, responsável por financiar a coleta, o tratamento, valorização e eliminação dos resíduos eletroeletrônicos. Cabe destacar o incentivo ao ecodesign, de modo a facilitar a desmontagem e a recuperação dos compostos e materiais dos equipamentos eletroeletrônicos e medidas relacionadas à conscientização dos consumidores, visando demonstrar os potenciais efeitos sobre o ambiente e a saúde humana advindos da presença de substâncias perigosas nos eletroeletrônicos, bem como a obrigação em não efetuar o descarte desse tipo de resíduo em lixo comum.

Já a Diretiva RoHS refere-se à restrição e quantidade mínima permitida para o uso de substâncias perigosas em equipamentos eletroeletrônicos comercializados na União Européia. As substâncias proibidas em valores máximos de concentração em materiais homogêneos são: chumbo (0,1%), mercúrio (0,1%), cádmio (0,01%), cromo hexavelente (0,1%), bifenil polibromados (PBB) (0,1%) e éteres difenil polibromados (PBDE) (0,1%).

É válido ressaltar que a restrição da utilização das substâncias perigosas faz aumentar as possibilidades de reciclagem dos resíduos eletroeletrônicos e a sua rentabilidade econômica, além de diminuir o impacto negativo sobre a saúde dos trabalhadores nas instalações de reciclagem.

Frente ao quadro de internacionalização dos mercados, as medidas da Comunidade Européia passaram a sensibilizar, tanto política quanto economicamente, diversos outros países. Por exemplo, nos Estados Unidos, a Califórnia implementou a “Califórnia RoHS” que proíbe a comercialização dos produtos com os valores de concentração acima das mesmas substâncias estabelecidas pela RoHS. No Canadá, em Nova Escócia, foi proposta uma emenda para sua legislação de resíduos, exigindo que o produtor implemente medidas de ecodesign para restringir o uso das seis substâncias perigosas estabelecidas pela RoHS. A China possui duas legislações similares às diretivas européias, a Administrative Measures on the Control of the

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5 a Management Regulation on the Recycling and Treatment of Disposal Appliances and

Electronics Products, mais conhecida como “China WEEE” (ANSANELLI, 2008).

No caso brasileiro, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) institui diretrizes gerais para todo o território nacional, relativas ao manejo dos resíduos sólidos. A PNRS estabelece o compartilhamento de responsabilidades pelo ciclo de vida dos produtos, não se restringindo a responsabilizar os fabricantes. São considerados também responsáveis os importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores e titulares dos serviços de limpeza urbana e manejo.

Dentre seus objetivos estão: a ordem de prioridade de não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição ambientalmente adequada dos rejeitos; o estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; adoção de tecnologias limpas como forma de minimizar os impactos ambientais; redução do volume e periculosidade dos resíduos perigosos; integração de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável. No caso específico da cadeia produtiva de produtos eletroeletrônicos e seus componentes, a PNRS traz a obrigatoriedade da estruturação e implementação de sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor. De acordo com a PNRS, a logística reversa é definida como:

Instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada (BRASIL, 2010).

Verifica-se que tal obrigatoriedade passa a ser um instrumento de promoção de novos negócios para a reciclagem dos resíduos eletroeletrônicos e oportunidade de geração de trabalho e renda.

2.2. Logística reversa: conceituação

O estudo de processos e modelos para o fluxo reverso da logística é relativamente recente e, dessa forma, o termo “logística reversa” tem sido empregado com significados bastante variados. Os enfoques tendem a transitar entre delimitações que enfatizam a operação logística em si, seu papel em relação ao meio ambiente e a vantagem competitiva que seu uso pode trazer à empresa.

Em razão de algumas confusões conceituais, faz-se necessário elucidar que a cadeia de suprimentos abrange um escopo maior de processos e funções do que a logística e, conseqüentemente, do que a logística reversa.

Rogers e Tibben-Lembke (1998, p.2) definem logística reversa como:

Processo de planejamento, implementação e controle da eficiência, do custo efetivo do fluxo de matérias-primas, estoques de processo, produtos acabados e as respectivas informações, desde o ponto de consumo até o ponto de origem, com o propósito de recapturar valor ou dar disposição adequada (tradução nossa).

Paulo Roberto Leite introduz a questão na literatura nacional e a define como:

[...] a área da logística empresarial que planeja, opera e controla o fluxo e as informações logísticas correspondentes, do retorno dos bens de venda e de

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pós-6 consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, por meio dos canais de distribuição reversos, agregando-lhes valor de diversas naturezas: econômico, ecológico, legal, logístico, de imagem corporativa, entre outros (LEITE, 2003, p. 16).

Pela definição anterior, a logística reversa pode ser dividida em duas áreas de atuação: logística reversa de pós-venda e logística reversa de pós-consumo. A primeira diz respeito ao planejamento, controle e destinação dos bens sem uso ou com pouco uso, que retornam à cadeia de distribuição por diversos motivos como, por exemplo, prazo de validade expirado, excesso de estoque nos canais responsáveis pela distribuição, devoluções por problemas de garantia, etc. Já a logística reversa de pós-consumo pode ser entendida como a área da logística reversa que trata dos bens no final de sua vida útil, dos bens usados com possibilidade de reutilização (embalagens) e os resíduos industriais (que devem retornar às indústrias para descarte final ambientalmente correto) (LEITE, 2003).

Diferentemente da logística reversa de pós-venda, de justificativa eminentemente econômica, a logística reversa de pós-consumo também se justifica por questões legais e ambientais. Para Bowersox e Closs (2001, p.51):

A logística reversa não serve necessariamente para aprimorar a produtividade logística. No entanto, o movimento reverso é justificado sobre uma base social e deve ser acomodado no planejamento do sistema logístico [...]. O ponto importante é que a estratégia logística não poderá ser formulada sem uma consideração cuidadosa dos requerimentos da logística reversa.

Verificamos que com a regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, a logística reversa pós-consumo, mesmo que com definição própria, ganha visibilidade.

De acordo com Barbieri e Dias (2002), a logística reversa deve ser concebida como um dos instrumentos de uma proposta de produção e consumo sustentáveis. No entanto, os processos envolvidos na logística reversa também podem trazer impactos ambientais potenciais. Para avaliar de forma consistente os impactos ambientais da logística reversa é preciso, portanto, pensar no ciclo de vida de forma holística.

Esse tipo de avaliação pode ser conduzido pela técnica de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), regida pelas normas ABNT NBR ISO 14040 (ABNT, 2009a) e ABNT NBR ISO 14044 (ABNT, 2009b). Os resultados de uma ACV podem auxiliar na identificação de qual cenário de logística reversa apresenta o menor impacto ambiental potencial.

3. Metodologia

Para condução desse estudo foram coletados celulares no intuito de definir uma amostra para avaliação. Na sequência os aparelhos foram caracterizados, medindo-se a massa e a quantidade de materiais presentes. Tal abordagem foi essencial para definir quais são os materiais presentes no resíduo e seu potencial impacto quando destinados para reciclagem. Uma segunda etapa do estudo foi definir quais são os cenários de logística reversa de celulares no Brasil. Dessa forma, foram consultadas empresas que trabalham com resíduos eletroeletrônicos, bem como dados da literatura (HISCHIER, 2007). Por fim, os cenários propostos foram avaliados comparativamente utilizando a técnica de ACV com o software SimaPro e método de impacto EPD.

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7 A campanha para coleta de celulares e acessórios foi realizada no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), durante 9 dias úteis, compreendendo o período de 27 de Setembro a 7 de Outubro de 2011. A campanha atingiu um universo de, aproximadamente, 850 pessoas entre terceirizados, servidores públicos, bolsistas e funcionários com regime CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

A coleta partiu do princípio da conscientização do púbico alvo por meio de e-mails e divulgação na página oficial do CTI. Em seguida foi feita uma divulgação por meio de banners, durante dois dias, nas recepções do CTI, de forma que todo o público pudesse notar a existência da campanha.

Em um universo de aproximadamente 850 pessoas, somente 25 fizeram doações, o equivalente a 3%. No total foram coletados 112 itens, sendo 82 celulares.

Dentro do universo dos celulares coletados, foram selecionados aleatoriamente 40, totalizando uma massa de 4,942 kg, para desmontagem e caracterização. Os celulares selecionados foram desmontados, agrupados em 3 módulos e pesados. O resultado da caracterização é demonstrado na tabela 1.

Módulos Percentual

Carcaça 51%

Bateria 27%

Placa de circuito impresso 22% Tabela 1- Caracterização da amostra

3.2 Cenários de logística reversa de celulares no Brasil

O cenário atual dos celulares que são descartados para reciclagem no Brasil pode ser expresso na figura 1, como cenário I.

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8 Diferentemente do cenário I, no qual somente as baterias são segregadas e recicladas no Brasil e as demais partes seguem para reciclagem fora do país, o cenário II apresenta a proposta de total reciclagem dos resíduos em território nacional.

3.3 Proposição de cenários e avaliação do ciclo de vida

A modelagem dos cenários de logística reversa de celulares retratados nas figuras a seguir (figuras 2 e 3), baseou-se nos valores estabelecidos a partir da caracterização da amostra (tabela 1). Basicamente os dois cenários se diferenciam na quantidade de deslocamento necessário para a logística reversa e na fonte da energia utilizada nos processos de tratamento dos resíduos.

No cenário I foi considerado um deslocamento de 10.000 km utilizando para o transporte um navio de carga, na logística reversa das outras partes (ver figura a seguir). Para o tratamento das baterias foi considerado um deslocamento regional de 150 km, utilizando transporte rodoviário de carga. A matriz energética considerada no cenário I é composta em sua maioria por termelétricas com uso relevante de carvão mineral como fonte combustível.

No cenário II, que retrata a realidade do tratamento no Brasil, foi considerado um deslocamento regional de aproximadamente 150 km, utilizando transporte rodoviário de carga para cada item segregado (carcaça, bateria e placa). A matriz energética utilizada no cenário II é composta em sua maioria por hidrelétricas.

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9 Figura 3 - Processos associados ao cenário proposto como alternativa (Cenário II) para o descarte de celulares no

Brasil.

Para avaliação ambiental dos cenários foi utilizada a técnica de Avaliação do Ciclo de Vida, definida como uma técnica para avaliar os impactos ambientais potenciais de um produto ou serviço ao longo de todo o ciclo de vida, desde a aquisição das matérias-primas, produção, uso, tratamento pós-uso, reciclagem até a disposição final (ABNT, 2009a).

A Figura 4 apresenta o fluxograma da técnica de ACV de acordo com a norma ABNT NBR ISO 14040 (ABNT, 2009a):

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10 Figura 4 - Fluxograma simplificado das etapas da ACV

Na definição das metas e do escopo do estudo são determinadas as condições e características do estudo, incluindo as limitações e suposições adotadas e as fronteiras do sistema que delimitam quais processos estão incluídos na avaliação.

A análise de inventário é um processo objetivo, baseado em dados, para quantificar a energia e as matérias-primas requeridas, as emissões aéreas, os efluentes para a água, os resíduos sólidos e outras emissões ambientais incorridas durante o ciclo de vida de um processo, produto, atividade ou serviço. Para este estudo, foram considerados dados internacionais disponíveis na base de dados ecoinvent (HISCHIER, 2007). A base de dados ecoinvent é composta por um conjunto de dados internacionais que descrevem os processos, incluindo o consumo de recursos, materiais auxiliares e as emissões para ar, agua e solo (FRISCHKNECHT, 2007).

Na etapa de avaliação de impacto os dados levantados na análise de inventário são submetidos à classificação e caracterização para determinar seu impacto ambiental potencial.

A classificação é o agrupamento dos indicadores para cada categoria de impacto, já a caracterização refere-se ao uso de fatores para determinar o potencial de impacto de cada substância em relação à categoria de impacto. A figura 5 ilustra as etapas de classificação e caracterização.

Figura 5 - Classificação e caracterização

A interpretação na ACV é um procedimento sistemático para identificar, qualificar, checar e avaliar as informações das conclusões da análise de inventário e/ou avaliação de impactos de um sistema, e apresentá-los de forma a atender as exigências da aplicação como descrito nos objetivos e escopo do estudo. A interpretação também é um processo de comunicação desenvolvido para dar credibilidade aos resultados das fases mais técnicas da ACV, chamadas de análise de inventário e avaliação de impactos, de forma que ambos sejam compreensíveis e úteis para o tomador de decisão (ABNT, 2009).

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11 Para auxiliar o manejo e a interpretação das informações foi utilizado o software SimaPro. Este software foi desenvolvido pela empresa holandesa PreConsultans, que desde 1990 está a frente de projetos de Avaliação do Ciclo de Vida, desenvolvendo metodologias, softwares e consultoria. Esse software suporta varias bases de dados. A base de dados utilizada para esse estudo, ecoinvent, foi desenvolvida por iniciativa do governo Suíço no intuito de agrupar os diferentes inventários do ciclo de vida em uma base de dados robusta e confiável.

O SimaPro também disponibiliza uma base de dados de métodos de impacto. Para este estudo foi utilizado o método de impacto EPD 2008 que auxiliou no balanço das emissões referentes às categorias de impactos ambientais descritas no quadro 1 abaixo.

Categoria de impacto Indicador Descrição

Aquecimento global kg CO2 eq Está relacionada com as emissões de gases do efeito estufa Depleção da camada de

ozônio kg CFC-11 eq

Está relacionada com as emissões de gases que destroem o ozônio estratosférico

Oxidação fotoquímica kg C2H4 eq

Está relacionada com a formação de substâncias reativas, principalmente o ozônio troposférico

Acidificação kg SO2 eq

Está relacionada com o aumento da acidez do meio, resultante da volatilização de diversos compostos

Eutrofização kg PO4--- eq

Está relacionada com a emissão de nutrientes para o ar, agua e solo

Uso de energia não

renovável MJ eq

Está relacionada com a extração de minerais e combustíveis fósseis, devido a entrada no sistema

Quadro 1- Categorias de impacto, indicadores e descrição da categoria.

4. Resultados e discussões

A avaliação dos cenários utilizando a técnica de ACV apontou para um melhor desempenho ambiental do cenário II, no qual todo o tratamento do resíduo é realizado no Brasil, em comparação com o cenário I, no qual parte do tratamento é realizado na Europa.

Comparativamente, o potencial para redução do impacto é em torno de 60% para acidificação, 35% para oxidação fotoquímica, 30% para eutrofização e 20% para uso de energia não renovável. Para as demais categorias, o potencial para redução fica em torno de 15%. A figura 6 retrata o comparativo entre os cenários I e II.

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12 Figura 6. Comparação do impacto ambiental potencial entre os cenários I e II

Os processos de tratamento de resíduos eletroeletrônicos são intensivos no uso de energia. No caso do Brasil, considerando grande parte da matriz energética de fonte renovável (hidrelétricas), os processos para tratamento desses resíduos se tornam menos agressivos ao meio ambiente. Outro fator decisivo para o melhor desempenho ambiental está relacionado ao fato de que o tratamento dos resíduos no Brasil demanda menor deslocamento e, consequentemente, menos consumo de combustíveis fósseis e menos emissões de gases de efeito estufa.

Vale lembrar que caso o tratamento dos resíduos ocorra no Brasil, os rejeitos destinados para a disposição final necessitarão ser aterrados em território nacional, demandando soluções tecnológicas.

Por outro lado, a avaliação dos cenários não considerou os ganhos ambientais provenientes da reinserção dos materiais reciclados na cadeia produtiva. Com o tratamento dos resíduos sendo realizados em território nacional haverá a possibilidade de reinserção da matéria prima secundária, resultando em economia de recursos naturais no Brasil.

5. Considerações finais

Diversas iniciativas têm demonstrado um aumento na preocupação com o descarte ambientalmente correto dos resíduos eletroeletrônicos. A regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos traz a obrigatoriedade na estruturação e implementação de sistemas de logística reversa para os produtos eletroeletrônicos e seus componentes.

Sob a perspectiva do ciclo de vida, os processos envolvidos na logística reversa também podem trazer impactos ambientais potenciais.

Diante disso, o artigo apresentou a avaliação de dois cenários de logística reversa de aparelhos celulares, utilizando a técnica de Avaliação do Ciclo de Vida. No primeiro cenário somente as baterias são tratadas no Brasil, enquanto as demais partes são tratadas na Europa. Este cenário

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13 retrata a situação atual do tratamento de aparelhos celulares no Brasil. No segundo cenário foi apresentada uma proposta na qual todo tratamento é realizado em território nacional.

Para a modelagem dos cenários foram adotadas as mesmas tecnologias de tratamento e dados internacionais, diferenciando-se apenas nas quantidades de deslocamento e na matriz energética. Tal abordagem foi adotada devido à ausência de base de dados nacional.

É importante ressaltar que o Brasil não possui tecnologia para tratamento de placas e, portanto, também foram consideradas as tecnologias utilizadas na Europa, modificando-se a fonte da energia.

O cenário II apresentou melhor desempenho ambiental em relação ao cenário I, principalmente para as categorias ambientais de acidificação, oxidação fotoquímica, eutrofização e uso de energia não renovável. Esta diferença está associada à fonte geradora da energia elétrica e ao menor consumo de combustíveis devido ao deslocamento dos resíduos para tratamento.

Acredita-se que o cenário II ainda tem outros benefícios não considerados neste estudo, como a reinserção da matéria prima secundária na cadeia produtiva nacional, reduzindo a pressão sobre os recursos naturais do Brasil. Além disso, a realização de toda a logística reversa em território nacional possibilitará ganhos sócio-econômicos com a comercialização dos materiais e também com a geração de emprego e renda.

Referências

ABNT. NBR ISO 14040 - Gestão Ambiental - Avaliação do ciclo de vida – Princípios e estrutura. Rio de Janeiro, 2009a.

ABNT. NBR ISO 14044 - Gestão Ambiental - Avaliação do ciclo de vida – Requisitos e orientações. Rio de Janeiro, 2009b.

ANSANELLI, S.L.M. Os impactos das exigências ambientais européias para equipamentos eletroeletrônicos

sobre o Brasil. Tese (Doutorado em Economia), Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008.

BASEL CONVENTION on the control of transboundary movements of hazardous wastes and their disposal. Disponível em:

<http://www.basel.int/Portals/4/Basel%20Convention/docs/text/BaselConventionText-e.pdf>. Acesso em: 12/03/2012.

BARBIERI, J. C.; DIAS, M.. Logística Reversa como instrumento de programas de produção e consumo sustentáveis. Revista Tecnologística, São Paulo, Ano VI, nº 77. Abril 2002.

BOWERSOX, D. J.; CLOSS, D. J. Logística Empresarial: o processo de integração da cadeia de suprimentos. São Paulo: Atlas, 2001.

BRASIL. Lei n°12.305, de 2 de agosto de 2010. BRASIL. Decreto n° 7404, de 23 de dezembro de 2010.

DIRECTIVE 2011/65/EU of the European Parliament and of the Council of 8 June 2011 on the restriction of the use of certain hazardous substances in electrical and electronic equipment (recast).

DIRECTIVE 2002/96/EC of the European Parliament and of the Council of 27 January 2003 on waste electrical and electronic equipment.

FRISCHKNECHT, R., Jungbluth, N. & Althaus H.-J., Doka G., Dones R., Hischier R., Hellweg S., Nemecek T., Rebitzer G. and Spielmann M., 2007. Overview and Methodology. Final report ecoinvent data v2.0, No. 1., Dübendorf, CH: Swiss Centre for Life Cycle Inventories.

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14 HISCHIER R. et al. Life cycle inventory of electric and electronic equipment: Use and disposal. Ecoinvent report N. 18, EMPA / technology and society. Swiss centre for life cycle inventories. Dumbedorf, 2007.

ISO. International Organization for Standardization. Disponível em: <www.iso.org>. Acesso em: 15/03/2012. LEITE, P. R. Logística reversa: meio ambiente e competitividade. São Paulo: Prentice Hall, 2003.

ROGERS, D.S.; TIBBEN-LEMBKE, R. S.. Going backwards: reverse logistics trends and practices. University of Nevada, Reno, Center for Logistics Management, Reverse Logistics Executive Council, 1998.

SOUZA, G.C., KETZENBERG, M.E, GUIDE JR, V.D.R. Capacitated remanufacturing with service level constraints. Production and Operations Management; summer 2002; 11, 2; ABI /INFORM Global, 2002. UNEP - United Nations Environment Programme. Basel Conference Addresses Electronic Wastes Challenge. Disponível em < www.unep.org>. Acesso em: 15/03/2012.

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