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A função social da propriedade intelectual

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Academic year: 2017

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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

Brasília - DF

2014

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DANY RAFAEL FONSECA MENDES

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Uni-versidade Católica de Brasília, como requisito para obtenção do Título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Ivo Teixeira Gico Junior

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7,5cm

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

M538f Mendes, Dany Rafael Fonseca.

A função social da propriedade intelectual. / Dany Rafael Fonseca Mendes – 2014.

106 f.; il : 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2014. Orientação: Prof. Dr. Ivo Teixeira Gico Junior

1. Direito. 2. Direito econômico. 3. Propriedade intelectual. I. Gico Juni-or, Ivo Teixeira, orient. II. Título.

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Dissertação de autoria de DANY RAFAEL FONSECA MENDES, intitulada “A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL”, apresentada como requisito para obtenção do grau de Mestre em Direito da Universidade Católica de Brasília, em 14 de março de 2014, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

_________________________________________ Professor Doutor Ivo Teixeira Gico Junior

Orientador

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Universidade Católica de Brasília - UCB

_________________________________________ Professor Doutor Marcos Aurélio Pereira Valadão Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

Universidade Católica de Brasília - UCB

_________________________________________ Professor Doutor Paulo Burnier da Silveira

Departamento de Direito Universidade de Brasília - UnB

_________________________________________ Professor Doutor Fabiano Teodoro de Rezende Lara

Departamento de Direito

Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG

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(Dedicatória)

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AGRADECIMENTO

É preciso agradecer a diferentes pessoas em momentos distintos da nossa vida, pois, não fosse assim, essa parte da dissertação não teria fim. Para mim, a ideia do mestrado come-çara a tomar corpo em 2005, diante da promessa de um irmão da República Extrema-Unção (Ouro Preto/MG): ajudar-me na busca por uma boa opção de curso stricto sensu, com bolsa, além de colaborar na elaboração do projeto de pesquisa – coisa que, em meio à graduação e às centenas de obrigações a cumprir no trabalho, parecia-me uma esfinge indecifrável – necessá-rio à candidatura. Então, começo agradecendo a todos da minha Extrema-Unção, especial-mente ao Adalberto (Máskara), não apenas por ter cumprido sua palavra, ajudando-me a che-gar até aqui, mas também por ter me guiado – ao estilo do mestre Yoda, em termos de beleza – pelo tortuoso caminho da propriedade intelectual. Já em Brasília, agradeço ao Michel (K-rente) que, quando eu estava para desistir da candidatura ao programa da UCB, prontificou-se a me ajudar – mesmo contra minha própria vontade – com o famigerado projeto de pesquisa e, ainda, na construção de um artigo para concorrer à bolsa da CAPES – sem a qual eu não po-deria continuar na Católica. Sem a ajuda desses dois grandes amigos, eu jamais teria conse-guido entrar – e permanecer – neste programa de mestrado.

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(Epígrafe)

“E com o bucho mais cheio comecei a pensar Que eu me organizando posso desorganizar Que eu desorganizando posso me organizar”

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RESUMO

Referência: MENDES, Dany Rafael Fonseca. A função social da propriedade intelectual. 2014. 106 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2014.

O presente estudo, lastreado na metodologia da Análise Econômica do Direito (AED), é uma discussão sobre a função social da Propriedade Intelectual (PI), do papel que a PI exer-ce na sociedade. Na busca de seus objetivos, este trabalho passa pelos conexer-ceitos de proprieda-de e pelas discussões acerca proprieda-de sua aplicação como tecnologia – solução técnica para um (ou mais) problema técnico. Após discutir a natureza do conhecimento (recurso que é matéria-prima das criações humanas), sempre sob os critérios da AED, a presente pesquisa se debru-çou sobre a investigação da PI como propriedade. Partindo para as conclusões, restou claro que, sendo uma subespécie de propriedade, com a diferença de ser relativa a bens incorpóreos, a PI tem a mesma função social do gênero propriedade, qual seja: permitir a apropriação pri-vada para evitar o subinvestimento. Já que a PI é uma tecnologia imperfeita, ela vem acompa-nhada de efeitos colaterais (custos sociais inerentes) e, concluindo, fica igualmente claro que é preciso utilizar meios para mitigar tais efeitos, como é o caso da limitação temporal dos direi-tos de propriedade intelectual (DPI).

Palavras-chave: ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO. PROPRIEDADE

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ABSTRACT

The present study, backed the methodology of the Law and Economic (L&E), is a dis-cussion of the social function of intellectual property (IP), the role that IP exercises in socie-ty. In pursuing its objectives, this paper goes through the concepts of ownership – and the discussions of their application as technology – technical solution to one (or more) technical problem. After discussing the nature of knowledge (resource which is the raw material of hu-man creations), always under the criteria of the L&E, this research has focused on the inves-tigation of IP as property. Leaving for the conclusions, remains clear that, being a subspecies of property, with the difference being related to intangible assets, the IP has the same social function of the genre property, namely: allow private ownership to avoid underinvestment. Since PI is an imperfect technology, it comes with side effects (social costs) and, in conclu-sion, it is equally clear that it is necessary to use means to mitigate such effects, such as the temporal limitation of the rights of property intellectual (IPRs).

Key words: ECONOMIC ANALYSIS OF LAW. INTELLECTUAL PROPERTY.

JEL: K1 (Law and Economics – Property Law); O34 (Economic Development, Technological

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Faculdades Econômicas e Jurídicas do Proprietário ... 34

Figura 2: Tipos Econômicos de Bens ... 54

Figura 3: Tragédia dos Stradivari ... 65

Figura 4: “Sistemática” da Propriedade ... 80

Figura 5: Estrutura de Incentivos Gerados pela Propriedade Intelectual ... 86

Figura 6: Função Social da Propriedade Intelectual ... 86

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 10

1.1 DELIMITAÇÃODOTEMAEDOPROBLEMADEPESQUISA ... 10

1.2 METODOLOGIA ... 15

2. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ... 26

2.1 FUNÇÃOSOCIAL ... 26

2.1.1 Função social do Direito ... 28

2.2 PROPRIEDADE ... 31

2.2.1 Conceito ... 31

2.2.2 Coordenação ... 35

2.2.3 Função social da propriedade ... 42

2.2.3.1 Teoria da barganha ... 48

2.3 BEMPÚBLICOVERSUSBEMPRIVADO ... 52

2.4 SUBINVESTIMENTO ... 55

2.5 CONCLUSÕESDOCAPÍTULO ... 56

3. CONHECIMENTO ... 58

3.1 NATUREZADEBEMPÚBLICODOCONHECIMENTO ... 61

3.2 (DES)INCENTIVOÀINOVAÇÃO ... 63

3.3 CUSTOSERISCOSDAPESQUISA&DESENVOLVIMENTO ... 67

3.3.1 Diferença de retorno do conhecimento ... 69

3.3.1.1 Externalidades positivas geradas pelas atividades de P&D... 69

3.3.2 Financiamento público da P&D ... 71

3.4 CONCLUSÕESDOCAPÍTULO ... 75

4. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL ... 78

4.1 DIFERENÇASDEABORDAGEM ... 78

4.2 PIÉPROPRIEDADE? ... 79

4.3 FUNÇÃOSOCIALDAPROPRIEDADEINTELECTUAL ... 85

4.4 CUSTOSSOCIAISDAPROPRIEDADEINTELECTUAL ... 87

4.4.1 Custo social do monopólio ... 87

4.4.2 Custo social da origem do conhecimento ... 91

4.4.3 Custo social da recompensa versus esforço ... 92

4.4.4 Custo social da igualdade de recompensas para diferentes níveis de inovação 92 4.4.5 Custo social da liderança de mercado versus vantagem extra (DPI) ... 93

4.4.6 Custo social do investimento em rotas tecnológicas arbitrárias... 93

4.4.7 Custo social de administração dos DPI ... 94

4.4.8 Custo social das patentes de bloqueio ... 95

4.5 LIMITAÇÃOTEMPORALDAPROPRIEDADEINTELECTUAL ... 96

4.6 CONCLUSÕESDOCAPÍTULO ... 97

5. CONCLUSÕES GERAIS ... 99

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1 INTRODUÇÃO

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA DE PESQUISA

Boa parte dos projetos de pesquisa parece, aos olhos do pesquisador, de suma relevân-cia. Entre os mais entusiasmados, há quem acredite – verdadeiramente – que seu trabalho será um divisor de águas no entendimento do tema e, ainda, que, uma vez divulgados suas conclu-sões extraídas da pesquisa, haverá um período “Antes de suas Concluconclu-sões” (A.C.), seguido daquilo que virá “Depois de suas Conclusões” (D.C.). O nível de empolgação incidente sobre um tema de pesquisa, contudo, decresce à proporção que a avaliação de importância do objeto de estudo se afasta do seu “profissional de bancada”. Isso pode ser percebido pelo impacto que o trabalho – de suma relevância para o pesquisador – exerce sobre a comunidade acadê-mica. O orientador do projeto, normalmente menos entusiasmado que seu pupilo, ainda guar-da a percepção de que se trata de um problema muito importante. Quanto ao restante guar-da co-munidade acadêmica envolvida com o tema, à medida que há um afastamento (em termos de área de concentração, linha de pesquisa, objeto etc.) destes em relação ao candidato-a-Galileu, o problema em exame vai passando de “muito importante” para “mais do mesmo”. Fora do ambiente acadêmico que lhe é próprio, a proeminência do tema desaba, sendo raríssimo en-contrar um problema de pesquisa que seja relevante para o público não ligado à academia.

Realizada uma pequena observação crítica sobre o entusiasmo dos pesquisadores fren-te à importância real de seus respectivos fren-temas, cumpre ressaltar que esta empolgação sim é de extrema relevância e que, sem tal condição, quiçá nem houvesse pesquisa. Porém, um pro-blema de pesquisa deve, necessariamente, ser relevante do ponto de vista social, ainda que esta importância não seja percebida de imediato ou que o objeto de pesquisa pereça diante de uma nova revolução científica, conforme processo descrito por Kuhn, em “A Estrutura das Revoluções Científicas” (1998). Em razão do seu grau de especialidade, há discussões cujo tema está sob a circunscrição exclusiva da academia, mas isso não quer dizer que, mais à fren-te – às vezes décadas mais tarde – tais problemas de pesquisa não guardem (ao menos) o obje-tivo de mudar a sociedade em que se inserem. Outros temas têm mais importância para a soci-edade, mas, no âmbito acadêmico, acabam ficando em segundo plano.

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A resposta para a formulação do problema de pesquisa deste trabalho, do ponto de vis-ta econômico, é relativamente simples, mas, antes de expô-la, há uma série de questões con-ceituais que precisam ser enfrentadas. Dentre esses subproblemas de pesquisa, numa análise econômica da propriedade intelectual, é essencial colocar o problema sob dois prismas: o que ocorre com o incentivo à inovação antes (ex ante) da aplicação de um sistema de PI; e, con-traposição, o que acontece depois (ex post) da adoção de um regime de DPI.

Em fase anterior ao exame supramencionado, é primordial investigar se, conceitual-mente, a PI, é, ou não, uma subespécie do gênero propriedade para, caso assim seja, averiguar se os DPI são também criados para resolver os problemas típicos daqueles recursos que care-cem ser objeto de apropriação privada. Mais ordenadamente, é necessário conceituar o institu-to da propriedade, determinar seu papel na sociedade, para, mais adiante, verificar se a PI po-de ser encaixada no mesmo mopo-delo.

Retornando à análise econômica do tema, em termos de incentivo à inovação, o exame

ex ante de um sistema de propriedade intelectual enfrenta, sobretudo, problemas relacionados

à natureza de bem público do conhecimento e a consequente baixa dos investimentos para a produção de mais conhecimento.

O diagnóstico ex post, referente à adoção e manutenção de um sistema de propriedade

intelectual, tem por objetivo avaliar os efeitos deste regime de apropriação privada sobre a sociedade e, nas situações em que se configuram efeitos negativos, estudar os possíveis remé-dios para os danos colaterais provocados pela instituição e manutenção de um sistema de DPI.

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E, por movimentar a estrutura de incentivos1 à inovação, não há dúvidas de que, do ponto de vista social, os DPI são um tema da mais alta relevância. Cabe, então, verificar se a aborda-gem do problema de pesquisa seria, ou não, importante ao estudo do tema.

Dizer que a propriedade intelectual serve de incentivo para a inovação tecnológica é desnecessário, ou melhor, deveria ser. Afinal, essa afirmação está devidamente positivada em um comando (artigo 5º, XXIX) da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988). Assim sendo, demonstrar o caráter utilitarista2 dos DPI não é a pretensão do presente estudo – isto já está postos no ordenamento jurídico nacional. Cabe ao trabalho, então, anali-sar, do ponto de vista juseconômico, o que aconteceria, ex ante, sem um sistema de proprie-dade intelectual e o que ocorre, ex post, com a adoção e manutenção de um regime de PI.

Ainda que não se debata o caráter utilitarista da PI no Brasil, há, neste instante, discus-sões relevantes sobre os níveis de apropriação privada necessários à manutenção do equilí-brio entre o incentivo à inovação e o amplo acesso aos produtos e serviços provenientes do processo inovativo. Nessa esteira, no âmbito de construção legislativa, há calorosos debates nacionais em trâmite, como, por exemplo, o do código brasileiro de inovação, Projeto de Lei (PL) nº 2177/2011 (Câmara dos Deputados, 2013); e o de alterações na Lei de Propriedade Industrial (BRASIL, 1996), PL nº 5402/2013 (Câmara dos Deputados, 2013). Na esfera inter-nacional, disputas judiciais da mais alta relevância têm alcançado repercussão global justa-mente por abarcar futuras referências aos níveis de apropriação privada – um exemplo, envol-vendo o patenteamento de seres vivos (no todo ou em parte) e seus impactos, foi a decisão da

1 Uma estrutura de incentivos é um arranjo de estímulos, positivos ou negativos, que movem os agentes – ou têm

a pretensão de fazê-lo – para uma determinada direção, normalmente determinada pelo Estado. No âmbito da Análise Econômica do Direito (AED), uma lei pode ser considerada uma estrutura de incentivos, pois ela provê estímulos para que os cidadãos façam algo, ou para que estes deixem de fazê-lo, de acordo com os critérios ado-tados na construção da norma. Há, ainda, estruturas de incentivos que não são, necessariamente, legais, como é o caso das sanções sociais aplicadas a comportamentos que destoam dos esperados. Em um exemplo simples, um cidadão pode ser forçado a não jogar lixo nas ruas por determinação legal, seguida de uma punição (multa, pri-são, chibatadas etc.), ou, ainda, o mesmo sujeito pode deixar de lado esse comportamento antissocial em função da pressão que a sociedade exerce sobre ele. Segundo Gico Jr. (2010), dentre outros motivos, as normas jurídicas são apenas incentivos porque, em muitos casos, por mais altas que sejam as punições atreladas às regras de con-duta, elas podem ser simplesmente ignoradas pelos agentes envolvidos.

2 O Utilitarismo poderia ser resumido como o cômputo do bem comum, e, segundo a Teoria da Utilidade, toda a

ação, qualquer que seja, tomada por quem quer que seja, deve ser aprovada ou rejeitada em função da sua ten-dência de aumentar ou reduzir o bem-estar das partes afetadas por tal movimento. Elaborado por Jeremy Ben-tham [1748-1832] e sistematizado por John Stuart Mill [1806-1873], o utilitarismo é uma espécie de cálculo dos custos e benefícios envolvidos em determinada norma, decisão política etc. No que tange à propriedade intelec-tual, embora o instituto da PI pudesse gerar efeitos colaterais indesejáveis, a utilidade (desenvolvimento tecnoló-gico) obtida pela sociedade como um todo, na visão dos elaboradores do sistema, superaria tais efeitos – a justi-ficativa seria a de que, em termos de bem-estar da comunidade, o regime de propriedade intelectual seria mais útil que sua ausência.

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Suprema Corte dos EUA, proibindo as patentes3 de genes humanos naturais4 (Inovação Unicamp, 2013).

À proporção que os ativos de propriedade intelectual se tornam mais valiosos que os bens corpóreos5, os DPI têm se tornado cada vez mais importantes para os Estados-membros da Organização Mundial do Comércio (OMC6), bem como para os demais atores em suas respectivas áreas de envolvimento. Atento a esse aspecto, o Governo brasileiro instituiu, em 21 de agosto de 2001, o Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual (GIPI7) e, desde então, o tema vem sendo tratado como política de Estado pelo Poder Executivo do Brasil.

Na esfera internacional, as discussões sobre PI, as quais reiteradamente se transfor-mam em processos judiciais bilionários8, têm relevância ainda mais significativa. Num resu-mo atual dos debates resu-modernos sobre o tema, os quais veem ocorrendo após a implementação do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS9), é possível afirmar que há uma “guerra” entre os países industrializados (mais

espe-3 Patente, ou carta-patente, é um título de propriedade temporária concedido pelo Estado, com base na Lei nº

9.279, de 14 de maio de 1996 (BRASIL), àqueles que inventam novos produtos e processos com aplicação in-dustrial. Esse título garante ao seu titular a exclusividade de exploração da tecnologia patenteada, além de asse-gurar a seu detentor o direito de impedir terceiros de explorar o objeto de proteção sem sua autorização (CNI - Confederação Nacional da Indústria, 2013).

4 Em decisão unânime, a Suprema Corte dos Estados Unidos determinou que “segmentos de DNA que ocorrem

na natureza” não podem ser patenteados. A decisão põe fim à disputa jurídica em torno da patente dos genes humanos (BRCA1 e BRCA2). O patenteamento era reivindicado pela empresa Myriad, a primeira a isolar esses genes, os quais estão diretamente relacionados com o câncer de mama e cujo mapeamento pode alterar substan-cialmente diagnóstico e tratamento da doença (Inovação Unicamp, 2013).

5 Vide, por exemplo, casos de sucesso como os da Nike, que desenvolve seus desenhos e submarcas nos EUA,

mas terceiriza a produção de seus produtos mundo afora. Mesmo se fossem somadas todas as fábricas (incluindo os centros de Pesquisa & Desenvolvimento) e produtos em estoque da Nike, seu valor como marca – avaliada em mais de USD 17 bilhões (Interbrand, 2013) – seria muito superior aos bens tangíveis que compõem fisicamente a empresa.

6 A OMC é uma organização internacional que trata das regras do comércio internacional e, atualmente, conta

com 156 Estados-membros. O surgimento da Organização foi um importante marco na ordem internacional que começara a ser delineada no fim da Segunda Guerra Mundial e, nesse contexto, ela surge a partir dos preceitos estabelecidos pela Organização Internacional do Comércio (OIC), uma vez que esta não foi levada adiante pela não aceitação do Congresso dos Estados Unidos da América. A OMC, uma das agências especializadas da Orga-nização das Nações Unidas (ONU) nasceu em 1º de janeiro de 1995 e todas as suas realizações são o resultado das negociações das quais é foro. A maior parte do trabalho atual da Organização vem das negociações ocorridas entre 1986 e 1994, chamada de Rodada Uruguai (WTO, 2013).

7 O Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual é um grupo governamental de avaliação e aconselhamento

sobre os aspectos relacionados com o tema – mais detalhes em “O GIPI e a Governança da Propriedade Intelectual no Brasil” (Porto & Barbosa, 2013).

8 Vide, por exemplo, a guerra judicial, envolvendo Sansung e Apple, sobre o plágio de tecnologias associadas à

produção de smartphones. (Exame, 2012). 9 O Acordo TRIPS (do inglês

Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights) é um tratado

multilateral, integrante do conjunto de acordos assinados em 1994, durante a criação da Organização Mundial do Comércio (WIPO, 2013). Também conhecido por “Anexo 1C” do Tratado de Marrakesh, o Acordo foi ratificado pelo Brasil através do Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994 (BRASIL).

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cificamente EUA, Japão e União Europeia) e aqueles em fase de desenvolvimento – enquanto os Estados-membros subdesenvolvidos, praticamente alheios à discussão, lutam para continu-ar sobrevivendo, à proporção que sofrem as consequências do estabelecimento de um sistema de PI para o desenho do qual não contribuíram. De volta às disputas entre os países desenvol-vidos e os em desenvolvimento, os primeiros, em razão de serem os maiores detentores dos direitos de propriedade intelectual – sendo titulares de aproximadamente 85% dos pedidos de patentes realizados no mundo (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2006) – puxam esses DPI para os níveis mais altos de apropriação privada, enquanto os segundos, na tentativa de garantir o mais amplo acesso às inovações, puxam os mesmos direitos para níveis mais bai-xos. É como um cabo-de-guerra de níveis de apropriação privada: de um lado os donos dos direitos, querendo mais direitos; e, do outro, aqueles que precisam acatar esses direitos, reme-tendo royalties aos primeiros – e, por óbvio, desejando manter (ou mesmo reduzir) o nível destas remessas.

Durante a criação da OMC e as concomitantes negociações para a elaboração do A-cordo de TRIPS, não seria demais afirmar que, do ponto de vista técnico, os países em desen-volvimento, incluindo o Brasil, entraram na discussão completamente despreparados, sem a menor ideia dos impactos que, mais tarde, as obrigações provenientes do Acordo lhes infligi-ria. Afinal, ainda hoje, avaliar os impactos futuros de um acordo comercial (ou de uma legis-lação qualquer) é uma tarefa extremamente difícil, o que dizer daquelas negociações ocorridas nas décadas de 1980 e 1990? – Uma crítica mais contundente assumiria que o Acordo fora uma imposição dos países industrializados aos subdesenvolvidos/em desenvolvimento, mas isso é assunto para outra discussão. Após alguns anos colhendo os perniciosos efeitos prove-nientes da adoção precipitada de TRIPS, que era uma das condições para figurar como Esta-do-membro da OMC, alguns países começaram a reagir. Internacionalmente, a Declaração de Doha (WTO, 2001), realizada pelos ministros da saúde de países em desenvolvimento, afir-mando que o respeito às regras de TRIPS não poderia significar o desrespeito à saúde pública de suas respectivas populações, pode ser considerado um marco dessa reação a um sistema de PI que, na prática, fora desenhado unilateralmente pelas nações industrializadas.

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apesar de parecerem meros pressupostos, o problema e os subproblemas que serão enfrenta-dos no presente trabalho compõem a discussão em si. É com lastro no tipo de debate aqui proposto que as decisões sobre o tema são tomadas, e é daí que vem a relevância, para a soci-edade como um todo, de discutir a função social da proprisoci-edade intelectual.

Restando evidente a importância do tema para a sociedade, embora este projeto de pesquisa não tenha a ambição de estabelecer limites do tipo A.C. e D.C., ele tem a pretensão de discutir o problema de pesquisa (o papel da PI na sociedade) sob o enfoque da Análise E-conômica do Direito. Nesse sentido, salvo raras exceções10, este trabalho traz essa novidade para a discussão brasileira acerca da propriedade intelectual, mas não é apenas na abordagem pela AED que o estudo pretende inovar – aqui serão postas questões, envolvendo a classifica-ção juseconômica adequada aos DPI, a exclusividade versus monopólio, outros custos sociais atrelados à PI, e, ainda, as limitações temporais aplicáveis aos direitos de propriedade intelec-tual.

1.2 METODOLOGIA

O presente trabalho será pautado pela metodologia da Análise Econômica do Direito e, como esta abordagem provavelmente não deve estar clara para uma parte dos juristas e e-conomistas convidados à leitura deste estudo, cabem alguns esclarecimentos conceituais pré-vios sobre a AED, também conhecida como Direito & Economia – Law & Economics (L&E) – ou, ainda, Juseconomia. Por isso, caso queiram, os leitores familiarizados com os conceitos da Análise Econômica do Direito podem saltar a descrição metodológica (item1.2) e ir direto para a discussão do capítulo seguinte (“Função Social da Propriedade”).

Antes mesmo de apresentar o significado de Análise Econômica do Direito, cumpre esclarecer que a AED não se confunde com o Direito Econômico, que é o ramo do Direito dedicado ao estudo da atividade econômica (produção e circulação de produtos e serviços) com preocupações acerca da regulamentação do mercado interno do país. Estão relacionados com o Direito Econômico temas que envolvem, por exemplo, problemas concorrenciais que alteram o equilíbrio do mercado, sendo perfeitamente possível realizar uma análise

juseconô-10 Tratando-se de uma abordagem da AED no tratamento da PI, durante este projeto de pesquisa,

desconsideran-do-se um ou outro artigo científico, o único trabalho brasileiro (escrito em português, considerando o sistema de

Civil Law e, ainda, a legislação nacional) encontrado foi “Propriedade Intelectual: Uma Abordagem pela Análise

Econômica do Direito”, do Professor Fabiano Teodoro de Rezende Lara (2010). Portanto, as críticas que aqui serão realizadas sobre o livro do Professor Fabiano são fruto mais da falta de referências adicionais do que das discordâncias acerca do trabalho do autor.

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mica destas questões – vide, por exemplo, a proposta de emprego do ferramental da AED ao Direito Econômico em “Cartel - Teoria Unificada da Colusão” (Gico Jr., 2006).

Se o Direito serve para regular o comportamento humano, a Economia é a ciência so-cial que tem por escopo estudar o comportamento humano diante recursos escassos. A AED, por sua vez, é o emprego de ferramentas econômicas e de outras ciências afins, também cha-madas de sociais, para expandir o alcance do Direito e aprimorar suas normas, notadamente no que se refere à avaliação de possíveis consequências de alterações nas estruturas normati-vas. A Análise Econômica do Direito, por meio dos instrumentos de exame próprios das ciên-cias econômicas, busca compreender os fatos sociais (diagnose) para antever comportamentos humanos (prognose) diante de possíveis alterações das estruturas de incentivos destes agentes (Gico Jr., 2010).

Deixando o histórico de surgimento da Escola para outra oportunidade, é importante reconhecer que, apesar da evolução oriunda da separação entre de “ser” (análise positiva) e o

dever ser” (análise normativa), o Positivismo jurídico, devido à sua dificuldade de investigar

os fatos sociais, não era capaz de dar respostas satisfatórias à sociedade. Era, então, preciso reestabelecer o diálogo entre o Direito e as demais ciências sociais e, nesse sentido, a AED seria uma alternativa capaz de fornecer: um arcabouço teórico robusto; a possibilidade de le-vantamento e teste de hipóteses; e, ainda, a flexibilidade necessária à aplicação dos seus ins-trumentos a situações específicas (Gico Jr., 2010). Perante esse difícil contexto histórico (pós-Positivismo) de impasses ao avanço da “ciência normal”, surge, reativamente, um novo para-digma científico, ou revolução científica (Kuhn, 1998) das ciências jurídicas.

Assim como é rotineiro que se misture AED com o Direito Econômico, é comum que se confunda Economia com termos afeitos ao comércio, como, por exemplo, taxas de juros, cotação de moedas, balança comercial etc. Sob essa influência, na linha dos exemplos supra-mencionados, as perguntas mais corriqueiramente ligadas às ciências econômicas são: qual a influência das taxas de juros sobre o desenvolvimento de novos empreendimentos? Como a cotação do dólar afetará os índices de inflação? Por que uma balança comercial negativa (em déficit) é considerada um indicador negativo para o país? Etc.

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isso, outras perguntas (aparentemente não relacionadas com a disciplina) são tão econômicas quanto aquelas do parágrafo anterior, como, por exemplo: por que as pessoas respeitam o li-mite de velocidade nas vias onde há fiscalização eletrônica, mas não o fazem em autoestradas desprovidas deste tipo de controle de velocidade? Por que os inventores preferem guardar suas invenções em segredo (quando conseguem fazê-lo) a solicitar proteção estatal por meio da propriedade intelectual? Por que é tão difícil alugar um imóvel no Brasil?

Por mais estranho que possa parecer, a Economia, por ser um método de investigação científica (característica que a define), é capaz de dar respostas a todas as perguntas dos dois parágrafos anteriores, sendo possível estender o método econômico a temas exógenos ao co-mércio11, como, por exemplo, poderia ser o caso de uma análise econômica dos relaciona-mentos conjugais. Enfim, tudo aquilo que envolve os processos decisórios (comportamento) diante de alternativas pode ser estudado pelo método econômico (Gico Jr., 2010). Aliás, da maneira como se convencionou nomeá-los, o termo “Método Econômico” deveria estar para a “Economia” da mesma maneira que o “Direito” está para a “Lei”, mas essas discussões epis-temológicas são demasiadamente complexas para caber numa simples descrição metodológi-ca.

Sendo a Análise Econômica do Direito uma abordagem do Direito por meio dos méto-dos econômicos de investigação científica, ela pode ser positiva, dedicando-se ao exame do “ser”, ou normativa, debruçando-se sobre a análise do “dever ser”. Então, conforme Gico Jr. (2010), enquanto a AED positiva é voltada ao estudo das consequências de uma regra jurídica ou política pública adotada, a AED normativa é prescrita para os casos que tratam de esco-lhas entre possíveis normas ou políticas aplicáveis. Ainda nesse sentido, se, por um lado, a análise positiva pode ser aplicada à verificação dos fatos, a análise normativa pode ser utiliza-da na investigação de valores.

De qualquer forma, sendo um método, a aplicação mais eficaz da Análise Econômica do Direito é como um meio de se alcançar um fim, e, seja na AED positiva ou na normativa, um juseconomista só se atreverá a opinar sobre qualquer norma a aplicar, ou decisão a

esco-11 Um dos pioneiros a se aventurar na aplicação do

approach econômico a questões exógenas às

tradicionalmen-te enfrentadas pela Economia foi Gary Stanley Becker, agraciado com o Prêmio Nobel de Economia (1992) justamente por estender a análise microeconômica para uma ampla gama de comportamentos e cooperações humanas, como a alocação do tempo dentro das famílias e o crime, por exemplo. Para verificação de uma parte do trabalho do autor no tratamento desses temas, sugere-se “The Economic Approach to Human Behavior

(Becker, 1990).

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lher, se os parâmetros dos objetivos a ser perseguidos estiverem pré-determinados. Na identi-ficação de objetivos que serão buscados por uma sociedade qualquer, a Análise Econômica do Direito pode até contribuir, limitadamente, como mais uma das ferramentas disponíveis ao estudo entre alternativas possíveis (Gico Jr., 2010). A Análise Econômica do Direito é como uma arma (método/meio) que precisa ser apontada para um alvo (objetivo/fim); a escolha des-te alvo, contudo, não cabe à arma e sim ao seu dedes-tentor – ou, no caso desta comparação, ao construtor do armamento (sociedade).

Partindo do pressuposto básico de que, pela metodologia econômica, as leis compõem estruturas de incentivos (com custos e benefícios) às quais os agentes deveriam reagir, Gico Jr. (2010) explica como um juseconomista faria a análise de uma norma em específico, mas o exemplo do autor cabe noutra regra qualquer e, por isso, pode ser apresentado como fluxo-grama de aplicação da Análise Econômica do Direito:

i) AED positiva – fase de diagnóstico – verificar como os agentes têm efetiva-mente (e não como deveriam fazê-lo, segundo a intenção do legislador) se comportado diante da norma;

ii) AED positiva – fase de prognóstico – analisar como uma possível mudança da norma alteraria a estrutura de incentivos dos agentes para, em seguida, simular situações hipotéticas e tentar prever como eles passariam a se comportar; iii) AED normativa – se, e tão-somente se, na análise em andamento, o

jusecono-mista for capaz de responder às duas perguntas anteriores, ele poderia se aven-turar na verificação técnica de “melhores” escolhas, sejam estas políticas ou judiciais, para o alcance dos resultados sociais almejados.

Então, de acordo com o modelo básico de atuação proposto para os praticantes da A-nálise Econômica do Direito, é fundamental deixar claro que este projeto de pesquisa se pau-tará pela AED positiva, mais especificamente pela fase de diagnóstico12, ou seja, pelo estudo da função social da propriedade intelectual como ela se apresenta na atualidade, sem conside-rar possíveis alterações na estrutura de incentivos que está posta ou, ainda, as possíveis alter-nativas de escolhas públicas aplicáveis aos DPI.

12 Ver relação com a “Tragédia dos Stradivari” (página 65).

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Além de entender as possibilidades e fases de aplicação da AED, para coloca-la em andamento, é fundamental que seus praticantes compreendam alguns pressupostos basilares da Economia, pois, sem o entendimento destes conceitos, os não-economistas estariam inabi-litados a utilizar o ferramental da AED – da mesma forma que, para aplicar a Análise Econô-mica do Direito, os não-juristas têm que se dedicar à inteligência das normas em exame.

Um dos pressupostos fundamentais da Economia é a escassez. Não houvesse insufici-ência de recursos, numa primeira análise, muito provavelmente não haveria problemas, nota-damente de coordenação (como os que serão apresentados no item 2.2.2). Apesar de não se-rem infinitos, recursos como o ar atmosférico e a luz do Sol incidente sobre a Terra não cau-sam congestionamento (luta por ar respirável ou por iluminação solar) entre os mais de sete bilhões de indivíduos que deles usufruem. Entretanto, recursos dessa natureza são exceções à regra – que é a escassez – e, na maioria dos casos, não há bens disponíveis em abundância para todos os agentes que os desejam, na quantidade que estes gostariam de tê-los. Aliás, co-mo bem exposto por Gico Jr. (2010), em última análise, a escassez é a razão para a existência de uma parte do próprio Direito, pois, se houvesse bens sobrando para todos os interessados, não haveria disputas entre os agentes sobre estes recursos.

A esta altura, já deve estar claro que, em termos conceituais, os processos decisórios são uma das preocupações centrais da Economia – se não for a principal – e que toda decisão envolve, necessariamente, custos13 e benefícios (trade off) diante dos quais os agentes

deci-dem. Grosso modo, o trade off pode ser resumido como um dilema, pois, na prática, ao optar pelos benefícios de uma das alternativas possíveis, o agente estará perdendo – ou deixando de ganhar – os benefícios que poderiam ser auferidos mediante escolha de outra alternativa. Nes-se dilema (trade off), o agente deve – ou, ao menos, deveria – estar ciente do custo de

opor-tunidade, que é o preço referente à segunda melhor alternativa e envolve o cálculo de fazer,

ou deixar de fazer, algo que seria benéfico para o próprio agente. Mais especificamente o

cus-13 É sempre bom reforçar que custos não são, necessariamente, valores pecuniários. No caso do mercado do

casamento, por exemplo, quando uma candidata à posição de noiva aguenta as aporrinhações que lhe são impos-tas pela sua futura sogra, ela esta incorrendo em um custo de paciência, esperando pelo benefício de se casar (custo imediato versus benefício esperado). No momento em que alguém, noutro exemplo, decide pelo consumo

de tabaco, além do valor de mercado do cigarro, este agente sofrerá uma redução dos seus índices de saúde e tal diminuição, ainda que não gere o gasto de um centavo adicional sequer, também é um custo, que é imposto em troca do prazer de fumar (benefício imediato versus custo esperado). Quando um apreciador de romances

televi-sivos opta por assistir a novela, em detrimento de fazer qualquer outra coisa, ele está utilizando seu tempo em função do benefício (prazer) de fazê-lo (benefício imediato versus custo imediato). Enfim, muito além dos

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to de oportunidade é composto pelas perdas provenientes de se abrir mão de uma escolha em detrimento de outra – para se dedicar à leitura desta dissertação, por exemplo, é preciso deixar de fazer outras coisas que gerariam benefícios ao leitor (assistir a um filme, ir à academia, ler um texto mais interessante etc.).

Em um ambiente que envolve escolhas entre alternativas acerca de recursos escassos, os economistas vão dizer que os agentes econômicos (que podem ser pessoas, sociedades empresárias, Estados etc.), ou simplesmente agentes, têm uma conduta racional

maximiza-dora de utilidade14. Eles são seres racionais maximizadores porque, diante de cada escolha,

os agentes, na média, agem como se calculassem os custos e os benefícios envolvidos em ca-da alternativa, para, ao final, majorar seu próprio nível de bem-estar. É importante deixar cla-ro que “agir como se calculassem” é diferente de “efetuar os cálculos”, pois os agentes, nota-damente as pessoas, não saem por aí medindo todos os custos e benefícios como se fossem aplicativos de controle financeiro. Contudo, na média, os agentes econômicos agem como se fizessem tais cálculos, na expectativa de aumentar a utilidade que suas escolhas podem, ou não, lhes propiciar. Esse senso de utilidade também não se refere a valores pecuniários e, por isso, pode, perfeitamente, estar relacionado com a satisfação que o agente experimenta ao ajudar o próximo ou, noutro exemplo, com o prazer de contemplar uma música – tudo isso pode ser utilidade para um agente, mas se trata de uma posição pessoal, portanto, subjetiva. Então, os agentes são racionais porque agem como se calculassem custos e benefícios; e são maximizadores de utilidade porque desejam melhorar seus níveis de bem-estar de acordo com aquilo que, conforme suas próprias preferências, consideram importante.

Neste ponto, é possível que parte dos leitores se pergunte: se os agentes são racionais maximizadores de utilidade, por que uma parcela razoável deles toma decisões aparentemente irracionais minimizadoras de (sua própria) utilidade? Sem mencionar as ocorrências

aleató-14 A utilidade é uma medida de satisfação relativa de um agente econômico. Para entender seu conceito, basta se

lembrar de quando os pais costumam perguntar a seus filhos do que, entre várias opções (doces, brinquedos, passeios etc.), estes mais gostam, a resposta compõe a escala de utilidade de cada criança. Na prática, diante de várias alternativas que lhe são colocadas, os agentes tomam decisões no intuito de aumentar (maximizar) sua própria satisfação (utilidade). O indicador é relativo porque pode ser usado para avaliar uma preferência de de-terminado agente em comparação com outra utilidade qualquer, do mesmo agente, numa escala de utilidades. Contudo, não é possível comparar a escala de um agente econômico com a de outro qualquer, pois as preferên-cias – invariavelmente – variam e, consequentemente, o valor que se dá a determinada utilidade é diferente para todos os agentes econômicos. Portanto, nem mesmo se tratando de dinheiro, um dado valor pecuniário relevante (USD 1.000, por exemplo) não tem a mesma utilidade para dois agentes, ainda que ambos se encontrem nas mesmíssimas condições financeiras, vez que estes certamente dão valores (pessoais) diferentes ao dinheiro em espécie.

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rias, ordinariamente denominadas de “azar”, durante o processo de tomada de decisões, os agentes não conseguem afastar alguns vieses comportamentais da análise marginal (custo-benefício). Esses desvios podem ser de toda ordem, mas, normalmente, estão relacionados com algumas informações, inclusive com aquelas atreladas à escolha posta, que os agentes desconhecem, ainda que eles tenham a convicção de que todos os subsídios sobre as opções sejam de seu pleno domínio.

Para exemplificar como a assimetria de informações15 – que, neste caso, é a diferen-ça entre o que os agentes sabem e aquilo que eles realmente conhecem – afeta o processo de tomada de decisões dos agentes, vale mencionar um exemplo que é muito comum: se toda pessoa com uma TV em casa tem plena ciência de que, para manter uma boa forma física, é necessário combinar alimentação saudável com exercícios físicos regulares, por que há tanta gente tentando emagrecer, mas não consegue fazê-lo? Numa explicação resumida, esse fenô-meno ocorre porque essas pessoas não conseguem trazer para o presente os benefícios espera-dos da combinação (de alimentação saudável e exercícios), ponderando “somente” os custos imediatos das suas decisões – caso clássico de benefício esperado versus custo imediato (vide nota 13). Avaliando a decisão de outro ângulo (custos esperados versus benefícios imediatos – vide nota 13), num exame de cenários futuros, as mesmas pessoas não compreendem os pos-síveis problemas de saúde que serão trazidos pela não-combinação (de atividade física e ali-mentação saudável), avaliando “apenas” os prazeres imediatos de se comer o que se quer e/ou de se manter no conforto do sedentarismo. Esse exemplo de desvio é tão-somente uma das possibilidades relativas aos problemas de cognição que podem ocorrer durante o processo de escolha dos agentes. Nessa esteira, um dos ramos mais promissores, tanto para o Direito quanto para a Economia, é o que se tem convencionado chamar de Economia

Comporta-mental, ou AED Comportamental, que, resumidamente, é a teoria dedicada ao estudo dos

desvios comportamentais dos agentes durante seus processos decisórios.

Para utilizar o método econômico, tão fundamental quanto o estudo dos processos de-cisórios dos agentes diante de recursos escassos – talvez até anterior a esta análise – é respon-der à seguinte questão: trata-se de um contexto hierárquico ou mercadológico? No primeiro contexto, os agentes não têm liberdade de interagir entre si; é o caso, por exemplo, das

rela-15 No caso das barganhas (item 2.2.3.1), as assimetrias compõem as diferenças entre as informações que um dos

negociantes conhece e aquelas que o outro agente desconhece. No mercado de carros usados, por exemplo, o comprador não tem noção dos defeitos do veículo que está sendo negociado, da mesma maneira que o vendedor não sabe qual seja a real situação financeira do comprador.

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ções de poder familiar (entre pais e filhos) e das de emprego (Gico Jr., 2010). Nas relações de mercado, os agentes são movidos pelo seu próprio interesse com relação aos recursos e à alo-cação destes bens, Assim, no contexto mercadológico, nos processos de barganha (de intera-ção cooperativa, que serão apresentados no item 2.2.3.1), é possível deslocar os bens de quem menos os valoriza para quem lhes dá mais valor.

Como se verá adiante (“Teoria da Barganha”, item 2.2.3.1), o equilíbrio só é possível num ambiente propício às barganhas, contexto de mercado, pois, quando um recurso fica na posse quem mais o valoriza, ocorre um equilíbrio temporário, que se mantém até que apareça um terceiro agente disposto a trocar o bem por outro recurso que o segundo agente valorize inda mais. Na prática, o equilíbrio nunca ocorre, mas, num contexto de mercado, sem o con-trole da hierarquia, as interações de troca realizadas entre os agentes econômicos tendem ao equilíbrio. Então, quando a literatura econômica faz referência ao mercado, ela não está tra-tando de assuntos próprios da “Economia”. Trata-se apenas de um pressuposto do método econômico, cuja função é informar que o objeto em exame está sob o regime mercadológico (não-hierárquico) e, portanto, tendente ao equilíbrio.

Ao mesmo tempo em que institui a eficiência alocativa16, o sistema de trocas consen-suais gera excedentes de cooperação, mas, como esse ponto será enfrentado em “Teoria da Barganha” (item 2.2.3.1), por ora, é importante mencionar outra justificativa econômica para criação e manutenção de um sistema de propriedade privada: se há propriedade e, consequen-temente, há trocas, há comércio; e, em função da vantagem comparativa, o comércio benefi-cia a todos, fazendo com que sempre haja alguém ofertando algo que outrem não tem interes-se em ofertar – desde que haja demanda para o produto ou interes-serviço em questão. A teoria da vantagem comparativa, elaborada por David Ricardo [1772-1823], é um aprimoramento da teoria da vantagem absoluta, que, por sua vez, é também uma criação Adam Smith [1723-1790]. Segundo a teoria da vantagem comparativa (própria de contextos mercadológicos), ao contrário do que ocorre e uma economia planificada, um agente (que pode ser uma pessoa, uma nação etc.) tem a possibilidade de se especializar na produção de determinado produto ou serviço, sem ter que se preocupar com a falta de outros produtos ou serviços que esse mesmo

16 A eficiência alocativa é a parte do conceito econômico de eficiência referente à distribuição (alocação) dos

recursos escassos. Ocorre eficiência alocativa (temporária) quando esses bens ficam com os agentes que mais os valorizam, em detrimento de tais recursos permanecerem nas mãos de quem menos os valorizam, e, no contexto de mercado, em função das trocas consensuais, os recursos tendem à eficiência alocativa, independentemente de como esses bens tenham sido distribuídos inicialmente.

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agente não possui expertise para oferecer ao mercado. Afinal, pois, em razão do custo de o-portunidade, sempre haverá a possibilidade de uma troca de um produto ou serviço por outro e, assim sendo, mesmo que haja falhas de mercado17, sempre haverá pluralidade de produtos e serviços ofertados.

Disponibilizar um produto ou serviço implica custos, e um destes custos, normalmente o mais caro, é o tempo (custo de oportunidade), vindo daí as circunstâncias de especialização dos agentes. Esse tempo que é consumido na produção de um bem ou disponibilização de um serviço poderia ser alocado na produção de outro bem ou disponibilização de outro serviço. Ocorre que as expressões “desperdiçado” e “aproveitado” não são adequadas ao tratamento do tempo, que, na verdade, é um recurso como outro qualquer. E, devido a esse custo de oportu-nidade, pois é caro consumir tempo naquilo em que não se é tão bom, o mais apropriado seria dizer que esse tempo que é consumido na produção de um bem ou disponibilização de um serviço poderia ser alocado na produção de outro bem ou disponibilização de outro serviço.

Voltando ao objetivo deste trecho do trabalho, que é esclarecer o significado de vanta-gem absoluta e vantavanta-gem comparativa, apresentar-se-á uma hipótese em que dois países, A e B, competem pelo fornecimento de produtos. Mesmo que um país A tenha uma vantagem ab-soluta sobre B, sendo mais eficiente que este na produção de todos os produtos necessários para ambos, A lucraria mais se concentrando no que ele faz de melhor, pois lhe é muito caro consumir tempo naquilo que ele não faz tão bem (custo de oportunidade). Essa escolha de A, que se dedicará à produção daquilo em que ele é especialista, abre uma janela para B, que produz a segunda opção de A quase tão bem quanto este, fornecer o produto sem a concorrên-cia acirrada de A. Em termos de comparação entre os países A e B, a vantagem comparativa é benéfica para ambos, pois tanto A quanto B podem fazer uso mais eficiente dos seus recursos, especialmente do tempo. Dessarte, posto que A tenha vantagem absoluta na eficiência de pro-dução sobre B, este tem uma vantagem comparativa sobre aquele país, pois, em razão dos custos de oportunidade, A não concorre com B na produção de sua segunda melhor opção de especialização. Assim, no conjunto, em função do comércio, mais produtos e serviços são produzidos e oferecidos a preços mais baixos porque, num mercado competitivo, a

especiali-17 As falhas de mercado ocorrem quando a alocação de bens e serviços determinada pelos mecanismos de

mer-cado, não regulados pelo Estado e deixados livremente ao seu próprio curso, não é eficiente. Esse fenômeno costuma ocorrer em cenários nos quais os indivíduos, em busca dos próprios interesses, agem na condução de resultados que não são eficientes, muito diferentes dos esperados pela sociedade, e que, de alguma forma, podem ser melhorados do ponto de vista da mesma sociedade.

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zação, além de aumentar a oferta (caso haja demanda para que isso ocorra), gera redução de custos, e esse é um processo que, em regra, acontece simultaneamente. De um lado, a oferta sobe devido à especialização de ambos na produção deste produto, pois, se, no exemplo aci-ma, A se dedica à produção daquilo em que é expert, este país vai fazê-lo cada vez mais efici-entemente, produzindo mais unidades em menor tempo a um custo mais baixo. E, do outro lado, no mesmo mercado competitivo, menor custo em regra significa menor preço final para os produtos e serviços ofertados.

As elucidações com exemplos do tipo A e B, embora pareçam mais simples, costumam confundir mais do que explicar. Assim, para evitar a mesmice dos países e produtos mencio-nados por David Ricardo (que citava Inglaterra, na produção de tecidos e vinhos18 versus Por-tugal com seu vinho do Porto) e apresentar uma opção de “serviços” no esclarecimento do que seja vantagem comparativa, segue um exemplo diferente: imagine-se num mundo em que houvesse um mercado de prestação de serviços de super-heróis, autodenominados de Liga da Justiça. Nesse ambiente, o Super-Homem, em termos de comparação absoluta, proposta por Adam Smith, presta todos os serviços melhor do que todos os demais heróis – com exceção dos Super-Gêmeos, cujas habilidades pouco úteis os relegaram a um papel de ajudantes de super-heróis, os estagiários da Liga, e, por isso, não é possível colocá-los nesta comparação. Entretanto, numa análise de vantagem comparativa, de acordo com a hipótese de David Ri-cardo, o Homem de Aço não pode fazer tudo ao mesmo tempo e, por isso, embora seja tão rápido quanto o Flash, por exemplo, ele precisa se concentrar em suas habilidades mais espe-cíficas (capacidade de voar, ultra força etc.), ou seja, manter o foco naquilo em que ele seja realmente especializado. Mantendo-se a coerência do exemplo, o fato de o Super-Homem não poder fazer tudo ao mesmo tempo, sendo necessário optar por suas especializações, dá ao Flash uma vantagem comparativa para usar sua hipervelocidade, fazendo com que este herói possa se dedicar ao seu ofício e, sem a concorrência do Homem de Aço, especializar-se na prestação desse serviço à comunidade, tornando-se cada vez mais rápido.

Se o exemplo dos quadrinhos fosse trazido para a realidade, graças à vantagem compa-rativa que os demais super-heróis têm sobre o Super-Homem, em que pese a vantagem

abso-18 No exemplo de David Ricardo, a Inglaterra tinha vantagem absoluta sobre Portugal na produção de tecidos e

de vinhos – vinho inglês melhor que o do Porto? É de deixar qualquer um boquiaberto, ainda que se trate tão-somente de uma comparação hipotética –, mas, em função de ser mais especializada no ramo têxtil, dedicava-se aos tecidos, deixando para Portugal a oportunidade de fornecer vinho sem a competição “acirrada” das vinícolas inglesas. Assim sendo, no exemplo de David Ricardo, Portugal tinha uma vantagem comparativa sobre a Ingla-terra na produção de vinho.

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luta deste sobre aqueles, a sociedade teria mais oferta de (super) serviços, com um nível mais alto de especialização entre os prestadores de tais serviços.

É óbvio que o estudo de um sistema de propriedade intelectual não pode ser realizado pela mera AED positiva de seus impactos num dado país, como se este estivesse ilhado dos restantes. O contexto histórico e as interações comerciais entre os Estados são extremamente relevantes para que sejam determinados os níveis de apropriação privada adequados a este ou àquele país. Todavia, essa determinação de graus de apropriabilidade é uma fase posterior à discussão do tema em si, que é o papel da propriedade (intelectual) privada numa sociedade. Preliminarmente, entre outras questões, a diferença entre os níveis de desenvolvimento dos Estados que pretendem realizar um acordo de níveis mínimos de proteção, como é o caso de TRIPS, deve ser, previa e cautelosamente, avaliada. Mais à frente, anteriormente à implemen-tação de um regime de PI em determinado país, a capacidade de suas instituições públicas é outro ponto que merece uma avaliação criteriosa, pois há Estados sem quaisquer condições institucionais de fazê-lo. De qualquer forma, apesar da importância do contexto histórico dos DPI e de interações comerciais, neste trabalho de Análise Econômica do Direito (positiva), para efeitos de determinação de um objeto de estudo, tais etapas e necessidades serão descon-sideradas.

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2. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

2.1 FUNÇÃO SOCIAL

Durante o exame de qualificação para esta defesa, uma pergunta foi comum aos exa-minadores que tiveram acesso àquele texto: mas, afinal, qual é a função social da propriedade intelectual? Naquela ocasião, pelo que se pôde depurar das discussões sobre o tema, o questi-onamento surgira da falta de uma definição clara no trabalho, caracterizando as diferentes posições de juristas e economistas, do conceito de função social e, consequentemente, de fun-ção social da propriedade, seja esta intelectual (de bens intangíveis) ou não (de bens tangí-veis). Logo, mantendo-se o texto como estava, faltava um pressuposto conceitual básico ao estudo do tema como um todo e, no intuito de solucionar tal falha, seguem alguns esclareci-mentos sobre as delimitações de função social adotadas neste trabalho.

Inicialmente, a omissão do conceito fora uma estratégia deliberadamente adotada para atrair a atenção de leitores menos interessados num tema tão particular, como é o caso de uma análise juseconômica da propriedade intelectual. Contudo, a estratégia não funcionou porque este estudo traz consigo uma dificuldade idiomática peculiar. Além de ser necessário apresen-tá-lo numa linguagem suficientemente clara tanto para juristas quanto para economistas, é preciso expor aqui noções de PI que não são comuns a nenhum dos dois públicos. Em resumo, o presente trabalho mistura três diferentes linguagens técnicas, com seus idiomas próprios, quais sejam: a do Direito, a da Economia e a da propriedade intelectual. E, num contexto aca-dêmico formal, no qual se exige tratamento com certa rigidez de linguagem aplicada aos te-mas, é justamente neste último idioma que reside o maior obstáculo linguístico, pois: se fal-tam juristas conhecedores de propriedade intelectual, visto que, na maioria das escolas de en-sino jurídico, apenas uma modalidade de PI19, a da propriedade industrial, é apresentada – quando é – em somente um dos vários módulos de Direito Empresarial, normalmente minis-trado em duas aulas de 50 minutos cada; se são raríssimos os economistas que entendam de propriedade intelectual, embora boa parte deles conheça as considerações schumpeterianas20

19 Além das proteções do tipo

sui generis (adotadas para circuitos topográficos, cultivares etc.), a propriedade

intelectual é tradicionalmente dividida em dois grandes grupos: propriedade industrial (marcas, patentes, dese-nhos industriais etc.); e direitos de autor (obras literárias, canções etc.).

20 Além de ter proposto os critérios de inovação que serviram de base para o conceito atualmente adotado pela

OCDE (página 57), Joseph Schumpeter [1883-1950] foi o responsável pela elaboração da teoria da destruição

criadora. O processo de destruição criativa, ou destruição criadora, ocorre quando um novo processo, produto

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sobre inovação; o que dizer de profissionais que dialoguem nos dois distintos idiomas das respectivas áreas de conhecimento, Direito e Economia, e, ainda, guardem noções de PI?

Naquela primeira proposta de texto, posto que houvesse uma tentativa acanhada de es-clarecer a função social da propriedade intelectual, considerando-se apenas a análise econô-mica de “para que serve”21 a propriedade intelectual, faltava uma descrição do que fosse, afi-nal, função social para os juristas. Esse erro de estratégia se justificava pela presunção de que todos os possíveis leitores estivessem familiarizados com os termos da AED, especialmente com aqueles conceitos mais vinculados às ciências econômicas. Contudo, como restou óbvio durante o exame de qualificação, para permitir o avanço de todos os leitores no entendimento da proposta deste estudo, há diferenças conceituais que precisam ser previamente delimitadas.

Conforme já mencionado, o presente trabalho se pautará pelos conceitos e métodos da Análise Econômica do Direito e, portanto, quando o texto mencionar “maximização do

bem-estar social”, não há qualquer juízo de valor atrelado à expressão. O termo se refere ao

me-lhoramento da situação de bem-estar da sociedade como um todo, ou seja, da soma de todas as pessoas (naturais e jurídicas) que fazem parte de uma sociedade. Da mesma forma, o termo “função social” também é apresentado sem referências a juízos de valor e, não cabendo aqui uma discussão sociológica sobre a expressão, a análise será elaborada com foco (econômico) em “para que serve a PI”, ou, ainda, em “qual é o papel da propriedade intelectual na maximi-zação do bem-estar de uma sociedade”, sem investigar se o estabelecimento de direitos de propriedade intelectual está, ou não, cumprindo sua função social – o que tem sido objeto de ampla discussão, mas pode ser investigado e discutido noutra ocasião –, ainda que haja o e-xame de parte dos efeitos provocados por um sistema de PI.

Trata-se, então, tão-somente de uma discussão conceitual sobre a função da PI na ma-ximização do bem-estar social, ou seja, trata-se da análise de um problema, ex ante, a “Natureza de Bem Público do Conhecimento”; da tecnologia aplicada no combate ao

proble-vável, que foi “destruído” pelo pen drive, que, por sua vez, vem sendo “destruído” pelas nuvens de

armazena-mento remoto (em rede). Para estudantes que precisam entender de relações de mercado (envolvendo a oferta de produtos, processos e serviços), é primordial ter noções de inovação e, ainda com base nos conceitos schumpete-rianos, de destruição criativa.

21 Nas aulas de AED, em razão de não ser necessário o formalismo de uma dissertação, é comum que se iguale a

expressão “função social” (de qualquer instituição) à sua versão mais coloquial, qual seja: “para que serve” (qualquer instituição). Os esclarecimentos prestados no item 2.1 compõem, portanto, uma tentativa de resposta à pergunta mais comum aos leitores deste trabalho, assim como ocorrera durante a qualificação. Em termos (qua-se) matemáticos: função social (de uma instituição ou direito) ≅para que serve (uma instituição ou direito), do ponto de vista da sociedade.

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ma fundamental, a “Função Social da Propriedade Intelectual”; dos efeitos colaterais, ex post, provenientes da aplicação dessa tecnologia, os “Custos Sociais da Propriedade Intelectual”; e, por fim, do paliativo para abrandar tais efeitos colaterais, a “Limitação Temporal da Proprie-dade Intelectual”.

Dessarte, doravante quando este texto mencionar “função social”, para os fins aqui propostos, a expressão deve ser avaliada sob um prisma de funcionalidade mesmo, e, por isso, ela poderá perfeitamente ser substituída por “para que serve” ou, ainda, por “qual o papel” desse ou daquele instituto em exame no contexto social. Tomando emprestada a conceituação oriunda da Sociologia Jurídica (Diniz, 2005, p. 704):

FUNÇÃO SOCIAL – Atividades e papeis exercidos por indivíduos ou grupos soci-ais, com o escopo de obter o atendimento de necessidades específicas (grifo nosso).

2.1.1 Função Social do Direito

Para os juristas, embora alguns doutrinadores continuem se arriscando na tentativa de criar expressões novas, a função social mais comumente atribuída ao Direito é a de prevenir e solucionar conflitos de interesses, na busca pela paz social, uma vez que, sem normas de con-duta, a vida em sociedade seria inviável (Filho, 2000, p. 15). É a arte22 de regular os compor-tamentos humanos (Gico Jr., 2010).

Contudo, a elaboração e aplicação do próprio Direito dependem do contexto histórico em que viveram e vivem os criadores e aplicadores do Direito, e, portanto, dizer o que venha a ser sua função social depende da sociedade em que se inserem os juristas. Assim, realizando a análise funcional proposta acima, o papel do Direito numa sociedade será determinado por este arranjo social e, logo, essa função carrega consigo os valores da sociedade que elaborou as normas sob as quais a comunidade funciona.

Na Constituição Federal (BRASIL, 1988), o termo “função social” é expressamente mencionado sete vezes, mas, na mesma Carta, há apenas duas tentativas de delimitação da expressão, justamente no que se refere à propriedade urbana (§ 2º, artigo 182, CRFB/1988) e rural (artigo 186, CRFB/1988). O Código Civil brasileiro (BRASIL, 2002) também menciona o termo “função social”, referindo-se aos contratos e à propriedade, mas não esclarece o que

22 Quando usou a palavra “arte”, ao invés de ciência, o autor, que faz tudo de propósito, se referia à Guilhotina

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venha ser este papel que o Direito deve exercer na sociedade. O problema é que, na falta de uma definição objetiva, legal, da função social do Direito, alguns magistrados têm aproveita-do a expressão para justificar decisões judiciais que se afastam aproveita-dos comanaproveita-dos legais aos quais estas sentenças deveriam estar adstritas.

Talvez – e isso já é assunto para outra discussão – a confusão dos juristas quanto ao que venha ser o papel do Direito na sociedade se deva à conotação de distribuição de riquezas que o termo carrega consigo. Em boa parte dos 1.240 cursos de Direito cadastrados no Bra-sil23, a expressão “função social”, dotada de uma forte carga de valores (normalmente cris-tãos) da sociedade contemporânea, é empregada como justificativa para políticas e sentenças relacionadas com reforma agrária, com direito do consumidor, enfim, com todo tipo de

redis-tribuição24 de recursos. Logo, na visão dos economistas que se debruçam sobre o tema, o uso

jurídico do termo tem sido posto para realizar redistribuição, ou seja, para transferir riqueza de uma parte – supostamente – mais abastada da sociedade para os – supostamente – menos afortunados desta mesma comunidade.

Para a Análise Econômica do Direito, a função social do Direito é, inicialmente, ga-rantir a vida em sociedade, pois, em concordância com a doutrina jurídica, não seria possível para a humanidade viver em comunidade sem que seus membros soubessem as regras do jogo

segurança jurídica. E, nos casos de quebra dessas regras, o Direito serve, ainda, para

diri-mir os conflitos que venham a surgir daí, evitando danos sociais mais graves que poderiam advir de outras possibilidades de soluções para conflitos de interesse humano.

Olhando de perto, um conflito jurídico de interesses é um processo de barganha (item 2.2.3.1) como outro qualquer – com a diferença de que, no Brasil, ele acontece no Poder Judi-ciário –, pois uma contenda judicial envolve partes (jogadores25), possibilidades de sentenças

23 O Brasil tem mais faculdades de Direito do que todos os países no mundo juntos. Em 2010, em território

na-cional, havia 1.240 cursos de Direito, enquanto, no mesmo ano, a soma não chegava a 1.100 universidades no restante do planeta Terra. Os números foram informados por Jefferson Kravchychyn, do Conselho Nacional de Justiça (IG, 2010), mas essa informação é tão-somente uma provocação para um possível estudo de oferta e demanda do recurso (advogados).

24 Embora sejam poucos os profissionais das ciências econômicas que considerem a redistribuição um dos focos

do estudo comportamental diante de recursos escassos, não há um economista sequer que desconsidere a busca pela eficiência na maximização do bem-estar social. Assim, o presente estudo não tem a pretensão de tratar de redistribuição, considerando a maximização do bem-estar social, objetivo final da AED, independentemente da distribuição alcançada dentro desta sociedade.

25 Explicação para o termo em “Teoria da Barganha”, item 2.2.3.1.

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que variam conforme o direito aplicável aos fatos da disputa (valores de ameaça26) e, no caso de um acordo, um ganho mútuo (excedente cooperativo27) que ocorre mediante flexibilidades aceitas por ambos os lados da querela. Nesse sentido, para as partes (jogadores), quanto mais claras forem as consequências da falta de cooperação (valores de ameaça), maior a possibili-dade de haver uma solução negociada (excedente cooperativo) – judicialmente, no Brasil, isso se dá mediante um pacto chancelado pelo juiz.

Superado o Estado de Natureza, o estabelecimento de direitos tem o papel de maxi-mizar o bem-estar social, independentemente dos valores culturais adotados pelos membros desta sociedade. Assim sendo, não há uma função para o Direito que não seja social, visto que, como dito acima, não cabem às ciências econômicas discussões de valor sobre o que seja “social”. Logo, função social do Direito, para a AED, é sinônimo de função do Direito na sociedade, ou seja, é o papel que cabe ao Direito na busca pelo bem-estar social. Simplifica-damente, as normas de conduta – aquilo que pode ou não pode ser feito – são as regras básicas da convivência humana. Continuando a análise, numa insinuação ainda mais simples e lúdica, o Direito poderia ser visto como um adulto que dita regras às crianças (pessoas em sociedade) e, quando necessário, intervém para evitar que estas se matem por um mero biscoito recheado (propriedade), ou por qualquer outro tipo de direito em disputa.

Todavia, é importante notar que, apesar do que possa parecer, maximizar o bem-estar social não significa, necessariamente, majorar a riqueza monetária de uma sociedade. Essa elevação do nível de bem-estar social significa, tão-somente, deixar a sociedade em melhor estado do que ela se encontrava antes, seja qual for o indicador adotado, do Índice de Desen-volvimento Humano (IDH) à quantidade de informações (supostamente sigilosas) obtidas de outros países numa situação de intensa competição internacional – ou será que há quem duvi-de que os EUA, duvi-de posse duvi-de dados valiosos sobre o mapeamento dos recursos minerais brasi-leiros28, não esteja em situação melhor que a de países que desconhecem tais informações? E é aí que reside o perigo da aplicação indiscriminada dos instrumentos de eficiência29 à

cons-26 Explicação para o termo em “Teoria da Barganha”, item 2.2.3.1 – Dixit (2004) nomeou de “negociação à

sombra da lei” esse fenômeno de usar as certezas, e incertezas, de uma solução litigiosa como valores de ameaça durante as barganhas.

27 Explicação para o termo em “Teoria da Barganha”, item 2.2.3.1.

28 Em setembro de 2013, novos documentos da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA),

vazados pelo ex-analista da agência, Edward Snowden, indicam que a Petrobrás também teria sido espionada pelos americanos (BBC - Brasil, 2013).

29 Na Física, assim como nas Engenharias, a eficiência, ou rendimento, é relação entre a energia fornecida a um

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trução e à aplicação de um arcabouço jurídico, pois estas ferramentas podem ser utilizadas na alteração de quaisquer estruturas de incentivos dos agentes para, mediante tal modificação, incentivar neles alterações comportamentais em qualquer direção determinada pelos tomado-res de decisões políticas.

Para a Economia, na prática, não há diferenças entre propriedade e direitos de proprie-dade, pois, em última análise, são estes que são negociados entre os agentes. No entanto, co-mo se verá abaixo (item 2.2.1), o Direito mais ortodoxo, na classificação da propriedade coco-mo tal, considera a relação entre o detentor e o objeto, ou melhor, do possuidor sobre a coisa ( iu-ra in re), ainda que as relações entre o proprietário e os demais agentes não sejam

desconside-radas pela doutrina. Então, da mesma maneira que é necessário esclarecer conceitos do méto-do econômico para os juristas, há delimitações próprias méto-do Direito que precisam ser compre-endidas pelos economistas que se candidatem a praticantes da AED.

2.2 PROPRIEDADE

2.2.1 Conceito

Na abordagem jurídica tradicional, os direitos de propriedade são tratados como uma das espécies do Direito Real, termo que, por sua vez, é uma derivação da expressão iura in re e poderia ser traduzido por direitos de um sujeito sobre uma coisa. Portanto, no âmbito do Direito Civil, há os direitos obrigacionais, derivados das relações entre as pessoas (sejam estas relações contratuais ou oriundas de responsabilidades civis extracontratuais) e os

direi-tos reais, derivados da relação entre um detentor e um objeto. Outra diferença importante

entre direitos obrigacionais e reais, adotada como critério de distinção entre ambos, reside no fato que os direitos oriundos das relações (obrigacionais) mantêm seus efeitos atrelados às partes envolvidas, enquanto, os direitos de um sujeito sobre determinada coisa (reais) devem ser respeitados por toda a sociedade – ou, na linguagem jurídica, são oponíveis contra todos (erga omnes).

Essa relação detentor-objeto parece estranha aos não-juristas e ela é mesmo, não a-penas na visão das ciências econômicas, pois a própria doutrina civilista clássica admite não

forma de trabalho ��= �

energia�. Para a Economia, posto que seja possível resumir o conceito na relação entre o

maior benefício possível ao menor custo necessário, tecnicamente, a Eficiência Econômica é a associação da eficiência técnica, que é a habilidade da unidade decisória em extrair o maior nível de produto para um dado nível de insumo, com a eficiência alocativa, habilidade da unidade decisória em utilizar os insumos na melhor proporção de forma a minimizar os custos.

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Figura 2: Tipos Econômicos de Bens  R IVALIDADE DE  U SO
Figura 4: “Sistemática” da Propriedade
Figura 6: Função Social da Propriedade Intelectual  R IVALIDADE DE  U SO

Referências

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