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Família e drogadição: compreendendo o padrão de relacionamento de uma família com um membro dependente químico

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM PSICOLOGIA

MESTRADO EM PSICOLOGIA

FAMÍLIA E DROGADIÇÃO: compreendendo o padrão de relacionamento de uma família com um membro dependente químico

HELOISA DO ABIAHY CARNEIRO DA CUNHA VIEIRA

Brasília – DF

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM PSICOLOGIA

MESTRADO EM PSICOLOGIA

FAMÍLIA E DROGADIÇÃO: compreendendo o padrão de relacionamento de uma família com um membro dependente químico

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia, da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia.

HELOISA DO ABIAHY CARNEIRO DA CUNHA VIEIRA ORIENTADORA: Profª Drª MARIA ALEXINA RIBEIRO

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Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, sob a orientação da Professora Doutora Maria Alexina Ribeiro.

Examinada e aprovada pela banca:

___________________________________________ PROFESSORA DOUTORA MARIA ALEXINA RIBEIRO

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA

_____________________________________________________ PROFESSORA DOUTORA MARIA APARECIDA PENSO

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA

_________________________________________________________ PROFESSORA DOUTORA MARIA INÊS GANDOLFO CONCEIÇÃO

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

________________________________________________________ PROFESSORA DOUTORA TÂNIA MARA CAMPOS DE ALMEIDA

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A GRATI DÃO É UM DOM!

A Grat idão é um Dom ! Ser grat o é reconhecer

a grandeza do nosso sem elhant e.

Agradecer é rogar para que aquele que nos fez algo de bom

sej a, de algum a form a, recom pensado.

É por isso que dizem os assim : Muit o obrigado.

Porque est am os “ obrigados” a ret ribuir a acolhida, o am or, o gest o, enfim , que nos foi perm it ido usufruir.

Dam os graças, dizem os graças a vocês... e as Graças vêm da Grécia e são t rês: Sua prerrogat iva é presidir

aos benefícios e à grat idão.

Desej am os que essas Graças se acerquem das pessoas que nos fazem o bem ,

que nos querem bem .

Por isso dam os graças... aos que por nós rezaram ,

aos que nos inspiraram e apoiaram , aos que nos aj udaram e nos corrigiram aos que nos esperaram e ent enderam , aos que conosco sorriram e nos ouviram E aos que por nós t orceram .

Aos que nos deram a m ão Dam os graças e um a Oração. Muit o obrigado!

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DEDICATÓRIA

Dedico este título aos meus eternos amores: meus pais.

A meu pai Epitácio, que do Paraíso me abençoa todos os dias e que muito lutou para que esse momento chegasse. Hoje aproveito a herança que ele me deixou: a vontade de aprender.

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AGRADECIMENTOS

À Professora Doutora Maria Alexina Ribeiro, por ter acreditado no meu sonho, em forma de projeto, que hoje se concretiza na apresentação deste trabalho.

Às Professoras Doutoras Maria Aparecida Penso, Maria Inês Gandolfo Conceição e Tânia Mara Campos de Almeida por aceitarem o convite para participar da Banca de Defesa desta Dissertação.

Ao Dr. Francisco Nonato Camilo, Diretor do Serviço Médico da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, por autorizar que a pesquisa fosse realizada na Gerência de Perícia Médica.

À Sandra Maria Gadelha, Coordenadora do Programa de Assistência ao Dependente Químico e Familiares da Secretaria de Estado de Educação do DF, pela amizade e compreensão.

À minha querida amiga Patrícia Oliveira Barbosa, Terapeuta de Família, pela valiosa participação nos encontros com a família pesquisada.

À minha querida amiga Maria Aparecida Martins de Abreu, que com sua sabedoria incomum, nos desperta para o verdadeiro sentido da vida e da amizade.

À querida amiga Conceição de Maria Couto Machado, nossa amada Concita, pelo carinho e pela colaboração para que este trabalho ficasse melhor.

Aos familiares, pelo incentivo constante para que esta etapa fosse alcançada.

Aos amigos, por aceitarem, várias vezes, deixar o bate-papo para outro dia...

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AGRADECIMENTOS ESPECIAIS

A Deus, nosso criador, por me conceder diariamente infinitas graças que me ajudam a querer ser sempre uma pessoa melhor.

À minha mãe amada, Ieve do Abiahy Carneiro da Cunha, psicóloga nata, pelo amor e carinho dedicados incondicionalmente.

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RESUMO

Vieira, Heloisa do Abiahy Carneiro da Cunha (2005). Família e drogadição: compreendendo o padrão de relacionamento de uma família com um membro dependente químico. Dissertação de Mestrado. Curso de Pós-graduação em Psicologia. Universidade Católica de Brasília.

Neste Estudo de Caso trabalhamos com uma família com um membro dependente químico do sexo feminino, usuária de álcool e merla, entre outras drogas, e utilizamos instrumentos como entrevistas clínicas individual e familiar, elaboração de genograma trigeracional e realização de colagem como técnica não verbal. Por intermédio da metodologia qualitativa da pesquisa-intervenção foi possível coletar dados que nos trouxeram uma compreensão mais acurada do que acontece no ambiente familiar, de como a dificuldade de tratamento é abordada e qual a participação efetiva da família no processo de recuperação da “pessoa” dependente química. Este trabalho foi realizado no Programa de Assistência ao Dependente Químico e Familiares da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, onde atendemos diariamente os servidores com problemas referentes ao uso indevido de drogas lícitas e ilícitas. A pesquisa proporcionou uma aproximação aos conflitos interpessoais anteriores ao estabelecimento da dependência química e às dificuldades de relacionamento familiar decorrentes da drogadição. As informações obtidas nos remetem a uma estrutura familiar pouco flexível com uma comunicação confusa. Nos relatos sobre a dinâmica familiar percebemos que o isolamento social desta família se deve ao fato das interações com sistemas externos terem sido escassas devido à pouca maleabilidade dos sistemas conjugal e parental.

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ABSTRACT

Vieira, Heloisa do Abiahy Carneiro da Cunha (2005). Family and drug addiction: Understanding the relationship pattern of a family having a chemical dependent member. Master’s dissertation. Pós-graduation Course. Universidade Católica de Brasília.

In this Case Study we have worked with a chemical dependent female member of a family who uses alcoholic beverages and “merla” among other drugs. We have used clinical individual and family interviews, trigeracional genograme elaboration and a collage. The collage was chosen for being a non-verbal technique. The use of qualitative research methodology of intervention research has made it possible to collect data that has brought a more accurate understanding of the events within the family context. Such events include how the family deals with the treatment and the effective participation of the family in the recovery of the chemical dependent. The present study was developed at the Chemical Dependent Assistance Program from State Education Secretariat, where we attend public servants who use legal and illegal drugs inappropriately. The study has favored the approaching of interpersonal conflicts that happened before the establishment of the chemical dependency and also of family relationships difficulties as a result of drug addiction. The data collected reveal a family structure that is not very flexible, having a confusing communication pattern. We identified that the family social isolation is due to scant interactions with external systems as a consequence of the little malleability of the conjugal and parental systems.

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SUMÁRIO

Dedicatória v Agradecimentos vi

Agradecimentos Especiais vii

Resumo viii

Abstract ix

Lista de Quadros e Figuras xiii

Lista de Tabelas xiv

Siglas Utilizadas xv

INTRODUÇÃO 01

PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA 08

1.1 ABORDAGEM SISTÊMICA DA FAMÍLIA 08

1.1.1 Histórico da Terapia Familiar 08

1.1.2 Conceito de Família como Sistema 14

1.1.3 Estrutura Familiar Segundo Salvador Minuchin 19

1.1.4 Ciclo de Vida Familiar 22

1.2 DEPENDÊNCIA QUÍMICA 31

1.2.1 Contextualizando a Dependência Química 31

1.2.2 A Dependência Química na Classificação Internacional de Doenças –

CID 10 38

1.2.3 Alcoolismo e Alcoolismo Feminino 43

1.3 DINÂMICA FAMILIAR DO DEPENDENTE QUÍMICO 47

1.3.1 Relações Familiares 47

1.3.2 Interação nas Famílias de Dependentes Químicos 52 1.4 PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA AO DEPENDENTE QUÍMICO E

FAMILIARES 58

1.4.1 Dados Gerais do Programa 58

1.4.2 Dados dos Atendimentos desta Pesquisadora no Programa 63

1.5 QUESTÕES DE PESQUISA 66

1.6 OBJETIVOS 67

1.6.1 Objetivo Geral 67

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PARTE II – MÉTODO 68

2.1 Contextualizando a Pesquisa 68

2.2 Estudo Exploratório 72

2.2.1 Participantes 73

2.2.2 Instrumentos 74

1º Roteiro de Entrevista – Individual 74

2.2.3 Procedimentos 74

2.2.4 Análise de Dados 75

2.3 Estudo de Caso 91

2.3.1 Participantes 91

2.3.2 Instrumentos

2º Roteiro de Entrevista – Individual 3º Roteiro de Entrevista – Familiar Genograma Familiar Colagem 93 93 93 94 94

2.3.3 Procedimentos 95

2.3.4 Análise de Dados 96

PARTE III – APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 97

3.1 Estudo de Caso 97

3.1.1 História Familiar

Infância e Adolescência Abandono do Pai

Abuso Sexual

Acidente com a Irmã

97 99 100 101 103 3.1.2 Uso de Drogas

Tratamentos

104 107 3.1.3 Papéis Familiares na Família de Origem e na Família Nuclear 109 3.1.4 Padrões Interacionais

Comunicação Fronteiras

110 113 114 3.1.5 Dados do Genograma Familiar

Genograma Familiar

Legenda do Genograma Familiar

(12)

3.1.6 Interpretação da Colagem Colagem

120 123 PARTE IV – DISCUSSÃO

a) Estudo Exploratório b) Estudo de Caso

124 124 129

PARTE V – CONSIDERAÇÕES FINAIS 144

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 148

ANEXOS 155 Anexo I – 1º Roteiro de Entrevista – Individual 155

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LISTA DE QUADROS E FIGURAS

Figura 1 – Estressores Horizontais e Verticais ... 30

Figura 2 – Agenda do Programa 2004 ... 59

Figura 3 – Sexo dos Usuários – Programa 2004 ... 60

Figura 4 – Substâncias Utilizadas – Programa 2004 ... 60

Figura 5 – Cargo dos Usuários – Programa 2004 ... 61

Figura 6 – Idade dos Usuários – Programa 2004 ... 61

Figura 7 – Número de Agendamentos, Freqüências e Faltas nos Anos 2004 e 2005 ... 62

Figura 8 – Tipo de Substâncias Usadas em 2004 e 2005... 63

Figura 9 – Atendimentos Realizados pela Pesquisadora em 2004 ... 64

Figura 10 – Substâncias Utilizadas pelos Pacientes Atendidos pela Pesquisadora em 2004 ... 65

Figura 11 – Cargo dos Pacientes Atendidos pela Pesquisadora em 2004 .... 65

Figura 12 – Genograma Familiar ... 118

(14)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Classificação das SPA Segundo Efeitos no SNC... 35 Tabela 2 – Idade e Sexo dos Usuários de Drogas ... 37 Tabela 3 – Padrão de Uso de Álcool no Brasil ... 43

Tabela 4 – Dados Biográficos dos Participantes do Estudo Exploratório ... 76 Tabela 5 – Dados Funcionais dos Participantes do Estudo Exploratório .... 77

Tabela 6 – Dados Sobre o Uso de Drogas pelos Participantes

do Estudo Exploratório ... 78 Tabela 7 – Dados Sobre o Tratamento Realizado pelos Participantes

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SIGLAS UTILIZADAS

AA – Alcoólicos Anônimos

AVC – Acidente Vascular Cerebral

CEBRID – Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas

CID – Classificação Internacional de Doenças NA – Narcóticos Anônimos

OMS – Organização Mundial de Saúde

OPAS – Organização Pan-americana de Saúde

PADQ – Programa de Assistência ao Dependente Químico e Familiares

SEE/DF – Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal SNC – Sistema Nervoso Central

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INTRODUÇÃO

Muito se tem falado, nos dias atuais, sobre a convivência humana e as dificuldades que encontramos quando tentamos, em nosso cotidiano, nos relacionar com o outro de maneira mais próxima. Temos a sensação de que a indiferença frente à violência e ao desrespeito para com o ser humano cresce a cada dia, quando ouvimos nos meios de comunicação notícias sobre agressão, morte, doença, corrupção e outros tantos assuntos que permeiam o nosso dia-a-dia, como se fossem algo natural e corriqueiro. Temas como: a falência do casamento, a desestruturação da família, o uso indiscriminado de drogas, a apatia da sociedade, a banalização do sexo, o recrudescimento da violência, a desigualdade social e muitos outros são incansavelmente discutidos em nosso círculo de amigos, de trabalho ou de estudo.

Por outro lado, a importância da família é ressaltada sempre que se discute sobre a formação do indivíduo e de seu desenvolvimento, no que se refere à possibilidade desse indivíduo tornar-se um adulto capaz de viver em sociedade. No entanto, não só os aspectos positivos e saudáveis da convivência familiar são enfatizados. A família tem sido culpabilizada por muitos comportamentos negativos e desajustados quando transgressões e ações violentas e criminosas são mostradas com freqüência pelos meios de comunicação. Neste momento são questionados alguns valores vividos e transmitidos pela família, tais como: honestidade, decência, ética, moral, solidariedade, amizade etc.

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seus membros estabelecem. Na vida desse grupo surgem sinais variados que muitas vezes têm a função de equilibrar o seu funcionamento, mas podem causar desconforto e sofrimento.

Como sistema auto-regulado (Andolfi, 1981), a família apresenta características próprias em seu funcionamento e organização, que quando desconsideradas, podem favorecer o aparecimento de alguns sintomas. Esses sintomas podem expressar processos de um funcionamento desequilibrado muitas vezes mantenedor de um ciclo disfuncional. A crença de que a comunicação familiar tem papel fundamental para a saúde dos indivíduos que a compõem, reforça a necessidade de acompanhar uma família onde o sintoma da drogadição se manifesta como tentativa de equilíbrio.

A abordagem sistêmica abrange uma forma de pensar que privilegia as interações intra e intersistêmicas, ou seja, “os problemas se situam entre as pessoas e não nas pessoas” (Andolfi, 1981, p. 29). De acordo com esta abordagem é essencial a compreensão das relações interpessoais.

Segundo Nichols e Schwartz (1998), comunicação é comportamento e para que haja mudança no comportamento é necessário trabalhar a comunicação. Compreender como as relações familiares se dão, em um contexto onde o comportamento da Dependência química se apresenta, pode ser um caminho para o trabalho terapêutico com famílias com este tipo de sintoma e uma tentativa de re-equilibrar o sistema de maneira saudável.

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esta reflexão quando alerta para o fato de que uma postura sistêmica não pretende controlar ou resolver conflitos, mas, antes de tudo, ampliar a visão de conhecimento e propor mudanças que serão construídas pelos próprios sistemas em seu movimento de busca da homeostase.

Além da comunicação, outras dimensões do relacionamento familiar são apresentadas por teóricos da Terapia de Família. Salvador Minuchin nos oferece uma visão de estrutura da família para explicar as transações familiares que ocorrem nesse grupo (Minuchin e Fishman, 2003). A estrutura da família, segundo Minuchin é estabelecida pelas transações que criam padrões de funcionamento que permitem a seus membros se relacionarem. A partir desses padrões, são criadas regras de convivência que vão governar o relacionamento familiar.

No âmbito do enfoque sistêmico “a farmacodependência é vista como um conjunto de condutas que fazem parte de uma seqüência íntima e interpessoal

dentro do sistema familiar...” (Fender, 1996, p. 86). Muitas famílias, hoje, vivenciam as dificuldades de lidar com a dependência química ou mesmo com o uso de drogas por um ou mais de seus membros.

(19)

Os levantamentos epidemiológicos realizados no Brasil nos últimos anos apresentam dados que confirmam o aumento do uso de drogas lícitas e de algumas drogas ilícitas, indicando a necessidade de ampliar e atualizar constantemente as informações dessas pesquisas para serem alicerce de programas de prevenção e tratamento (Carlini, Galduróz, Noto e Nappo, 2002).

Em relação ao consumo de drogas psicotrópicas pela população jovem, o CEBRID, em seu V Levantamento Nacional de 2004, realizado nas 27 capitais brasileiras com estudantes do ensino fundamental e médio da Rede Pública Estadual e Municipal de Ensino, nos apresenta um índice de 22,6% uso na vida de drogas e de 2,0% uso pesado de drogas, excetuando-se o álcool e o tabaco no universo pesquisado de 48.155 (quarenta e oito mil, cento e cinqüenta e cinco) alunos. Os índices para o álcool e tabaco são ainda mais preocupantes com o uso na vida de álcool em 65,2% e uso pesado em 6,7% e para o tabaco o uso na vida de 24,9% e uso pesado de 2,7% para o mesmo universo entrevistado (Galduróz, Noto, Fonseca e Carlini, 2004).

(20)

A pesquisa e o trabalho com drogadictos têm mostrado como a participação familiar é importante para a adesão do usuário ao tratamento. A literatura que trata das adicções enfatiza o adoecimento não só do usuário ou dependente, mas também de toda a família, deixando clara a necessidade de compreender o sistema familiar que apresenta esse sintoma, uma vez que um dos membros do sistema está representando a problemática da família por intermédio do uso de drogas ou da dependência química (Freitas, 2002).

Esta pesquisa teve origem na vontade de conhecermos com mais propriedade a dinâmica de uma família onde o fenômeno da drogadição está presente. Observamos que algumas famílias se organizam de tal maneira que permitem uma intervenção em sua dinâmica, desenvolvendo assim, padrões diferentes de funcionamento e de posicionamento frente ao fenômeno da drogadição. Outras não conseguem permitir uma intervenção que possa ajudar na mudança em direção ao desaparecimento do sintoma, sem que o equilíbrio familiar seja comprometido.

Compreendendo que a família tende a funcionar de forma integrada, como sistema que é, fica evidente que o comportamento de um membro tende a afetar o comportamento dos demais e, assim, mudanças provocadas também terão este mesmo efeito, de acordo com Fender (1996). Segundo essa mesma autora, tanto no campo da terapia de família, quanto no campo do tratamento das adicções, a família tem papel importante na prevenção ao uso de drogas, no tratamento e acompanhamento de usuários.

(21)

Assim, o presente trabalho teve como objetivo conhecer a dinâmica de uma família que possui um adulto com dependência química, identificando o padrão de comunicação entre seus membros, os padrões interacionais que contribuem para a manutenção ou interrupção do comportamento sintomático e investigar a participação da família no tratamento e acompanhamento deste indivíduo.

Para chegarmos à servidora atendida no programa, que aceitou o convite para realizarmos a pesquisa com sua família, realizamos inicialmente um levantamento de dados, que chamamos de Estudo Exploratório, que consistiu na reunião de informações colhidas por intermédio de um questionário, denominado “1o

Roteiro de Entrevista – Individual” (Anexo I), que foi respondido na presença da entrevistadora. No total foram preenchidos 21 questionários para, dentre outros objetivos, atualização de alguns dados dos servidores, conhecimento da opinião que os servidores têm sobre família e trabalho e sondagem da possibilidade de participação na pesquisa. Uma vez encontrada a servidora que concordou em participar da pesquisa, que por sua vez é dependente de álcool e merla, cessamos o preenchimento dos questionários.

Os dados levantados por intermédio do questionário (Anexo I) foram agrupados por categorias e apresentados em tabelas e as respostas às perguntas abertas foram comentados segundo sua relevância para o trabalho.

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realizamos três encontros, conforme o “3o Roteiro de Entrevista – Familiar” (Anexo

III), com a participação da família, quando foram realizadas as entrevistas, a elaboração do genograma familiar e a colagem.

Nossa opção pelo referencial da teoria familiar e sua base sistêmica nos permitiu observar e compreender, a partir da análise realizada, a ressonância do uso de drogas no sistema familiar e como a dinâmica estabelecida pode modificar ou manter a drogadição de um ou mais membros da família. Ao final desta pesquisa foi possível vislumbrar a importância do aspecto relacional de um sistema complexo, como é a família, na problemática do uso de drogas.

(23)

PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA

1.1) ABORDAGEM SISTÊMICA DA FAMÍLIA

“Todas as partes do organismo formam um círculo. Portanto, toda e qualquer parte é um princípio e um fim.”

Hipócrates

1.1.1) Histórico da Terapia Familiar

Nascida na década de 1950, a Terapia Familiar, em seu processo de amadurecimento, contou com a colaboração de grandes pesquisadores que estudavam famílias sob diferentes óticas, como o grupo de Palo Alto, na Califórnia, formado por Gregory Bateson, Jay Haley, Don Jackson, John Weakland, William Fry, dentre outros (Nichols e Schwartz, 1998).

O nome Gregory Bateson figura entre os precursores da Terapia Familiar, por intermédio dos seus estudos sobre esquizofrenia. Concentrando esforços na comunicação familiar, para tentar desvendar a origem e a natureza do comportamento esquizofrênico no contexto das famílias, Bateson e seu grupo de estudiosos procuraram desenvolver uma teoria da comunicação que pudesse esclarecer fatos observados no funcionamento das famílias esquizofrênicas (Nichols e Schwartz, 1998).

(24)

profissionais que atuavam na terapia de família tinham raízes na visão psicanalítica, ou na visão tradicional da psiquiatria, enfatizando dessa forma o indivíduo como paciente e não a família como um todo (Nichols e Schwartz, 1998).

Desde então, a Terapia Familiar veio se organizando e se desenvolvendo, passando por modelos de psiquiatria hospitalar, psiquiatria interpessoal, dinâmicas de grupo, terapia de grupo, aconselhamento conjugal e pesquisas sobre esquizofrenia. Mas, diferenciando-se de todos eles, chega hoje ao status de uma abordagem sistêmica, creditando à Teoria Geral dos Sistemas, à Cibernética e ao Funcionalismo, muitas de suas mudanças neste processo de maturação (Nichols e Schwartz, 1998).

(25)

na psicanálise para compreender a família como unidade de diagnóstico e de tratamento (Nichols e Schwartz, 1998).

Diferentemente de Bowen, Ackerman trabalhava com as famílias inteiras e, no máximo, atendia em separado a unidade pais ou avós. Em seu método de trabalho preocupava-se mais com o problema que com a técnica e defendia o envolvimento emocional do terapeuta e a confrontação para ajudar as famílias a resolverem seus conflitos (Nichols e Schwartz, 1998).

Mas a evolução da Terapia Familiar continua e chegamos à década de 1970 com outro grande responsável pelo desenvolvimento dessa abordagem: Salvador Minuchin e sua visão estrutural da família. Minuchin acreditava na técnica e na experiência prática para obter resultados positivos no seu trabalho e assim desenvolveu uma abordagem de família para tratar delinqüentes em uma escola de Nova Iorque e também famílias de cortiços urbanos. A terapia familiar estrutural de Minuchin se apóia em dois eixos: a união do terapeuta com a família e posteriormente a reestruturação para romper com as estruturas disfuncionais (Nichols e Schwartz, 1998).

(26)

Já nos idos de 1990, a terapia de família tem suas tendências absorvidas do construcionismo social, de questões sociais e políticas, do feminismo e, porque não dizer, da visão de abordagens integrativas. Neste momento, começam os questionamentos sobre o movimento de alguns terapeutas de família em utilizar técnicas e métodos de outras abordagens para tentar obter melhores resultados, trazendo assim preocupações para o cenário da terapia de família em relação aos seus conceitos, suas estratégias e métodos de tratamento. Esses questionamentos possibilitaram grandes reflexões sobre a prática da terapia de família e hoje já conseguimos visualizar os ganhos com relação à postura do terapeuta em não impor suas vontades, não querer controlar a família, nem querer solucionar os problemas que cada uma delas apresenta; mas aceitar o momento de cada uma e propiciar um clima capaz de levar à família para o caminho da mudança e ao encontro de suas próprias soluções (Nichols e Schwartz, 1998).

Muitos outros estudiosos contribuíram para o processo de construção da terapia familiar, cada um em seu tempo e de acordo com sua formação acadêmica, e como não é possível citarmos todos, apresentamos mais alguns nomes que de uma forma ou de outra se destacaram, ou ainda hoje se destacam no campo da terapia de família, como por exemplo: Froma Walsh, Michael White, Margaret Mead, Theodore Lydz, Lyman Wynne, Ivan Boszormenyi-Nagy, Carl Whitaker, Janet Helmick Beavin, H. Charles Fishman, Mony Elkaim, Maurizio Andolfi, entre outros.

(27)

foco de observação, na descrição dos fenômenos utilizando-se o verbo estar e, por fim, na aceitação de outras descrições do que se apresenta, não impondo a própria visão, enfatizando assim, respectivamente, a complexidade, a instabilidade e a intersubjetividade.

Neste momento, os conceitos da Teoria Geral dos Sistemas, da Cibernética e da Teoria de Autopoiese de Humberto Maturana, estão mais vivos do que nunca, ajudando a entender o pensamento sistêmico e, por conseqüência, a atuar em terapia familiar de forma compreensiva e abrangente (Vasconcellos, 2002).

Em relação aos principais conceitos da Teoria Geral dos Sistemas utilizados pela Terapia Familiar, enfocaremos alguns deles por serem norteadores do presente estudo.

Segundo Woodworth (1976), o pensamento sistêmico abrange o fato de que os elementos de um sistema são mais que partes agrupadas e que se movimentam em direção à totalidade, para conhecer o funcionamento e a finalidade de cada organismo. Assim funcionam os sistemas abertos, alimentados por seus

inputs (entradas) que se tornam base para os processos internos e pelos outputs (saídas) resultantes desses processos.

Quando Ludwig von Bertalanffy discute as diferenças entre os processos estáticos e dinâmicos, ou entre a homogeneidade e a necessidade de diferenciação, ou então define feedback, na realidade ele nos impele a pensar não mais de forma linear, mas nos oferece a oportunidade de analisar os aspectos interacionais e dinâmicos dos sistemas chamados abertos (Woodworth, 1976).

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aberto o autor o compara a um organismo vivo, que apresenta continuamente entradas e saídas de informações (matéria), e que está continuamente construindo e desconstruindo a matéria que entra e sai de forma dinâmica.

Para explicar o estado de equilíbrio em um organismo vivo, ou seja, em um sistema aberto, Bertalanffy afirma que o equilíbrio neste tipo de sistema, independe de tempo, mas depende das condições do próprio sistema, mediante as diversas mudanças e perturbações que o sistema sofre continuamente, e não das condições iniciais, como acontece em sistemas fechados. Essa propriedade dos sistemas abertos de alcançar estados de equilíbrio por intermédio de suas próprias condições é conhecida como eqüifinalidade (Bertalanffy e cols., 1976).

Segundo Colle (2001), o princípio da eqüifinalidade é uma das expressões do aspecto dinâmico de todo sistema vivo. A eqüifinalidade, segundo o autor, representa a impossibilidade de deduzir o estado passado do sistema e de prever o estado futuro. O sistema vivo é concebido como “uma entidade individualizável distinta de seu meio e composta por elementos em interação, que

evoluem com o tempo e os acontecimentos” (p. 192).

Segundo Bertalanffy e cols. (1976), o conceito de homeostase vai além de uma tendência do sistema em satisfazer necessidades ou reduzir tensões, mas é preciso observar que um sistema aberto é um organismo ativo e, por esse motivo, um estímulo neste tipo de sistema apenas modifica processos (não causa processos), uma vez que o sistema é intrinsecamente ativo e dinâmico; sendo assim o princípio da homeostase é muito mais que a busca do equilíbrio.

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mais específico e heterogêneo onde há maior articulação e hierarquia (Werner, citado por Bertalanffy e cols., 1976).

Bertalanffy e cols. (1976) atribuem à Cibernética o papel de explicar o

feedback como sendo um tipo de esquema que responde às perturbações externas tentando controlar as funções do sistema, seja para manter um estado desejado, seja para dirigir o sistema a uma determinada meta. E o autor vai além, dizendo que as diferenças entre cibernética e sistemas gerais estão nesta regulação em que, para a cibernética, o feedback se dá por causalidade unidirecional e linear (embora circular: inputoutput), baseado em estruturas preestabelecidas; e para os sistemas gerais o feedback ocorre por intermédio da interação entre múltiplas variáveis e de forma dinâmica.

Assim a Teoria Geral dos Sistemas, juntamente com a Cibernética, por intermédio de conceitos trazidos da biologia, da cinética e da termodinâmica oferecem uma oportunidade de pensarmos o ser humano como um sistema que, de forma dinâmica e ativa, interage com vários outros sistemas; ele não é um mero reagente a situações ou estímulos, mas constrói e desconstrói continuamente sua atuação no mundo.

1.1.2) Conceito de Família como Sistema

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Para Andolfi (1981), a família é: a) um sistema em constante transformação que se desenvolve num processo duplo de continuidade e crescimento simultâneos, oscilando entre a homeostase e a necessidade de transformação; b) um sistema ativo e auto-regulado por regras desenvolvidas e modificadas ao longo do tempo, por meio de experimentação e adaptação e; c) um sistema aberto, em interação com outros sistemas que se estabelece também por intermédio de suas relações dialéticas com o conjunto de suas relações sociais.

Segundo o autor, uma vez que mudanças no comportamento de uma unidade do sistema afetam outra unidade e a resposta desta última vai afetar a primeira, sucessivamente, todas as unidades do sistema são afetadas.

De acordo com Calil (1987), todo sistema é parte de um outro sistema e também integra subsistemas. Assim é a família, com seus vários subsistemas, organizando suas funções e delimitando suas fronteiras. A idéia é que um sistema permita a troca de informações por intermédio de uma fronteira semipermeável que, por sua vez, interage com outros sistemas sem, contudo, perder sua identidade própria. No entanto, várias famílias funcionam com fronteiras rígidas demais, outras vezes permeáveis demais, quando o ideal seria a semipermeabilidade.

(31)

Compondo um sistema e sendo composta por diversos subsistemas, a família vai se construindo como entidade capaz de organizar e estruturar as interações humanas e, para isso, cumpre o papel de alicerce para que seus membros possam viver as fases de individuação e pertencimento, essenciais para a formação de novos sistemas familiares (Minuchin e Fishman, 2003).

Esses mesmos autores afirmam que o desenvolvimento de uma família se dá sempre em meio a mudanças e adaptações constantes e quando o equilíbrio é afetado pelas tensões e requer uma nova organização para que o estado de homeostase seja alcançado novamente, mecanismos de adaptação são acionados levando a respostas de aceitação ou evitação, de flexibilidade ou rigidez. Mas o entendimento de que a família é um sistema aberto e em movimento, oferece a compreensão de que os acontecimentos que exigem mudança, também vistos como causadores de crises, são necessários para que haja o crescimento e a continuidade do sistema familiar e de seus integrantes.

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Minuchin e Fishman (2003), consideram muito pertinente a utilização, pela terapia familiar, do conceito de Holon, apresentado por Arthur Koesler para designar um sistema que emprega energia para sua autopreservação, sendo um todo, e também transmite energia integradora, sendo uma parte; portanto, todo e parte se comunicam e se relacionam continuamente, uma vez que contêm um ao outro. Diversos holons são propostos na formação de uma família. São eles: o holon

individual, que por si só já é um sistema e incorpora o conceito de Self (aspectos da personalidade do indivíduo); o holon conjugal, que constitui o núcleo vital da família; o holon parental, que envolve as funções de educar e socializar os filhos; e o holon

fraterno, no qual as crianças vão viver com seus iguais e apreender os valores transmitidos em todos os subsistemas pertencentes à família.

De acordo com Whitaker e Bumberry (1990), a família começa pela formação de um casal e a visão de que duas culturas e dois contextos familiares estão se unindo também, facilita a compreensão da complexidade do que é uma família e da necessidade de vê-la sempre dentro de um contexto, para não anular sua singularidade. A opção pelo casamento como vínculo propiciador de compromisso em criar uma família, passa pela aceitação e construção de um “nós”, como possibilidade de integração de duas pessoas que trazem seus próprios valores e padrões a partir de suas famílias de origem.

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externas suscetíveis a todo sistema aberto, certamente será possível a constituição de outros holons no sistema familiar. Em cada fase vivida pela família, as exigências são diferentes e quanto mais estruturado e amadurecido o subsistema conjugal estiver, mais fácil será a adaptação frente às dificuldades impostas pela vida (Minuchin e Fishman, 2003).

Segundo Cerveny e Berthoud (2002), sendo a família também um sistema plurigeracional no qual o indivíduo é, ao mesmo tempo, uma parte e um todo de um sistema maior, que por sua vez pertence a sistemas maiores, num processo contínuo de comunicação e interação, podemos tentar compreendê-la: 1) Quanto à estrutura: mais rígida – menos rígida; 2) Quanto ao funcionamento e dinâmica: relações estabelecidas, vínculos estabelecidos e mantidos, como lidam com os problemas e conflitos, que rituais cultivam; 3) Quanto à etapa de desenvolvimento (ou ciclo vital): início da família, filhos em que idade, pais jovens ou não, quantas gerações convivem, núcleo reduzido de pessoas mais velhas ou não; 4) Quanto a origens étnicas e raciais; 5) Quanto à inserção cultural e social.

De acordo com categorias utilizadas para designar famílias, Cerveny (2000, p. 22) apresenta algumas considerações sobre o que seriam esses tipos de família: 1) a Família de Origem, “que pressupõe laços sangüíneos e conceitos de ascendência e descendência”; 2) a Família Extensa, que também “pressupõe laços sangüíneos ou por afinidade de pessoas ligadas entre si, ligadas no tempo e no

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Conhecendo melhor os conceitos sobre Família, podemos analisar com maior acuidade alguns aspectos da Terapia Familiar.

1.1.3) Estrutura Familiar Segundo Salvador Minuchin

O trabalho de Minuchin nos ajuda a compreender melhor os padrões de relacionamento familiar, motivo pelo qual decidimos apresentar alguns conceitos importantes da terapia familiar estrutural, que vão ao encontro dos objetivos de nossa pesquisa e nos permitem organizar o pensamento em relação às dinâmicas familiares.

A prática clínica de Salvador Minuchin em psiquiatria facilitou muito sua transição para a Terapia de Família, pelo fato de estar acostumado a ouvir atentamente seus pacientes, o que contribuiu para a construção de sua técnica em atender famílias que incluía além da escuta cuidadosa e acolhedora, a participação ativa no meio do grupo familiar (Nichols e Schwartz, 1998).

Para Minuchin (1990, p. 52) “a família passa por mudanças que correspondem às mudanças da sociedade, e assume ou renuncia as funções de

proteção e socialização de seus membros em resposta às necessidades da cultura”.

Entre as funções da família, o autor observa dois objetivos diferentes, “um interno, de proteção psicossocial de seus membros, e um externo, de acomodação a uma

cultura e transmissão da mesma”.

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fixa, e indicava uma constância ou repetição nas interações familiares que quando necessário deviam ser modificadas e flexibilizadas para não interromperem o desenvolvimento da família (Minuchin e Nichols, 2002).

Ainda segundo esses autores, o desenvolvimento da família podia ser observado por meio das adaptações realizadas em cada estágio de seu ciclo de vida, uma vez que a família, apesar de conservadora, é um sistema em evolução que precisa lidar com as mudanças exigidas em cada etapa de seu desenvolvimento.

Nesta visão estrutural da família, Minuchin alerta para três conceitos essenciais para a compreensão da família, que são: a estrutura, os subsistemas e as fronteiras. No que se refere à estrutura da família, Minuchin a define como um padrão organizado que descreve seqüências predizíveis de interação dos membros da família, e a repetição dessas interações estabelece um padrão de relacionamento que é perpetuado pelos membros da família. Para o autor, a estrutura familiar envolve também um conjunto de regras que coordenam as interações da família e permitem seu funcionamento, assim como apresenta uma hierarquia onde a autoridade é distribuída de forma diferente entre seus membros (Minuchin, 1990).

Segundo Minuchin (1990, p. 57) “a estrutura familiar é o conjunto invisível de exigências funcionais que organiza as maneiras pelas quais os membros da

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intermédio da observação, na qual seja possível visualizar a repetição das interações que formam o padrão de relacionamento (Minuchin, 1990).

Depois da estrutura, outro conceito trazido por Minuchin (1990) é o de subsistemas. “O sistema familiar diferencia e leva a cabo suas funções através de subsistemas” (p. 58). As famílias se organizam em subsistemas onde os membros podem se agrupar segundo o sexo, a idade, o papel que exercem, os interesses em comum e outros motivos, formando assim díades: mãe-filho, esposo-esposa, tríades: pai-mãe-filho, pai-filho-filha, enfim, grupos dentro do grande grupo que é a família. Nos subsistemas “um indivíduo tem diferentes níveis de poder, aprende habilidades diferenciadas e ingressa em diferentes relações complementares” (p. 58), o que torna possível observarmos muitos padrões de interação por intermédio dos papéis que os membros da família desempenham e das interações que estabelecem continuamente.

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amadurecimento de seus membros. O ideal é que as fronteiras sejam nítidas ou claras, ou seja, que haja flexibilidade para o distanciamento ou para a fusão, de acordo com as necessidades dos subsistemas e dos membros da família nas diferentes circunstâncias que a família vive (Minuchin, 1990).

Minuchin alerta para o fato de que uma família funcional não está isenta de problemas, mas o que a difere de uma família disfuncional é o seu padrão de relacionamento. O padrão disfuncional revela a falta de flexibilidade e de acomodação da família frente às exigências de cada estágio de seu desenvolvimento. A mudança de um padrão de relacionamento disfuncional para um padrão funcional recai na necessidade de modificar as interações entre os subsistemas, tornando-as mais flexíveis diante das diferentes necessidades da família. Conseqüentemente, é preciso que haja também flexibilidade nas fronteiras estabelecidas pela estrutura familiar para permitirem acomodações nos diferentes estágios do ciclo de vida da família (Minuchin, 1990).

A seguir, apresentamos as diversas etapas pelas quais passa a família em seu ciclo de vida, de acordo com Betty Carter e Monica McGoldrick (2001).

1.1.4) Ciclo de Vida Familiar

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As autoras afirmam que compreender a família, segundo o seu ciclo de vida, significa observar como ela se organizou no passado, como interage no presente e de que forma pensa o futuro, entendendo os sintomas e as disfunções existentes dentro do contexto de seu funcionamento ao longo do tempo.

A família, segundo Carter e McGoldrick (2001, p. 09), “incorpora novos membros apenas pelo nascimento, adoção ou casamento, e que diferentemente de

outros sistemas, esses membros só podem deixá-la pela morte”. Assim como em outros sistemas, a família também tem papéis e funções, mas o mais importante no sistema familiar são os relacionamentos. Na família encontramos o sistema emocional de pelo menos quatro gerações, em conseqüência disso a influência da família não fica restrita a apenas um subsistema ou ao ramo nuclear, mas se estende aos relacionamentos passados, aos relacionamentos atuais e antecipa de alguma maneira os relacionamentos futuros.

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A família, segundo a abordagem do ciclo vital, é entendida sob a perspectiva multigeracional, ou seja, é necessário que as três ou quatro gerações que compõem a família possam transitar pelas etapas do ciclo de vida de forma que consigam manter o seu desenvolvimento. Na transição de um estágio para o outro, as famílias encontram as dificuldades que vemos através dos sintomas e relacionamentos disfuncionais.

O primeiro estágio: saindo de casa: jovens solteiros, apresenta o momento em que o jovem adulto irá deixar sua família de origem para buscar sua vida conforme seus ideais, e nesse momento é preciso que ele tenha condições de se responsabilizar emocional e financeiramente por suas atitudes e decisões. Nesta etapa se espera que o jovem adulto consiga estabelecer relacionamentos íntimos com seus pares, consiga se diferenciar da família sem que para isso precise romper com seus membros, consiga se manter a partir de seu trabalho. A família e o jovem adulto precisam aprender uma nova forma de relacionamento que não seja tão hierárquica como no passado e essa mudança de status pode ser geradora de conflitos. Nessa fase é comum ver famílias que estimulam a dependência dos filhos; ver filhos que se rebelam, mas continuam vinculados emocionalmente; ou filhos que acatam o jogo dos pais e mantêm a condição de dependência. O ideal nesta fase, ou considerado funcional, é que se estabeleça uma forma adulta e respeitosa de relacionamento na qual o jovem adulto e sua família assumam o novo status e as novas responsabilidades decorrentes dessa etapa de seu desenvolvimento (Carter e McGoldrick, 2001).

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constituem. Neste momento é necessário que cada cônjuge se comprometa com o novo sistema e assuma a condição de casal. É comum nesta fase encontrarmos famílias com dificuldades em acomodar os relacionamentos por causa da ampliação do grupo familiar, cônjuges que não sabem redimensionar as fronteiras com suas famílias de origem ou que se isolam na tentativa de preservar sua nova identidade. Grande parte das mudanças ocorridas neste ciclo de vida da família tem ressonância no papel da mulher no sistema familiar, principalmente no subsistema conjugal. Em tempos mais remotos, o papel da mulher era o de esposa e mãe e a criação dos filhos era atividade quase que exclusiva dela. Nos dias de hoje a mulher desempenha outros papéis dentro da família, o que tem contribuído para as transformações do papel feminino na organização da família e, conseqüentemente, do sistema conjugal e parental (Carter e McGoldrick, 2001).

O terceiro estágio: famílias com filhos pequenos. Nesta etapa a família vai precisar abrir espaço para a chegada dos filhos e ajustar seu funcionamento para acolher os novos membros. É o momento de conciliar as tarefas domésticas e de trabalho, com a educação dos filhos; de adaptar o relacionamento com os avós e demais membros da família e de se preocupar com o suporte financeiro para manter os novos integrantes. Os problemas mais comuns nesta etapa de desenvolvimento da família são: a dificuldade de assumir as responsabilidades de cuidar da geração mais nova, a incapacidade de exercerem a função de pais, ou dificuldade do casal em assumir os novos papéis dentro do sistema com mais uma geração (Carter e McGoldrick, 2001).

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ampliada pelos amigos dos filhos, que chegam para trazer novas formas de pensar e agir. É necessário que a família tenha maior flexibilidade em suas fronteiras para permitir que seus membros adolescentes possam se movimentar entre a dependência e a independência. A autoridade dos pais deve permitir que os filhos possam experimentar o distanciamento para testar sua capacidade de resolução de problemas, mas possam também se aproximar quando perceberem que não têm condições de lidar com os desafios que se apresentam. Quando os pais entendem essas necessidades dos adolescentes e conseguem manter um canal aberto para o diálogo e para as negociações que precisam ser feitas e, por sua vez, quando os filhos conseguem distinguir o momento propício para agir ou recuar, o relacionamento desses subsistemas se dá de forma mais tranqüila. No entanto, é comum encontrarmos famílias nesta etapa do ciclo vital, muito fechadas e autoritárias, ou muito abertas e permissivas, que não conseguem deixar que os filhos cresçam ou têm medo de perdê-los; que não conseguem lidar com os assuntos comuns aos adolescentes, como sexo, gravidez, drogas, delinqüência, e por isso sofrem com os relacionamentos ruins que estabelecem uns com os outros.

Neste estágio do ciclo vital também é preciso que o casal olhe para os seus pais com idade avançada, que os filhos aprendam a lidar com os avós que já estão envelhecendo, que a família se organize para enfrentar o aumento das tarefas e das responsabilidades, agora com a geração mais velha. É comum também neste período que o casal, já de meia idade, se veja insatisfeito com sua vida conjugal, sua vida profissional e até mesmo com questões pessoais, o que pode levar o casal à casos extra-conjugais, separações e divórcio (Carter e McGoldrick, 2001).

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filhos, com o nascimento dos netos, com a convivência entre as várias famílias que se uniram por intermédio do casamento dos filhos. Mais do que em qualquer outro estágio, a família neste momento de seu ciclo vital precisa de flexibilidade em suas fronteiras para aceitar o movimento crescente de pessoas que entram e saem constantemente. As dificuldades mais freqüentes nesta fase do ciclo de vida da família dizem respeito aos relacionamentos que precisam ser reformulados, já que os filhos cresceram e a conversa de pai para filho agora é entre adultos. Entre o casal também é necessária uma reestruturação de papéis, uma vez que os seus pais estão com idade avançada e provavelmente se tornarão dependentes, demandando atenção e cuidados; os netos estão chegando e normalmente os filhos atribuem outras responsabilidades ao casal; é mais comum neste período que o casal volte a ter mais tempo para ficar junto; e que financeiramente possam fazer planos sobre o que sempre tiveram vontade de fazer quando os filhos crescessem.

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para reorganizar seus papéis, reorganizar suas fronteiras para melhor interagir nos diversos subsistemas que se ampliaram (Carter e McGoldrick, 2001).

Por fim, o sexto estágio: famílias no estágio tardio da vida. Neste último estágio as autoras alertam para o fato mais difícil de ajustamento na família que é a perda de um dos cônjuges. A necessidade de lidar com problemas de saúde e perdas de pessoas da família tem seu começo no ciclo anterior, mas é neste período que a morte dos pais, de irmãos, de parentes mais próximos acontece mais freqüentemente, devido a idade avançada em que se encontram alguns membros da família. Um problema comum às famílias nesta etapa do ciclo de vida é a transição de poder dos mais velhos aos mais novos e a necessidade de diminuição das atividades desenvolvidas, muitas vezes por questões de saúde. É bem difícil para os mais velhos aceitarem que sua condição física e mental já não permite algumas atividades como no tempo em que eram mais jovens; da mesma forma aceitarem que é preciso delegar poder aos novos, pois isso significa assumir que já não têm mais tantas habilidades e nem saúde para continuarem no mesmo ritmo.

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Essas seis etapas são descritas por Carter e McGoldrick (2001), como sendo os estágios tradicionais do ciclo de vida da família, mas diante das mudanças ocorridas em vários campos da vida humana nos últimos tempos, as autoras consideram algumas variações no ciclo de vida da família como: o divórcio e o recasamento como acontecimentos inseridos hoje na vida das famílias. O divórcio é considerado como “uma interrupção ou deslocamento” do ciclo de vida tradicional da família, que a mobiliza significativamente, provocando grande desequilíbrio na organização familiar. Assim como no divórcio, no recasamento também é necessário um grande ajustamento para que se possa aceitar ou criar uma nova estrutura familiar que permita o desenvolvimento tanto emocional quanto afetivo dos membros das famílias envolvidas.

Em todas as etapas do ciclo de vida da família, as autoras alertam para problemas ou estresses familiares que costumam aparecer nos pontos de transição do ciclo, ou seja, entre uma etapa e outra, e normalmente têm um efeito prolongado no desenvolvimento familiar ao longo do ciclo vital entre as diversas gerações. De acordo com Carter e McGoldrick (2001), o princípio-chave para a transição emocional de cada estágio do ciclo vital é:

1º aceitar a responsabilidade emocional e financeira pelo eu; 2º comprometimento com um novo sistema;

3º aceitar novos membros no sistema;

4º aumentar a flexibilidade das fronteiras familiares para incluir a independência dos filhos e as fragilidades dos avós;

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Para as autoras, o fluxo de ansiedade da família, ou melhor, os estressores que desencadeiam as dificuldades vividas pela família se situam em dois eixos: vertical e horizontal. O eixo vertical abrange os padrões de relacionamento e o funcionamento da família, transmitidos de geração em geração; e o eixo horizontal diz respeito aos estresses que acompanham a família ao longo do tempo e que são: a) desenvolvimentais – próprios das transições do ciclo vital, e b) impredizíveis – que são acontecimentos inesperados como morte precoce, acidentes e outros.

Figura 1. Estressores Horizontais e Verticais

Fonte: (Carter e McGoldrick, 2001, p.12).

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segredos, os mitos, os legados familiares que são passados de geração em geração e que constituem no tempo atual, o funcionamento da família em seu processo de desenvolvimento.

Sendo assim, o entendimento da família com objetivos terapêuticos, segundo a perspectiva do ciclo vital, é o conhecimento de seu funcionamento nos estágios específicos de seu desenvolvimento, para que diante das dificuldades que a família apresenta, os terapeutas possam sugerir maneiras de enfrentamento dos problemas ou de conscientização de atitudes, de modo que haja a reorganização do sistema familiar e o crescimento emocional necessário para a continuação do seu processo de desenvolvimento.

Em seguida abordaremos a questão da Dependência química e, na seqüência, enfocaremos a drogadição no contexto familiar.

1.2) DEPENDÊNCIA QUÍMICA

“Na bagagem do toxicômano que nos procura o que aparece em primeiro lugar é o pai, é a mãe”.

Claude Olievenstein

1.2.1) Contextualizando a Dependência Química

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associação essencialmente humana. E enquanto o homem existir, ele estará buscando a satisfação de suas necessidades e a evitação de seus medos (Calanca, 1991).

O uso de drogas psicoativas é conhecido há muitos séculos, mas foi a partir da década de 1960 que o uso tornou-se abusivo e exagerado, principalmente nas civilizações ocidentais, o que gerou grande preocupação quanto aos efeitos decorrentes desse comportamento (Ministério da Saúde, 1991).

Muitos nomes são utilizados para definir o uso de drogas, e depois de alguns anos discutindo o problema, a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1997) determinou o termo “dependência química” para designar o fenômeno da drogadição e descrever, de maneira objetiva, os diferentes sintomas que compõem o seu quadro. Mas outros termos foram utilizados para descrever o uso de drogas, inclusive pela própria OMS e, apesar da indicação do novo termo, ainda hoje essa nomenclatura passeia entre os estudiosos do tema.

Nos anos 1920 o termo utilizado, tanto no meio médico quanto no meio jurídico, era Toxicomania, que significa:

“o conjunto de características e sintomas indicativos de uma irresistível necessidade de usar substância química em quantidade e freqüência cada vez maiores, causando danos à saúde física e mental do indivíduo, além de efeitos nocivos a ele e à sociedade” (OMS, 1950, citado por Calanca, 1991, p. 56).

Em 1969, a OMS propôs o termo Farmacodependência, que significa:

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De acordo com Charles-Nicolas e Le Coguic (1991), em se tratando de abrangência, o termo farmacodependência proporciona a inclusão de substâncias que não são propriamente psicotrópicas e por este motivo não fazem parte do objeto de abuso de um usuário ou dependente. Por assim dizer, um toxicômano não se vicia em um antibiótico e aí então o termo farmacodependência já não nos serve como referência do problema que estamos apresentando. Os melhores termos para definirem o que pretendemos explorar continuam sendo toxicomania e dependência química, por nos remeterem a um entendimento de intoxicação ou alteração orgânica e psíquica por intermédio de uma substância química.

A dependência química nasce em um contexto de associações entre o homem, a substância de escolha e o ambiente social onde estabelece suas relações. Para Olievenstein (Olievenstein, 1990, p. 14), não se pode pensar em dependência sem que haja uma “ligação estreita, permanente e transcendente”

entre esses três fatores: indivíduo-produto-ambiente social.

Para Bernard Geraud (citado por Olievenstein, 1990, pp. 13-14) “da dependência instalada em silêncio, um dia expira o termo: a falta”. Para ele “a dependência não é resultante, ela é submissão, (...) é uma luta contra o hábito”.

Seguindo esse ponto de vista, Olievenstein pondera que o sujeito dependente tem muito medo da falta da falta, pois sem a falta ele se vê obrigado a enfrentar a falta fundamental e arcaica que pode ser encontrada na ausência da dependência (Olievenstein, 1990).

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O uso de Substâncias Psicoativas – SPA está dividido em três categorias, de acordo com a OMS (OPAS, 2005): o uso medicinal, que é regulado por prescrição médica através de receitas; o uso legal ou lícito, que tem propósitos sociais e recreacionais e não está vinculado à obtenção dos efeitos psicoativos das substâncias, apesar das propriedades psicoativas estarem presentes na substância utilizada; e o uso ilícito ou ilegal, que diz respeito ao uso de substâncias proibidas pelas convenções internacionais.

Estas Convenções, elaboradas pelas Nações Unidas, são: a Convenção Única Sobre Drogas Narcóticas de 1961; a Convenção Sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971 e a Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Drogas Narcóticas e Substâncias Psicotrópicas de 1988. As convenções internacionais regulam o uso de Substâncias Psicoativas – SPA e determinam quais são as drogas lícitas e quais são as ilícitas, norteiam o controle das drogas, bem como o trabalho que deve ser desenvolvido para o combate, a prevenção, o tratamento, a pesquisa, entre outras atividades (OPAS, 2005).

Para a OMS o uso de drogas deve ser classificado da seguinte maneira: a) uso na vida: quando a pessoa fez uso de qualquer droga pelo menos uma vez na vida; b) uso no ano: quando a pessoa utilizou drogas pelo menos uma vez nos últimos 12 meses; c) uso no mês ou recente: quando a pessoa utilizou drogas pelo menos uma vez nos últimos 30 dias; d) uso freqüente: quando a pessoa utilizou drogas seis ou mais vezes nos últimos 30 dias (Ministério da Saúde, 1991).

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drogas semanalmente, mas não fez uso diário no último mês; d) usuário pesado: a pessoa que utilizou drogas diariamente no último mês (Ministério da Saúde, 1991).

Em relação às Substâncias Psicoativas – SPA podemos tipificá-las segundo alguns critérios como: 1) natureza (origem): natural, sintética e semi-sintética, 2) legalidade: drogas lícitas ou ilícitas; e 3) mecanismos de ação no Sistema Nervoso Central – SNC. Segundo esta classificação podemos dividí-las em: a) depressoras – lentificam e diminuem a atividade cerebral, podendo deprimir sistemas específicos como o respiratório, o cardíaco e o circulatório; b) estimulantes – aumentam a atividade cerebral e aceleram seu funcionamento, causando um estado de alerta exagerado; e c) perturbadoras – provocam alterações na percepção e no funcionamento do cérebro, ocasionando distúrbios psíquicos como as alucinações e os delírios. Na Tabela 1 podemos conferir as principais substâncias psicotrópicas agrupadas por seus efeitos no SNC (Seibel e Júnior, 2000).

Tabela 1. Classificação das SPA segundo efeitos no SNC

DEPRESSORAS DO SN C

ESTI MULAN TES DO SN C

PERTURBADORAS DO SN C

Álcool Tabaco

(Nicotina)

Maconha/Haxixe

Opiáceos

(Heroína / Morfina / Codeína)

Cafeína Anticolinérgicos

Barbitúricos

(Hipnóticos)

Anfetaminas Alucinógenos

(LSD / Ayahuasca)

Benzodiazepínicos

(Tranqüilizantes / Ansiolíticos)

Cocaína

(Crack / Merla)

Ecstasy

(MDMA)

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Durante alguns anos a preocupação do governo brasileiro com relação ao uso de drogas, e especificamente com o uso de bebida alcoólica, teve fundamento principalmente em levantamentos policiais e de saúde, nos quais as ocorrências como acidentes de trânsito, acidentes de trabalho, morbidade, mortalidade e violência, associadas ao uso freqüente de álcool pela população em geral, eram os indicadores que permitiam as análises sobre a situação naquele momento. Atualmente as pesquisas epidemiológicas têm sido fonte de outros indicadores que nos permitem ampliar o conhecimento sobre o uso de drogas no país. (Ministério da Saúde, 1994).

O 1° Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil, realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas – CEBRID, em 2001, mostra um número grande de uso na vida de álcool e tabaco de 68,7% e 41,1% e de dependência de álcool e tabaco de 11,2% e 9,0% respectivamente (Carlini e cols., 2002).

No que diz respeito ao uso na vida de outras substâncias exceto álcool e tabaco, a porcentagem chega a 19,4% o que significa, neste levantamento, um número superior a nove milhões de pessoas da amostra total pesquisada, que foi superior a 47 milhões de habitantes, distribuídos em 107 cidades brasileiras, nas cinco regiões do país (Carlini e cols., 2002).

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Tabela 2. Idade e Sexo dos Usuários de Drogas

Faixa etária

Fonte: (Carlini et al., 2002, p. 41).

Anos

Sexo masculino %

Sexo feminino %

12 a 17 14,0 10,1

18 a 25 18,9 18,1

26 a 34 22,2 20,9

35 46,3 52,6

Total 100,0 100,0

Esses números reafirmam a necessidade de continuarmos as pesquisas sobre o uso de drogas no nosso país, com o objetivo de compreendermos melhor o uso dessas substâncias e estudarmos meios mais eficazes de prevenção e tratamento. Além disso, os levantamentos estatísticos fornecem subsídios para a avaliação das políticas públicas de saúde e de assistência social implementadas no Brasil e contribuem para dar visibilidade ao fenômeno do uso de drogas e suas implicações na sociedade.

Bucher (1992, p. 27), nos afirma que não é possível termos sociedades sem drogas, já que o consumo dessas substâncias é uma “prática humana milenar,

podendo revelar informações importantes sobre a organização, os sistemas, as

crenças e mitos, as representações existenciais e religiosas de uma sociedade”.

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quando na realidade precisaríamos associá-lo à evolução da sociedade com seus conflitos e modos de convivência.

É possível dizer que em nossa sociedade atual o uso de drogas é visto como um sintoma social, uma vez que o consumo em geral dita a lógica como nos comportamos, e a partir desse consumo, o objeto droga adquire um significado pessoal de evitação do sofrimento ou de busca de bem-estar ou da própria felicidade (Gonçalves, Delgado e Garcia, 2003).

A seguir veremos como a Dependência química é abordada em um dos instrumentos que temos como referência na área de saúde, que é a Classificação Internacional de Doença, 10ª Revisão, conhecida como CID-10.

1.2.2) A Dependência Química na Classificação Internacional de Doenças – CID 10

A Classificação Internacional de Doenças em sua 10ª Revisão, CID-10 (OMS, 1993), nos apresenta uma terminologia específica para falar da Dependência química, descrevendo-a no capítulo de: Transtornos Mentais e de Comportamento Decorrentes do Uso de Substâncias Psicoativas – SPA, que inclui desde o transtorno causado por uso de álcool – F10, até o transtorno causado por uso de substâncias múltiplas – F19. O conceito de transtorno é importante para circunscrever o fenômeno da drogadição como um problema complexo e decorrente de fatores diversos, que é exatamente o que propõe a CID-10 em sua definição de transtorno: “conjunto de sintomas ou comportamentos clinicamente reconhecível associado, na maioria dos casos, a sofrimento e interferência com funções pessoais”

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As categorias para o diagnóstico dos transtornos mentais e de comportamento causados por substâncias são as seguintes: F10 – álcool; F11 – opiáceos; F12 – canabinóides; F13 – sedativos e hipnóticos; F14 – cocaína; F15 – outros estimulantes, inclusive a cafeína; F16 – alucinógenos; F17 – fumo; F18 – solventes voláteis; F19 – múltiplas drogas e outras substâncias psicoativas (OMS, 1997).

Diante dessas categorias é definido o diagnóstico principal com base na substância psicoativa que é a maior responsável pelo quadro clínico que a pessoa apresenta. Além dessas indicações, juntamente com a especificação da substância, é feito o diagnóstico complementar para determinar o tipo de consumo. Essas subdivisões acompanham o código F e indicam o estado conseqüente ao uso em 10 caracteres diferentes. As definições abaixo encontram-se na CID-10 (OMS, 1997).

.0 – Intoxicação Aguda: estado conseqüente ao uso de substância psicoativa compreendendo perturbações da consciência, das faculdades cognitivas, da percepção, do afeto ou do comportamento, ou de outras funções e respostas fisiológicas diretamente vinculadas aos efeitos farmacológicos agudos da substância. A natureza das complicações depende da categoria farmacológica da substância consumida e do seu modo de administração, e os efeitos agudos tendem a desaparecer com o tempo.

.1 – Uso nocivo para a saúde: modo de consumo de uma substância psicoativa que é prejudicial à saúde. As complicações podem ser físicas ou psíquicas. Este modo é conhecido como abuso.

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dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância à droga e por vezes a um estado de abstinência física. A Síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (álcool), a uma categoria de substâncias psicoativas (substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente diferentes.

.3 – Síndrome (estado) de abstinência: conjunto de sintomas que se agrupam de diversas maneiras e cuja gravidade é variável. Pode ser uma abstinência absoluta ou relativa, de uma substância psicoativa consumida de modo prolongado. O início e a evolução da síndrome de abstinência são limitados no tempo e dependem da categoria e da dose da substância consumida, imediatamente antes da parada ou da redução do consumo. A síndrome de abstinência pode se complicar com a ocorrência de convulsões.

.4 – Síndrome de abstinência com delirium: Estado no qual a síndrome de abstinência descrita no caráter .3 se complica com a presença de delirium (perturbação da consciência e da atenção, da percepção, do pensamento, da

memória, do comportamento psicomotor, das emoções e do ritmo de vigília-sono).

Este quadro pode comportar também convulsões quando fatores orgânicos são considerados na sua etiologia, conhecido como delirium tremens induzido pelo álcool.

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distorções das percepções, de idéias delirantes (idéias paranóides ou persecutórias), perturbações psicomotoras (agitação ou estupor) e de afetos anormais, como medo intenso ou êxtase.

.6 – Síndrome amnésica: síndrome dominada pela presença de transtornos crônicos importantes de memória (fatos recentes e antigos). Normalmente, a memória de fatos recentes está mais perturbada que a memória remota. A síndrome pode apresentar confabulações intensas, mas outras funções cognitivas geralmente estão bem preservadas. É exemplo desse quadro a Síndrome de Korsakov, induzida pelo álcool ou por outra substância psicoativa.

.7 – Transtorno psicótico residual ou de instalação tardia: é o transtorno no qual as modificações, induzidas pelo álcool ou por substâncias psicoativas, da cognição, do afeto, da personalidade ou do comportamento, persistem além do período que possa ser considerado efeito direto da substância (tempo de vida da substância no organismo). É necessário que se possa comprovar o efeito residual da substância psicoativa para o diagnóstico desse caráter.

.8 – Outros transtornos mentais e comportamentais.

.9 – Transtorno mental ou comportamental não especificado.

É importante ressaltar que dentro dos 10 caracteres apresentados, também existem subdivisões que melhor determinam o quadro apresentado pelo indivíduo no momento do diagnóstico. Por exemplo, um diagnóstico F10.01 significa: Transtornos mentais e de comportamento decorrentes do uso de álcool, intoxicação aguda com trauma ou outra lesão corporal; um outro exemplo F14.22 significa: transtornos mentais e de comportamento decorrentes do uso de cocaína, com síndrome de dependência, atualmente em regime de manutenção ou

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último exemplo F 16.72 significa: Transtornos mentais e de comportamento decorrentes do uso de alucinógenos, com transtorno psicótico residual e de início tardioe demência

E assim a CID-10 apresenta os transtornos causados pelo uso de substâncias psicoativas, permitindo um diagnóstico confiável e de amplo entendimento entre os profissionais que utilizam essa classificação para uso cotidiano na clínica da dependência química.

É preciso ter em mente que na presença de sintomas como a tolerância (necessidade cada vez maior de substância para causar os efeitos desejados) e a síndrome de abstinência, as intervenções terapêuticas já são baseadas em processos de motivação para cessação do uso de substâncias e/ou redução de danos, uma vez que o quadro já é de dependência química.

O trabalho de motivação do paciente para que ele consiga ficar em abstinência ou prevenir possíveis recaídas, exige muito do paciente, bem como das equipes multiprofissionais dos programas de acompanhamento do dependente químico. Possivelmente, essa tarefa de motivar o paciente para se descobrir e para descobrir outras alternativas de se relacionar com as pessoas e também interagir em seu meio sem o uso nocivo de substâncias psicoativas, seja a mais trabalhosa e a mais difícil de se realizar, se pensarmos na complexidade de situações que a dependência química apresenta. Fica o desafio!

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Figura 1. Estressores Horizontais e Verticais
Tabela 2. Idade e Sexo dos Usuários de Drogas  Faixa etária
Tabela 3. Padrão de Uso de Álcool no Brasil  Faixa etária
Figura 3. Sexo dos Usuários – Programa 2004
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Referências

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