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OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE ÓNUS DA PROVA

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 03B3151

Relator: BETTENCOURT DE FARIA Sessão: 30 Outubro 2003

Número: SJ200310300031512 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: APELAÇÃO.

NACIONALIDADE AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE

OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE ÓNUS DA PROVA

Sumário

I - A prova que a Lei da Nacionalidade exige para que o estrangeiro casado com cidadão nacional adquira a nacionalidade portuguesa é de ordem positiva - tem de se fazer a prova da ligação efectiva à comunidade nacional - , e não de ordem negativa, ou seja, a prova de que não é indesejável.

II - O respectivo ónus da prova compete ao requerente, de acordo com a exigência legal da "comprovação pelo interessado" da referida ligação.

III - A mesma ligação consiste na vivência directa e não através de situações objectivas, como as familiares, dos valores culturais e civilizacionais da comunidade nacional.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I

O Mº Pº instaurou a presente acção especial de oposição à aquisição de nacionalidade contra A, para o que alegou que a requerente não fez prova bastante da sua efectiva ligação à comunidade nacional para efeitos de obtenção da nacionalidade portuguesa.

Contestou a requerida alegando que, face aos documentos juntos, deveria ser atribuída a nacionalidade portuguesa.

No Tribunal da Relação de Lisboa foi julgada procedente a oposição, determinando-se o arquivamento do respectivo processo.

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Apela a requerente, a qual, nas suas alegações de recurso, apresenta as seguintes conclusões:

1) Negar a aquisição da nacionalidade portuguesa à recorrente, face aos factos considerados provados, constitui violação expressa da letra e do

espírito da Lei da Nacionalidade, designadamente, da alínea a) do artº. 9º da Lei nº. 37/81, de 03.10, com a redacção actualizada pela Lei nº. 25/94 de 19.08.

2) Na verdade, está considerado assente que a recorrente é filha de pai

português, foi baptizada em Portugal, é casada com um português há 6,5 anos, é mãe duma criança nascida em Portugal, que actualmente tem 4,5 anos,

domina a língua portuguesa, conhece a cultura e a história de Portugal, que também é a sua história.

3) Ora, é certo que a oposição à aquisição da nacionalidade assenta no facto do Estado reservar para si a faculdade de impedir que alguém que seja por si considerado indesejável venha a integrar o círculo dos seus nacionais.

4) E por isso só se justifica a oposição em circunstâncias que indiciem de alguma forma a indesejabilidade de quem pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa.

5) Seria assim necessário aferir, para que tivesse vencimento o entendimento do Venerando Tribunal da Relação, que a ora recorrente, face aos factos que se aduziram e foram considerados provados, fosse uma pessoa não grata.

6) Para determinação de tal requisito, a lei refugia-se, como critério, no conceito indeterminado de que o interessado tenha "ligação efectiva à comunidade nacional".

7) Cabia ao Tribunal da Relação demonstrar e fundamentar que a recorrente não tinha ligação efectiva à comunidade nacional.

8) Tal Venerando Tribunal não o fez.

9) Contudo, na parte que cabia à recorrente demonstrar, fê-lo claramente.

10) De facto, no caso dos presentes autos, se evidencia claramente que há uma ligação efectiva da recorrente à comunidade portuguesa. Aliás, mais do que tal ligação, existem raízes duradouras e laços de sangue.

11) Corolário de tal afirmação é a abundante Jurisprudência dos nossos Venerandos Tribunais Superiores de que

"a comunidade nacional é o conjunto dos cidadãos portugueses, independentemente da sua residência em Portugal".

Ou defendendo o princípio de que:

"o agregado nuclear, constituído pelo casal e pelos filhos, deve ter a mesma nacionalidade, correspondendo à ideia de que, devendo a união familiar ser tão completa quanto possível, isso implica a unidade da nacionalidade"

"quando o legislador estabeleceu condicionantes para a naturalização de

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estrangeiros, em caso de casamento com cidadãos nacionais, não pretendeu passar da permissividade quase absoluta para a mais forte restrição, nem pretendeu conceder a aquisição da nacionalidade pelo casamento só a elites intelectualizadas.", o que o legislador pretendeu foi ser razoável, permitindo a quem tivesse uma ligação sincera com a comunidade nacional portuguesa que pudesse aceder a tal comunidade.

12) Portugal é um país justo, fraterno e acolhedor. Em caso algum voltaria as costas àqueles que, durante várias gerações, mantiveram laços históricos e culturais com a língua portuguesa.

13) Não podemos ignorar que, em 1972 (ano em que nasceu a recorrente), Cabo Verde era uma colónia portuguesa e seu pai um português.

14) Além do mais a recorrente é uma pessoa esclarecida e que pretende por via do presente recurso obter interligar os laços familiares de três gerações a Portugal, escopo que só consegue atingir com a procedência da presente acção.

II

Corridos os vistos legais cumpre decidir.

No Tribunal recorrido deram-se por assentes os seguintes factos:

1. A recorrente é natural de Amiens, França, onde nasceu em 23.12.72, sendo filha de pais caboverdianos e tendo a mesma nacionalidade.

2. Em 21.12.96, na Cidade da Praia, Cabo Verde, casou com cidadão português, B, natural da freguesia de Nossa Senhora da Graça, Praia.

3. Desse casamento, nasceu, em 23.10.98, na freguesia de S.Sebastião da Pedreira, Lisboa, C.

4. Em 27.09.01, na secção consular da Embaixada de Portugal na Praia, Cabo Verde, a recorrente prestou declarações, formulando o propósito de adquirir a nacionalidade portuguesa, em consequência do seu casamento com o referido B.

5. Na altura das declarações, a recorrente expressou-se em português.

6. Do certificado do registo criminal, emitido em 03.04.02, em Portugal, nada consta acerca da recorrente.

7. Do certificado do registo criminal, emitido em 24.08.01, em Cabo Verde, também nada consta acerca da recorrente.

8. A recorrente foi baptizada em Lisboa em 1973.

9. A recorrente reside em Cabo Verde.

10. O pai da recorrente, D, manteve a nacionalidade portuguesa.

III

Apreciando

1 - Antes do mais há que esclarecer um princípio que a recorrente invoca nas suas alegações. O de que o requisito para a aquisição da nacionalidade

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portuguesa por parte de estrangeiro casado com nacional é de ordem

negativa. Ou seja, o de que só não pode adquirir a nacionalidade quem seja considerado indesejável.

Cremos que nada está mais longe do fim pretendido pelo legislador ao fazer depender tal aquisição da prova duma ligação efectiva à comunidade nacional.

A interpretação tem de ser outra, no sentido de que só pode adquirir a nacionalidade quem fizer essa prova.

A questão da indesejabilidade põe-se ao nível dos pressupostos - a ausência de antecedentes criminais -, não ao nível dos requisitos, os que integram a

referida ligação.

2 - Quanto à questão do ónus da prova cabe dizer que a tese do Mº Pº, na senda de jurisprudência deste STJ, é de aceitar totalmente.

Com efeito, a alteração legislativa que mudou a expressão "manifesta

inexistência de qualquer ligação efectiva à comunidade nacional" por "a não comprovação pelo interessado da ligação efectiva à comunidade nacional" só pode querer significar que ónus da prova da ligação pertence ao interessado, não ao MºPº.

3 - A aquisição da nacionalidade portuguesa por via do casamento com nacional não é automática, a lei exige algo mais. Logo, o casamento é irrelevante para determinar da ligação em apreço. E não muito relevará a paternidade ou maternidade de nacional, uma vez que se trata duma consequência normal do casamento.

Ligação a uma certa comunidade nacional significa uma qualquer forma directa e pessoal, não através de situações familiares ou objectivas, de

integração, de vivência dos seus valores culturais e civilizacionais. Quem tem essa ligação, do ponto de vista sociológico, já pertence a essa comunidade. A atribuição da nacionalidade é apenas o reconhecimento dessa pertença.

Os ditos valores não se confundem com o interesse em estar ligado, ou em ter relações com a mesma comunidade, nomeadamente, através da residência no seu território nacional. Para este último caso, existe até um estatuto que confere a generalidade dos direitos civis e públicos à excepção dos direitos políticos e que é o estatuto de residente.

Compete, por isso, averiguar, se o que pretende adquirir a nacionalidade participa dos valores em questão.

E esta participação há-de sempre se traduzir em condutas que a revelem, atentas as situações que, em concreto, se apresentam.

Assim, por exemplo, a língua é um factor relevante, se a nacionalidade de origem não for a de algum dos países de expressão oficial portuguesa., situação esta em que o falar português não significa interesse pela cultura nacional. Por outro lado, se o nacional dum destes países residir em Portugal

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será de encarar como mais fácil a integração.

Partindo destas considerações para o caso concreto não devisamos qualquer facto pessoal que denote a integração da recorrente na comunidade

portuguesa.

Pelo que atrás se consignou, os factos familiares não têm relevância. Nem os factos objectivos como o do baptizado. Igualmente, a língua, nesta hipótese, em que é o português é também a língua oficial do país originário, nada nos diz.

Finalmente, o referido nas conclusões 12 a 14 das alegações de recurso, poderão constituir um, aliás douto, preâmbulo justificando uma alteração da lei da nacionalidade, tendo em conta certas situações resultantes da

descolonização, mas não se coadunam com o direito vigente.

Termos em que nada há a censurar à douta decisão recorrida.

Pelo exposto, acordam em negar a apelação e confirmam o Acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 30 de Outubro de 2003 Bettencourt de Faria

Moitinho de Almeida Ferreira de Almeida

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