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Um tratado sobre a questão da consciência

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Academic year: 2022

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Um tratado sobre a

questão da consciência

Nikolas Woellner

Prefácio de Domingos Júnior Viana Costa

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CONSELHO EDITORIAL Ana Claudia Santano – Professora do Programa de

Mestrado em Direitos Fundamentais e Democracia, do Centro Universitário Autônomo do Brasil – Unibrasil.

Pós-doutora em Direito Público Econômico pela Ponti- fícia Universidade Católica do Paraná. Doutora e mes- tre em Ciências Jurídicas e Políticas pela Universidad de Salamanca, Espanha.

Daniel Wunder Hachem – Professor de Direito Cons- titucional e Administrativo da Universidade Federal do Paraná e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Doutor e mestre em Direito do Estado pela UFPR. Co- ordenador Executivo da Rede Docente Eurolatinoame- ricana de Derecho Administrativo.

Emerson Gabardo – Professor Titular de Direito Admi- nistrativo da PUC-PR. Professor Associado de Direito Administrativo da UFPR. Doutor em Direito do Estado pela UFPR com Pós-doutorado pela Fordham Univer- sity School of Law e pela University of California - UCI (EUA).

Fernando Gama de Miranda Netto – Doutor em Direi- to pela Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro. Pro- fessor Adjunto de Direito Processual da Universidade Federal Fluminense e membro do corpo permanente

do Programa de Mestrado e Doutorado em Sociologia e Direito da mesma universidade.

Ligia Maria Silva Melo de Casimiro – Doutora em Direi- to Econômico e Social pela PUC-PR. Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Professora de Direito Adminis- trativo da UFC-CE. Presidente do Instituto Cearense de Direito Administrativo - ICDA. Diretora do Instituto Bra- sileiro de Direito Administrativo - IBDA e coordenadora Regional do IBDU.

Luiz Fernando Casagrande Pereira – Doutor e mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Co- ordenador da pós-graduação em Direito Eleitoral da Universidade Positivo. Autor de livros e artigos de pro- cesso civil e direito eleitoral.

Rafael Santos de Oliveira – Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre e gra- duado em Direito pela UFSM. Professor na graduação e na pós-graduação em Direito da Universidade Fede- ral de Santa Maria. Coordenador do Curso de Direito e editor da Revista Direitos Emergentes na Sociedade Global e da Revista Eletrônica do Curso de Direito da mesma universidade.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Bibliotecária: Maria Isabel Schiavon Kinasz, CRB9 / 626

Pacheco, Beto

P116 O riso, o raso e a reza / Beto Pacheco – Curitiba:

Íthala, 2020.

177p.: il.; 21cm ISBN: 978-65-5765-018-9

1. Literatura brasileira. 2. Crônicas. I. Título.

CDD B869.3 (22.ed) CDU 860.9(81)-3

Editora Íthala Ltda.

Rua Pedro Nolasko Pizzatto, 70 Bairro Mercês

80.710-130 – Curitiba – PR Fone: +55 (41) 3093-5252 Fax: +55 (41) 3093-5257 http://www.ithala.com.br E-mail: editora@ithala.com.br

Capa: Duilio Scrok Revisão:

Informamos que é de inteira responsabilidade dos autores a emissão de conceitos publicados na obra. Ne- nhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia auto- rização da Editora Íthala. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei nº 9.610/98 e punido pelo art. 184 do Código Penal.

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Um tratado sobre a

questão da consciência

Nikolas Woellner

Prefácio de Domingos Júnior Viana Costa

EDITORA ÍTHALA

CURITIBA – 2021

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Dedico este livro a todos os pensadores, de todos os tempos. Não somente aos ilustres destacados direta ou indire-

tamente ao longo deste tratado, mas, também, e sem menos importância, aos não ilustres que me dão o prazer de conviver comigo na contemporaneidade, me induzindo a reflexões que acabam tendo um impacto tão profundo como as mais refina-

das das filosofias. Conforme é um dos propósitos deste texto demonstrar, cabe a todas as entidades humanas, nos seus mais diversos modos de ação, a construção de todo e qualquer co-

nhecimento que direciona a flecha da vida em direção à expansão da consciência.

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Prefácio

A presente obra, além de um tratado original de Psicologia e Filo- sofia, é um convite ao fascinante universo, ou multiversos, da consciência.

E, mais especificamente, da consciência humana. As questões levantadas pela dimensão da autoconsciência, da responsabilidade pessoal e da li- berdade, entre outras, assim como sua “perene atualidade” e potencia- lidades futuras, são aqui apresentadas pelo autor de forma orgânica e convidativa. Através de apontamentos lógicos e didáticos sobre a indis- sociável relação da consciência com outros campos da atividade humana (política, ciência, religião, mitologia, etc) ingressamos aos poucos na di- mensão mais profunda de nossa própria experiência. É um livro dinâmico escrito conjuntamente com o leitor. Não se trata, portanto, de um convite qualquer, mas de um convite ao aprofundamento em nossa mais íntima e intransferível experiência enquanto seres humanos. Em seus aspectos abismais e luminosos ao mesmo tempo. Em outros termos, é um apelo feito diretamente pelo daemon filosófico que, por mais esquecido e fal- seado que seja atualmente por muitos, pelos filodoxos ou amantes das aparências e opiniões, é onipresente. Sempre retornando em renovadas e variadas formas. Basta, para tanto, criarmos um espaço responsável para sua manifestação. O presente livro é um espaço propício. O autor-anfitrião é, neste caso, o mensageiro escolhido da vez para transmitir a mensagem universal do Daemon Filosófico.

Partindo da premissa de que toda situação ou empreendimento no qual o ser humano esteja engajado requerer, de forma ativa ou pas- siva e em graus diversos, alguma medida de consciência, está implícita a possibilidade de avançarmos em autoconsciência ou permanecermos basicamente no mesmo estrato de apreensão. Trata-se de uma verdade relativamente simples, porém, de grandes consequências práticas. Pode

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ser construtiva ou demolidora da vida, seja ela individual ou coletiva, a depender da forma como é recebida e metabolizada. As reiteradas ten- tativas de fazer com que o ser humano abdique de sua autoconsciência, através de diversos mecanismos de controle externo e internos, prova- velmente encontra aí sua gênese. O autor resgata, com o impulso de uma contracorrente cultural construtiva, a importância de nossa dimen- são autoconsciente. Realidade da qual ainda somos, em grande medida, continuamente alienados por determinados segmentos sociais (mídia, Estado, partidos políticos, instituições de ensino, pseudoreligiões, etc).

Uma apreensão mais abrangente da vida requer, inevitavelmente, que olhemos de frente para aquilo que temos continuamente evitado ou que tem sido ocultado de nosso campo de visão por mecanismos espúrios de sujeição ou rejeição voluntária. A situação existencial em que nos en- contramos atualmente, enquanto indivíduos históricos, pós-modernos, é análoga àquela em que se encontrava o famoso guerreiro Arjuna na épi- ca batalha de Kurukshetra, de que nos fala a Bhagavad-Gîtâ1 dos hindus.

Arjuna assume para nós, mas não por nós, o papel do herói arquetípico imemorial, pois toda jornada realmente heroica é, ao fim das contas, uma tentativa de ampliação da consciência. Jamais a escravização ou compac- tação da consciência em limites estreitos.

Cabe também ressaltar ao leitor que aquilo que está sendo posto diante de seus olhos não é mais um simples exercício ou passatempo in- telectual estéril, na medida em que não produzem maiores consequên- cias, mas, pelo contrário, que terá diante de si uma obra cuja vivacidade e potencial tocam, de forma elegante e honesta, sem artifícios desneces- sários, em temas fundamentais que, tenhamos ou não consciência, são essenciais ao nosso estar-no-mundo. Realidade impositiva. Que desper- ta problemas em relação aos quais, ainda que assim desejássemos, não poderíamos ser neutros ou indiferentes sem violentarmos nossa própria dignidade. O quanto temos sido coautores de nossa própria miséria aní- mica? O quanto temos sido autores de nossa liberdade? O eixo central em

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torno do qual gravita a realidade mais imediata é a consciência. Façamos, portanto, um movimento interno de autopercepção, como sugerido pelo autor.

Ao tratar a obra de temas atemporais, portanto, de natureza ar- quetípica, o que aponta para o fato de serem temas universais passíveis de contínua expansão e aprimoramento, experimentamos diretamente aquilo que é, justamente, o mote central da exposição: a expansão da consciência, da própria “substância primordial” da experiência humana.

Como disse Jung, a psique é eixo do mundo. O resultado dependerá, so- bretudo, de como reagiremos ao que é proposto: aceitaremos o chamado do Daemon-Sophia ou faremos, mais uma vez, ouvidos moucos? A obra estabelece, em seu desenvolvimento progressivo, um diálogo visceral e envolvente com o leitor. Escrita para todos. Sem exceção.

O tratado aqui referido consiste em uma abertura a mais na com- preensão do misterioso tecido da vida. Aliás, em mais uma tessitura. Um texto no sentido original da palavra: aquilo que une. Que tece. Que cria sentido, unidade e coesão. Uma a mais, no entanto, não apenas mais uma.

O diálogo proposto entre diversos autores, escolas e ciências aponta para a necessidade, cada vez mais premente, formalmente reconhecida ou in- tuída, tanto pelo público leigo quando por especialistas, de uma efetiva intercomunicação entre diversos campos ou esferas do conhecimento.

Trata-se de uma obra escrita por um legítimo pensador contemporâneo.

Atento ao espírito geral de nosso tempo, em seus modos multifacetados de expressão, bem como aos aspectos mais sutis e sensíveis que perpas- sam nossa experiência individual, porém, sem qualquer pretensão de soar como portador de uma resposta última e definitiva ou imantar seu discurso com tonalidades proféticas. O autor revela estar em plena posse da capacidade, hoje quase extinta em muitos escritores, de expressar de forma translúcida e acessível questões de evidente magnitude. Um dos muitos méritos da iniciativa por ele levada adiante.

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10 Um tratado sobre a questão da consciência

Por fim, faço votos de que os frutos da empreitada sejam compar- tilhados por todos. Direta ou indiretamente. Que produzam sementes ca- pazes de transmutar, ainda que em doses pequenas, mas nem por isso menos significativas, a obscuridade de nossa era, pois temos em nossas mãos uma obra que, ainda que não seja escrita em linguagem propria- mente hermética, possui um caráter verdadeiramente alquímico. “Quan- do vires o negro alegra-te, pois é o início da tua obra!”.

Domingos Júnior Viana Costa Psicólogo junguiano especialista em saúde hospitalar

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Sumário

Introdução ... 13

I

O mundo artificial ... 15

II

Ser consciente em Camus ... 39

III

Ser consciente em Jung ... 47

IV

Ser consciente em Kierkegaard ... 63

V

Realidade e consciência ... 71

VI

Especulações sobre a questão da morte ... 79

VII

O caminho natural da consciência a partir do ser humano ... 89 Referências bibliográficas... 97

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Introdução

Se quiséssemos afirmar um sentido à vida, deveríamos no mínimo ter mais um planeta, isolado deste que estamos e que tenha desenvolvi- do vida, a fim de compararmos. Mas podemos dar um sentido à vida na Terra, ainda que não seja o único. A flecha do desenvolvimento da vida na Terra aponta na direção da expansão de consciência. Antes de iniciar- mos, gostaria de delimitar o problema aqui explorado de forma desco- lada de qualquer visão mística ou religiosa a qual possa estar ligada ao termo expansão de consciência, ainda que a tese possa abarcar essa visão de mundo também, mas nunca separada da filosofia ou da psicologia. A tese pretende ser fundada em bases lógicas, conquanto se possa utilizar de mitos, mitologemas, e religiões comparadas, para sustentar princípios e enunciados gerais a respeito do desenvolvimento da consciência huma- na. Quando trato aqui a respeito de expansão, me refiro ao movimento simples de se tornar mais consciente, a respeito de qualquer fato que seja.

De um ponto de vista puramente do humano civilizado, imerso em algum cenário sociocultural, um indivíduo assim se torna mais consciente todo dia: toda vez que aprende uma palavra nova, um fato novo, domina um determinado modo de se movimentar, toma conhecimento de um outro indivíduo, toca alguma nova ideia, alguma nova forma de pensar sobre qualquer coisa da vida, desde as mais simples. O movimento de expandir a consciência, então, nesse sentido, é constante e imparável.

Podemos destrinchar a flecha da expansão da consciência de três formas: analisando toda a história natural da formação da vida na Terra, desde o organismo unicelular mais simples até o Homo sapiens; analisan- do somente o desenvolvimento das sociedades humanas ao longo do tempo, em uma visão puramente antropológica; ou ainda a partir de uma terceira forma de ver que englobasse essas duas, principalmente com uma ênfase entre a transição do que historicamente foi tratada como tipo

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14 Um tratado sobre a questão da consciência

de vida irracional para o contraponto denominado racional, ou seja, olhar para a humanidade como o salto entre essas duas classificações.

O presente tratado busca tanto sintetizar a questão do desenvol- vimento da consciência em si, a partir de determinadas visões de mundo fundadas principalmente sobre os terrenos da psicologia, da biologia e da antropologia, sem nenhuma subjetividade filosófica. Contudo, tam- bém tentaremos abordar o tema, aí sim, a partir de um ponto de vista do desenvolvimento do pensamento filosófico sobre a questão, de forma a dar um sentido teleológico, isto é, voltado para uma finalidade. Procura- remos responder a seguinte pergunta: “Tudo bem, assumindo a hipótese de que a questão da consciência é o ponto central da existência humana, o que devemos fazer com isso?”. A visão de que podemos fazer algo a par- tir da assimilação de determinado conhecimento toca, inevitavelmente, a questão da liberdade. Até que ponto somos livres para, seja fundado nessa ou naquela visão de mundo, tomarmos as rédeas da nossa vida (ou, pelo menos, de parte dela)?

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I O mundo artificial

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ma pessoa nasceu na Terra, inapta para a sobrevivência.

Sem nenhum recurso que pudesse salvaguardar sua vida e manter esse organismo em funcionamento. Nesse mo- mento da história desse ser existem duas opções de acontecimentos: ou será amparada por outras pessoas que desejam que ela permaneça viva, ou padecerá. Seguindo o caminho da vida, terá cada vez mais, conforme mais o seu tempo em vida passa, boa parte de sua programação biológica reprimida. Seus comportamentos serão moldados por essas pessoas que lhe deram suporte à vida. Em algum momento, começa a surgir alguma possibilidade de vida material independente, e mais ou menos por essa época é que essa pessoa começa a tomar consciência de si mesma como um ente separado dos demais seres e do mundo em geral. Uma primeira e vaga noção de individualidade. Exatamente nesse ponto iniciam-se as angústias, as quais a acompanharão, em algum nível, até a morte. Sempre uma espécie de nostalgia por aquilo que ela deveria ter sido, sempre essa angústia original que acabará por se desdobrar em tantas outras, a de- pender de outros fatores externos e internos a si.

Nessa primeira parte da vida, a pessoa fica submetida a influências profundas das figuras que representam esses papéis dos pais, que de al- guma forma o acompanharão por toda a vida. Se, em mitos ou histórias fantásticas, muitas vezes, narram-se casos de maldições que são transmi- tidas por gerações, a influência psíquica representa em algum nível essa espécie de hereditariedade. É interessante notar como, frequentemente, as figuras dos pais interessam-se em pautar suas atitudes conscientes para com os filhos, várias vezes buscando compensar na vida dos descen- dentes aquilo que acabou ficando pendente em suas próprias vidas, em uma espécie de compensação. Porém, ainda que não sejam esforços em vão, não podemos deixar de ressaltar que a maior parte das influências passadas de geração para geração estão fora do nosso controle – estão in- conscientes, ou seja, nós nem tomamos conhecimento, geralmente, des-

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II Ser consciente em Camus

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filosofia de Camus trata da questão da quantidade, ao de- fender a ideia do não suicídio, justamente nos termos de que importa mais simplesmente viver, o quanto mais for possível, e independente do que está se fazendo da vida. Justamente porque qualquer atitude perante a vida inevitavelmente resulta em mais consciência, e isso por si só já é uma boa aposta. O Homem Absurdo de Camus é o Mersault, personagem central de seu romance O Estrangeiro (Camus, 2020), o qual responde tanto faz para qualquer questão da vida.

Tanto faz precisamente porque não importa, o sentido da vida é inerente à própria vida, e basta estar vivo para estar vivendo com sentido. Assim como o Sísifo é o deus absurdo, que também nutre seu ódio pela morte e sua paixão pela vida, conforme brilhante analogia de Camus em O mito de Sísifo (Camus, 2020). No romance, até mesmo assassinar o árabe acabou trazendo a Mersault a possibilidade de expandir a consciência, sobretu- do a partir da oportunidade de vivenciar fatos novos, ao ser encarcera- do, julgado, e condenado à morte. Todas as reflexões decorrentes dessas novidades demonstraram serem maiores em tamanho e quantidade do que se o personagem tivesse seguido sua vida banal. É nesse ponto que devemos desenvolver uma reflexão a respeito da questão do tempo. No absurdismo de Camus, seria realmente a questão da quantidade ligada di- retamente a quantidade fria de tempo percorrido, ou seria a quantidade de um tempo específico: o tempo que passamos em contato com o novo?

Um sentimento que não é nada incomum para boa parte das pes- soas é a da mudança da sensação da passagem de tempo. Talvez, muita gente se lembre de como era a questão da ansiedade infantil por esperar por alguma data festiva, em que presentes eram prometidos. Um mês pa- recia uma quantidade de tempo enorme, que se arrastava através de lon- gos dias. Depois de adultos, um mês imerso em uma rotina sem surpresas passa no mesmo ritmo de um dia de uma criança que está descobrindo um mundo novo todo dia. A mesma sensação pode ser aferida de uma

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III Ser consciente em Jung

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primeiro ponto de contato que pode ser observado entre o absurdismo de Camus e o pensamento de Jung é em re- lação a como o homem assimila suas experiências vividas no mundo exterior, no seu mundo interior. Quando Camus traz a questão de não importar que tipos de experiências vivemos, bastando que esteja- mos conscientes delas, temos duas possibilidades: ou assumimos que as experiências humanas são tão diversas que nem caberia a nós falar algo qualitativo sobre elas, ou então podemos colocar o olhar proposto por Jung e organizado nesses termos por Joseph Campbell (o maior mitólogo de todos os tempos) a respeito do monomito, ou a jornada do herói(Cam- pbell, 2007). Nessa segunda visão, tudo que vivemos tende a se organizar em torno de uma estrutura padrão de vivências. Essas experiências esta- riam travestidas das formas mais diversas, de acordo com o contexto cul- tural e social a que cada indivíduo está submetido, e também em relação com a sua estrutura psicológica, a forma interna de funcionar de cada um de nós. Mas, simbolicamente, seriam todas equivalentes, ao menos em um determinado nível dessas ações e vivências.

Para falarmos sobre a questão da vida simbólica, podemos fazer uma rápida revisão a respeito do que os símbolos representam nessa for- ma de observar a realidade. Uma forma de olhar para a questão é imagi- nar que cada símbolo seria uma espécie de pacote de informações que, por serem geralmente contraditórias entre si, não podemos experimen- tá-las de forma direta a partir do nosso ego consciente. A simbologia é o idioma pelo qual o inconsciente se comunica. Nos sonhos, por exemplo, o inconsciente busca uma forma de transmitir uma mensagem ao nosso aspecto consciente. Essa mensagem não chega até nós na linguagem que nos é convencional da nossa vivência egoica. A questão da interpretação dos sonhos é, portanto, uma tentativa de tradução. Como se recebêsse- mos um texto em inglês e tentássemos traduzir para o português. Apesar de não termos um dicionário para fazer essa tradução, um dos materiais

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IV Ser consciente em Kierkegaard

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ontudo, na humanidade, não se sonda que haverá um dia o destino final. Sempre podemos ir além. O próximo passo que proponho é resolver a nostalgia de unidade a partir da busca de Camus em Kierkegaard, e ultrapassar o estado do absurdo. Para tal, a minha proposição é ler Kierkegaard a partir do ângulo que pretendo colocar luz na questão, com a sustentação da visão de Jung a respeito do arquétipo de Deus e seu relacionamento com a tensão entre os polos psíquicos – consciente e inconsciente. A hipótese que Jung levanta em relação a imago dei, ou seja, a imagem de Deus em um sentido psíquico, é a de que esta seria a representação simbólica da totalidade do nosso ser.

Já podemos elucidar o caso com um exemplo: nas escrituras sagradas de diferentes vertentes religiosas é recorrente a figura de um profeta, uma espécie de sábio que foi encarregado por receber mensagens divinas di- recionadas a seu povo. Se substituirmos, nesses casos, a figura divina por esse aspecto do nosso ser que abarca toda a nossa totalidade (ou seja, a soma de nossos aspectos conscientes e inconscientes), poderíamos então dizer que estas mensagens são derivadas de uma expansão de consciên- cia em direção a nós mesmos. Uma mensagem de si para si mesmo (ou do self para o ego), sem a necessidade de envolver uma figura divina na ques- tão. Esse mesmo conceito é utilizado de forma terapêutica todos os dias em consultórios psicológicos pelo mundo, em que sonhos são analisados, a fim de traduzir a mensagem que o inconsciente do paciente pretende passar para o ego. Assim como sonhos são um dos mecanismos de lin- guagem simbólica que o inconsciente possui, aparecem de forma notória também na história de profetas sonhadores. Em um outro exemplo famo- so, o químico Kekulé certa vez se deparou com um problema insolúvel em uma de suas pesquisas. O benzeno, enquanto composto químico, já havia sido descoberto, mas, por algum tempo, os químicos não conse- guiam descobrir qual seria sua fórmula estrutural. O químico relata em seus escritos que, ao cochilar em seu laboratório enquanto pensava sobre

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V Realidade e consciência

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72 Um tratado sobre a questão da consciência

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eitas essas considerações até este ponto, agora temos a opor- tunidade de aprofundar um pouco mais o raciocínio em di- reção a como a questão do consciente se relaciona com a questão da estrutura da realidade em si. Podemos abordar a problemáti- ca a partir da definição de dois parâmetros presentes no mundo. A parte material do mundo e a parte psíquica. Vamos assumir que se dividirmos a estrutura da realidade entre essas duas partes, estaremos englobando a totalidade desta. Ou seja, tudo que não está contido na parte material está contido na parte psíquica, e tudo que não está contido na parte psí- quica está contido na parte material. Vamos notar com o desenvolvimen- to desse raciocínio que toda a estrutura da realidade, em qualquer de seus níveis, está dividida (polarizada) em duas partes. Descendo um ní- vel, podemos, por exemplo, estabelecer que a parte psíquica da realidade também se divide em duas partes, sendo o consciente e o inconsciente.

Até mesmo observar que a parte material está dividida entre o estado de onda e o estado de partícula. Nessa questão, a respeito de tudo possuir dois polos, existe um paradoxo que provavelmente é no mínimo polê- mico de ser sondado. Assim como a clássica pergunta sobre quem veio primeiro, se “o ovo ou a galinha”, nesse caso, também, podemos pensar em duas hipóteses: ou a estrutura de toda a realidade de fato se constrói em sua essência dessa forma, e, portanto, o ser humano por fazer parte deste tecido da realidade também está submetido a essa espécie de lei.

Ou então essa é uma limitação intrínseca somente ao ser humano: a natu- reza da nossa psique é dual, e, portanto, nós aqui presos nesta espécie de ser só conseguimos aferir uma parte da realidade, exatamente essa que se comporta também de forma dual. Nessa segunda possibilidade, pode- ríamos supor que uma parte importante da realidade está fora do nosso alcance: todo o resto desta que se comporta de forma diferente, fora da dimensão da dualidade. Em uma forma ainda mais simplificada de olhar para essa questão, ou podemos supor que existe uma lei que se aplica a

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VI Especulações sobre a

questão da morte

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80 Um tratado sobre a questão da consciência

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questão da morte no desenvolvimento do pensamento sobre a expansão de consciência parece estar consonante com todos os outros pontos que foram abordados neste tratado. Tudo sobre a morte, nesta linha de desenvolvimento intelectual, é especulativo. No entanto, todas as especulações possíveis, desde as mais hipotéticas até as que tocam algum sentido mais factível, parecem ser complementares ao fato de todas as vezes que falamos sobre sentido de vida englobarmos também nesse conceito o sentido de morte. Por um lado, todos os animais que não possuem conhecimento a respeito da sua própria morte não sofrem nenhuma angústia relacionada a esse episódio da vida, em acordo com a observação que até determinado estado de consciência na linha de desenvolvimento da vida na Terra se vive sempre no presente. No presente, não há morte, e, quando há, é o fim imediato.

Especulações de continuidade da vida após a morte física a parte deste fato. No caso do humano, a morte na velhice é observada no comporta- mento como algo natural, no sentido de que as demandas observadas nos consultórios de psicologia a partir da segunda metade da vida são diversas às da primeira. De forma que se sobressai como como um proble- ma de adaptação a questão do velho que quer continuar se comportando como jovem, da mesma forma e tão grave quanto o adulto que quer con- tinuar se comportando como criança. Após o meio dia da vida é como se fosse iniciada uma preparação para a morte: deixamos de nos importar com a conquista de coisas materiais, de poder, de aspectos relacionados à continuidade da espécie, incluindo aí a sexualidade. Se não nos voltamos para dentro até essa parte da vida, inevitavelmente iniciaremos um pro- cesso de redirecionamento da nossa atenção, do mundo exterior em dire- ção ao mundo interior. Até mesmo em relação ao aspecto de puramente medo da morte podemos notar diferenças quando conversamos sobre o tema com uma pessoa de 25 anos e com uma de 80. A própria natureza, se corretamente assimilada, e não repelida por meio dessa moda contem-

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VII O caminho natural da consciência

a partir do ser humano

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spero que tenha ficado evidente durante todo esse texto que foi abordada a partir de diferentes pontos de vista apenas uma questão muito simples: a transposição da questão da vontade do que o ser humano pode fazer da vida, do campo do que é sem intenção simplesmente, para o campo da intencionalidade. Ou seja, por motivos inerentes à nossa própria natureza, abriu-se a possibilidade de tomarmos as rédeas de uma parte muito pequena do nosso ser, mas que pode se tornar uma questão grande se nos atentarmos ao susto e ao desespero de termos recebido essa dádiva. Os séculos de desenvol- vimento civilizacional nos indicaram que o que podemos fazer é conti- nuarmos no curso da natureza, mesmo que agora tenhamos que praticar uma espécie de força psíquica para fazermos o que antes fazíamos sem força nenhuma, de forma natural. A ampliação da consciência a partir do ponto da intencionalidade possui o potencial de se perder, e talvez tenha que ser assim mesmo. O ego nasceu e quis mudar o mundo, criando toda sorte de coisas artificiais. Ocorreu que nos demos conta de que só vamos conseguir continuar se voltarmos um pouco.

A questão do desespero nasceu a partir da unilateralidade que imprimimos à nossa psique: nos identificamos com o ego de forma a acreditar que esta parte tão pequena do nosso ser correspondia à nossa totalidade. As outras partes de nós gritam e se descabelam: nos levam a distúrbios individuais (neuroses, psicoses, depressão) e coletivos (fome, guerras, pobreza). O que temos chamado de autotranscendência, por- tanto, podemos, a fim de deixar mais claro, chamarmos de egotranscen- dência. No fim, a questão é simples e todas as filosofias do mundo estão apontando para esse caso nos últimos milênios. Talvez, aqui no ocidente, a nossa forma de ver o mundo tenha dificultado a assimilação de algo tão simples: somos seres muito maiores do que achamos que somos. É só isso. Se nos unificarmos novamente, aboliremos as angústias. Além disso, ter criado um mundo material tão complexo, de forma unilateral, ou seja,

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