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O alívio da confraria Rogério L. Furquim Werneck

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O Estado de S.Paulo e O Globo Sexta-feira, 6 de abril de 2018

O alívio da confraria

Rogério L. Furquim Werneck*

Em artigo publicado neste mesmo espaço, em novembro do ano passado, (“Instinto de sobrevivência”, 17/11), chamei a atenção para o clima de apreensão na economia com as dificuldades de aglutinação das forças políticas de centro, ameaçadas de se verem imprensadas na disputa presidencial por duas candidaturas fortes, à esquerda e à direita do espectro político. Já não faltava então quem arguisse, que até por simples instinto de sobrevivência, os partidos de centro teriam de tentar se aglutinar em torno de uma mesma candidatura.

Em flagrante autoplágio, permito-me reproduzir aqui, nos três parágrafos a seguir, as ponderações que então fiz acerca do centro político e seu suposto instinto de sobrevivência.

Quando a resultante de um sistema de forças se afigura surpreendente, há que se indagar se há outras forças importantes em jogo que não estão sendo consideradas.

No caso, as forças que talvez não estejam sendo levadas devidamente em conta são as provenientes de uma aliança tácita, cada vez mais poderosa, fundada num mesmo temor que hoje perpassa, da esquerda à direita, as cúpulas de todos os partidos políticos de maior expressão: a preocupação com os desdobramentos da Lava Jato e operações similares.

Desse temor, compartilham correligionários e adversários: Temer e Lula, grande parcela dos governadores e parte substancial dos membros do Congresso Nacional.

Mais de 20% dos congressistas hoje enfrentam dificuldades com tais operações. E, é bom que se diga, não se trata do baixo clero. Está aí incluída boa parte dos parlamentares mais proeminentes do Congresso. Não há, portanto, como ter dúvidas sobre quão poderosa pode ser essa numerosa Confraria dos Atingidos pela Lava Jato e Operações Similares, designação que talvez possa ser encurtada para Calajato.

A análise baseada no instinto de sobrevivência faz sentido. Mas é importante ter em conta a real natureza do instinto de sobrevivência que, de fato, vem pautando o comportamento de boa parte dos principais atores políticos envolvidos. O que os move não é a preocupação com a sobrevivência das forças políticas de centro e, sim, com sua própria sobrevivência, num sentido muito mais estrito e elementar:

salvar a própria pele e escapar da Lava Jato.

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A evolução do quadro político do País nas últimas semanas vem trazendo novas e contundentes evidências de quão bem defendidos têm sido os interesses mais básicos da confraria.

Já há algum tempo, o Supremo Tribunal Federal (STF) vem sendo fortemente pressionado para que altere a jurisprudência firmada no final de 2016, sobre a possibilidade de prisão de réus condenados em segunda instância. E, aos poucos, ao longo dos últimos meses, tornou-se cada vez mais claro que essa jurisprudência deixara de contar com o apoio da maioria dos ministros.

Seria mais compreensível se o surgimento de nova maioria, com entendimento divergente sobre essa questão, tivesse decorrido de alterações na composição do STF, na esteira da substituição de ministros. Mas não foi o que ocorreu. A nova maioria adveio de simples mudança de posição do ministro Gilmar Mendes que, qual pluma ao vento, se permitiu passar a defender posição diametralmente oposta à que defendera há menos de um ano e meio.

Quem quer que se interesse por entender o que vem ocorrendo no STF não pode deixar de testemunhar a convicção e a contundência com que o ministro defendeu sua posição anterior, em voto proferido em novembro de 2016, bem documentado em vídeo amplamente disseminado na internet.

Ainda que o pedido de habeas corpus de Lula tenha sido negado, graças à deferência da ministra Rosa Weber pela jurisprudência firmada em 2016, o julgamento do STF deixou mais do que claro que a legalidade da prisão de réus condenados em segunda instância parece estar com os dias contados. Para enorme alívio da confraria.

Quanto à aglutinação das forças políticas de centro, ainda não parece haver pressa.

* Rogério L. Furquim Werneck, economista, doutor pela Universidade Harvard, é professor titular do Departamento de Economia da PUC-Rio.

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