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DIREITO HUMANO AO PROCESSO JUSTO NA DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO IVCHER BRONSTEIN VS. PERU

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XIV Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis

DIREITO HUMANO AO PROCESSO JUSTO NA DECISÃO DA CORTE

INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO IVCHER

BRONSTEIN VS. PERU

JOSÉ EDUARDO AIDIKAITIS PREVIDELLI Mestrando em Direitos Humanos

UniRitter – Laureate International Universities

edprevidelli@gmail.com

JOÃO PAULO K. FORSTER Doutor em Direito pela UFRGS

Professor do Mestrado e Graduação no UniRitter – Laureate International Universities

Joao_forster@uniritter.edu.br

CAMILA MOUSQUER BURALDE Mestranda em Direitos Humanos

UniRitter – Laureate International Universities

camila.mousquer@gmail.com

DANIELLA BITENCOURT

Mestranda em Direitos Humanos

UniRitter – Laureate International Universities

daniellabitencourt4@gmail.com

Resumo: O presente estudo aborda o direito humano ao processo justo segundo a Corte Interamericana de Direitos Humanos, por meio da análise da decisão proferida no Caso Ivcher Bronstein vs. Peru. O trabalho encontra-se dividido em duas partes: na primeira, foram traçadas as bases teóricas necessárias à compreensão do direito humano ao processo justo, abordando a sua definição e amplitude, segundo os pactos internacionais de direitos humanos, constituições nacionais e doutrina. Na segunda do estudo, examinou-se o caso julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, unicamente em relação ao reconhecimento de um direito humano processual ao processo justo, diante dos pressupostos teóricos apresentados anteriormente, de acordo com as peculiaridades do caso concreto e os fundamentos apresentados pela Corte. O presente artigo foi elaborado de acordo com o método indutivo para aferição da existência e forma de proteção do direito humano ao processo justo, consoante o posicionamento adotado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos a partir da análise do caso selecionado.

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1 Introdução

No estudo dos direitos humanos processuais, deve assumir posição de destaque a observância do direito humano ao processo justo, porquanto pode ser considerado como eixo central daqueles, de onde decorrem os demais direitos humanos processuais ao mesmo tempo em que integram aquele. Inclusive, para Cambi (2001, p. 110), “não é exagerado afirmar que a garantia do devido processo legal seria o gênero das demais garantias processuais”.

A proposta apresentada neste artigo é, primeiramente, compreender o conteúdo e alcance do direito humano ao processo justo para, após, analisar o seu reconhecimento e forma de proteção pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, tomando-se por exemplo o julgamento do Caso Ivcher Bronstein vs. Peru.

O presente artigo foi elaborado por meio do método procedimental indutivo para averiguação do reconhecimento e forma de proteção deste direito humano processo pela CorteIDH no julgamento acima referido.

Na primeira parte deste estudo, serão apresentados os elementos teóricos para o reconhecimento da existência de uma gama de direitos humanos de natureza processual. De tal base, examina-se – segundo os pactos internacionais de direitos humanos, constituições nacionais e doutrina – o direito humano ao processo justo.

Na segunda parte, como adiantado, será efetuada a análise do Caso Ivcher Bronstein vs. Peru, julgado em 2001 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, com a finalidade de aferir, com lastro nos pactos invocados e na posição jurisdicional adotada, como se funda e qual a forma de proteção conferida ao direito humano ao processo justo.

2 Breves considerações sobre o direito humano ao processo justo

No ordenamento jurídico nacional brasileiro, desde o advento da Constituição Federal de 1988, verifica-se a endoprocessualização dos direitos fundamentais previstos naquela. Carta (PORTO, 2018, p. 38). Com tal movimento resulta na conformação do processo à tutela dos direitos e garantias constitucionalmente previstos.

Ao mesmo tempo que se observa a constitucionalização do direito processual, impera o igual reconhecimento da existência de um rol de direitos humanos processuais. Estes direitos decorrem da previsão nos pactos internacionais de direitos humanos de

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direitos voltados à atividade processual1. Estes direitos humanos de natureza processual podem ser definidos como todos aqueles direitos reconhecidos aos seres humanos “em razão da sua condição humana, visando garantir patamares mínimos necessários a uma existência digna, a serem exercidos no âmbito do processo judicial”. (ALMEIDA, 2011, p. 161-162).

Nesta levada, adquire especial relevância o direito humano ao processo justo, considerando que dele são decorrentes os demais direitos humanos processuais. As doutrinas civil (REICHELT, 2016, p. 184 e MITIDIERO, 2011, p. 22-23) e penal (FELDENS; SCHMIDT, 2010, p. 120) são uníssonas em estabelecer este direito humano como decorrente dos Pactos Internacionais de Direitos Humanos, assim como da observância de um devido e adequado processo legal estabelecido na Constituição Federal de 1988.

No âmbito dos pactos internacionais, o direito ao processo justo encontra previsão na Declaração Universal dos Direitos do Homem que assegura a todo ser humano os direitos “a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei” (artigo 8º) e “em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele” (artigo 10). Da mesma forma, no artigo 8.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos2 e no artigo 6.1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem3.

1 Aliás, Ingo Sarlet (2015, p. 29) ensina que os direitos fundamentais são “aqueles direitos do ser humano

reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado”. De outro lado, o autor (SARLET, 2015, p. 29) aponta que os direitos humanos estão relacionados “com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional”, resultando na conciliação dos mesmos direitos em ambas as esferas.

2 Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou

tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

3 Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo

razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os interesses de menores ou a proteção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os interesses da justiça.

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Também, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 07 de dezembro de 2000, dedica o seu capítulo VI à “Justiça” (artigos 47 a 50), de onde destacamos, neste momento, o disposto na segunda parte do artigo 47 que assegura à toda pessoa o “direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei”. Ainda que “non costituisce um atto normativo né há per effeto la produzione di norme giuridiche dirette a determinati destinatari per atribuire diritti e doveri o regolare condotte” foi adotada pelos Estados membros daquela comunidade como “dichiarazione solene di princìpi e di garanzie” (TROCKER, 2002, p. 1172).

O direito ao processo justo também decorre da observância do disposto no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal de 1988, assim como é observado “em praticamente todas as constituições liberais democráticas do mundo” (MOTTA, 2003, p. 263), no sentido de que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Dessa observação decorre celeuma doutrinária no tocante a adequação da expressão “devido processo legal” adotada pela Constituição em detrimento à “processo justo” propriamente dito. (MITIDIERO, 2011, p. 24).

Doutrinadores como Luis Alberto Reichelt (2016, p. 184) também acolhem o direito ao processo justo como “um direito fundamental cujo conteúdo hoje estabelecido é, antes de tudo, fruto de um processo histórico-cultural” iniciado com a Magda Carta de João-Sem-Terra de 1215 (Magna Charta Libertatum) que previu em seu artigo 39 a law of the land (o direito da terra, ou de uma determinada região)4. Expressão entendida por por CAMBI (2001, p. 108-109) como sinônimo de due process of law, que restou consolidado na Constituição Estadunidense. Tal consolidação inicialmente ocorreu sob um enfoque processual (procedimental due process of law5) e, segundo interpretação da Suprema Corte norte-americana ao final do século XIX, em um sentido material (substantive due process of law6) de forma a exigir justificativa suficiente para autorizar a restrição de direitos dos indivíduos. (REICHELT, 2016, p. 186)7.

4 Nenhum homem livre será detido ou sujeito à prisão, ou privado dos seus bens, ou colocado fora da lei, ou

exilado, ou de qualquer modo molestado, e nós não procederemos nem mandaremos proceder contra ele senão mediante um julgamento regular pelos seus pares ou de harmonia com a lei do país.

5 Possuindo um caráter mais restrito, “é também chamado de Devido Processo Procedimental ou Devido

Processo Adjetivo. É sobretudo, a norma que dispõe basicamente que deverá ser respeitado um procedimento previamente ordenado” (MOTTA, 2003, p. 274), ou “o direito de ser processado e a processar de acordo com as normas previamente estabelecidas para tanto”. (KIM; BENASSI, 2018, p. 145).

6 Para Kim e Benassi (2018, p. 145), o procedimental due process of law representa “a garantia do trinômio

vida, liberdade e prosperidade. Não basta a regularidade formal da decisão, é necessário que a decisão seja substancialmente razoável. É dessa garantia que surgem os princípios da proporcionalidade e da

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Em sentido contrário, parcela da doutrina, representada por Daniel Mitidiero (2011, p. 23-24)8 e Humberto Ávila (2008, p. 56-57)9, critica a expressão “devido processo legal” adotada pela Constituição, porquanto, decorrente do contexto estadunidense (due process of law), traz à liça a diferenciação – inadequada, para tal corrente – entre as dimensões substancial (substantive due process of law) e processual do devido processo legal (due process of law).

Independentemente da corrente doutrinária a se filiar, o direito humano ao processo justo pode ser entendido como um termo indeterminado, compondo uma cláusula geral que, todavia, comporta uma dupla conformação do processo: a primeira diz respeito ao processo pautado pela colaboração entre as partes e o juiz e a segunda, segundo a lição de Daniel Mitidiero (2011, p. 26-27), diz respeito a constituição do processo como:

[…] capaz de prestar tutela jurisdicional adequada e efetiva, em que as partes participam em pé de igualdade e com paridade de armas, em contraditório com ampla defesa, com direito à prova, perante juiz natural, em que todos os seus pronunciamentos são previsíveis, confiáveis e motivados,

razoabilidade”, enquanto Motta (2003, p. 273) o aponta como “[…] também conhecido como o sentido material da garantia constitucional, tem sentido mais genérico, atuando no que diz respeito aos direitos materiais”.

7 Para esta corrente, a previsão do devido processo legal na Constituição Federal brasileira “é sinal seguro do

compromisso com as exigências de procedimental due process of law e de substantive due process of law” e exigem a qualificação do processo judicial segundo os ditames da adequação e da efetividade, no caminho de um direito ao processo justo. (REICHELT, 2016, p. 186).

8 De forma mais completa, o autor (MITIDIERO, 2011, p. 24) assevera que “não é necessário recorrer ao

conceito de substantive due process of law com o objetivo de reconhecer e proteger direitos fundamentais implícitos, na medida em que nossa Constituição conta expressamente com catálogo aberto de direitos fundamentais (art. 5º, § 2º), o que desde logo permite a consecução desse mesmo fim reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais implicitamente previstos e mesmo não previstos na Constituição (conceito material de direitos fundamentais)”.

9 Segundo Ávila (2008, p. 56), “o uso da expressão ‘devido processo legal substancial’, como variante de

significado supostamente decorrente da previsão expressa do ‘devido processo legal’ é triplamente inconsistente: em primeiro lugar, porque leva ao entendimento de que o fundamento normativo dos deveres de proporcionalidade e razoabilidade é o dispositivo relativo ao ‘devido processo legal’, quando o seu fundamento reside na positivação dos princípios de liberdade e igualdade conjuntamente com finalidades estatais; em segundo lugar, porque os deveres de proporcionalidade e de razoabilidade são aplicados mesmo fora do âmbito processual, razão pela qual perde sentido o uso da expressão ‘devido processo legal substancial’ para representá-los; em terceiro lugar, porque o ‘devido processo legal substancial’, se compreendido com os deveres de proporcionalidade e de razoabilidade, dá a entender que esses deveres não estão presentes no ‘devido processo legal procedimental’, quando […] servem para a sua própria configuração como processo adequado ou justo.”

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em procedimento público, com duração razoável e, em sendo o caso, com direito à assistência jurídica integral e formação de coisa julgada.

Sob tal enfoque, apresentamos dogmáticos necessários à compreensão do tema, é possível examinar o reconhecimento e proteção deste direito humano processual no âmbito de julgamentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

3 A Distribuição do ônus da prova pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Ivcher Bronstein vs. Peru

Em 31 de março de 1999, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos apresentou a denúncia nº 11.762 contra o Estado do Peru, perante a Corte Interamericana. Tal denúncia imputava aquele Estado a violação dos artigos 8 (Garantias Judiciais), 13 (Liberdade de Pensamento e de Expressão), 20 (Direito à Nacionalidade), 21 (Direito à Propriedade Privada) e 25 (Proteção Judicial), todos eles em relação ao artigo 1.1 (Obrigação de Respeitar os Direitos) da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. (CORTE, 2001, p. 01).

As violações apontadas decorreram da alegada provação arbitrária da nacionalidade de Ivcher Bronstein, peruano por naturalização, com o intuito de retirá-lo do controle editorial do canal televisivo Frecuéncia Latina. Bronstein figurava como acionista majoritário, Diretor e Presidente do Conselho de Administração do aludido canal e por meio dele efetuava reiteradas denúncias de violações aos direitos humanos e de corrupção contra o governo peruano. Da mesma forma, foi indicada a violação em razão da criação de órgão judicial no curso dos fatos ocorridos, de forma a violar o direito ao juiz independente e previamente estabelecido.

O Estado do Peru, notificado do processo perante a Corte Interamericana apresentou manifestações nos dias 02 e 09 de agosto de 1999, noticiando que “por meio da Resolução Legislativa Nº 27.152, de 8 de julho de 1999, [...] o Congresso da República aprovou a retirada do reconhecimento da competência contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos”. (CORTEIDH, 2001, p. 05). Em razão de tais manifestações, o Peru pretendeu o reconhecimento de incompetência da Corte para o julgamento da questão em tela, o que foi rejeitado na sentença proferida em 24 de setembro de 1999.

O processo foi instruído, inclusive com realização de audiência pública, tudo sem manifestação do Peru. Apresentadas alegações finais apenas pela Comissão Interamericana, o Estado comunicou, em 23 de janeiro de 2001, a Resolução Legislativa nº 27.401 que derrogava a de nº 27.152, “restabelecendo plenamente para o Estado peruano a

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competência contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos”. (CORTEIDH, 2001, p. 09).

O ponto do julgamento objeto da presente análise, reforçamos, diz respeito exclusivamente à forma como o julgamento examinou a alegação de violação ao disposto no artigo 8ª da Convenção Americana, relativo às garantias judiciais.

Na hipótese, a Comissão Interamericana sustentou que o devido processo legal, previsto no artigo 8 do Pacto de São José da Costa Rica “é uma garantia que se aplica em todo tipo de procedimento judicial ou administrativo que implique a determinação de um direito e é fundamental no Estado de Direito”. Ainda, que tal garantia foi violada diante da arbitrária privação da nacionalidade da vítima10, por ato da Direção Geral de Migração e Naturalização.

A decisão proferida pela Corte Interamericana inicialmente assentou posicionamento de que as “garantias judiciais” previstas no artigo 8 da Convenção Americana não tem incidência restrita “aos recursos judiciais em sentido estrito, mas ao conjunto de requisitos que devem observar-se nas instâncias processuais a efeito de que as pessoas possam se defender adequadamente ante qualquer ato emanado do Estado que possa afetar seus direitos”. (CORTEIDH, 2001, p. 45). No mesmo sentido, foi reconhecido que o direito a ser ouvido (artigo 8.1 da Convenção Americana) aplica-se à autoridade administrativa, mesmo que o texto legal contenha a expressão “juiz ou tribunal independente”. (CORTEIDH, 2001, p. 45).

Sob tal premissa, a violação ao direito humano do devido processo legal decorreu do trâmite de processo unilateral, considerando que contou exclusivamente com a presença das autoridades públicas que tomaram a decisão final. O indivíduo foi privado da ciência dos atos praticados e das acusações imputadas, sendo impedido de exercer seu direito de defesa e influenciar na decisão tomada.

Neste reconhecimento, ainda, é possível verificar a necessidade de observância dos direitos humanos processuais à defesa, iniciada com a “comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada” (artigo 8.2, alínea “b” da Convenção Americana); direito ao contraditório (artigo 8.1 da Convenção); e direito à produção de provas (artigo 8.2, alínea “f” da Convenção), como integrantes do direito ao processo justo.

10 Segundo a ComissãoIDH, “o senhor Ivcher não foi citado em nenhuma oportunidade, não recebeu

comunicação prévia e detalhada do assunto sujeito ao conhecimento da autoridade, com informação das acusações correspondentes, não lhe foi dado a conhecer que o expediente de nacionalização havia sido perdido, nem lhe foi requerido que apresentasse cópias com o fim de reconstruí-lo; tampouco lhe foi permitido apresentar testemunhas que demonstrassem sua posição; em suma, não lhe foi permitido exercer seu direito de defesa”. (CORTEIDH, 2001, p. 44).

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Igualmente, o Estado foi apontado como responsável pela violação do direito ao processo justo também sob o enfoque do direito ao julgamento por um “juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei” (artigo 8.1 da Convenção Americana). Esta imputação decorreu da aferição de que:

[…] o Estado, ao criar Salas e Juízos Transitórios Especializados em Direito Público e designar os juízes que integrariam os mesmos, no momento em que ocorreram os fatos do caso sub judice não garantiu ao senhor Ivcher Bronstein o direito a ser ouvido por juízes ou tribunais estabelecidos “anteriormente por lei”, consagrado no artigo 8.1 da Convenção Americana. (CORTEIDH, 2001, p. 47).

E não são de pequena importância estes apontamentos pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ao contrário, da decisão do processo em exame, foi possível aferir o reconhecimento do direito humano ao processo justo com base nas garantias judiciais previstas na Convenção Americana (artigo 8), incidente tanto na esfera judicial quanto administrativa.

4 Conclusões

A Declaração Universal dos Direitos do Homem e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, dentre outros pactos internacionais objetivando a proteção dos direitos humanos preveem diversos direitos de natureza processual. Estes direitos são espécies de um direito humano processual que engloba todos eles dentro de um sistema protetivo: o processo justo.

A partir de tal constatação e com a finalidade de averiguar a amplitude e âmbito de proteção deste direito humano nos julgamentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos, construiu-se este artigo. Partiu-se da constatação do direito ao processo justo nos pactos internacionais definindo-o e observando-se a divergência no tocante a doutrina nacional em relação à sua denominação de devido processo legal pela Constituição Federal brasileira.

Superada tal elaboração teórica, foi possível analisar o reconhecimento do direito humano ao processo justo e de seu âmbito de proteção, pela Corte Interamericana no Caso Ivcher Bronstein Vs. Peru, a partir do conteúdo da sentença prolatada em 06 de fevereiro de 2001.

De tal leitura foi possível aferir – ao menos no aludido caso concreto – que a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconhece a previsão do direito ao processo justo,

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composto por um feixe de direitos humanos processuais, com base nas garantias judiciais estabelecidas no artigo 8 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, incidente nos âmbitos judicial e administrativo. Este julgamento importou em igual reconhecimento da cogência deste direito humano processual, sob pena de violação daquela esfera mínima de direitos assegurada à pessoa humana.

Enfim, a relevância da proteção dos direitos humanos processuais, dos quais se destaca o processo justo como gênero do qual derivam os demais como espécies é fundamento hábil para o reconhecimento de sua violação, independente da conjugação com outro direito de natureza material. E esse fundamento decorrente das decisões no âmbito internacional acaba permeando os ordenamentos internos quando do diálogo entre as fontes, ampliando a estrutura protetiva de Direitos Humanos.

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