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A burocracia régia tardo-afonsina : a administração central e os seus oficiais em 1476

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A BUROCRACIA REGIA TARDO- AFONSINA

A ADMINISTRAÇÃO CENTRAL E OS SEUS OFICIAIS EM 1476

VOLUME I

TEXTO

Dissertação de Mestrado em História Medieval

apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto

UNIVERSIDADE DO PORTO FACULDADE DE LETRAS

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A BUROCRACIA REGIA TARDO- AFONSINA

A ADMINISTRAÇÃO CENTRAL E OS SEUS OFICIAIS EM 1476

VOLUME I

TEXTO

Dissertação de Mestrado em História Medieval

apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto

UNIVERSIDADE DO PORTO FACULDADE DE LETRAS

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FACULDADE DE LETRAS

Dissertação de Mestrado em História Medieval apresentada por

Isabel Carla Moreira de Brito

PORTO

2001

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Foram muitos os contributos que recebi para a realização deste trabalho, que apesar de ser uma tarefa solitária, contou com a ajuda e participação de muitas pessoas. As palavras de incentivo que fui recebendo ou a simples indicação de um livro, tudo ajudou a construir o trabalho a que me havia proposto. Porém, não quero deixar de fazer alguns agradecimentos personalizados.

Destaco em primeiro lugar, o papel desempenhado em todo este processo, pelo Professor Doutor Armando Luís de Carvalho Homem, pelo acompanhamento dado ao longo destes três anos, de um modo tão paciente, sempre disponível, orientando esta dissertação de forma exemplar e constituindo um modelo de cientifícidade e rigor.

Cabe-me ainda aqui salientar, a importância dos suportes científicos e métodos de investigação veiculados no ano curricular do Mestrado, pelo Professor Doutor José Marques e pelo Professor Doutor José Augusto Pizarro, que se traduziram em alicerces fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho.

Deixo também uma palavra de apreço aos professores que tive durante a licenciatura, principalmente aos medievistas, que conduziram ao despertar da minha curiosidade por esta época da História.

Quero igualmente agradecer à Professora Doutora Judite Antonieta Gonçalves de Freitas e aos Mestres Ana Paula Godinho de Almeida, Armando Paulo Carvalho Borlido e Helena Maria Matos Monteiro, presentes em alguns dos seminários em que participei, sempre disponíveis para prestar esclarecimentos.

A todos os colegas de Mestrado deixo também um bem haja, em especial ao Eduardo, à Eliana, ao Hugo e à Isabel Bárbara: mais do que um percurso científico, a elaboração do presente trabalho saldou-se por uma caminhada de crescimento humano, pautado pela solidariedade e apoio de todos os que o integraram.

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tratamento informático deste trabalho.

Recordo também todos aqueles que sempre acreditaram em mim e me apoiaram nos momentos "menos bons", partilhando tanto angústias como alegrias.

Por fim, devo a concretização do presente trabalho ao Luís e à Isabel, que sempre me incentivaram a caminhar para o "futuro", e a quem não pude dedicar a atenção e a companhia devidas durante estes últimos meses. Muito do que transparece destas linhas é também deles uma pequena parte.

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Af. - Afonso

IAN/TT - Instituto dos Arquivos Nacionais da Torre do Tombo

Art. cit. - Artigo citado

Cf. - Confrontar Ch. - Chancelaria

Ch.U.P. - Chartularium Universitatis Portucalensis Cit. - Citado(a) Cód. - Códice Col. - Colecção Cont. - Continuação Dactil. - Dactilografado Dir. - Direcção Dissert. - Dissertação Doe. - Documento Ed. - Edição Fl./fls. - Fólio/fólios Id. - Idem L./ls. - Livro/livros N° - Número N. - Nota Ob. - Obra Policop. - Policopiado Publ. - Publicado Reed. - Reedição Reimp. - Reimpressão S/d. - Sem data S/l. - Sem local V

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Ss. - Seguintes T./ts. - Tomo/tomos Tit. - Título V. - Verso Vd. - Vide Vol./vols. - Volume/volumes VI

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1. Introdução

A consecução do presente trabalho deve-se ao interesse pelo estudo da Burocracia Régia, decorrente do seminário reservado a esta área, no ano curricular de

1998/1999 do Mestrado em História Medieval. Dado tratar-se de um domínio de conhecimento novo para nós, desde logo constituiu um desafio que pretendemos agarrar.

Este estudo vem na sequência de outros anteriormente realizados e que têm como suporte principal os registos da Chancelaria de D. Afonso V1. No caso presente, a abordagem dos referidos registos reporta-se ao ano de 1476, ou seja um período de tempo relativo à fase final do reinado do "Africano".

Temos como propósito orientar este trabalho em função de alguns objectivos chave. Pretendemos em primeiro lugar, realizar o levantamento da documentação presente nos livros 6 e 7 da Chancelaria Afonsina e inserir esses registos documentais em categorias tipológicas previamente definidas.

Um segundo objectivo deste estudo, prende-se com a identificação dos burocratas régios presentes na Administração Central em 1476. Para além da identificação destes oficiais, iremos também proceder ao levantamento dos cargos que ocupavam e correlacionar dados por nós obtidos com os já existentes, sendo possível desta forma, definir o percurso da oficialidade régia através da elaboração de Catálogos

Prosopográficos, nosso terceiro objectivo.

As conclusões obtidas através das respostas aos objectivos supracitados, permitir-nos-ão conhecer de forma mais concreta a organização administrativa do reino.

1 Ver por todos, os trabalhos de Ana Paula Pereira Godinho de Almeida, A Chancelaria Régia e os seus

oficiais em 1462, policop., Porto, 1996; Armando Paulo Carvalho Borlido, A Chancelaria Régia e os seus oficiais em 1463, policop., Porto, 1996; Helena Maria Matos Monteiro, A Chancelaria Régia e os seus oficiais (1464-1465), 2 vols., policop., Porto, 1997; Eugenia Pereira da Mota, Do "Africano" ao

"Príncipe Perfeito" (1480-1483). Caminhos da Burocracia Régia, 2 vols., policop., Porto, 1989, para

além dos trabalhos de Judite Antonieta Gonçalves de Freitas relativos não só à Chancelaria de D. Afonso V mas também de D. Duarte, A Burocracia do "Eloquente" (1433-1438). Os textos, as normas, as

gentes, Cascais, Patrimónia, 1996; "Teemospor bem e mandamos": A burocracia régia e os seus oficiais em meados de Quatrocentos (1439-1460), 3 vols., policop., Porto, 1999 e também o estudo relativo à Chancelaria de D. João I, efectuado por Vasco Rodrigo dos Santos Machado Vaz, A boa memória do monarca. Os escrivães da Chancelaria de D. João I (1385-1433), 2 vols., policop., Porto, 1995.

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O espólio documental relativo ao ano em apreço, permite-nos ainda averiguar a existência ou não de alterações a nível burocrático, desde o início do reinado do monarca até à fase final do mesmo, na qual a presença do príncipe herdeiro assume um papel preponderante.

Para que a prossecução dos objectivos definidos fosse possível, para além do recurso aos registos da Chancelaria, foi necessário proceder à consulta de dissertações de mestrado e doutoramento que abordam as elites do poder régio2.

A presente dissertação engloba seis capítulos, o primeiro é relativo à Introdução, o segundo diz respeito às fontes utilizadas, e nele procedemos à "distribuição" da documentação exarada por diferentes categorias tipológicas.

No capítulo terceiro, distinguimos os titulares dos vários ofícios da Administração Central, procedendo ainda à caracterização dos referidos ofícios.

No quarto capítulo, relativo às carreiras da oficialidade régia, analisamos o percurso dos oficiais burocratas e averiguamos entre outras, as relações existentes entre a pertença a determinada família e o acesso a cargos de maior relevância. A formação universitária e a presença dos clérigos na Administração Central são também elementos de estudo.

O quinto capítulo diz respeito à caracterização do ano de 1476 e salientamos algumas das suas peculiariedades. No sexto capítulo é realizada a conclusão à presente dissertação. Para além dos seis capítulos acima descritos, que integram o primeiro volume deste estudo, existe um segundo, que compreende os Catálogos

Prosopográficos, respeitantes aos oficiais redactores e escrivães.

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2.1. Os registos da Chancelaria

Os livros 6 e 7 da Chancelaria de D. Afonso V constituem a fonte base do presente estudo. Podemos considerar a Chancelaria régia como a "Secretaria" onde eram elaborados, autenticados e expedidos os diplomas régios, nela trabalhavam para além dos oficiais detentores dos mais importantes cargos da burocracia, escrivães, notários e guardas dos selos.

Verificamos que durante todo o século XV ocorreu um significativo aumento da produção documental, que teve como consequência principal o ultrapassar da barreira do milhar de cartas anual, a partir da década de 604.

Este aumento da produção documental está associado a diversos factores e entre eles destacamos, a cada vez maior preponderância de determinados tipos diplomatísticos presentes nos registos da Chancelaria.

Salientamos para o ano em estudo as cartas de perdão5, os provimentos de oficio a as doações de bens e direitos , que representam no seu conjunto 74,14% dos

diplomas exarados.

O aumento da produção documental não conduz a um enriquecimento tipológico, muito pelo contrário, determinados tipos de diploma, passam a ter registo em diferentes instituições, tal como a Casa do Cível e a Casa da Suplicação*. Desta forma nem todos os burocratas régios presentes em 1476, podem ser representados neste trabalho e para muitos dos mesmos, os informes que possuímos são mínimos, tornando-se necessário o recurso a outras fontes para além da Chancelaria.

3 A Chancelaria de D. Afonso V é constituída por 38 Livros. Existiriam 44, dos quais no século XVI já tinham desaparecido 2. Cf. Anselmo Braancamp Freire, "A Chancellaria de D. Afonso V", Archivo

Histórico Portuguez, vol. II, Lisboa, 1904, pp. 479-480.

4 A partir de 1438 verifica-se já um aumento do número de diplomas expedidos. Cf, Maria Helena da Cruz Coelho e Armando Luís de Carvalho Homem, "Origines et evolution du registre de la Chancellerie

Royale Portuguaise (XlIIe - Xve siècles), sep. da Revista da Faculdade de Letras [UP] , História, II Série,

XL(1995), p. 55:

Representam 38,63% dos diplomas exarados. 6 Representam 18,05% dos diplomas exarados. Representam 17,46% dos diplomas exarados.

8 Trata-se do caso das sentenças, que ficam sob a alçada destes tribunais superiores e também de alguns diplomas relativos à área das Finanças, que têm o seu registo na Casa dos Contos. Cf. Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemospor bem e mandamos... ", vol. I, pp. 17-18.

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2.2. O número de documentos

Para o ano de 1476 compulsamos 1025 diplomas, essencialmente distribuídos pelos livros 6 e 7 da Chancelaria de D. Afonso V.

O primeiro dos referidos livros comporta cerca de 130 fólios e o segundo 144, para além de actos relativos a 1476, exaramos nestes livros diplomas respeitantes a anos anteriores, nomeadamente 1474 e 1475. Recorremos ainda aos livros 26 e 32 nos quais foi possível encontrar documentos referentes a 1476.

Verificamos que para além dos documentos integrais, surgem esporadicamente alguns sob a forma de ementa, que podemos caracterizar como resumos de cartas régias . Entre os registos que compulsamos sob esta forma, destacamos diplomas de

legitimação e privilégio. O seu número não é significativo, apenas 23 num universo de

1025 diplomas.

Tal como acontece em trabalhos anteriormente realizados, registamos diferentes formas de subscrição documental10.

Uma primeira opção, a mais comum de ser encontrada, consiste na fórmula: "El-Rei o mandou, Y a fez", e habitualmente está presente em cartas de subscrição régia. Relativamente a diplomas de subscrição redactorial, é comum encontrarmos, a fórmula "El- Rei o mandou por X, Y a fez". Mas para além do tipo de registo acima descrito, encontramos com frequência a intervenção de uma terceira pessoa no escatocolo dos diplomas. Compulsamos diplomas cujo protocolo final consta do seguinte: "El- Rei o mandou por X (redactor), Y a fez (escrivão) e eu Z a fiz escrever e subscrevi". Esta última fórmula, surge após o escatocolo e denota a presença de um terceiro elemento na subscrição, que seria o responsável na passagem a registo da Chancelaria de determinados actos escritos, de certa forma atribuindo-lhes validade11.

"Desde os primeiros tempos de existência de chancelarias que foi introduzido o costume de trasladar, em forma resumida, textos cujos protocolos, formulários e até conteúdos fossem idênticos ou semelhantes aos de outro primeiramente transcrito na sua totalidade". Cf A. H. de Oliveira Marques, "Ementa" in Dicionário de História de Portugal, dir. Joel Serrão, vol. II, Porto, Figueirinhas, 1985, pp. 362-363.

Cf. os trabalhos citados na nota 1.

Sobre este assunto veja-se Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio (1320-1433), Porto, ÍNÍC/CHUP, 1990, pp. 49-52 e Ofício Régio e Serviço ao Rei em Finais do Século XV: Norma

Legal e Prática Institucional, 1996; Helena Maria Matos Monteiro, A Chancelaria régia e os seus oficiais..., pp. 14-15; Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemospor bem e mandamos..", vol. I, pp. 27-30.

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É importante salientar que devido às más condições em que se encontram muitos dos fólios dos dois livros base do nosso estudo, não foi possível 1er dezenas de documentos, daí que os 1025 diplomas exarados não representem a totalidade dos registos existentes nos livros supracitados, mas apenas aqueles que com maior ou menor dificuldade foi possível 1er.

Iremos seguidamente proceder de forma mais pormenorizada à análise e correlação de dados, obtidos essencialmente através do protocolo final dos documentos.

Merece-nos uma primeira apreciação os ritmos presentes na elaboração de diplomas. Haveria uma produção mensal regular?

Constatamos existir um acentuado contraste, entre meses de intensa produtividade e outros de menor ritmo, a nível da elaboração de actos escritos. O quadro que se segue permite-nos retirar as mais diversas ilações.

MESES N.° DE CARTAS % JANEIRO 34 3,32 FEVEREIRO 50 4,88 MARÇO 50 4,88 ABRIL 69 6,73 MAIO 60 5,85 JUNHO 100 9,76 JULHO 227 22,15 AGOSTO 204 19,90 SETEMBRO 58 5,66 OUTUBRO 90 8,78 NOVEMBRO 42 4,10 DEZEMBRO 41 4,00 TOTAL 1025 100,00

Os meses de Junho, Julho e Agosto contrastam com os do início e final do ano (Janeiro, Novembro e Dezembro). No mês de Julho são redigidos mais diplomas que nos quatro primeiros meses do ano. Quais as razões para tal discrepância a nível da produção de actos escritos?

Vários estudos realizados neste âmbito, realçam a maior ou menor luminosidade dos diferentes meses do ano. Os meses de Primavera e Verão beneficiam de maior

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número de horas de luz natural devido à maior extensão dos dias, seria pois natural que a actividade da escrita fosse realizada primordialmente nesses meses. Tal hipótese coincide com o que se passa em 1476, uma vez que o maior quantitativo de diplomas está presente nos meses de Junho, Julho e Agosto.

Mas avançamos com outra hipótese para esta disparidade. O ano em apreço pode ser considerado "sui generis", uma vez que o monarca passa a maior parte do mesmo fora do reino. No início de 1476, D. Afonso V está em Castela e no final do ano em França. O soberano regressa de Castela em Junho e permanece em Portugal nesse mesmo mês, Julho e parcialmente em Agosto, embarcando para França depois do dia 27 do referido mês.

Os meses em que se verifica um quantitativo de actos escritos mais significativo, são aqueles que coincidem com a presença de D. Afonso V no reino.

Em Setembro, registamos uma assinalável quebra da produção documental, que acontece quando o monarca se ausenta.

Consideramos também, a possível perda de documentação referente aos primeiros meses do ano, ou sua inclusão em distintos livros, tal hipótese aplica-se ao mês de Janeiro que revela quantitativos com muito pouca expressividade.

Relativamente à relação existente entre a produção documental e os dias da semana, está presente uma homogeneidade a nível do despacho de diplomas exceptuando os domingos tal como podemos constatar através do quadro seguinte:

DIAS DE SEMANA N.° DE CARTAS %

Segundas-feiras 170 16,59 Terças-feiras 163 15,90 Quartas-feiras 154 15,02 Quintas-feiras 140 13,66 Sextas-feiras 172 16,78 Sábados 146 14,24 Domingos 80 7,80 Total 1025 100,00

O dia da semana em que se redige menor número de diplomas é o domingo, tal como acontece na década de 60n. Por sua vez constatamos uma maior emissão de

cartas, às segundas e sextas-feiras, precisamente início e final da semana.

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No que concerne aos dias santos, nem todos foram respeitados. A Epifania (6 de Janeiro), o Pentecostes (2 de Junho) e o Corpo de Deus (13 de Junho) foram dias de actividade burocrática. Por sua vez na Páscoa, celebrada a 14 de Abril, não registamos qualquer acto escrito.

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2.3. Os itinerários do monarca e dos seus burocratas

A análise do escatocolo dos diplomas faculta-nos a reconstituição dos itinerários do monarca e de alguns dos detentores das principais dignidades do reino, que nem sempre coincidiram. Tal como refere Rita Costa Gomes, os itinerários colocam, em primeiro lugar, a questão da simultaneidade dos movimentos dos reis em relação aos do seu Desembargo, que nem sempre é similar .

Tal como anteriormente referimos 1476 trata-se de um ano "sui generis", uma vez que na maior parte do mesmo D. Afonso V não se encontra em território nacional. Desde 1475 que o monarca se havia estabelecido em Castela, é precisamente a partir de localidades castelhanas que temos notícias do mesmo, desde Janeiro a Maio.

Registamos a sua presença entre Arévalo, Zamora e Toro (onde estabelece o seu campo de acção).

Em Junho o "Africano" regressa a Portugal, não ficando em território português mais do que dois meses, uma vez que em Agosto embarca numa frota de 21 navios com destino a França.

Vários oficiais burocratas que constam dos nossos catálogos prosopográficos, estiveram junto do monarca, na sua campanha por terras castelhanas. A itinerância da corte é bem patente em 1476, e constatamos o desfasamento existente entre as deslocações efectuadas pelo monarca e pelos oficiais que com ele mais de perto colaboram. Tal situação ocorre porque, "mesmo quando a denominada Chancelaria

régia permite documentar grande parte do arco cronológico dos vários reinados, as deslocações que revela podem ser apenas um esboço grosseiro do itinerário real do monarca, mais ou menos coincidente com ele, e aproximando-se talvez mais, afinal, de um itinerário da corte na sua expressão mais lata- ou seja da parte mais numerosa e vasta do séquito que seguiria, o seu próprio ritmo no "rastro " do monarca"14.

O percurso de D. Afonso V no ano em apreço está compartimentado em três fases distintas. De Janeiro até ao início de Junho, o monarca está em terras castelhanas, os dispositivos escatocolares registam a sua presença sobretudo em Toro, localidade a partir da qual são emitidos a maior parte dos diplomas régios entre Janeiro e Junho. A

Rita Costa Gomes, A Corte dos reis de Portugal no final da Idade Média, Lisboa, Difel, 1995, p. 244. 14 Idem, ibidem, p. 245.

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partir de meados de Junho e até ao início de Agosto, o "Africano" subscreve diplomas tendo como sede a cidade do Porto. Desde meados de Agosto e até Outubro, surgem actos escritos da responsabilidade redactorial do monarca, emitidos em Lisboa. Através da leitura das Crónicas15, sabemos que D. Afonso V inicia a viagem a França em finais

de Agosto, pelo que as cartas que registamos para os meses de Setembro e Outubro (tendo como local de emissão Lisboa) são elaborados sem a presença do monarca.

Entre os oficiais que estão junto do monarca em Castela, destacam-.se D. ÁLVARO DE PORTUGAL, Chanceler- mor do reino, JOÃO GALVÃO, Escrivão da Puridade, GONÇALO VASQUES DE CASTELO BRANCO e D. JOÃO DE ALMEIDA, Vedores da Fazenda e LOPO DE ALBUQUERQUE, Camareiro- mor.

Os oficiais supracitados realizam um itinerário que apenas permite assinalar a sua presença no reino a partir do mês de Junho. Os Vedores da Fazenda, GONÇALO VASQUES DE CASTELO BRANCO e D. JOÃO DE ALMEIDA revelam uma mobilidade apreciável. O primeiro surge a despachar diplomas em território português a partir de meados de Maio16 e o seu itinerário inclui passagens por Évora, Lisboa, Porto, Torres Vedras, Óbidos, Atouguia e Estremoz.

D. JOÃO DE ALMEIDA, tem a sua presença registada nos dispositivos escatocolares a partir de Junho17 do ano em apreço, e despacha diplomas em localidades tão distintas como Lisboa, Santarém, Porto, Arruda e Évora.

Individualizamos também o itinerário de DIOGO DA FONSECA, igualmente presente em território castelhano, entre Fevereiro e Junho. Em Julho e Agosto a sua actividade está registada em Santarém, no mês de Setembro encontramo-lo a subscrever a partir de Lisboa e desde o início de Outubro até final do ano, DIOGO DA FONSECA subscreve diplomas a partir de Évora18.

Os Desembargadores RUI DA GRÃ e FERNÃO RODRIGUES e o Vice-Chanceler JOÃO TEIXEIRA, têm percursos bastante similares, despachando primordialmente a partir de Santarém. Enquanto o monarca e alguns dos titulares das principais dignidades do reino se encontram em terras castelhanas, o Vice- Chanceler é

C£ Rui de Pina, "Crónica de D. Afonso V", in Tesouros da Literatura e da História, cap. CXCTV, Porto, Lello & Irmão, 1977, pp. 573-881.

16IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 105; IAN/TT, Ch. D. Af. V,L.6,3. 95v.

17 IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 112v; IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 99.

Veja-se o quadro correspondente ao itinerário de DIOGO DA FONSECA, nos anexos a este estudo p 130.

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o responsável no reino por parte significativa dos diplomas despachados. O doutor JOÃO TEIXEIRA redacta nos primeiros cinco meses do ano a partir de Santarém e em Junho quando D. Afonso V retorna a Portugal, os diplomas subscritos pelo Vice-Chanceler surgem a partir de Lisboa.

Com a estadia do monarca no Porto a partir de Junho, JOÃO TEIXEIRA deixa Lisboa e incorpora-se no séquito régio, mantendo-se nessa cidade até 9 de Agosto, regressando posteriormente a Santarém, enquanto são realizados os preparativos respeitantes à viagem de D. Afonso V a França.

Concluímos pois que JOÃO TEIXEIRA acompanha o "rastro" do monarca quando o mesmo regressa a Portugal, até aí estivera "sediado" em Santarém. A partir de Setembro e até final do ano, não temos qualquer registo da actividade do Vice-Chanceler enquanto produtor de diplomas, tal facto estará relacionado com a missão diplomática que D. Afonso V lhe atribui: solicitar a dispensa papal para o casamento do rei com D. Joana de Castela19.

A análise dos itinerários do monarca e de alguns oficiais do Desembargo20, permite-nos chegar a algumas conclusões:

enquanto o monarca está em campanha militar, alguns dos mais destacados burocratas régios acompanharam-no, destacando-se em território nacional a actividade do doutor JOÃO TEIXEIRA;

O Vice- Chanceler e alguns oficiais, entre os quais os Desembargadores RUI DA GRÃ e FERNÃO RODRIGUES, subscrevem parte significativa dos diplomas a partir de Santarém;

com o regresso de D. Afonso V ao reino, os oficiais burocratas acompanham o itinerário régio e estabelecem-se no Porto durante o mês de Julho e em Lisboa no mês de Agosto.

Rui de Pina, "Crónica de D. Afonso V , in Tesouros da literatura e da História, cap. CXCVIII, p. 573. Cf. quadros relativos aos itinerários do monarca e de alguns oficiais do Desembargo, nos anexos a este estudo, pp. 129-132.

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2.4. Tipologia documental

No que a este item diz respeito, adoptámos a tipologia definida por Armando Luís de Carvalho Homem , e posteriormente utilizada com algumas nuances em dissertações de mestrado22 e doutoramento23 respeitantes à Chancelaria Régia e aos oficiais que integravam a mesma. Relativamente às referidas nuances, salientamos aqui a tipologia utilizada por Judite Antonieta Gonçalves de Freitas na sua tese de doutoramento que propõe alguns "novos"24 tipos documentais. Tal como a citada autora refere, estes novos tipos pretendem essencialmente individualizar determinados diplomas, que até então eram incluídos na epígrafe Diversos ou outras. Também os estudos realizados sobre determinadas cartas - tipo e o facto de algumas delas constituírem modelos autênticos, conduziu à individualização desses diplomas25.

Para 1476, tivemos pois em conta os modelos tipológicos supracitados e não estabelecemos qualquer tipo diplomatístico novo, o que se coaduna com um empobrecimento tipológico que verificamos acontecer26.

Consignamos na tipologia por nós definida, vinte e seis tipos de diplomas que distribuímos por cinco grandes compartimentos: Graça, Justiça, Fazenda, Administração Geral e Chancelaria.

Devemos salientar, que em alguns casos, apesar da pouca expressividade dos documentos exarados (apenas um exemplar) os individualizamos, dada a sua presença constante nos livros da Chancelaria. Nas situações em que deparamos com diplomas de

21 Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio (1320-1433), Porto, 1990.

2 Ana Paula Godinho de Almeida, A Chancelaria Régia e os seus oficiais em 1464, dissert, de mestrado, polic, Porto, 1985, Armando Paulo Carvalho Borlido, A Chancelaria Régia e os seus oficiais em 1463, dissert, de mestrado, polic, Porto, 1996; Helena Maria Matos Monteiro, A Chancelaria Régia e os seus

oficiais (1464-1465), 2 vols., polic., Porto, 1997; Eugenia Pereira da Mota, Do "Africano" ao "Príncipe Perfeito" (1480-1483). Caminhos da Burocracia Régia, 2 vols., polic, Porto, 1989; Judite Antonieta

Gonçalves de Freitas, A Burocracia do "Eloquente" (1433-1438). Os textos, as normas, as gentes, Cascais, Patrimónia, 1996.

Judite Antonieta Gonçalves de Freitas, "Teemos por bem e mandamos ": A burocracia régia e os seus

oficiais em meados de Quatrocentos (1439-1460), vol. I, polic, Porto, 1999.

Judite Antonieta Gonçalves de Freitas, "Teemospor bem e mandamos"..., vol. I, pp. 62-63. 25 Idem, ibidem.

26 Relativamente ao empobrecimento tipológico, falaremos mais adiante, ainda neste capítulo. Ver página 37 deste estudo.

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fraca expressividade, e habitualmente sem presença regular nos registos da Chancelaria, canalizamo-los para a epígrafe Diversos. Apresentamos em seguida o rol dos diferentes tipos diplomatísticos estabelecidos.

A - GRAÇA

Al - Administração e/ou instituição de capela (mosteiro, albergaria, hospital) A2 - Aposentações

A3 - Apresentação de clérigos a igrejas do padroado régio A4 - Cartas de estalajadeiro

A5 - Cartas de tabelião A6 - Coutadas

A7 - Doações de bens e direitos (e confirmações de )

A8 - Doações, comportando exercício de jurisdições e/ou poderes senhoriais A9 - Escambos

AIO - Legitimações

Al 1 - Licença para ter subalterno

Al2 - Perfilhamentos (e confirmações de ) Al3 -Privilégios em geral

A14 - Privilégios, comportando escusa de determinações gerais Al5 - Regulamentação do direito de pousada

A16- Segurança a mercadores

B - JUSTIÇA (administração de) BI - Perdões

C - FAZENDA

Cl - Aforamentos (e confirmações de) C2 - Fiscalidade

C3 - Provimentos de ofícios (e confirmações de) C4 - Quitações

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D - ADMINISTRAÇÃO GERAL

Dl - Cartas de Físico

D2 - Defesa e regulamentação de encargos militares (e confirmações de) D3 - Regulamentação de jurisdições locais

D4 - Resposta a capítulos de cortes e outros escritos de agravos

E - CHANCELARIA El - Traslados

F - Diversos

Procederemos seguidamente,, e por ordem alfabética a uma breve caracterização dos diplomas exarados.

Administração e/ou instituição de capela (mosteiro, albergaria, hospital)

As cartas que inserimos nesta alínea, representam um valor modesto no espólio documental. Estão enquadradas nos "novos" tipos documentais definidos por Judite Gonçalves de Freitas27, embora já as encontremos em períodos anteriores, incluídas em rubricas distintas28.

O beneficiado com o diploma supracitado, obtinha do monarca a concessão da administração de uma capela, mosteiro, albergaria ou hospital, estando incluídos todos os seus bens.

Para 1476, compulsamos quatro exemplares, respeitantes à administração de três capelas e um hospital. Salientamos a concessão da administração do Hospital de Santo Estevão de Lisboa29, atribuída a Fernão Martins, e a tutela de uma capela30, instituída na

Cf. Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemospor bem e mandamos"..., vol. I, p. 63. Cf. Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., pp. 71-72. IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 48.

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Igreja de Santa Maria de Setúbal, concedida a Salvador Eanes. A subscrição dos quatro exemplares registados foi da responsabilidade de D. Afonso V.

Aforamentos (e confirmações de)

A carta de aforamento é habitualmente da esfera de competência dos Vedores da Fazenda tal como o determinam as Ordenações Afonsinas31. Através destes diplomas

conhecemos as condições em que foram arrendados determinados bens. No ano em apreço, é de salientar o aforamento de prédios urbanos e propriedades fundiárias situadas maioritariamente em Lisboa.

Os Vedores da Fazenda e o monarca, foram em 1476 os responsáveis pela subscrição das doze cartas que compulsamos. Estamos perante instrumentos fundamentais para o conhecimento pormenorizado de determinados edifícios e propriedades, uma vez que através da análise minuciosa destes exemplares, ficamos a conhecer a localização exacta do bem aforado e também os dados relativos aos indivíduos que realizam o contrato.

As condições em que os referidos contratos eram celebrados32 e o valor da renda a pagar, estão também consignados na carta de aforamento.

Aposentações

As cartas de aposentação representam um valor modesto dentro do nosso espólio documental, cerca de 2,05%, que dizem respeito aos 21 instrumentos compulsados.

Em conformidade com o estabelecido nas Ordenações Afonsinas33, este diploma

era atribuído a indivíduos que tivessem 70 anos e o solicitassem ao soberano. Para além da idade outros factores poderiam permitir a concessão da carta de pousado,

30 IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 108.

31 Ordenações Afonsinas, L. I, tít. III, § 15, p. 25.

Nos diplomas por nós exarados os contratos são realizados por três vidas e o primeiro tem a faculdade de nomear o segundo, assim como este o faz em relação ao terceiro.

(25)

destacando-se a incapacidade física, doença, cansaço ou fraqueza. Era necessária a comprovação da idade ou de qualquer outra razão apresentada pelo requerente, para tal o monarca mandava realizar inquirição, antes de conceder o privilégio de pousado.

Para além das condições que acima referimos, deparamos com uma outra situação que conduz à obtenção da aposentação. Assim, alguns indivíduos obtêm o privilégio de pousado sem qualquer tipo de condição (idade incluída). Os indivíduos em causa são aposentados e em simultâneo obtêm a condição de vassalo. O requerimento era habitualmente realizado por familiares do monarca, para as pessoas que estavam na sua estreita dependência.

Em 1476, entre os beneficiados com a aposentação destacam-se alguns vassalos, acontiados e besteiros. Os indivíduos mencionados beneficiavam de um vasto conjunto de privilégios. No que diz respeito aos vassalos, mantinham as honras, graças, mercês e regalias dos vassalos aposentados com idade superior a 70 anos. Estes últimos estavam isentos da prestação do serviço militar, serviços concelhios e de encargos régios. No caso dos acontiados em armas, estavam "isentos de servir na guerra, de conduzir presos

e dinheiros de ser curadores ou tutores de pessoas (salvo se as tutorias fossem lídimas) e de servir os encargos e servidões dos concelhos. "34

Também os moedeiros continuavam a usufruir dos privilégios que tinham aquando do exercício do seu ofício.

A responsabilidade redactorial dos instrumentos compulsados repartiu-se pelo monarca, Vice- Chanceler e Coudel- mor.

Apresentação de clérigos a igrejas de padroado régio

Compreende esta alínea os diplomas através dos quais, o Rei exerce o direito de apresentar os clérigos às igrejas de que é padroeiro. Compulsamos apenas três instrumentos pertencentes a este tipo diplomatístico, todos subscritos pelo monarca, embora as Ordenações Afonsinas mencionem a responsabilidade do Chanceler- mor no seu desembargo35.

Armando Paulo Carvalho Borlido, A Chancelaria Régia e os seus Oficiais em 1463, p. 29.

(26)

A utilização do latim neste tipo de cartas, continua a persistir, tal como acontece para períodos anteriores ao por nós estudado36.

Cartas de Estalajadeiro

Incluímos nesta rubrica, os instrumentos respeitantes à concessão de uma licença, que permitia a montagem de uma estalagem37.

Compulsamos três cartas de estalajadeiro, que representam 0,29% dos documentos exarados. Nenhum dos exemplares referidos surge em forma de ementa38 e dos mesmos constam o nome e morada do beneficiário, assim como alguns privilégios, dos quais seria usufrutuário. Entre as regalias atribuídas aos estalajadeiros destacam-se:

- isenção de serem besteiros do conto;

- isenção do pagamento de encargos concelhios: peitas, fintas, talhas; - isenção de prestação de serviços de aposentadoria;

- autorização para vender vinho e outros produtos trazidos de fora, sem embargo de qualquer ordenação em contrário;

- a sua casa não podia ser tomada de aposentadoria de forma gratuita para ninguém39.

A subscrição dos diplomas supracitados foi da responsabilidade do monarca.

Cf. respectivamente, Armando Luis de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., pp. 68-69; Ana Paula P. de Almeida, A Chancelaria régia e os seus oficiais..., p. 30; Armando Paulo Borlido, A

Chancelaria régia e os seus oficiais..., p. 36; Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemos por bem e mandamos"..., vol. I, p. 39.

A licença era concedida pelo monarca e permitia ao requerente da mesma, montar em sua- casa uma estalagem.

Para períodos anteriores, é habitual encontrar a carta de estalajadeiro em forma de ementa. Cf. Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemospor bem e mandamos": A burocracia régia e os seus oficiais..., vol. I, pp. 69-70.

Cf. Iria Gonçalves, "Privilégios de Estalajadeiros Portugueses" (séculos XIV e XV) in Imagens do

(27)

Cartas de Físico

Através deste tipo de diploma, físicos e cirurgiões ficavam habilitados a exercer a sua actividade em todo o reino. Os examinadores dos futuros físicos e cirurgiões, assinariam uma carta que permitia o exercício da profissão e estava-lhes consignado o direito de solicitar a prisão daqueles que exercessem a medicina sem licença40. Ao ser-ine atribuído o diploma, o novo médico jurava sobre os Santos Evangelhos, caso fosse de origem judaica, o juramento era feito sobre o Tora41.

Das duas cartas que integram o acervo documental respeitante a 1476, ambas habilitam judeus a exercer a medicina. Facto perfeitamente comum no Portugal quatrocentista, uma vez que existe um grupo apreciável de físicos e cirurgiões de origem judaica. Aliás, Luís de Pina afirma "serem israelitas os maiores médicos até ao

século XVIIFA2.

Os instrumentos registados, foram da responsabilidade de Mestre Fernando e de Rodrigo de Lucena.

Cartas de tabelião

Este tipo de carta possibilitava ao beneficiado com a mesma, receber do monarca uma licença que lhe permitia assinar documentos, executados por si, dentro das suas funções43.

Trata-se de mais um tipo diplomatístico com escassa expressividade, consignamos um exemplar, subscrito por D. Afonso V, embora as Ordenações

Cf. Iria Gonçalves, "Físicos e cirurgiões quatrocentistas. As cartas de exame." in Imagens do mundo

medieval, Lisboa, 1988, pp. 9-52.

Idem, ibidem, p. 18. 42

Luís de Pina, "Medicina e Médicos" in Dicionário de História de Portugal, dir. Joel Serrão, vol. IV, Porto, Figueirinhas, 1985, p. 242.

Entre essas funções Judite Antonieta G. de Freitas, destaca as de escrivão do almoxarifado, escrivão das capelas do rei, escrivão dos órfãos, escrivão dos feitos das sisas e escrivão das alniotaçarias entre outros. Cf. "Teemospor bem e mandamos"..., vol. I, p. 73.

(28)

Afonsinas, cometam ao Chanceler- mor a responsabilidade da passagem das cartas de tabelião44.

Coutadas

Registamos a presença de um exemplar para o ano em apreço. Este tipo de diploma diz respeito à isenção de determinados direitos comunitários entre os quais se destacam a caça , pesca, o corte de ervas ou madeira e o pasto de animais. Apenas o proprietário das terras poderia usufruir das actividades anteriormente descritas.45

Habitualmente são um apanágio do monarca e de elementos da nobreza, o que se verifica no instrumento por nós compulsado.

A redacção do diploma registado coube ao monarca.

Defesa e regulamentação de encargos militares (e confirmações de )

Incluímos na presente rubrica 19 cartas que representam 1,85% dos diplomas exarados. A epígrafe Defesa inclui instrumentos relativos ao provimento das alcaidarias dos castelos, regulamentações respeitantes a acontiados a cavalo, de besteiros do conto e privilégios em matéria de uso e porte de armas entre outros46.

No que concerne ao ano de 1476, as cartas analisadas reportam-se a privilégios em matéria de uso e porte de armas47 e à regulamentação respeitante ao exercício do cargo de besteiro do conto ou de acontiado a cavalo.

A subscrição destes diplomas é da responsabilidade dos Desembargadores, do monarca e do Coudel- mor.

Ordenações Afonsinas, L. I, tít. II, § 16, pp. 21-22.

45 Sobre este tipo diplomatístico veja-se Ruy d 'Abreu Torres, "Coutadas" in Dicionário de História de

Portugal, dir. Joel Serrão, vol. II, Porto, Figueirinhas, 1985, p. 220.

Cf. Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., pp. 70-71.

Sobre o uso e porte de armas veja-se, João Silva Sousa, "Das autorizações de porte de armas e de deslocação em besta muar em meados do século XV. Algumas notas de estudo", in Estudos de História

(29)

Doações de bens e direitos (e confirmações de )

No ano de 1476 compulsamos 179 doações que representam um valor bastante significativo, 17,46% da documentação estudada.

Uma parte significativa destas doações diz respeito a tenças em numerário48 e também em géneros, moradias, doações de propriedades fundiárias e prédios urbanos. Enunciamos por ordem decrescente os diferentes diplomas exarados.

Comprova-se mais uma vez a imagem de D. Afonso V como o monarca que teria desfalcado parte significativa do património régio. As tenças em numerário atingem valores apreciáveis49. Algumas das referidas tenças, estão estreitamente ligadas ao cenário bélico vivido em Toro. O "Africano" procuraria recompensar os intervenientes na Batalha. Entre os diversos exemplos que encontramos na documentação e que exemplificam o anteriormente exposto, destacamos a tença atribuída a D. Pedro Álvares de Sotomaior50, Conde de Caminha, contemplado com um montante de 100.000 reais. Também Catarina Fernandes51, viúva, recebe 9.600 reais de tença após a morte de Garcia Coelho, seu marido, no cenário de Toro.

D. Afonso V atribuí tenças em numerário a indivíduos de diferentes categorias sociais, destacando-se membros do Conselho Régio, como é o caso de Fernão Cabral52, cavaleiros e escudeiros do monarca e o rabi- mor do reino entre outros.

Entre as doações efectuadas por D. Afonso V, salientam-se também as realizadas através de cartas de se asy he. Nestas, o monarca atribui bens de raiz ou móveis, de alguém acusado de uma infracção, a um outro indivíduo ( o denunciante), desde que as infracções cometidas fossem comprovadas53.

Veja-se o quadro n.° 7, no anexo a este estudo. Veja-se o quadro n.° 7, no anexo a este estudo. 50IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 38, fl. 93.

51 IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 75.

52 O referido Fernão Cabral é contemplado com uma tença no valor de 30.000 reais. (IAN/TT, Ch. D. Af.

V, L. 7, fl. 42).

53

Após a denúncia, os bens eram confiscados ao acusado e passavam para a posse do monarca. Se o réu não comprovasse a sua inocência, o rei doava os referidos bens ao denunciante.

(30)

Compulsamos ainda alguns diplomas nos quais são doados os rendimentos e direitos de portagens, almoxarifados e judiarias de um lugar54.

O predomínio das subscrições relativas a estas cartas cabe ao monarca (29,89%). Os Vedores da Fazenda e os Desembargadores, são os responsáveis pelos restantes actos subscritos.

Relativamente às confirmações referentes a este tipo de diplomas, compulsamos apenas quatro, da responsabilidade redactorial de D. Afonso V.

Verificamos que em inúmeras doações efectuadas pelo monarca, surge também a menção ao Príncipe D. João. Referimo-nos a diplomas régios, nos quais podemos observar no escatocolo o seguinte: "El Rey o mandou e o Pryncepe assynou". Rui de Pina afirma que esta situação ocorre uma vez que: "El Rey sefoy na entrada do mês de

Mayo a Arronches, e com elle o Pryncepe seu Filho, a que deu as provisoões que compriam,. pêra ynteira governança e regimento do reyno de Portugal em quefycava, e assy outras declaraçoões secretas como per via de testamento, em que quis e declarou que todallas graças e doaçoões, que durando esta empresa e necessydade de castelã e quaaesquer pessoas fizesse, que passassem de dez myl réis de venda, nom sendo aprovadas, consentydas, e assynadas juntamente pello dito Pryncepe seu Fylho fosem de nehum valor, como cousas per constrangimento e sem vontade outorgadas"56.

Para além da menção à assinatura do Príncipe em doações de bens e direitos, constatamos acontecer o mesmo na atribuição de alguns privilégios e confirmações desses mesmos privilégios57.

Doações, comportando exercício de jurisdições e/ou poderes senhoriais

Compreende os diplomas que implicam a concessão de títulos e poderes habitualmente sobre uma terra ou lugar, "com todas as suas entradas e saídas, rendas,

direitos, foros e eventualmente padroados de igrejas; ou então, com todas as suas

54 IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 27.

As Ordenações Afonsinas atribuem aos Vedores da Fazenda, as cartas «per que Nos Mandemos fazer merecer a alguii de qualquer cousa, que seja do Nosso aver ». Cf. Ordenações Afonsinas, L I tit III § 4

p. 24. ' Rui de Pina, "Crónica de D. Afonso V", in Tesouros da Literatura e da História, cap. CLXXV, p. 540.

(31)

rendas, direitos e jurisdições, mero e misto império, com ressalva da correição e das alçadas".

Habitualmente os beneficiários são indivíduos de condição social elevada, tal como verificamos na documentação analisada. Um dos exemplos mais significativos é o de D. ÁLVARO DE PORTUGAL, Chanceler do reino que recebe em 1476 em alvarás emitidos a partir de Toro, as vilas e castelo da menagem de Torres Novas e Alvaiázere com os respectivos termos, todas as rendas, jurisdições e direitos59, bem como os padroados das igrejas60. Merece igualmente destaque a doação que D. Afonso V faz a Fernão Telles, de quaisquer ilhas que este encontrasse desde que fossem inabitadas e não estivessem situadas nos mares da Guiné61

No total são nove os exemplares desta espécie diplomatística subscritos por D. Afonso V, correspondendo três instrumentos a confirmações.

Escambos

A presente rubrica reporta-se aos diplomas respeitantes à troca de bens de raiz, casas, herdades e reguengos. Surge com valores pouco significativos, compulsamos apenas três exemplares para o ano em apreço.

Merece destaque um escambo realizado entre D. ÁLVARO DE PORTUGAL e o Príncipe. Assim, o Chanceler- mor do reino que tinha em sua posse Torres Novas, resolve escambar a vila com o Príncipe, obtendo Tentúgal, Póvoa, Buarcos, Pereira, Vila Nova de Anços, Anobra e outros lugares, como resultado de um contrato celebrado no Porto a 25 de Julho de 147662 e confirmado três dias depois63.

Os exemplares exarados são da responsabilidade redactorial de D. Afonso V, e do Vice- Chanceler.

Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., p. 73. IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 104v.

IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 99v. IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 93. IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 31v. IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fis. 16-16v.

(32)

Fiscalidade

Incluímos nesta alínea os diplomas que dizem respeito a privilégios relativos ao foro fiscal. Em 1476, D. Afonso V isentou os beneficiados com este privilégio, do pagamento de almoçatarias, peitas, fintas, talhas, sisas, dízimas e portagens.

As Ordenações Afonsinas, atribuem aos Vedores da Fazenda a responsabilidade de despachar as cartas de quitamento de dízimas e portagens, assim como "qualquer

outro tributo, que perteença ao aver Nosso"64.

A redacção dos dois diplomas exarados coube integralmente aos Vedores da Fazenda.

Legitimações

Trata-se de um tipo diplomatístico frequente na documentação proveniente da

Chancelaria, apresentando valores significativos no período por nós abordado63.

Habitualmente os progenitores requerem a legitimação de um ou mais filhos bastardos, pretendendo desta forma "a superação de todas as limitações que o Direito

vigente colocava à capacidade de herdar" 6.

Regra geral, a solicitação do pedido de legitimação é paterna e verificamos nos documentos compulsados tratarem-se de petições realizadas por elementos de todas as condições sociais67, embora com um ligeiro predomínio dos clérigos68.

Ordenações Afonsinas, Liv. I, tit. Ill, §§ 9 e 11, p. 25.

Podemos considerar estes valores significativos quando os comparamos com os do Io quartel do século XV. Cf. Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., p. 76; Judite Antonieta G. de Freitas, A Burocracia do "Eloquente"..., p. 117.

Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., p. 75; Cf. Sónia Maria de Sousa Amorim Teixeira, A vida privada entre Douro e Tejo: Estudos das legitimações (1433-1521), dissert, de mestrado, policop., Porto, 1996 e Carla Maria de Sousa Amorim Teixeira, Moralidade e costumes na

sociedade de Além- Douro: 1433-1521, dissert, de mestrado, policop., Porto, 1996.

Pedro Eanes Brandão, alcaide-mor de Castelo Branco e Comendador da Ordem de Cristo, legitima António Brandão, seu filho e de Maria Eanes. (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 96).

Tal é o caso de João Gonçalves, clérigo, que legitima Pedro de Sousa seu filho (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 65v).

(33)

Os Desembargadores responsabilizam-se pela maioria da redacção destes diplomas tal como estava consignado nas Ordenações Afonsinas69, as restantes cartas

foram subscritas pelo monarca.

Licença para ter subalterno

Estamos perante um tipo diplomatístico que se insere nos "novos" tipos documentais definidos por Judite Antonieta Gonçalves de Freitas70, podendo

71

considerar-se "uma subespécie de privilégio'" . Tal como o título indica, quando o monarca concedia esta licença, permitia que os escrivães ou tabeliães tivessem a ajuda de outrem no exercício das suas funções. As motivações conducentes ao requerimento desta licença, estavam habitualmente associadas ao excesso de trabalho por parte do requerente e/ou idade avançada.

Compulsamos apenas três exemplares72, que tiveram como subscritor o monarca.

Perdões

As cartas de perdão atingem valores consideráveis no ano de 1476. Compulsamos cerca de 396 cartas que representam 38,63% do acervo documental. Tal

Ordenações Afonsinas, L. I, tít. IV, § , p. 36.

Judite Antonieta Gonçalves de Freitas, "Teemospor bem e mandamos": A burocracia régia e os seus

oficiais..., vol. II, pp. 75-76.

71 Idem, ibidem.

Um dos diplomas exarados é emitido a partir de Toro, e no mesmo, Fernão de Braga, escrivão perante o Corregedor da Corte, obtém licença para ter um escrivão que lhe faça escrituras. (IAN/TT, Ch. D. Af V, L. 7, fl. 74v).

Na definição de Luís Miguel Duarte, a carta de perdão "é a consubstanciação, num diploma da

chancelaria, de um acto de graça régia em matéria de justiça, através do qual o monarca outorga o seu perdão a um ou mais súbditos, na sequência de um crime, de um delito ou de uma suspeita de que os destinatários os tenham cometido ". Justiça e Criminalidade no Portugal Medievo (1459-1481), vol. I,

(34)

como em trabalhos referentes a períodos anteriores , confírma-se a tendência para uma significativa presença dos diplomas de perdão na Chancelaria de D. Afonso V.

Este tipo de carta é facilmente identificável, uma vez que apresenta um formulário específico. Assim, na maior parte dos documentos exarados, encontramos no protocolo a saudação, realizada pelo monarca, a que se segue uma exposição dos factos bastante pormenorizada. São evocados os acontecimentos que conduziram ao crime, os intervenientes e também a data ou datas^ do ocorrido, utilizando o narrador na maioria dos casos uma linguagem coloquial. Esta descrição dos acontecimentos, a súplica, contempla por vezes as medidas levadas a cabo pela justiça em relação ao acusado. Verificamos que em parte significativa dos diplomas, acontece a detenção do réu e-posteriormente este foge da cadeia, andando amorado. Em seguida o mesmo solicita o perdão.

Numa segunda parte do documento, está presente a decisão do monarca e posteriormente os trâmites finais, "quer no sentido de ser cumprida a pena que

acompanha o perdão, quer no sentido de, satisfeitas as petições, o peticionário não ser molestado'" . Através da análise de todos estes elementos, sobretudo dos cronológicos,

concluímos que a aplicação da justiça se realizava de uma forma bastante lenta, sendo os processos resolvidos em média num espaço de tempo não inferior a dois meses.

No ano em apreço os diplomas de perdão contemplaram maioritariamente os seguintes delitos:

- fuga da prisão76, - homicídio77, - roubo78,

Cf. as teses de mestrado e doutoramento de Ana Paula Godinho de Almeida, A Chancelaria Régia e os

seus oficiais em 1464, vol. I, dissert, de mestrado, polie, Porto, 1985; Armando Paulo Carvalho Borlido, A Chancelaria Régia e os seus oficiais em 1463, dissert, de mestrado, polia, Porto, 1996; Helena Maria

Matos Monteiro, A Chancelaria Régia e os seus oficiais (1464 - 1465), vol. I, polie, Porto, 1997; Eugenia Pereira de Mota, Do "Africano" ao "Príncipe Perfeito" (1480-1483). Caminhos da Burocracia

Régia, vali, palie., Parto, 1989; Judite' Antonieta Gonçalves: de Freitas, "Teemos por bem e mandamos": A burocracia régia e os seus oficiais em meados de Quatrocentos (1439 - 1460), vol. I

polie, Porto, 1999.

Luís Miguel Duarte, Justiça e Criminalidade no Portugal Medievo..., vol. I, pp. 34-37. É o caso de Álvaro Mendes morador em Santarém . (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 20). 77

Registe-se o exemplo de Afonso Fernandes culpado pela morte de Gonçalo Dias (IAN/TT Ch D Af.

(35)

- adultério .

Segundo a tipologia definida por Luís Miguel Duarte80, os delitos supracitados

integram-se nas seguintes alíneas:

- contra o rei, a autoridade e a ordem pública (fuga de prisão); - contra a pessoa humana (homicídio);

- contra a propriedade e "ordem económica" (roubo); - contra a "moral" e os "bons costumes" (adultério).

O perdão poderia ser individual ou colectivo, e a participação de vários indivíduos homiziados na Batalha de Toro, foi condição fulcral para que obtivessem o perdão. Está incluído nesta situação Nuno Vasques, criado de D. Álvaro de Castro, Conde de Monsanto. O mesmo beneficia da amnistia concedida aos homiziados que combateram em Toro, tal como se pode constatar no diploma que parcialmente transcrevemos: "El Rey fazemos saber a todos Nossos corregedores juizes e justiças dos

nossos Regnos de Portugall e a outros quasquer a que este pertemcer e este Nosso alvará for mostrado que nos querendo fazer graça e mercee a Nuno Vaasquez escudeiro criado do Conde de Monsanto que deus aja queremos e Nos praz que ele entre e possa entrar em o perdam jeerall que ora delyberamos e prometemos fazer. E este sem embargo de huum alvará que em outro tempo pasamos e demos ao licenciado Joham Fernandez sobrejuiz par que prometemos alevantar o degredo ao dicto Nuno

Vaasquez que per causa do dicto Joham Fernandez lhe foy posto (...)"81.

A subscrição dos instrumentos de perdão foi realizada primordialmente por duplas de Desembargadores, destacando-se os doutores JOÃO TEIXEIRA e DIOGO DA FONSECA, em parceria com RUI DA GRÃ e FERNÃO RODRIGUES.

Para além dos Desembargadores, também o monarca interveio na subscrição, sendo responsável por 42 cartas que representam 9,44% do total de perdões exarados.

78

Vasco Ruivo recebe diploma de perdão tendo sido provada a sua participação no roubo de gado (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, £1. 63v e 64).

79 Catarina Martins obteve perdão por cometer adultério. (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 15). Luís Miguel Duarte, Justiça e Criminalidade no Portugal Medievo..., vol. I, pp. 327-331. 81 IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 100.

(36)

Perfilhamentos (e confirmações de)

Trata-se de um tipo de diploma com uma presença pouco significativa na documentação compulsada. A carta de perfílhamento diz respeito à adopção de uma pessoa por parte de outrem, que tem habitualmente um determinado tipo de características. Assim, o perfilhante é na maior parte dos casos uma pessoa singular ou um casal sem herdeiros ou filhos, que pretende assegurar que alguém irá herdar os seus bens. Trata-se pois de uma situação bastante distinta em relação ao que hoje em dia entendemos por perfílhamento82. Nos exemplares que analisamos, os perfilhados são indivíduos que prestam serviços ao(s) perfilhante(s), sendo o perfílhamento uma recompensa pelos serviços prestados83.

Também através deste acto, os menores (órfãos, enteados e sobrinhos) encontravam alguém que administrasse o seu património até à idade adulta.

Dos sete exemplares que fazem parte da documentação estudada, três são confirmações deste acto. Os Desembargadores84 e o monarca foram os responsáveis pela subscrição dos referidos exemplares.

Privilégios em geral

Este tipo de carta surge em lugar de destaque na documentação por nós estudada. Compulsamos cerca de 87 cartas que constituem 8,49% dos diplomas exarados nos livros 6 e 7 da Chancelaria de D. Afonso V.

Estamos perante uma espécie compósita na qual englobamos diplomas respeitantes a diferentes situações, entre as quais salientamos:

Cf. Humberto Baquero Moreno, Subsídios para o estudo da adopção em Portugal na Idade Média, sep. da "Revista de Estudos Gerais Universitários de Moçambique", vol. Ill, série V, Lourenço Marques,

1966.

83

Temos como exemplo o caso de Lourenço Eanes, criado de Pedro Alvares e Maria Afonso, que é perfilhado pelo casal supracitado, sendo desta forma beneficiado pelos serviços que entretanto lhes prestara. (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 115).

As Ordenações Afonsinas atribuem aos Desembargadores do Paço o livramento deste tipo de carta.

(37)

- a concessão de privilégios relativos à isenção de pagamentos de fintas, talhas,

peitas e portagens;

- isenção de encargos e serviços concelhios;

- concessão de diferentes isenções a pessoas colectivas (mosteiros, povoações, concelhos, judiaria e/ou judeus;

- privilégios relacionados com a isenção de serviços em mar e terra; - privilégios relativos aos besteiros do conto83.

É ainda importante realçar a confirmação de privilégios, que surge frequentemente na documentação e que se restringe à confirmação de benefícios anteriormente outorgados.

A subscrição das cartas de privilégio e confirmações das mesmas, foi em 1476 da responsabilidade de D. Afonso V, dos Desembargadores e Vedores da Fazenda.

Privilégios comportando escusa de determinações gerais

Estamos perante uma espécie prolixa, na qual englobamos entre outros, os diplomas que autorizavam os clérigos a adquirir bens móveis e de raiz até um certo montante86, que era determinado consoante o estatuto social do beneficiário. Por norma, o soberano estabelecia que as propriedades a adquirir não se localizassem nos seus reguengos, e que após a morte do beneficiado, esses mesmos bens fossem herdados por pessoas leigas da jurisdição do monarca.

Uma outra situação com que nos deparamos no ano em apreço, reporta-se à autorização concedida pelo rei para que um mosteiro pudesse ficar com os bens deixados por um frade que falecera. Podemos ainda destacar a licença concedida a um clérigo para ficar com determinados bens de raiz , doados por D. Beatriz Pereira, que fora casada com Rui de Melo.

Incluímos ainda neste epígrafe um diploma no qual D. Afonso V, autoriza que o conde de Viana e de Loulé, D. Henrique de Meneses, se falecer sem deixar

Quando o privilégio diz respeito a um domínio especifico (militar, fiscal, ou direito de aposentadoria), inserimos esses instrumentos nas rubricas competentes.

"sem embargo de quaeesquer leix, hordenaçoões e defessas que em contrair o sejam postas £ Jectas".

(38)

descendência masculina, possa ter como herdeira a sua filha D. Beatriz87. A Lei Mental

"apenas prevê a transmissão de terras da coroa por linha masculina, portanto com total exclusão das mulheres, embora elas não apareçam referidas"83. Esta autorização

concedida pelo monarca ia pois de encontro às prescrições legislativas vigentes.

No que concerne à subscrição destes instrumentos, verifica-se que a maioria absoluta dos diplomas é redactada pelo monarca. Este tipo de carta representa 2,15% do nosso acervo documental.

Provimentos de ofício (e confirmações)

As cartas de provimento constituem em parceria com os privilégios em geral e os perdões, um dos tipos diplomatísticos mais representativos em 1476. Consignamos 185 exemplares, que representam 18,05% dos documentos exarados.

Os diplomas por nós analisados abrangem uma panóplia de cargos que abarcam diversos departamentos da governação central. Destacam-se os sectores da Fazenda, Justiça e Milícia, verifícando-se uma predominância nos provimentos dos seguintes ofícios:

Fazenda - escrivães e juízes das sisas, requeridores das sisas, escrivães dos almoxarifados, requeridores da alfândega e porteiro das sisas;

Justiça - tabeliães do cível e do crime, escrivães dos feitos das sisas, juízes de fora e tabeliães das notas;

Milícia - escrivães da coudelaria e coudéis.

A subscrição destes diplomas vai de encontro ao prescrito pelas Ordenações

Afonsinas. Os instrumentos relativos ao sector da Fazenda89 são na sua maioria da

5/IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 6.

88

Humberto Baquero Moreno, "Contestação e oposição da nobreza portuguesa ao poder político nos finais da Idade Média", in Exilados, marginais e contestatários na sociedade portuguesa medieval,

Estudos de História, Lisboa, Presença, 1990, p. 24. Ordenações Afonsinas, L. I, tit. Hl, p. 24.

(39)

responsabilidade redactorial doa Vedores, embora o monarca e. os Desembargadores tenham intervenções esporádicas. As cartas adstritas ao sector da Justiça90, foram maioritariamente subscritas pelo Vice- Chanceler e Desembargadores, e o Coudel- mor ou seu substituto livraram os diplomas enquadrados no sector da Milícia.

Surge habitualmente na documentação, a motivação ou motivações conducentes ao provimento de determinado indivíduo. Entre as mesmas destacamos a morte do anterior detentor do cargo91, renuncia a esse mesmo cargo (muitas vezes realizada a favor de alguém da família)92, doença e idade.

Para além das motivações supracitadas, surge-nos com relativa frequência o provimento na sequência da apresentação de uma carta de se asy he. Assim, devido a incompetência no desempenho do seu ofício, fraude ou falsificações e na sequência de uma denúncia, o detentor do cargo poderia ser desapossado do mesmo, caso o denunciante comprovasse a acusação anteriormente realizada.

Devemos salientar ser habitual a interferência de alguém de estatuto social superior, na nomeação para determinado ofício . Entre os diplomas presentes no nosso acervo documental, verificamos que alguns dos indivíduos, providos, estavam na estreita dependência de elementos da Nobreza94 ou Clero95.

Para além dos provimentos propriamente ditos registámos também as confirmações dos mesmos que atingem valores pouco significativos.

Ordenações Afonsinas, L. I, tít. II, pp. 19-20 e pp. 22-23.

Em 12 de. Junho de 1476, Gonçalo Nunes é provido como. escrivão, das. sisas de Valdevez, por morte de Álvaro Gil. (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 29v).

92 -r

João Barbosa, filho de Gonçalo Eanes Barbosa é provido tabelião em 8 de Março de 1476, substituindo o seu pai que renunciara ao dito ofício.

Tal é.o caso de-Nuno Martins, criado de-Alvaro Pires Vieira do conselho do rei é provido tabelião de Cível de Lisboa a 9 de Setembro de 1476. O diploma de provimento consta do seguinte:

"Dom afonsso etc. A nosjujzes vereadores concelho e homens boons da nossa mnj nobre E sempre leal cidade de Lixboa Saúde. Sabede que nos querendo fazer graça e mercê a nuno martjns criado daluaro pirez vieira do nosso concelho etc. teemos por bem e damollo em essa cidade e sseu termo por tabeliam do cyuelf..)". (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 51v).

E o caso de Diogo Barbosa, escudeiro do Conde de Vila Real, é provido escrivão dos juizes dos órfãos em Maio de 1476. (IAN/TT, Ch. D. Af.V,L. 7,fl. 25).

João de Lisboa, escudeiro de arcebispo de Lisboa é nomeado escrivão das sisas em Setembro de 1476 (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 62).

(40)

Quitações

Encontramos apenas dois exemplares enquadráveis nesta tipologia96. A carta de quitação tem uma função de "recibo", uma vez que se trata de "um documento passado

a um funcionário régio, declarando que o destinatário dera boa conta e recado dos dinheiros e bens que recebera no exercício do cargo"9,', desta forma o monarca

declarava-o como quite. Os diplomas em apreço, pormenorizam as quantias recebidas pelos funcionários ao serviço do soberano, discriminando por vezes, de que forma essas mesmas somas tinham sido dispendidas98.

D. Afonso V é o responsável pelos diplomas compulsados embora em termos de prescrições normativas as Ordenações Afonsinas" atribuam ao Corregedor da Corte, procuradores dos concelhos e aos mordomos.dos.hospitais, albergarias ou tutores.de menores a subscrição destes instrumentos.

Regulamentações de jurisdições locais

A presente alínea abrange os diplomas respeitantes à regulamentação de poderes jurisdicionais de algumas entidades, (destacando-se os concelhos) individualidades ou titulares de cargos.

Os exemplares relativos a 1476, dizem respeito à confirmação de juizes já eleitos (dois diplomas) e também ao ajustamento de limites entre dois concelhos (um diploma).

O assentamento dos três exemplares referidos ficou a cargo do monarca e dos Desembargadores. Em termos legislativos, as Ordenações Afonsinas atribuem aos Desembargadores do Paço a responsabilidade das cartas de confirmação dos juízes100,

Verifica-se em estudos realizados para épocas anteriores, que as cartas de quitação atingem valores pouco significativos, apesar de marcarem uma presença constante na Chancelaria. Cf. Armando Luís de Carvalho Homem, "O Desembargo Régio..:', p. 83; Judite Antonieta G. de Freitas, "Teemos por bem e

mandamos...", p. 27; Armando Paulo C. Borlido, A Chancelaria Régia..., p. 39. 97

Armando Luís de Carvalho Homem, O Desembargo Régio..., p. 83.

Cf. Iria Gonçalves, "Quitação (carta de)", in Dicionário de História de Portugal, dir. Joel Serrão, vol. V, Porto, Figueirinhas, 1985, p. 228.

99 Ordenações Afonsinas, L. I, tít. V, §. 19, p. 45.

(41)

sendo aos juízes dos Feitos de El- Rei atribuída a subscrição dos diplomas «que perteecem aas Nossas jurdiçoões»m.

Regulamentação do direito de pousada

Compreende um conjunto de diplomas relativos à isenção de aposentadoria. Os beneficiados com esta carta não estavam obrigados a acolher os poderosos (habitualmente monarca e nobres) nem a fornecer-lhes roupas, animais, alimentos...

Os valores que encontramos para 1476 são pouco significativos, apenas uma carta que perfaz 0,1% da documentação compulsada.

No que diz respeito à subscrição, foi o soberano o responsável pela redacção do instrumento referido, contrariando desta forma as Ordenações Afonsinas102 que

atribuem ao Corregedor da Corte a responsabilidade destas subscrições.

Resposta a capítulos de cortes e outros escritos de agravos

Englobamos nesta rubrica todos os instrumentos que dizem respeito a agravos apresentados por um grupo social, uma comunidade ou vila do reino, aos quais o monarca dá o seu parecer. Assim, e conforme o anteriormente exposto, encontramos agravamentos lançados pela cidade do Porto, que solicita ao monarca alguns esclarecimentos, aos quais o soberano dá resposta. Também os juízes e homens bons de Parada, Cabril e Monção, pedem ao monarca que este se pronuncie sobre a possível nomeação de João de Paiva como escrivão dos órfãos, dando D. Afonso V uma resposta à mencionada solicitação103.

Relativamente a esta epígrafe, importa ainda esclarecer que não encontramos em 1476, qualquer resposta a capítulos de cortes, aliás não existe qualquer certeza sobre a realização de cortes no ano em apreço. Armindo de Sousa refere que todos os historiadores admitem a realização destas cortes, e, contudo, não existe qualquer

Ordenações Afonsinas, L. I, tít. VI, § 21, p. 58. Ordenações Afonsinas, L. I, tít. V,§§ 30-31, pp. 52-53.

(42)

documento que garanta a existência das mesmas. Nas referidas cortes teria sido jurado sucessor do reino, o Infante D. Afonso, após a morte do seu avô e do pai.104

Compulsamos dois diplomas respeitantes a respostas a agravamentos, ambos da responsabilidade redactorial do monarca.

Segurança a Mercadores

Trata-se de um tipo de diploma que concedia a segurança real, a mercadores estrangeiros que se deslocavam ao território nacional105. Ao dirigirem-se a Portugal, os referidos mercadores solicitavam ao monarca a concessão de uma carta de segurança, que lhes permitia transaccionar as respectivas mercadorias e circular sob a protecção régia. A referida protecção, abrangia não só mercadores, como também as mercadorias e eventualmente as embarcações106.

Solicitaram carta de segurança no período por nós abordado, mercadores de Castela107, sendo a subscrição dos referidos instrumentos da responsabilidade de D. Afonso V.

Traslados

Estamos perante uma alínea com pouca expressividade no acervo documental. Consideramos como traslado "uma carta que transcreve qualquer escritura anterior,

iUJ IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 6, fl. 66.

104 Cf. Armindo de Sousa, As Cortes Medievais Portuguesas (1385-1490), vol. I, Porto, INIC, CHUP, 1990, pp. 462-463.

A carta de segurança também poderia ser requerida por mercadores nacionais. Na documentação por nós exarada, apenas encontramos a solicitação deste tipo de diploma realizada por estrangeiros.

Luís Miguel Duarte, "Súbditos da coroa de Aragão em Portugal no Século XV - Comércio e

Segurança. Algumas notas. ", sep. da Revista da Faculdade de Letras, II série, vol. VII, Porto, 1990, pp.

71-83.

107 Destacamos um diploma emitido a partir do Porto a 28 de Julho de 1476, que concede a segurança régia a naturais de Castela que pretendiam comerciar em Pinhel. (IAN/TT, Ch. D. Af. V, L. 7, fl. 35).

Imagem

Gráfico 1- Tipologia das Cartas 102  Quadro 2- N.° de cartas por Subscritor 103  Gráfico 2- N.° de cartas por Subscritor 104  Quadro 3- Tipos de cartas de subscrição régia 105

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