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As bibliotecas digitais (não) autorizadas e a questão dos direitos autorais no gesto de compartilhar / Non-authorized digital libraries and copyright issues for sharing

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761

As bibliotecas digitais (não) autorizadas e a questão dos direitos

autorais no gesto de compartilhar

Non-authorized digital libraries and copyright issues for sharing

DOI:10.34117/bjdv5n9-071

Recebimento dos originais: 18/08/2019 Aceitação para publicação: 12/09/2019

Natália Rodrigues Silva

Mestra em Ciências da Linguagem pela Universidade do Vale do Sapucaí (Univás) (2018). Graduada em Biblioteconomia pelo Centro Universitário de Formiga (UNIFOR-MG) (2012). Bibliotecária no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de

Minas Gerais (IFSULDEMINAS) – Campus Avançado Carmo de Minas.

Endereço: Alameda Murilo Eugênio Rubião, s. n., Chacrinha, Carmo de Minas – MG, Brasil E-mail: natalia.silva@ifsuldeminas.edu.br

RESUMO

Este trabalho – filiado a Análise de Discurso, segundo as perspectivas teóricas de Michel Pêcheux, na França, e de Eni Orlandi, no Brasil – trata da constituição das bibliotecas digitais e a sua relação com os direitos autorais e analisa a discursividade da Biblioteconomia. Desse modo, temos como objetivo compreender como os sentidos sobre o compartilhamento de obras na sociedade, hoje, face ao advento da Internet, são produzidos em relação às “bibliotecas digitais” e os direitos autorais. Busca compreender, também, de que maneira é produzido o imaginário de que o que se está disponível on-line é de livre reprodução e compartilhamento. Objetiva, especificamente, analisar como os sujeitos, em determinadas posição-sujeito, enunciam sobre a questão do compartilhamento, na ordem do digital (Orlandi, 2007) e como o compartilhamento afeta a constituição de uma determinada posição sujeito autor, enquanto detentor do(s) direito(s) autorais. A problematização do trabalho, assim, se volta para uma compreensão de como os direitos autorais são significados na contemporaneidade em relação ao gesto de compartilhar obras.

Palavras-chave: Bibliotecas digitais. Direitos autorais. Análise de Discurso. Compartilhamento.

ABSTRACT

This work - affiliated with Discourse Analysis, according to the theoretical perspectives of Michel Pêcheux in France and Eni Orlandi in Brazil - deals with the constitution of digital libraries and their relationship with copyright and analyzes the discursiveness of Librarianship. In this way, we aim to understand how the senses about the sharing of works in society, today, in the face of the advent of the Internet, are produced in relation to digital libraries and copyright. It also seeks to understand how the imaginary is produced that what is available online is free reproduction and sharing. It aims specifically to analyze how subjects, in certain subject-position, state on the issue of sharing, in the order of the digital (Orlandi, 2007) and

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 how sharing affects the constitution of a certain author subject position, ) Copyright. The problematization of work, thus, turns to an understanding of how copyright is signified in contemporary times in relation to the gesture of sharing works.

Keywords: Digital libraries. Copyright. Discourse Analysis. Sharing. 1. INTRODUÇÃO

As tecnologias têm provocado mudanças sem precedentes na comunicação e no uso da informação. Com o advento da Internet há vários questionamentos quanto aos direitos autorais. O controle de uso de obras na Internet tem se mostrado um dos principais desafios para a contemporaneidade. A facilidade que existe em obter-se cópias e reproduções que não são autorizadas na Internet coloca em evidência uma necessidade de proteção dos direitos autorais. Os direitos autorais foram consolidados em uma época em que não haviam tantos instrumentos tecnológicos que possibilitassem o compartilhamento, a alteração e reprodução instantânea e desautorizada de obras protegidas. A disponibilização de conteúdos on-line é cada vez mais frequente e com números expressivos. Hoje é fácil encontrarmos na rede diversas publicações de diferentes áreas do conhecimento de autores renomados ali bem a nossa frente, em tela. Mas será que todo esse material que encontramos na internet para fazer download é autorizado?

O interesse por esta pesquisa parte da inquietação desta pesquisadora, bibliotecária no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), que escuta em seu cotidiano os discursos nos quais se inscreve a evidência de sentido de que todo material disponível na Internet é de livre compartilhamento e reprodução.

A pesquisa busca compreender como é significada a questão dos direitos autorais na contemporaneidade em relação a “cultura científica” (PÊCHEUX, [1982] 1994) que vivenciamos, na qual se constitui uma infinidade de “informações” disponíveis no espaço digital. E, de outro lado, nas políticas públicas, buscaremos analisar como se constituem os sentidos sobre as relações entre direitos autorais e biblioteca digital, bem como descrever e interpretar os processos de institucionalização dos sentidos, produzindo efeitos de legalidade ou de ilegalidade desses materiais disponíveis na Internet.

Considerando que não há sentido literal (unívoco) na perspectiva teórico-metodológica da Análise de Discurso (AD), fundada por Michel Pêcheux, na França, e por Eni Orlandi, no Brasil, propomos um trabalho sobre os direitos autorais em relação às bibliotecas digitais a fim de compreender o processo de produção de sentidos sobre o gesto de compartilhar obras

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 na contemporaneidade e os modos de inscrição desse gesto, no espaço digital, em relação às políticas públicas de proteção dos direitos autorais.

Essa pesquisa nos propõe refletir sobre a temática e analisar as possíveis relações (de sentidos) entre linguagem, conhecimento e tecnologia, visto que o tema aborda duas questões (biblioteca digital e direitos autorais) que ainda se fazem presentes e produzem muitos questionamentos. Nos instiga a pensar também a relação que há entre os sujeitos e a sociedade no contemporâneo.

2. BIBLIOTECAS DIGITAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) possibilitaram a ampliação de produtos e serviços oferecidos em bibliotecas. Com o avanço tecnológico e em especial da internet, estamos concebendo e conhecendo uma outra forma de biblioteca. Percebe-se que com o advento da internet o sentido e o discurso sobre/de biblioteca foram se modificando.

Sobre o discurso, de acordo com Pêcheux (1969), o discurso é efeito de sentido entre locutores. E para Orlandi e Lagazzi (2006, p.14), “dizer que o discurso é efeito de sentido entre locutores significa deslocar a análise de discurso do terreno da linguagem como instrumento de comunicação”.

Em relação às bibliotecas digitais, Tammaro e Salarelli (2008, p. 119), salientam que

[...] o conceito de “biblioteca digital” não é simplesmente o equivalente ao de uma coleção digitalizada datada de instrumentos de gestão da informação. É, antes, um ambiente que reúne coleções, serviços e pessoas para apoiar todo o ciclo vital de criação, disseminação, uso e preservação de dados, informação e conhecimento.

Cunha (2009) diz que a biblioteca digital pode ser denominada de diferentes maneiras: “biblioteca virtual”, “biblioteca eletrônica”, “biblioteca sem paredes”. Sayão (2009, p. 8) afirma que essas denominações “possuem diferentes significados, mas que são usados frequentemente para designar a mesma coisa”.

Alguns teóricos colocam como primeira biblioteca digital um protótipo idealizado ao final da Segunda Guerra Mundial, por Vanevar Bush, em 1945. Bush a nomeou como Memex (Memoy Extension), “que em inglês ao pé da letra quer dizer memória extensiva, mas que na prática queria dizer memória expansível, ou memória que se possa expandir” (PROCÓPIO, 2004, p. 11). Segundo Procópio (2004, p. 11), “tal maquininha, trazia consigo o conceito do

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 acesso a uma teia com servidores de conteúdo informacional interligada, que claramente Bush considerava ser a biblioteca universal do futuro”.

Segundo Orlandi (2009, p.31), a memória “tem suas características, quando pensada em relação ao discurso”. Em análise de discurso, a noção de memória é trabalhada em relação a noções de interdiscurso, ao que já foi dito e/ou pré-construído e nos remete também a sentidos de circunstâncias de enunciação em momentos e lugares textuais passados. A memória é também constituída de esquecimentos, silêncios, lacunas e falhas. A memória funciona determinada pelas condições de produção do discurso (ORLANDI, 2009).

A memória discursiva utiliza-se de dizeres que afetam o sujeito em determinadas situações. Orlandi (2009, p. 31) salienta que o “o interdiscurso disponibiliza dizeres que afetam o modo como o sujeito significa em uma situação discursiva dada”, pois o que já foi dito anteriormente, produz efeito no discurso atual.

As bibliotecas digitais se constituem por uma memória metálica. Dias (2016) ressalta que a memória metálica são movimentos de repetição, reprodução. E que esta é ligada ao armazenamento de dados no computador, bem como relaciona-se ao funcionamento das mídias, quantidade de informações disponíveis e sua reprodução.

Nos anos 50, a introdução dos computadores provoca uma verdadeira revolução da memória: a possibilidade da memória eletrônica, distinta da memória humana por sua duração. A memória humana está sujeita ao esquecimento enquanto a memória das máquinas é ilimitada, dependendo de técnicas de armazenamento (LUCAS, 1996, p. 24).

A busca pela preservação da memória é vivenciada desde as bibliotecas da Antiguidade, com o uso dos tabletes de argila, o papiro, o pergaminho, o papel, quando cada período é definido por características próprias, de acordo com cada tecnologia disponível na época (SANTOS, 2012).

O que nesta pesquisa compreendemos como biblioteca digital constitui-se no final do século XX, com o uso das TICs, pelas quais tornou-se possível a ampliação da produção de informações em formato digital, e o uso das redes de comunicação que permitiram a troca de informações em diferentes formatos.

As primeiras bibliotecas digitais eram basicamente coleções digitais, formadas por informações pessoais, organizacionais ou de grupos de trabalho e ambientes colaborativos (SAYÃO, 2008). Essa noção de biblioteca digital perpassa duas linhas de investigação:

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A primeira diz respeito à biblioteca digital como um fruto de um processo evolutivo das bibliotecas como um todo. A seguinte vê a biblioteca digital como uma ferramenta tecnológica que revolucionou o cenário das bibliotecas, mas, entretanto, fomenta a dúvida de que a biblioteca digital seja realmente uma biblioteca (ASSUNÇÃO, 2011, p. 4).

Orlandi (2016, p. 78) salienta que

[…] quando tomamos como objeto de reflexão o digital, em suas condições de existência e de produção – da ideologia pragmática (a da informação e da comunicação que engajam o cognitivo e o psicológico). O digital corresponde, nessa perspectiva, na conjuntura sócio-histórica que vivemos, à forma de linguagem que reflete o modo como a ciência, a tecnologia e administração se sobrepõem no funcionamento das práticas simbólicas que realizam o imaginário do sujeito pragmático. Ou seja: há contemporaneamente uma dominação pragmáticoideológica, seja como conhecimento, seja como produção do real. E as tecnologias, na forma que o digital oferece, correspondem à produção dominante dos processos de significação e de constituição dos sujeitos.

Há um imaginário de que tudo está disponível nas bibliotecas digitais. Mas será que isso é verdade? Como esse imaginário se constituiu? Orlandi (2016) ressalta que estamos vivendo em uma sociedade da informação. Mas será que com a popularização da internet todos têm acesso à informação?

3. DIREITOS AUTORAIS

Na história do conhecimento linguístico ocidental, tradicionalmente, Roma e Grécia são consideradas as civilizações pioneiras em preservação de propriedade intelectual. É nessa época que começam a surgir também as pequenas práticas e produções editoriais (PINTO, 2009).

Durante esse período as regras eram baseadas nos costumes e usos da época, não havendo assim uma legislação específica, uma vez que a educação e a escrita eram privilégio de poucos. Quem copiava e fazia uso de uma obra sem autorização era punido severamente, como por exemplo, amputando-se as mãos (SOUZA, 2013).

Quando se fala em direito(s) autor(ais) há ainda muitas controvérsias e discussões. No século XI, com a invenção da prensa de Gutenberg, é que começa a se pensar em direito

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 autoral, devido a invenção permitir a publicação de obras em série (SOUZA, 2013). Vale frisar que, no início, as proteções não almejavam proteger o autor, mas os impressores e editores, como uma forma de assegurar um retorno financeiro a esses (MELLO, 2013).

A Inglaterra é considerada a pioneira na proteção de obras e autores. Em 1709, a rainha Ane outorgou o Copyright Act (ato do direito de cópia), cuja lei passou a regular e proteger os autores copistas (SOUZA, 2013). Direito autoral é a ramificação do Direito que trata dos direitos dos autores. O termo Direito de autor foi estabelecida por Louis d’Héricourt, advogado francês em 1725, após a edição do Estatuto da Rainha Ane, em 1710 (FRAGOSO, 2009).

Na história dos direitos autorais, destaca-se ainda o droit d’Auteur, da França, que surgiu com a Revolução Francesa, abolindo o modelo de privilégios e estabelecendo o caráter moral do direito do autor e o copyright norte-americano, que surge no final do século XVIII (MELLO, 2013). No decorrer dos anos, vários tratados foram realizados com o intuito de se estabelecerem regularizações quanto aos direitos autorais, entre os quais podemos citar a Convenção de Berna (1886), que discute o direito autoral em âmbito internacional.

No Brasil, os decretos, leis, resoluções (etc.) buscam legitimar o(s) direito(s) do autor. Nesse sentido, questionando sobre as políticas públicas, Orlandi (2010b, p. 13) salienta que o que é considerado público “[…] assim como o que é de uso comum, popular, é concebido de modo pejorativo”. Para a mesma autora

[…] a noção de povo, que está na base dos processos de significação de popular/público é uma noção projetiva, que acolhe as diferentes imagens que lhe são atribuídas – inclusive as pejorativas – mas que em seu real não se identifica exatamente com nenhuma. O “povo” é o fiel da balança, digamos. Permanece como o possível de uma nova (ou outra) ordem social em sua materialidade histórica. Permite a abertura do social para o que pode vir a ser. O povo é constituído por relações, por vínculos. O popular é o que se faz no movimento, no plural. Ele é a dimensão pública, a da quantidade, onde convergência e divergência se cruzam (ORLANDI, 2010, p. 13).

No que se refere ao Brasil, a lei que rege o direito autoral (Lei nº 9.610/1998) é recente se comparada a outros países. Ela foi criada em uma época em que não haviam tantas tecnologias disponíveis e de rápido acesso. A Propriedade Intelectual está dividida em duas áreas: A Propriedade Industrial (patentes, marcas, desenho industrial, indicações geográficas e proteção de cultivares) regida pela lei 9.279/96 e a do Direito Autoral (obras literárias e artísticas, programas de computador, domínios na Internet e cultura imaterial), que é regida

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 pela lei 9.610/98. (SCALCO, 2013)

Os Direitos de autor por sua vez é divido em duas partes: o direito moral e o direito patrimonial. Tratamos de direitos, no plural, para designar essas duas partes (FRAGOSO, 2009).

Conforme Fragoso (2009, p. 29) “[…] a expressão “direito moral” surgiu inicialmente na França em 1872, cunhada pelo advogado André Morillot, designando prerrogativas vinculadas à personalidade do autor.” O direito moral foi estabelecido pela Conversão de Berna, em seu artigo 6 bis, por meio da salvaguarda dos direitos de paternidade, de integridade e de modificação (FRAGOSO. 2009) e está relacionado aos seus créditos, ou seja, o direito de pleitear sua autoria. Assim sendo, o autor tem os seus direitos sobre a obra reconhecidos como sendo seus, da maneira como esta foi criada originalmente. “Esse direito é irrenunciável, ou seja, o autor não pode abrir mão dele nem vendê-lo ou transferi-lo (KISCHELEWSKI, [200-], n. p.).”

O direito moral permite que o autor tenha seu nome publicado na obra, podendo recusar-se a modificá-la, ou mesmo suspender a sua utilização, caso esteja sendo usada de forma que prejudique sua imagem e/ou até mesmo sua honra. Por esse direito é dada a possibilidade de se reconhecer que a obra foi criada pelo autor e, por sua vez, de garantir que este receba créditos pela sua criação.

A comprovação de criação original da obra se dá por meio de sua caracterização e distinção. As criações intelectuais contêm traços, marcas e formas de expressão do seu autor e mostram sua originalidade. O direito moral surge a partir do momento em que a obra é criada e o autor recebe o reconhecimento de sua publicação e divulgação. A obra criada transcende o tempo, ela permanece sempre sendo de autoria do autor que a criou e nada mudará isso (REIS; ROZADOS, 2013, p. 4).

O direito patrimonial possibilita que o autor faço uso e disponha de determinada obra da maneira como quiser. O autor tem os privilégios dos direitos patrimoniais somente durante um período. “Sendo assim, ele pode permitir que terceiros usem, traduzam e reproduzam sua obra, negociando sua utilização de forma integral ou parcial. Essa negociação pode ser feita em caráter gratuito ou não.” (KISCHELEWSKI, [200-], n. p.).

O desenvolvimento tecnológico tem fomentado a discussão sobre a criação de normas de proteção mais eficazes e amplas para proteger os direitos do autor.

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No plano jurídico, como decorrência da ampliação do universo tecnológico e da crescente difusão de obras pela rede, vemos também o aumento da tensão entre o direito à informação e o direito de reprodução; entre o direito dos autores e outros titulares e os interesses públicos, em particular a informação, aí incluída a educação (FRAGOSO, 2009, p. 74).

A Internet não modificou os direitos autorais, a LDA também é válida no espaço digital, pois, em seu artigo 7, diz que “São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro (BRASIL, 1998, grifos nosso).”

A questão é que, diariamente milhares de pessoas infringem os direitos autorais na internet, fazendo uso indevido de obras de outros via internet.

4. O COMPARTILHAMENTO DE OBRAS VIA INTERNET

O controle de uso de obras na internet tem se mostrado um dos principais desafios para a contemporaneidade. Isso ocorre “Em razão da imaterialidade de textos, músicas, fotos e vídeos, todo esse conteúdo fica muito mais suscetível ao uso não autorizado do que as mesmas obras quando inseridas em suportes físicos” (BRANCO; BRITTO, 2013, p. 27).

Nem tudo que está disponível na internet é autorizado para download, ou seja, está legitimado para compartilhamento. De acordo com a lei 9.610, que versa sobre os direitos autorais no Brasil, em seu artigo 24, inciso IV diz que são direitos morais do autor “o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;” (BRASIL, 1998). Dito de outro modo, a divulgação, o compartilhamento e a divulgação de determinada obra sem o consentimento do autor é colocado como algo que fere, gravemente, os direitos autorais.

Com o advento da internet, há uma evidência de que os sentidos são as informações e de que esses ficaram disponíveis de forma mais rápida e fácil: mas será que todos têm acesso a essas informações? Ou essa ideia de completude vinda da era da internet faz parte somente de um imaginário?

Orlandi (2006) nos diz que temos uma ilusão de igualdade, pois nem todos têm acesso às informações disponíveis na rede. A internet propiciou um imaginário de socialização que possibilita o acesso e o compartilhamento do conhecimento. Orlandi (1994, p. 56) salienta que o imaginário “medeia a relação do sujeito com suas condições de existência”. Em relação ao

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 espaço digital, Orlandi (2010) ressalta que este é fundamentalmente urbano. O gesto de compartilhar obras via internet nos remete ao imaginário de que é possível dividir, distribui, partilhar algo com outros, como forma de socializar, divulgar, disseminar diversos tipos de materiais, favorecendo que mais indivíduos tenham também oportunidade de acesso a esses.

Dias (2005, p. 41) afirma que “diante da mudança provocada pelo surgimento da Internet na sociedade, criamos novas formas de relação com o conhecimento, de relação entre os sujeitos, de relação com a sociedade [...]”.

As “bibliotecas digitais” disponíveis na Internet estão inscritas em uma forma de (com)partilhamento, pois ao reunir em um mesmo espaço (Internet) diferentes sujeitos, de forma voluntária, em torno de um objetivo comum (de fazer upload ou download de obras para suas pesquisas ou leituras de lazer), pressupõe um trabalho colaborativo entre os “usuários” dessas plataformas.

Podemos dizer que as “bibliotecas digitais” que se inscrevem nesse discurso de compartilhamento, se constituem por um imaginário de que pela possibilidade do (com)partilhamento de materiais se tem um “compartilhamento do conhecimento” em seus sites. Os sentidos destas “bibliotecas digitais” são determinados por esse imaginário de propiciar a interatividade e a conectividade pelos sujeitos, ou seja, por essa interação que sustenta o imaginário de que há uma oferta de novas formas de ser e pensar.

Muitas vezes, os usuários que utilizam essas “bibliotecas digitais”, desconhecem que alguns dos materiais que fazem parte de seus “acervos” não estão autorizados por seus autores a estarem naquelas plataformas e a circular da maneira como estão postos. Muitos desconhecem inclusive que há uma lei de direitos autorais e que esta pode estar sendo infringida por eles ao (com)partilhar materiais da e nas “bibliotecas digitais”. Talvez também por ser uma prática tão comum na sociedade da informação na qual vivemos, o ato de faze upload e downloads dos materiais nas “bibliotecas digitais” pode passar por despercebido por seus “usuários” que esta prática não é legal.

Ouso dizer, que estas “bibliotecas digitais” que possibilitam esse (com)partilhamento de material não autorizado que infringem os direitos autorais, na realidade não são bibliotecas digitais como comumente são denominadas, mas plataformas digitais colaborativas. São plataformas digitais colaborativas, pois são os próprios “usuários” que “alimentam” seu acervo com seus materiais e (com)partilham estes com outros membros com uploads e downloads.

Estas plataformas digitais colaborativas, são determinadas e definidas enquanto sentidos de colaboratividade e de conectividade, bem como de Internet, pois são os sujeitos “usuários”

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 que as “alimentam” com materiais, e, para acessar os conteúdos, é preciso estar conectado à internet e, por sua vez, a outros “usuários”.

Nestas plataformas digitais colaborativas percebemos que o “usuário” ao fazer o upload de um material em uma das plataformas, que não é de sua autoria, acaba assumindo, naquele espaço, pois ao fazer o upload divulga uma obra que não lhe “pertence” em termos legais, mas ao ser lançado na plataforma por esse “usuário” ele assume um dos papéis do autor, de detentor de direitos, pois “autoriza” essa divulgação naquele espaço. Assim, as plataformas digitais colaborativas, pela posição sujeito “usuário”, produzem um imaginário de liberdade de “uso”, de acesso livre, de livre (com)partilhamento. O espaço digital possibilita a esses “usuários” esse imaginário de “liberdade”. Liberdade essa para inserir materiais na plataforma e (com)partilhar arquivos com outros sujeitos. Essa noção de liberdade sem necessariamente responsabilidade é constitutiva de práticas de leitura da contemporaneidade, na ordem do digital.

5. CONCLUSÃO

Ao fim deste texto concluímos que na história das bibliotecas digitais, seu surgimento se deu de forma tímida em que não se imaginava o alcance que estas teriam na hoje conhecida “sociedade da informação” (CAPURRO, 2017). A Internet propiciou que as ditas “bibliotecas digitais” sejam cada vez mais populares e popularizadas nesse espaço. Ao considerar as “bibliotecas digitais” como plataformas digitais colaborativas deixamos em evidência como a questão é complexa e deve ser discutida entre os profissionais bibliotecários.

Os uploads oferecidos pelas plataformas digitais colaborativas colocam os “usuários” como possíveis transgressores dos direitos autorais, pois muitas vezes a infringem. Vale salientar que a internet não modificou os direitos autorais, a lei de direitos autorais também é válida no espaço digital, pois, em seu artigo 7, diz que “São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro” (BRASIL, 1998, grifos nosso). A questão é que, diariamente, milhares de pessoas infringem os direitos autorais na internet, fazendo uso indevido de obras de outros. O espaço digital, e em especial a internet, ocasionou uma situação inesperada no âmbito do direito autoral e no trato do profissional bibliotecário com as informações disponibilizadas nessas plataformas.

Basta tirar o material do site? Uma vez que entra em circulação na rede e é compartilhado, o funcionamento da “memória metálica”, esse material pode retornar em

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9, p. 14666-14678 sep. 2019 ISSN 2525-8761 outros locais, inclusive do qual foi tirado. Vale ressaltar que a internet não é terra sem lei, é um espaço que atos ilícitos podem também ocorrer. Os atos que violam os direitos autorais podem ocorrer tanto no espaço físico como no digital. Dito de outra maneira: os sentidos do que é dito em um lugar está em relação ao que é dito em outro lugar.

REFERÊNCIAS

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Referências

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