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As narrativas do génio e da salvação : a invenção do olhar e a fabricação da mão na educação e no ensino das artes visuais em Portugal (de finais de XVIII à primeira metade do século XX)

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DA EDUCAÇÃO. As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão na Educação e no Ensino das Artes Visuais em Portugal (de finais de XVIII à primeira metade do século XX). Catarina Sofia Silva Martins. Doutoramento em Educação Área de Especialização em História da Educação 2011.

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(3) UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DA EDUCAÇÃO. As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão na Educação e no Ensino das Artes Visuais em Portugal (de finais de XVIII à primeira metade do século XX). Catarina Sofia Silva Martins. Orientador: Professor Doutor Jorge Ramos do Ó. Doutoramento em Educação Área de Especialização em História da Educação 2011.

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(5) UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DA EDUCAÇÃO. As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão na Educação e no Ensino das Artes Visuais em Portugal (de finais de XVIII à primeira metade do século XX). Catarina Sofia Silva Martins. Orientador: Professor Doutor Jorge Ramos do Ó. Doutoramento em Educação Área de Especialização em História da Educação 2011.

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(7) ÍNDICE GERAL. Resumo........................................................................................ 7 Abstract........................................................................................ 7 Agradecimentos............................................................................. 8 Objecto de estudo: linhas de construção e notas metodológicas............................... 10 Linhas de construção: introduzindo(-me).......................................... 11 Explicação de um método no interior da prática da escrita................... 17 Territórios de análise e linhas desta investigação............................... 22 Construindo uma cartografia: a possibilidade de deslocamento no processo de questionar evidências................................................................. 26 A ‘verdade’ do discurso e os mecanismos de exclusão......................... 33 Notas metodológicas: O ‘arquivo’...................................................... 38 A definição de uma estratégia na selecção e na leitura das fontes......... 40 Roteiro de escrita desta investigação: as séries discursivas e os problemas que organizam a investigação.......................................... 46 As narrativas de salvação em torno da Educação Artística.......... 52 Narrativas de salvação e criatividade................................................52 Uma genealogia da Educação Artística: porquê uma história do presente?......................................................................................54 O ‘amor pela arte’ como forma de salvação cultural.............................69 Sistemas de exclusão na produção da legitimidade: a prática do ‘cuidado de si’ e o ‘amor pela arte’....................................................71 As narrativas de salvação como fuga à barbárie.................................77 Enfrentando o ‘gosto’, ou, como fugir ao mito do ‘gosto’ inato................81 As actividades artísticas como uma das modalidades de ‘polícia’...............................................................87 Um começo para as artes: o conceito de polícia como tecnologia de governo....................................................................................87 O governo de todos e de cada um.....................................................95 A ‘governamentalidade’ e a produção de sujeitos auto-governados........99 As artes nos antípodas: nobres e marginais........................................106 O Colégio dos Nobres (1761): o desenho para ‘fidalgos’........................108 A Casa Pia de Lisboa (1780): de marginais a artistas............................114 O governo do corpo e da alma..................................................... 122 A construção de uma expertise sobre o desenho em Portugal e a circulação de saberes................................................................. 122 O discurso sobre o desenho em Portugal na viragem para o século XIX... .......................................................127 O desenho como o sublime tecnológico do século XIX..........................132 O estado do ensino do desenho em Portugal: os exemplos do estrangeiro.............................................................141 South Kensington e Viena de Áustria: o princípio da graduação no treino do olhar e no fazer da mão................................ 146 Treinar o olhar e fazer a mão: o desenho como tecnologia disciplinar......154 O discurso sobre o corpo no discurso sobre o desenho....... 157 O desenho no virar do século XIX: a Reforma de Jaime Moniz (1895).... 167.

(8) A ‘língua’ pedagógica num programa de desenho graduado..............177 O discurso pedagógico sobre a arte e o governo da alma do aluno.........180 A imagem no mapeamento da alma infantil..........................................185 Artífices ou artistas?: a necessidade de clarificar e repartir os domínios do sensível a partir da ‘aptidão’.................................................................................196 A mão em liberdade: do dom para o desenho à natural tendência da criança para desenhar........................................................................207 As lentes da alquimia no ensino do desenho............................................216 Os trabalhos manuais: ‘poderoso agente educativo’..........................................223 A gramática da máquina.....................................................................230 O desenho industrial: a gramática da máquina..........................................231 As escolas de desenho industrial: reproduzir para produzir........................234 Finalidades e organização disciplinar das escolas de desenho industrial e escolas industriais em finais do século XIX.......................................240 O desenho técnico em finais do século XIX: um desenho ‘quase’ futurista............245 O desenho de máquinas: a literacia visual e técnica...........................................250 O discurso da crise e o gesto ‘reformador’ no ensino técnico......................255 O génio como uma tecnologia de governo....................................260 O estatuto do artista-génio: a construção de um modo de ser ‘sujeito’...................261 A cegueira do génio: primeiras linhas para a sua desnaturalização........................265 Escritas de si: a biografia e a auto-representação na construção da tecnologia do génio....................................................268 Vocação e singularidade...............................................................271 A emergência do ‘eu’ como uma categoria psicológica............................279 Desdobramentos do ‘eu’.....................................................................288 O artista e a função ‘autor’ na modernidade..................................296 A genialidade como modo de fazer artistas na modernidade.................................304 A emergência de um discurso sobre o génio................................313 Génios e genes..........................................................321 A imagem do artista em Portugal: a ideologia dos dons naturais......................336 As condições de possibilidade do discurso da arte...........................................351 Uma arqueologia da arte: as regras da arte da pintura.........................................359 Da arte como um ofício ao ensino académico da arte................................374 As primeiras tentativas para um ensino das artes em Portugal: um percurso de irrealizações pontuado com alguns resultados.....................376 A fundação das Academias de Belas Artes: 1836, a institucionalização de um ensino académico de belas artes.......................................... 381 Os primeiros planos de estudos das Academias portuguesas de belas artes: um figurino cristalizado no tempo............................................................................385 Do governo e constituição da vida académica................................................394 A visibilidade do regime académico: alunos candidatos a pensionistas e artistas candidatos a professores..........................399 O discurso da crise e a necessidade da ‘reforma’do ensino de belas artes: um debate de ‘sempre’ em torno da salvação..................................407 O ideal de uma arte burguesa no feminino.........................................423 O lugar dos ‘grandes mestres’ no processo de formação do artista...........431 Arquivar o ‘eu’: relatórios de bolseiros................................................................436 O lugar dos mestres na escrita de si............................................439 A formação do artista académico a partir dos pensionistas portugueses no estrangeiro.......................................................................445 A crítica portuguesa a uma arte de elites .......................454.

(9) Linhas finais: os debates em torno da educação artística e do ensino das artes ...........................................................................463 Fontes Impressas..................................................................................472 Fontes Manuscritas..............................................................................496 Catálogos......................................................................................501 Índice de outras fontes documentais consultadas....................503 Legislação............................................................................................506 Debates Parlamentares..................................................507 Referências Bibliográficas............................................................................507.

(10) RESUMO As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão na Educação e no Ensino das Artes Visuais em Portugal (de finais de XVIII à primeira metade do século XX) configura-se como uma história do presente. A possibilidade que aqui se abre de traçar uma genealogia e uma arqueologia do nosso próprio pensamento acerca da ‘necessidade’ das artes na educação é a de desnaturalizarmos a evidência dessa mesma necessidade. A tese articula-se em torno de problemas específicos que encontram nas questões do autor e do génio, das narrativas de salvação e das tecnologias morais e disciplinares associadas ao ensino das artes visuais, - particularmente do desenho -, as linhas para a configuração de dispositivos de fabricação de determinados tipos de sujeitos. No longo arco temporal que nesta investigação é percorrido acedemos aos modos através dos quais se tornaram possíveis as nossas próprias formas de ser, de ver, de pensar, de agir e de sentir. É na historicização dessas ‘grelhas’ de pensamento que se tornam visíveis as condições que governam o presente. Imaginar outros devires para a educação e o ensino das artes passa, assim, por um profundo conhecimento do nosso próprio ‘arquivo’ discursivo e de nós próprios enquanto sujeitos cujo ‘eu’ se inventou na modernidade. Palavras-chave: génio; autor; ensino das artes visuais; desenho; educação artística;. ABSTRACT The narratives of genius and salvation: the invention of the gaze and the making of the hand in the Education and Teaching of Visual Arts in Portugal (from the late 18th to the first half of the 20th centuries) appears as a History of the Present. Tracing a genealogy and an archeology of our own thinking about the 'necessity' of the arts in education denaturalizes the common sense of this value. The thesis is structured around specific problems: author and genius, the narratives of salvation and the moral and disciplinary technologies associated with the teaching of visual arts, particularly the drawing. I am interested, in the long arc of time of this research, in studying how certain kinds of people are fabricated. The purpose is to access the ways in which our own ways of being, seeing, thinking, acting and feeling are made possible. In the historicizing of these 'grids' of thought what becomes visible are the conditions that govern the present. Imagine other becoming for arts education is only possible by a deep knowledge of our own 'archive' and of ourselves as subjects invented in modernity. Key-words: genius; author; teaching of visual arts; drawing; arts education;. 7.

(11) Agradecimentos As páginas que se seguem são a consequência de muitas perguntas e perplexidades. São parte de um percurso iniciado há cerca de quatro anos e são, sobretudo, o resultado de muitos encontros de pensamento. Mas não só. Foram encontros com pessoas, que geraram afectos, intensidades, ligações, discussões, incentivos, chamadas de atenção, risos, visões, partilhas, medos, confidências. Foram também as ausências próprias dos momentos de solidão que a escrita traz consigo, pelo menos aos olhos dos outros, porque para aquele que escreve, os autores são eles próprios a companhia da escrita. Antes de passar aos agradecimentos individuais aos meus amigos, companheiros de percurso e demais pessoas que permitiram que esta tese acontecesse, gostaria de referir em primeiro lugar a minha família. Muito principalmente registar o imenso apoio dos meus pais, Nelson e Branca, e a sua história de vida que é, para mim, um exemplo. A proximidade e apoio das minhas irmãs, Dália e Lena. O meu sobrinho, Filipe, por tudo o que ele é e pelo que me faz pensar. Mas também o Américo e o Álvaro pela proximidade das suas presenças. É com grande prazer que constato que uma tese nos muda a todos e que neste percurso também todos eles se transformaram, nomeadamente ao nível da compreensão que construíram sobre as exigências que a escolha de um percurso de investigação traz consigo. Inevitavelmente, a próxima pessoa a quem quero agradecer é ao meu orientador, Professor Doutor Jorge Ramos do Ó, por ter aceitado orientar esta tese, pela amizade, por me ter permitido elaborar conceptualmente o meu problema de investigação; por a cada passo, nos seminários de leitura que organiza no Instituto da Educação da Universidade de Lisboa, nos últimos anos, ter conseguido articular o que faz, pensa e é, com aquilo que é a própria prática da escrita. Foi nessa operatividade de que sempre fala, na disciplina que o pensamento exige em termos de sistematicidade e exaustividade, que me vi perante a possibilidade de ‘tecer’ a minha própria escrita. Mas foi também neste grupo que encontrei pessoas e amigos com os quais fui conversando e discutindo as questões que, de certo modo, são as ‘nossas’. Quero agradecer: à Helena Cabeleira, pelas conversas, pelos desabafos, e cumplicidades de uma amizade muito próxima que se iniciou em Lisboa, seguiu para Edimburgo, cidade do vento, voltou para Portugal e continuará vida fora; à Ana Paz, pela perspicácia e ironia dos seus comentários, pelo rigor do seu próprio pensamento; ao Tomás Vallera, ao António Henriques, à Maria Romeiras, pelo modo como dizem aquilo que investigam; à Lígia Penim, pela sua amizade calma e por todo o seu trabalho de investigação. Ao Luís Alberto Marques Alves por ter aceitado ler e comentar alguns dos primeiros momentos desta investigação. Um grupo semelhante, em termos de potência do pensamento, encontrei também em Madison, no Wed-group, espaço onde me cruzei com modos de ser investigador, marcados por um engajamento e uma disciplina pouco comuns. Com os participantes neste grupo aprendi e discuti muitas coisas importantes para este trabalho. Quero agradecer à Ruth Gustafson pela disponibilidade em conversar sobre os meus ‘problemas de investigação’ e pela disponibilização do seu próprio trabalho que em alguns pontos se toca com este. A Julia Koza, pela sua simpatia em me ter permitido assistir aos seus seminários e pelo seu rigor intelectual. Ao Daniel Friedrich, ao Ezequiel Caride, à Weili Wu pela forma como sempre me receberam em Madison. Um agradecimento muito especial a dois grandes amigos. Ao Tom Popkewitz, por me ter recebido na Faculdade de Educação da Universidade de Wisconsin-Madison de braços abertos. Madison é hoje uma das ‘minhas’ cidades e isso liga-se totalmente com as pessoas que lá encontrei, mas também com as imensas possibilidades de trabalho que a Universidade oferece aos estudantes e visitantes. Ao Tom quero agradecer pela enorme amizade que construímos ao longo destes últimos anos, pelas conversas, discussões e sugestões de leituras. Pelos passeios de barco no lago Mendota e pelos potluck em sua casa. Por todo o tempo que sempre arranja para conversar, ainda que seja por email. Pelo seu trabalho que é, para mim, um espaço pelo qual circulo para pensar o meu próprio trabalho. À Tita, por uma amizade já de muitos anos, mas que se tornou cada vez maior e incondicional nos últimos, por me ter acompanhado nesta viagem e me ter mostrado que ‘Youcali’ é um lugar em devir possível: ‘c’est presqu’au bout du monde, ma barque vagabonde, errant augré du l’onde, cherchant partout l’oubli, c’est le pays de nos désirs’.. 8.

(12) Ao Martin Lawn quero também agradecer a sua disponibilidade em receber-me no Centre for Educational Sociology, no qual passei mais de meio ano, aproveitando essencialmente esse momento para a realização de leituras teóricas. Queria ainda relembrar aqui todos aqueles companheiros de percurso do primeiro ano do Curso de Doutoramento em História da Educação, bem como os vários Professores que são uma referência ao nível da História da Educação em Portugal, a partir dos quais acedi a uma ‘realidade’ diferente daquela de onde provinha. No último ano de escrita deste trabalho, houve uma alteração significativa naquele que vinha sendo o percurso e o ritmo desta investigação. O meu trabalho como professora na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto trouxe-me novos desafios na articulação entre as minhas novas funções docentes e a escrita. Quero agradecer ao José Paiva, por todo o apoio e compreensão neste percurso, muito especialmente nestes últimos meses. Quero agradecer também aos meus estudantes do Mestrado em Ensino das Artes Visuais, pelas questões pertinentes que colocam e por me confrontarem sempre com as suas práticas enquanto docentes de artes visuais. Muito principalmente agradecer também aos meus primeiros orientandos de Mestrado, por me permitirem falar tanto sobre o que a escrita pode ser, fazendo-me pensar nas dúvidas que eles têm a partir do meu próprio trabalho. Daqui se soltaram pontas para um outro grupo, recentemente criado, e que avança pela aventura de um pensamento que só se imagina possível através de um intenso mergulho na leituraescrita-discussão. São as ‘conversas comestíveis’, alojadas entre a Gesto, o Identidades e o Núcleo de Educação Artística da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, e cuja emergência coincidiu com os últimos momentos desta escrita. Por último, quero deixar registados os agradecimentos institucionais. Já aqui referi a Faculty of Education da University of Wisconsin-Madison e a University of Edinburgh. Nas duas encontrei bibliotecas excepcionais e na primeira uma facilidade em estar sempre a uns minutos de qualquer livro que procurasse. Em Portugal, a Biblioteca Nacional, a Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian e o Arquivo da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, foram locais onde o trabalho se tornou ‘mais fácil’ pelo profissionalismo das pessoas que ali trabalham. Enquanto Bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, tenho de deixar aqui expresso o meu profundo agradecimento e dizer que sem esta Bolsa de Investigação nunca teria tido a oportunidade de realizar este trabalho.. 9.

(13) Objecto de estudo Linhas de construção e notas metodológicas. Fig. 1 – Sala do Metropolitan Museum of Modern Art, Nova Iorque, Catarina Martins, 2010.. “Porque não se pode dizer tudo. É preciso escolher. Mas na escolha dos documentos vai dominar um certo espírito; como ele varia segundo as condições do escritor, nunca a história será definitiva. É triste – pensavam eles. Porém, podia-se pegar num assunto, esgotar as fontes, analisá-las bem – e depois condensá-lo numa narrativa, que seria como que um resumo das coisas que reflectisse a verdade inteira. Uma obra assim parecia a Pécuchet exequível. - Queres que tentemos escrever uma história? - Não quero outra coisa! Mas qual? - Realmente, qual?” (Flaubert, 2003:112). “The role of genealogy is to record [...] the history of morals, ideals, and metaphysical concepts, the history of the concept of liberty or of the ascetic life; as they stand for the emergence of different interpretations, they must be made to appear as events on the stage of historical process” (Foucault, 1984 a: 86).. 10.

(14) Linhas de construção Introduzindo(-me) Narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão é um trabalho de carácter histórico que procura, na longa duração (desde finais de XVIII à primeira metade do século XX), identificar discursos e práticas que problematizem a educação e o ensino das artes visuais em Portugal. No essencial, interessa-me perceber, a partir de uma perspectiva genealógica, os modos como a educação artística foi problematizada e os processos históricos que constituem a racionalidade da importância das artes na educação das crianças e dos jovens portugueses. No longo arco temporal que aqui se abre, muito embora se convoquem não com a mesma intensidade, - dependendo dos problemas tratados -, períodos diferenciados, esta investigação entrega-se à compreensão do processo de naturalização das ideias e das práticas que nortearam aquilo que foi, no nosso país, o ensino artístico, ora de uma certa 'elite' artista, ora, em pleno século XIX, de um certo grupo 'anónimo' de futuros operários. A cindir os dois campos atrás anunciados esteve, desde cedo, a função 'autor'1. O autor como foco de emergência da obra original será analisado no seu modo de funcionamento nas sociedades ocidentais a partir das relações de poder2 e dos seus efeitos, que adquirem visibilidade nas figuras do mestre e do discípulo, e na activação do génio como uma tecnologia de governo. O génio, como equivalente da originalidade e do totalmente novo corresponde à irrupção, numa história linear, de um momento cuja explicação é a própria magia da sua aparição. O princípio organizador dessa história seria um único: evolução. Mas são essas sínteses já feitas, recortadas, já legitimadas na sua O problema que circunda a função autor foi colocado por Michel Foucault em dois momentos particulares que me interessa aqui sublinhar. O primeiro corresponde ao seu texto ‘O que é um autor’, resultado de uma comunicação à Societé Française de Philosophie, o outro, à sua lição inaugural no Collège de France, em 1970, que deu origem àqueloutro texto que circula como ‘A ordem do discurso’. Mais à frente irei explorar essa ‘função’ tal como ela foi inventada e assimilada como um dado natural no Ocidente, nomeadamente a correspondência entre a pessoa que produz e a obra produzida, e da obra como o reflexo da pessoa, tanto no campo da literatura quanto das artes em geral. O desdobramento a que se procede mostrará que a questão da originalidade é inseparável da figura do autor como um sujeito com uma personalidade particular. A partir da modernidade a obra não se desliga do sujeito que a ‘cria’. Perguntar-se-á quem a produziu, e é sob o nome do artista que esta se insere nos mapas de circulação, acredita-se que a obra se articula de um modo directo com a vida e a experiência do autor. Ora, estas ficções sem as quais hoje nos parece impossível escrever ou produzir objectos artísticos carregam em si todo o jogo de identidade, de individualidade e do ‘eu’ do sujeito que se liberta através da obra, tal como as ciências psicológicas os elaboraram durante a segunda metade do século XIX. No entanto, quando coloco em questão o autor, faço-o no sentido do autor como autoridade. Deste modo, esta desmontagem da figura do autor é pensada não apenas no campo das artes visuais como também se articula inteiramente com a escrita desta tese. Os autores aqui mobilizados serão considerados unicamente a partir do seu lugar enquanto instauradores de um discurso que se torna produtivo porque o é na potência que oferece à sua transformação pelo exercício contínuo de uma reescrita. O posicionamento assumido toma os próprios textos como objectos que se inserem em grelhas de possibilidade, e que fazem derivar outras combinatórias no texto daquele que arrasta essas vozes para a sua própria escrita. É nesse sentido que a escrita, como pensamento, se entrevê como uma construção em devir permanente. 2 Quando me refiro ao longo deste texto ao poder, faço-o numa mobilização do conceito a partir de Michel Foucault. Deste modo, o poder não deve aqui ser considerado como um ‘negativo’, como algo que simplesmente exclui, sujeita ou domina. Pelo contrário, os efeitos do poder são percebidos ao longo desta tese como ‘produtivos’ naquilo que é a fabricação dos sujeitos. Diz assim Foucault: “o indivíduo é sem dúvida o átomo fictício de uma representação ‘ideológica’ da sociedade; mas é também uma realidade fabricada por essa tecnologia específica de poder que se chama ‘disciplina’. Temos de deixar de descrever sempre os efeitos de poder em termos negativos: ele ‘exclui’, ‘reprime’, ‘recalca’, ‘censura’, ‘abstrai’, ‘mascara’, ‘esconde’. Na verdade o poder produz; ele produz realidade; produz campos de objectos e rituais de verdade. O indivíduo e o conhecimento que dele se pode ter se originam nessa produção” (Foucault, 2004 e: 161). 1. 11.

(15) validade que têm de ser questionadas. Pela minha parte, estou interessada em perceber como funcionam essas grandes narrativas. Como funciona o génio ainda hoje? A resposta passa pelo estudo das grelhas de racionalidade que permitem, no presente, a sua inteligibilização. O que me interessa, então, não é determinar a existência ou não de génios, mas antes perceber como a categoria 'génio' opera nos processos de subjectivação dos sujeitos. Enfim, em vez de um desdobramento transparente do génio e da liberdade humana, tentarei sempre recortar aquilo que é ‘insuportável’ ver-se recortar, em ir para outros locais que não os do gesto que articula aquele que é o autor das grandes obras. Será essencialmente o discurso em torno da possibilidade ou impossibilidade das aprendizagens artísticas que será aqui analisado. Diríamos que o ensino das artes, em Portugal3, viveu não numa posição antinómica, mas antes nessa ambiguidade da institucionalização do não ensinável, no campo das belas artes, e da elaboração, por outro lado, de uma gramática curricular bem definida e organizada sequencialmente, tendo em conta o aluno e o seu destino profissional, particularmente ao nível do discurso pedagógico sobre o desenho, no ensino liceal e técnico. A questão da genialidade e dos dons inatos, que acompanhou a figura moderna do artista, levou a que no ensino regular a educação artística fosse sendo remetida para as margens, dificilmente se equivalendo a um campo de conhecimento, por outro lado, a sua instrumentalização como uma disciplina manual reduziu-a a uma tecnologia disciplinar do corpo e da alma do aluno. Num e noutro caso, tratou-se, quase sempre, da produção de comunidades de leitores, ou seja, decifradores de um discurso que subjectivam como ‘verdadeiro’. A invenção do olhar e a fabricação da mão condensam em si o processo de confecção de observadores, quer na vertente de uma galeria de notáveis e de modelos que organizam e ordenam o saber a considerar, quer no lento apuramento auto-disciplinar de um olho e de uma mão eficientes. Pensar o devir da educação artística obriga-nos a fazer a história do seu presente. A perspectiva genealógica permite-me decifrar no presente linhas de continuidade nos modos de pensar a educação artística, mas também diferenças na sua configuração. Fundamentalmente, é importante perceber como se formou, e através de que matrizes institucionais se naturalizou, um modo específico de pensar a educação artística e o ensino das artes visuais. A discussão aqui aberta identifica discursos e práticas que nos mostram que as questões colocadas em torno da educação e da aprendizagem das artes raramente abandonaram a plataforma das narrativas de salvação cultural. No entanto, essa transformou-se num lugar de cegueira permanente. Ora, perceber os processos pelos quais as articulações entre a arte e o seu ensino foram sendo montadas, abre a possibilidade de compreender, hoje, as condições de existência de um pensamento que defende a necessidade das artes na educação de todas as crianças e jovens, tornando visíveis as arbitrariedades que fundam as maiores convicções depositadas na excepcionalidade da arte e da cultura4, bem Esta incompatibilidade entre a arte e o seu ensino, surgindo em pleno século XIX e não somente em Portugal, mas aliás com muito maior intensidade em França, continua a operar ainda hoje ao nível dos discursos que circulam sobre a educação e o ensino artístico. Bonnet e Jagot argumentam que esta ideia, que se desenvolve a partir do romantismo, era totalmente estranha ao período clássico: “L’idée que les artistes ne peuvent être formés, que l’enseignement des arts est un frein à la libre expansion du génie, marque fortement la conception actuelle de la création artistique” (Bonnet & Jagot, 2007: 31). 4 No capítulo teórico dedicado às narrativas de salvação, veremos como é nesta assimilação entre a arte e a cultura, como planos superiores e distintos, que se funda toda a discursividade que tem como objectivo legitimar um discurso universal de defesa da arte. Se pensarmos, como Nietzsche (2000), que todas as designações remontam a uma mesma metamorfose dos conceitos, percebemos os duplos gestos que elas contêm, operando sempre num mundo construído a partir de oposições binárias. É a partir do conceito de distinto e de nobre que, no plano social, a arte adquire um sentido como algo pertencente a um plano superior da alma, ou, todo aquele que com ela adquire uma relação de familiaridade, se vê e é visto como um privilegiado quanto à alma. “E este 3. 12.

(16) como linhas que nos são mais inacessíveis e que se relacionam directamente com a nossa própria construção enquanto sujeitos humanos. Perceber aquilo que somos hoje, os objectos que olhamos e as discussões que somos capazes de empreender, a partir da identificação de uma grelha de racionalidade totalmente contingente, é um dos desafios desta escrita. É essa a marca fundamental deste 'tempo da teoria' que hoje vivemos (Hunter, 2007). É essa também a marca de uma história que se quer do presente, isto é, de uma história que se dedica a mostrar que os objectos se constroem no interior de grelhas de práticas históricas que os tornam visíveis e dizíveis (Popkewitz, 2011). As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão é o título que melhor traduz os desdobramentos que as artes proporcionaram naquela que é também a história da produção do ‘eu’ do sujeito moderno. Deste modo, a subjectividade aparece mais como um processo construído na interacção do sujeito consigo mesmo, e em face dos outros, o mesmo é dizer, como uma longa e contínua tarefa que tem na interioridade o seu terreno de eleição e no movimento de exteriorização pela vinculação exaustiva e sistemática a uma tarefa, seja pela escrita, seja pela prática artística, a marca da sua inteligibilização. É na emergência mesma do ‘eu’ como uma categoria psicológica que se abre, nesta tese, a possibilidade de pensar a presença das actividades artísticas, no interior de instituições disciplinares, enquanto espaços laboratoriais para o desenvolvimento de ‘bons cidadãos’. Veremos esta articulação desenvolver-se a partir de um entendimento das artes como uma das modalidades de polícia, activada ainda no final do século XVIII, e num Estado que se constrói como um Estado governamentalizado, no qual saber e poder sobre ‘as coisas’ a governar se tornam um binómio inseparável. Para o leitor começa a ficar claro que esta se configura como uma história que tem no presente o seu ponto de partida. Na verdade, nos capítulos introdutórios da tese analisam-se discursos que, a nível nacional e internacional, vêm justificando a necessidade da presença da arte na escola. Só a sua historicização nos permitirá desnaturalizar essa ‘necessidade’. O enfoque hoje colocado na criatividade sustenta esse discurso, fornecendo a matriz de formação de um cidadão flexível e adaptado às incertezas do presente. No que procura ser, então, um modo de planear o futuro, plasma-se, antes, um modo de governar o presente. Uma outra discussão que me interessa muito analisar tem que ver com a forma como o debate da possibilidade de aprendizagem das artes, insuflado ainda por questões que têm no conceito e entendimento do artista como um génio a sua génese, é ele próprio um debate que se mantém ainda hoje activo. Por um lado, não se utiliza o nome ‘génio’ para designar a excepcionalidade, mas são outros os nomes que operam na linha desta tecnologia de governo. A recente exposição organizada pelo Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian é disso reflexo. Nesta mostra, a figura ‘professor artista’ continha em si a possibilidade da impossibilidade, isto é, a possibilidade de ser professor de algo que não se ensina. A possibilidade de os pensar, aos professores artistas, como aqueles que "foram capazes de ser simultaneamente o ser e o seu contrário", é também ela historicamente mapeável (Carlos, 2010: 13). Esta tese falará, sobretudo, da produção histórica de um determinado tipo de ser, o artista, e das múltiplas relações que se jogaram em volta desta figura e das suas produções, incluindo a produção histórica dessoutra figura que a esta primeira se contrapõe, o espectador. Teremos, por um lado, uma teoria assente na produção artística e, por outro lado, uma outra que tem na contemplação o princípio do seu funcionamento. É neste sentido que falarei do 'amor pela arte' como uma narrativa de distinção social que se destina, sempre, desenvolvimento”, diz Nietzsche, “corre sempre em paralelo com um outro que faz com que ‘vulgar’, ‘plebeu’, ‘baixo’, se transforme invariavelmente no conceito de ‘mau’” (Nietzsche, 2000: 24).. 13.

(17) a activar na figura do ‘Outro’, o desejo de pertencimento a um grupo que só o é por essa capacidade de ser 'diferente' de uma massa homogénea de sujeitos, e pela luta em se manter nesse estado de excepção. Já a questão do artista será acedida a partir da via aberta pela sua própria formação, nessa também necessidade de constituição de um corpus de saber visualmente informado, que foi encontrando solução quer através de períodos de permanência no estrangeiro, onde a frequência e a cópia dos 'grandes mestres' nos museus foi assaz frequente, quer através da circulação de uma galeria de génios nas publicações impressas. No entanto, é o conceito de génio como uma fabricação que será aqui explorado, e dizer isto não é dizer que o génio não é real. Pelo contrário, como uma classificação que incorpora modos de pensar sobre sujeitos, o génio como tecnologia pode ser visto como um ‘actor’5 nos modos como os sujeitos se vêem e conduzem a sua própria conduta. O debate acerca da importância das aprendizagens artísticas, no que ao nosso país diz respeito, cedo mobilizou actores no campo político, educacional, cultural e artístico. As razões terão sido diversas, mas dificilmente se situaram fora do intervalo que vai de um entendimento das artes como uma tecnologia moral, disciplinar e económica e o outro extremo da arte vista como uma tecnologia de distinção social. Ora, nestes espaços entre uma e outra plataforma foi-se estabelecendo o terreno dos 'possíveis' em torno do que era e do que deveria ser a educação artística, não só a nível especializado, como muito principalmente naquela que era a educação de todos os escolares portugueses. O movimento gerado entre estes dois espaços foi, no amplo plano social, marcando as diferenças entre aquilo que eram as artes maiores (belas artes), daquelas que eram as artes menores (artes e ofícios industriais). A sua configuração foi acontecendo a partir de uma expertise científica que não só no campo da arte mas principalmente, e com maior intensidade, no da pedagogia, se referiu duplamente ao estrangeiro. Por um lado, a consciência de que era nas arenas internacionais que se pensavam novas propostas gerava uma discussão em volta da desactualização, da inércia e do vazio de sentido das propostas nacionais, por outro lado, o estrangeiro era percepcionado como o modelo a seguir e a experimentar, em especial os exemplos de South Kensington e Viena de Áustria no que à democratização do ensino das artes dizia respeito. Já em inícios do século XX, os referentes eram outros. Todos eles gravitavam já em volta das propostas que pedagogos diversos, mas todos eles consensualmente lutando contra as pedagogias ditas tradicionais, e que se exprimiram nos projectos da Educação Nova e muito particularmente do conhecimento científico de uma ‘natureza’ da infância e da adolescência. A agenda das belas artes incorporou também em si essa geografia da internacionalidade, enviando bolseiros para estudar, primeiro em Roma, depois em Paris. O móbil era não só o das escolas, mas o da proximidade aos ‘arquivos’ dos grandes mestres. Compreender as condições de possibilidade de um discurso que sempre afirma a importância da arte mas denuncia o estado sempre por alcançar dessa ideia, e os efeitos que essas práticas discursivas particulares, que emergem em grupos singulares, provocam quando fazem de uma coisa singular algo de universal, é para mim outro dos desafios desta. Esta ideia de uma classificação como um ‘actor’ surgiu em conversas com Thomas S. Popkwetiz a propósito dos conceitos de Ian Hacking ‘making up people’ e ‘looping effect’. O que se pretende aqui explorar são os efeitos interactivos que as classificações operam sobre os sujeitos classificados. Recentemente Popkewitz explicava a dupla nuance da ‘fabricação’: “the autonomous subjects of research are responses to the [ontic] world by creating fictions about people of that world so research can identify the causes of their ‘problems’ and enable the development of social programs and policy. Fabrication is also the simultaneous making or fabricating people as theories, programs and other actions are to ensure people’s development” (Popkewitz, 2011: 1). Quando me refiro, portanto, a uma classificação como um tipo de actor, e neste caso ao ‘génio’, pretendo com isso abrir as perspectivas que esta classificação opera nos modos de ver, pensar e agir dos sujeitos. Enquanto ‘actor’ a classificação é, então, performativa. 5. 14.

(18) escrita. Por essa razão o leitor será por vezes confrontado com certas paragens que correspondem a momentos de explicação que procuram observar a historicidade de modos de racionalidade que hoje, por tão naturais nos parecerem, seguem inquestionáveis. A questão fundamental é uma: de onde vêm, como se formaram, as nossas concepções actuais sobre o que é e sobre o que deveria ser a educação artística em Portugal? Não é natural a ideia de considerar as artes como uma área e um mundo à parte e culturalmente superior. Não é natural a ideia de que as artes, não servindo de forma objectiva para nada, adquiram e com elas os seus produtores, um estatuto especial e diferente. Não é, portanto, natural, a ideia de que as artes devem, obviamente, fazer parte do currículo escolar do aluno enquanto criança e jovem porque seriam investidas de poderes de uma 'completude' humana. Mas dizer isto não é sequer pensar que as artes não devam fazer parte dos currículos escolares. Muito pelo contrário, poderemos admitir a pergunta: porque não aprendemos todos arte? Ou porque o aprendemos como o aprendemos? Que arte, - se é que o é -, se aprende nas escolas? Porque acreditamos que a arte é parte essencial do património cultural de um país e da construção da nacionalidade? Porque estabelecemos uma fronteira entre a arte como forma de ‘cultivo’ individual e a arte como profissão? Como se desencadeia o desejo de ser artista? Que tipo de práticas enformam a educação artística e o ensino das artes visuais na contemporaneidade? A literatura situada no campo do pósestruturalismo tem-nos vindo a mostrar que os educadores de hoje desconhecem as crenças e os imaginários que determinam que as suas práticas e os seus discursos sejam aquilo que são (Carroll, 1997; Bamford, 2009; Chalmers, 2004). Deste modo, ignorando a sua própria constituição, o devir da educação artística será o de uma repetição cega. O passado segue activo no presente como o afirma Nicholas Mirzoeff e, simultaneamente, é ‘invisível’ (in Dussell, 2008: 79). Esta escrita parte da análise do discurso do que tem constituído a educação artística no nosso país, quer pela voz de pedagogos e educadores portugueses, quer de políticos, artistas ou escritores. Muito embora esta tese se inscreva num campo que é o da História da Educação, as suas preocupações não se confinam somente a este campo. São várias as razões que o determinam. Em primeiro lugar, a formação inicial da autora destas páginas situa-se no campo das belas artes e da educação artística, mas fundamentalmente há outros factores a considerar. Fechar uma análise num campo disciplinar é fechar também todas as possibilidades de contágio que outros campos (também disciplinares, é certo) podem trazer à observação. Assim, centrei-me na análise do discurso do presente intentando a sua historicização, não no sentido ‘clássico’ de inventariação de factos do passado (porque é de história que se trata), mas antes no sentido da discussão de problemas que ainda hoje nos habitam. Quando se refere o ensino artístico tudo são evidências. Evidentemente que é essencial, evidentemente que tem de se investir nesta área, evidentemente que, sendo considerada fundamental, continua a ser colocada num segundo plano face às restantes disciplinas do currículo. Quando se trata das artes ninguém tem dúvidas em situá-las no topo de um necessário desenvolvimento pessoal e cultural, mas se ninguém tem dúvidas em afirmar o seu poder, raros são os que se esforçam no sentido de explicar a razão das suas crenças e convicções. Parece natural que as artes e a cultura artística sejam coisas importantes. Mas o que é evidente não o pode ser por si mesmo. O senso comum do valor das artes, ou da sua prescindibilidade, tem de ser tomado no seu sistema de racionalidade. O que é evidente tem, portanto, de ser explicado como o resultado de silêncios e acumulações que o vão constituindo como um dado natural. Basta, para nos desinstalar desta ideia tão comum da excepcionalidade da arte e do artista, o facto de nos referirmos à arte como uma invenção, ao artista como um personagem também ele recente, pelo menos enquanto elementos que parecem estar fora e acima dos condicionalismos humanos. Noções 15.

(19) que são hoje tão evidentes como as do artista e do criador, e do primeiro como um criador ‘incriado’ são “produto de um longo e lento trabalho histórico” (Bourdieu, 1989:288). De algum modo, a análise que aqui se empreenderá deixará desconfortáveis aqueles que nutrem um ‘amor pela arte’ julgado natural, mas que ainda assim teimam em alimentar. Ora, a necessidade cultural não é outra coisa que não o resultado de uma educação, quer ao nível do sistema escolar quer de um modo mais livre, dependente da origem social. O objectivo é então o de tomar as práticas discursivas na sua complexidade e de perceber como estas se desenham como as condições segundo as quais as práticas são exercidas. Não se trata de impor limites à suposta liberdade do sujeito, mas de perceber as regras e as relações que a sustentam. E estas, embora nos seja difícil admitir, estão em nós como a ‘voz’ do Estado. Termino esta curta introdução com a análise de Ian Hunter, no seu livro Rethinking the School: subjectivity, bureaucracy, criticism, quando o autor se dedica a problematizar o grande consenso da educação na contemporaneidade, que coloca no mesmo plano pessoas que se julgariam em campos opostos, e que eu gostaria de trazer até aqui, não para questionar o porquê desse consenso, mas antes para que, ao longo desta escrita, vá tentando responder ao modo como esse consenso se vai estabelecendo a partir da naturalização, e diria mesmo, da imposição de violências que não admitem sequer ser questionadas: “Virtually all academic discussion of the school system is marked by this single indelible characteristic. Whether it derives from the disciplines of sociology or philosophy or history – and whether it is politically inclined towards liberalism or Marxism or social democracy – this discussion is highly ‘principled’, in two closely related senses. First, it treats the existing school system as the (partial or failed) realisation of certain underlying principles. There are several such principles – democracy, equality, rationally, liberty -, but they all cohere around the notion of an ideal formation of the person. This is a formation that, through its freedom from extrinsic purposes and constraints, results in a ‘complete’ development of the faculties and thereby allows the person to know and govern their own conduct” (Hunter, 1994: xv). Sublinho a última parte do pensamento de Hunter, dizendo que as artes estiveram sempre articuladas, na modernidade educativa, a essa ideia de completude humana, e em simultâneo foram percebidos os seus poderes, – por uma tónica colocada na ‘liberdade’ –, na regulação da moralidade e da liberdade individual de cada um, no interior de um dispositivo de governo dos emergentes Estados-nação6.. Mais à frente, no capítulo dedicado às artes como uma tecnologia de polícia, desenvolverei não apenas o conceito de governamentalidade, como a sua ligação com a emergência dos modernos Estados-nação. No entanto, adiantarei aqui que a governamentalidade será tomada como uma arte de visibilidades, isto é, como uma arte que torna os sujeitos visíveis, a partir de um saber-poder, e uma arte de condução da conduta de cada pessoa, pela activação de técnicas e de tácticas específicas de relacionamento do sujeito consigo. 6. 16.

(20) Explicação de um método no interior da prática da escrita. “Não há diferença entre aquilo de que um livro fala e a maneira como é feito. Por isso, um livro já não tem objecto. [...] Perguntar-se-á com que é que funciona, em conexão com quê é que ele faz ou não passar intensidades, em que multiplicidades introduz e metamorfoseia a sua, com que corpo sem órgãos faz ele próprio convergir o seu. Um livro só existe pelo fora e de fora” (Deleuze & Guattari, 2006: 8, 9).. A tentativa de esboçar as questões gerais de um trabalho de investigação é sempre uma necessidade que se impõe e que permite ao leitor situar-se e antecipar, de certo modo, o desenrolar da investigação. Só isso é já demais porquanto compromete tudo aquilo que o investigador será capaz de mostrar, por um lado, e, por outro lado, a capacidade de activar no leitor o desejo de leitura do trabalho que se propõe. Mas por essa razão é sempre importante explicar aquele que é o próprio desejo do investigador durante todo o processo da escrita, o que equivale a deixar claro para o leitor as zonas para as quais será convidado e aquelas que não pode nunca esperar visitar em companhia daquela que escreve este texto. As palavras iniciais de Flaubert em Bouvard e Pécuchet são aqui colocadas como uma primeira imagem de que esta tese será apenas uma história possível entre outras histórias. A horizontalidade em que esta será escrita obriga a uma escrita que é ela própria rizomática. Um rizoma, dizem Deleuze e Guattari, em si mesmo tem formas muito diversas: "desde a extensão superficial ramificada em todos os sentidos até às concreções em bolbos e tubérculos" (Deleuze & Guattari, 2006: 15). Reservando esta imagem como uma metáfora que me acompanha em todo o processo de pensamento através da escrita, gostaria desde já de lançar o desafio de uma leitura que não se organiza a partir de uma linearidade. Este posicionamento obriga a que a leitura dos textos aconteça não já na busca das suas significações latentes, mas antes nas construções em que os próprios textos-objectos devêm na escrita. Deixa de ser o mito da interioridade o grande motor da escrita. Foucault explicou-o numa entrevista com o título ‘Sobre as maneiras de escrever a história’. O título marca essa ‘diferença’7 de sentido na mecânica ler e escrever, caracterizada para Michel Foucault, mas igualmente para outros como Roland Barthes, pela exterioridade. É na conexão de textos, que outros textos surgem: “[a crítica contemporânea localiza-se] no exterior de um texto, ela o constitui como exterioridade nova, escrevendo textos de textos” (Foucault, 2005 a: 70). Desse modo, a escrita não é já a operação de registo, nem de pintura, nem de gestos puros, mas de arrastamentos (Barthes, 2004).. Mas a marca dessa diferença, que começa pela questão já atrás abordada do ‘autor’, seria verdadeiramente questionada se o sujeito que escreve dispensasse para si o nome próprio que o localiza como o autor do texto ou da obra. O anonimato desapareceu do funcionamento da produção literária ou artística, mas o seu desaparecimento, por não ser ‘natural’, pode devir em qualquer outra modalidade. O apagamento do nome próprio seria a instauração do anonimato como o grande operador do funcionamento do texto em rastos de outros textos. 7. 17.

(21) Recuperando a ideia de ‘assemblage’ de Derrida8, não se trata, nesta investigação e pelo que no parágrafo de abertura se deixou escrito, de descrever uma história, nem de recontar os passos, texto por texto, contexto por contexto, mostrando a cada passo cada elemento, mas muito mais esta investigação se revê nesse gesto de colocar em conjunto, numa paisagem, algumas ideias que hoje nos parecem naturais, de fazer atravessar esses espaços por linhas que se intersectam e se afastam, ou de juntar algumas outras linhas que pareciam nunca encontrar-se. E é nessas geometrias traçadas na própria escrita que os sentidos e as forças dos problemas vistos através de lentes teóricas emergem naquela que é a sua história. Dizer isto é fazer da escrita um dispositivo no sentido aberto por Gilles Deleuze (1992), ele mesmo a partir de Foucault, como uma ‘máquina de fazer ver e de fazer falar’. Esta descrição de uma técnica de pensamento não é linear e obriga o investigador, no próprio acontecimento da escrita e na definição do seu território, a desinstalar-se dos territórios já desenhados por outros. É esse movimento que torna possível a formulação de um problema e a definição clara, para o próprio investigador, do modo pelo qual lhe vai pegar, que escolhas vai efectuar, que zonas vai percorrer. De toda a massa de dados consultada, que enfrentamentos trava com ela, qual e como convoca na própria escrita. A deslocação num território é aqui entendida no próprio acto performativo de fazer território, ou seja, de construir um mapa que a todo o momento procura libertar-se do gesto de decalque de cartografias já desenhadas. Mas dizer isto não é, também, recusar esses outros mapas. É antes percorrê-los nos seus espaços 'entre', um movimento sempre em agenciamento com os 'fora' dos territórios bem delineados. Assim, há alguns núcleos que gostaria de deixar esclarecidos: i) A narrativa que se segue constrói-se no desejo de conhecer e compreender a realidade educativa relativa às artes visuais em Portugal, num arco temporal que se quer propositadamente longo, que tem o seu ponto mais remoto em finais do século XVIII e que se prolonga até à primeira metade do século XX, para se vir encontrar com um presente que aparentando embora divergir, mantém algumas dessas mesmas estruturas lineares; diria que este é o enquadramento da minha tese e que sendo esta a paisagem, ela será, na sua horizontalidade de representação, feita de multiplicidades que se conectam entre si por 'caules' de sentidos, ou seja, por linhas cuja única ordem é a de responder aos problemas da investigação; deste modo, procura-se tornar evidente que o modo como pensamos e agimos é localizável historicamente em práticas e em grelhas de racionalidade específicas9. Assumo “It is not a matter of describing a history, of recounting the steps, text by text, context by context, each time showing which scheme has been able to impose this graphic disorder... rather, we are concerned with the general system of all these schemata. On the other hand the word ‘assemblage’ seems more apt for suggesting that the kind of bringing-together proposed here has the structure of an interlacing, a weaving, or a web, which would allow the different threads and different lines of sense or force to separate again, as well as being ready to bind others together” (Derrida, 1973: 131). 9 É nas condições e nos modos como os objectos se tornam pensáveis que me procuro focar, isto é, o que aqui se apresenta procura explorar as regras historicamente inscritas que dão inteligibilidade aos objectos do presente. Exploro isso noutros locais ao longo da tese, mas a ideia de que a educação artística tem como vocação proporcionar um completo desenvolvimento das capacidades humanas e muito especialmente da sensibilidade e da criatividade, por exemplo, é apenas uma das modalidades historicamente inscritas em sistemas de razão que permitem fabricar e governar tipos de sujeito. O princípio que orienta o meu pensamento é o de que os modos como pensamos, vemos, dizemos e sentimos não podem ser percebidos fora dos princípios inscritos historicamente e que circulam dando forma aos próprios princípios da prática. Por essa razão não se estabelece aqui uma linha de separação entre a teoria e a prática, ambas se encontram entrelaçadas. Thomas S. Popkewitz (2011) argumenta que a categoria ‘jovem’, por exemplo, enquanto modo de classificar um estado e tipos de pessoas só se torna inteligível porque foi historicamente possível ver, pensar, agir, sentir e planear esse mesmo estado. Desse modo, neste caso particular, o que ao historiador do presente importa é explorar as condições que 8. 18.

(22) plenamente o risco de me situar fora do que convencionalmente se designa por História da Educação, não somente por as minhas questões se situarem num enredamento desta com outros campos disciplinares, mas porque me interessa mais o foco nos sistemas de racionalidade que comandam a própria investigação em História da Educação do que a fixação num desses nichos temáticos que teriam como meta o alcance de uma história total, por exemplo, sobre a educação e o ensino das artes visuais em Portugal. Mas não nego, no entanto, que a visita ao arquivo, - aqui entendido como uma mole de discurso funcionando segundo regras específicas -, tão do ofício daquele que é historiador é o grande eixo impulsionador da escrita. Devo advertir, no entanto, que ao arquivo do passado se junta o arquivo do próprio presente como sendo o arquivo de práticas discursivas particulares que se naturalizaram. ii) Não se centrando sobre nenhum nível de ensino específico atravessa, por outro lado, níveis diferenciados cujo elemento de ligação não é senão discursivo10; iii) Não se centra apenas nas questões do ensino artístico, mas de um modo mais abrangente alastra-se ao território da educação artística11. Inevitavelmente terei de me centrar sobre o desejo e o medo da modernidade, quer dizer, sobre o sistema de racionalidade que vê na ideia de civilização e cultura a sua tarefa contra o barbarismo. Três enunciações que determinam a economia desta escrita, num equilíbrio, que terá de ser continuamente procurado, entre a teoria e o arquivo12, entre grandes territórios e arcos temporais também eles longos, entre aquilo que poderia ser por outros considerado uma panóplia de diferenças e aquilo que a investigação me permite ver como obedecendo a algumas, e não muitas, invariantes. Ora, a objectivação desses invariantes coloca-nos face a uma paisagem que, julgando-se embora hoje muito diferente daquela que começou por colocar em cena as questões relacionadas com a educação e o ensino das artes, permanece funcionando segundo uma grelha de racionalidade muito próxima. Deste modo, assumem forma algumas variáveis que são a condição de existência dos modos como nós, no presente, nos relacionamos com esse campo. No dizer de Deleuze (2005: 157), é um trabalho mais próximo da investigação histórica do que do trabalho de historiador, porque é uma fabricam esse espaço como um espaço de verdade. Este gesto implica tomar essa mesma construção como um ‘evento’ que só é possível como ‘pensamento’ e como um objecto de acção, através da assemblagem e conexão entre diferentes práticas sociais, institucionais e culturais. É também segundo esta orientação, que empreenderei este estudo. Procurarei mostrar, por exemplo, que a construção do artista como um ‘génio’, por exemplo, mas também das artes como uma forma de ‘completude humana’, são eventos explicáveis não por um retorno a uma origem, mas antes pela colocação teórica de grelhas de possibilidade que lhes conferiram sentido e que, desse modo, permitiram a sua ‘visualização’ e os seus efeitos, em formas particulares. 10 Haverá, é certo, uma abordagem diferenciada do ensino artístico de belas artes e do ensino artístico técnico e secundário. Mas não é tanto no estabelecimento destes diferentes nichos que me interessa focar. Ainda que estas ‘divisões’ correspondam a diferentes distribuições dos sujeitos em lugares sociais, com diferentes estatutos a eles anexados, é o discurso sobre as artes e os modos através dos quais esse discurso se mobiliza na fabricação de sujeitos que quero aqui estudar. 11 Por vezes ambas as designações são abordadas, educação artística e ensino artístico. No entanto, quando me refiro ao ‘ensino’ são mais as questões da ordem dos saberes construídos para serem assimilados pelo aluno que são objecto de atenção; quando me refiro à educação artística, o campo de análise é mais alargado e menos pormenorizado quanto a conteúdos. 12 Mais adiante explicarei o modo como mobilizo o conceito de arquivo. No entanto, desde já gostaria de deixar claro que não estabeleço uma separação entre uma suposta teoria que teria a sua efectivação ou comprovação nas fontes ou na prática. A divisão não é senão artificial. Para o investigador, a escrita começa no próprio arquivo. É nele que se constituem, através de lentes teóricas, os problemas que mobilizam a escrita.. 19.

(23) investigação centrada nas condições sob as quais as ‘coisas’ têm uma existência real, sob um regime de luz particular. Ficará desde já explicitada a ideia de que o eixo estruturante desta tese, em termos temporais, não se orienta por cronologias políticas. A posição genealógica em que me coloco leva-me a perceber que não são as mudanças de regime, - monárquico, republicano, ditatorial ou democrático -, que operam mudanças significativas no modo como se concebe a educação e o ensino das artes, muito embora não negligencie o facto de que na minúcia da lei se poderá assistir a uma afinação, desenvolvimento ou abandono de certas ideias, na mudança de um para outro regime. Mas o essencial, e que me parece a mim significativo, é que o modelo escolar13 de que se fala é o mesmo e são os mesmos os grandes objectivos da educação pública há pelo menos centúria e meia de anos, bem como são as mesmas as crenças que têm vindo a ser depositadas na capacidade potencialmente transformadora da arte14. Dizer, portanto, que a matriz desta escrita não obedece a uma cronologia política, é concordar com Paul Veyne, autor para o qual a escrita da história depende sempre das perguntas que se formulam face àquilo que se designa por facto histórico. Ora, não é negar o facto histórico porque a história, materialmente, se escreve a partir do facto histórico, mas conceptualmente se escreve “com problemáticas e conceitos” (Veyne, 1989: 6). Os conceitos são as linhas que constroem e dão simultaneamente sentido aos problemas que orientam esta escrita. Além do mais, importa não apenas detectar as descontinuidades, mas também as continuidades que se estabelecem mesmo nestes largos arcos temporais, de tal modo que se constituem como ‘verdades’ inquestionáveis do presente. Não é esta, por isso, uma tese que encontre o fio da sua narrativa em instituições de ensino artístico especializado. As razões são não apenas metodológicas, como da própria ordem dos problemas que aqui me interessam focar. Ao nível prático cedo se verificou a impossibilidade de aceder de forma igualitária aos arquivos das Academias e Escolas Superiores de Belas Artes de Lisboa e do Porto. Há que referir que ao contrário do arquivo da escola de Lisboa, o do Porto não só abriu a possibilidade de consulta e cópia de documentos, como, mais recentemente e coincidindo já com uma fase mais final de elaboração desta tese, iniciou um trabalho de disponibilização aberta, a partir do seu site na 13 Tal como nos mostram alguns trabalhos históricos no campo da educação, o modelo escolar do presente é em tudo semelhante àquele que se impôs durante o século XIX. David Tyack e Larry Cuban referiram-se ao conjunto dos elementos que compõe o processo de escolarização, dos métodos aos actores e aos espaços, como sendo essa gramática escolar: “The basic grammar of schooling, like the shape of classrooms, has remained remarkably stable over the decades. Little has changed in the ways that schools divide time and space, classify students and allocate them to classrooms, splinter knowledge into ‘subjects’, and award grades and ‘credits’ as evidence of learning” (Tyack & Cuban, 1995: 85). Em Portugal, historiadores da educação como Jorge Ramos do Ó sublinham também essa resistência à mudança e à dificuldade de imaginar um outro modo de funcionamento escolar: “O modelo escolar que temos hoje é um modelo que foi criado no final do século XIX e que se baseia, estruturalmente, digamos assim, na construção de grupos homogéneos de alunos que progridem por classes e onde existe sempre uma correlação entre a idade do aluno e o saber que lhe é fornecido. Estes grupos-classe são, ainda, constituídos por regimes de avaliação muito próximos e o conteúdo ministrado é um conteúdo racionalista, que podemos dizer que visa construir através das disciplinas do plano de estudo uma visão racional e articulada da realidade, que tem dentro dela um modelo intelectual que consiste em imaginar que o mundo é um mundo completo” (Ó, 2007: 110). 14 Os contextos em que tenho centrado de forma mais próxima a minha investigação são os Europeu e NorteAmericano. As questões atravessam e cruzam os dois territórios e organizam-se na procura da evidência de que a educação artística é benéfica para o sucesso dos estudantes na escola e na vida. Muito embora, hoje, o enfoque na personalidade criativa e flexível atinja níveis de sofisticação muito convincentes, o que a mim me interessa é mostrar que no imaginário dessa ‘personalidade’ vivem tipos de pessoas particulares. Assim, aquilo que se mostra como o ideal a atingir é tão somente a organização de modos de vida particulares, totalmente contingentes em termos históricos e culturais e que pretendem funcionar como princípios universais, não deixando espaço para imaginar outras formas de vida.. 20.

Imagem

Fig. 1 – Sala do Metropolitan Museum of Modern Art, Nova Iorque, Catarina Martins, 2010

Referências

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