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Uma dança para o figurino: análise e criação do figurino para dança contemporânea

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CAMILA CRISTINA RODRIGUES GUERREIRO

UMA DANÇA PARA O FIGURINO:

ANÁLISE E CRIAÇÃO DO FIGURINO PARA A DANÇA

CONTEMPORÂNEA

NATAL – RN 2016

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CAMILA CRISTINA RODRIGUES GUERREIRO

UMA DANÇA PARA O FIGURINO

ANÁLISE E CRIAÇÃO DO FIGURINO PARA A DANÇA

CONTEMPORÂNEA

Relatório final, apresentado a Universidade Federal Do Rio Grande Do Norte, como parte das exigências para a obtenção do grau de Licencianda em Dança.

Orientadora: Profª. Dra. Maria De Lurdes Barros da Paixão

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CAMILA CRISTINA RODRIGUES GUERREIRO

UMA DANÇA PARA O FIGURINO

ANÁLISE E CRIAÇÃO DO FIGURINO PARA A DANÇA

CONTEMPORÂNEA

Relatório final, apresentado a Universidade Federal Do Rio Grande Do Norte, como parte das exigências para a obtenção do grau de Licencianda em Dança. Sob a orientação Professora Dra. Maria De Lurdes Barros da Paixão.

APROVADA EM __/__/2016.

Banca Examinadora

Profa. Dra. Maria de Lurdes Barros da Paixão Orientadora

Prof. Esp. Paulo Honório da Costa Fonseca 1º Membro

Prof. Esp. Ewerton Emanoel Fernandes de Medeiros 2° Membro

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha mãe, aos meus avós, à minha família, aos meus amigos e à Iuri Dantas (In memorian) por toda alegria e amor que trouxe a esse mundo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus por me dar a dádiva da vida, a força e a fé para vivê-la e não desistir daquilo que almejo.

Agradeço à minha mãe Sônia Guerreiro, minha avó Maria da Paz e meu avô Raimundo Nazareno, por todo apoio e amor incondicional, por todo esforço em me proporcionar a melhor educação e formação possível, sem vocês eu não teria chegado até aqui! Mãe, Vovó e Vovô, vocês são os pilares da minha vida! Aos meus familiares e em especial às minhas tias que apesar de tão pequenas tem um coração enorme!

Aos queridos amigos que tanto me incentivaram e me colocaram pra cima nos momentos mais difíceis! Aos companheiros de Biodanza, aos companheiros de moradia do nosso querido QG, e em especial a Alyne, Ananda, Analice, Iana, Léo, Lívia e Victor, vocês são especiais!

Agradeço a orientação especial da professora Maria de Lourdes! Gratidão pela paciência, pela atenção e pelos puxões de orelha também, você transformou os meus "mulambos" e minha imaturidade artística em conhecimento e movimento!

Meu muito obrigado aos professores e companheiros de turma, aprendi e aprendo muito com vocês ao longo destes anos!

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UMA DANÇA PARA O FIGURINO:

ANÁLISE E CRIAÇÃO DO FIGURINO PARA A DANÇA CONTEMPORÂNEA

RESUMO

O Figurino da dança abrange estudos sobre cores, formas, corpo e dramaturgia na cena da dança contemporânea. Objetiva-se neste trabalho reunir conhecimentos acerca do figurino e seus processos de criação entendendo-o como elemento estético dramatúrgico. Acredita-se que este trabalho venha contribuir na lacuna existente de estudos específicos sobre o figurino para a dança, assim o presente trabalho visa ampliar as discussões e proposições acerca do figurino, arguindo-se sobre: “o que usar?”, “Como usar?” e “Para que usar?”. Estas questões podem proporcionar aos artistas e educandos vivenciarem experiências de criação e produção de sentidos na concepção do figurino. O trabalho se orienta com base nos referenciais epistemológicos e metodológicos da pesquisa cartográfica. O trabalho desenvolve estudos críticos e reflexivos sobre processos de construção do figurino para dança contemporânea e identifica pistas que surgem a partir do olhar estético sobre os figurinos estudados, visando a elaboração do figurino para dança.

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A DANCE FOR THE COSTUME:

ANALYSIS AND CREATION OF THE COSTUME FOR CONTEMPORARY DANCE

ABSTRACT

The Dance Costume covers studies of colors, shapes, body and dramaturgy in the contemporary dance scene. The objective of this work is to gather knowledge about the costumes and their creation processes, understanding it as a dramaturgical aesthetic element. It is believed that this work will contribute to the existing gap of specific studies on costume for dance, so the present work aims to broaden the discussions and propositions about the costume in both the artistic and educational scope of dance teaching, raising questions: "What to use? ", " How to use? " and " For what purpose?". These issues can provide artists and learners experience of creating and producing senses in the design of costumes. The work is oriented based on the epistemological and methodological references of cartographic research. The work develops critical and reflexive studies on the processes of construction of the costume for contemporary dance, identifies the clues that arise from the aesthetic look on the costumes studied, aiming at the elaboration of the costumes for dance.

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Sumário

1. INTRODUÇÃO ... 9

2. O FIGURINO DA DANÇA ... 13

2.1 Breve Histórico ... 13

2.2 Conceitos Possíveis e Contemporaneidade ... 16

3 – PROCESSOS CRIATIVOS E SEUS FIGURINOS ... 22

3.1 - Ter/ser ... 22

3.2 – Amaré ... 24

3.3 – Entrepele ... 26

3.4. Elementos Estéticos... 28

4. O QUE? COMO? POR QUÊ? ... 30

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 33

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1. INTRODUÇÃO

Na dança temos uma dramaturgia escrita com o corpo, cheia de significados, que nem sempre podem ser expressos em palavras e sentidos literais. Mas não é apenas o corpo em movimento que escreve a poética de um espetáculo: iluminação, som ou a ausência de sons, cenário, figurino e maquiagem são elementos dramatúrgicos fundamentais à construção da cena e seus entendimentos.

O figurino é o elemento cênico mais próximo do intérprete, como uma segunda pele e, pode garantir o sucesso do espetáculo ou vir a interferir na técnica do bailarino e até na fruição estética do espectador. Tecidos, cores e formas alteram a plasticidade do corpo do bailarino e sua experiência sensorial e motora, alguns interferem mais que outros, um exemplo dessa reconfiguração são os figurinos do Balé Triádico:

“...os figurinos do Balé Triádico alteravam, mesmo que só no momento da performance, as configurações sensório-motoras do corpo, pois são estruturas, as quais, acopladas ao corpo, interferem e alteram as possibilidades de movimento, velocidade, agilidade, alcance do corpo no espaço.” (DINIZ, 2012, p. 43)

Enquanto aluna do curso de Licenciatura em Dança da UFRN, coloco meus questionamentos e experiências como parte do trabalho, pois a motivação para escrevê-lo surgiu ao escrevê-longo deste curso, em diversas disciplinas e processos criativos propostos e vivenciados. As perguntas “o que vou usar em cena?”, “Como usar?” e “Por que usar?” surgiram diversas vezes ao longo do curso, e nem sempre obtive respostas satisfatórias.

As referências metodológicas acerca da criação de figurino geralmente originam-se dos estudos teatrais, e não parecem dar conta das particularidades da cena de dança. Alguns processos criativos fornecem pistas ou possibilidades de criação de figurino, no entanto, a sensação de inadequação entre a proposta dramatúrgica e as escolhas de figurino surge em alguns momentos, motivando a ampliar a pesquisa a partir de referenciais epistemológicos teóricos e imagéticos das artes cênicas, das artes visuais e da moda, além de uma observação mais atenta de espetáculos artísticos abaixo relacionados: A cura, A cura 2.0, Proibido Elefantes, dentre outros espetáculos do grupo Gira Dança (RN); Rio Cor de Rosa e Bodas de Sertão, da Cia. De dança do Teatro

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Alberto Maranhão (RN); Violência do grupo Cena 11 (SP), bem como espetáculos dos grupos: Quasar Cia. De Dança (GO), Grupo Corpo (MG), dentre outros.

O presente trabalho objetiva desenvolver e sistematizar conhecimentos sobre o figurino na dança, a partir da investigação e análise de processos de construção do figurino, no contexto da dança contemporânea, bem como, pretende contribuir na identificação de pistas para novos processos criativos e metodológicos na construção do figurino para dança.

O conceito de dança contemporânea a qual este trabalho se refere é a dança pós-moderna contemporânea à luz dos conceitos: da ironia e da paródia, como uma forma de questionar determinados valores sociais. A dança pós-moderna contemporânea preocupa-se com os questionamentos e não com produtos e conceitos fechados e finalizados. O pós-moderno é, segundo Linda Hutcheon:

“[...] no mínimo, uma força problematizadora em nossa cultura atual: ele levanta questões sobre (ou torna problemáticos) o senso comum e o “natural”. Mas nunca oferece respostas que ultrapassem o provisório e o que é contextualmente determinado (e limitado).”. (HUTCHEON, 1947, p. 13)

O presente trabalho se justifica a partir das dúvidas que surgiram ao longo dos processos criativos durante as disciplinas do curso de licenciatura em dança, bem como a dificuldade em encontrar referenciais teórico-práticos sobre o figurino da dança. Acredita-se que esse estudo venha contribuir com uma lacuna existente de trabalhos específicos de figurino para a dança.

A metodologia adotada neste trabalho é baseada em estudos qualitativos e descritivos, por entender a dança como uma arte produtora de subjetividades ancoradas em diferentes dramaturgias. O livro Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade serve como referencial metodológico e epistemológico da pesquisa cartográfica e orientam estes escritos a partir das ideias apresentadas pelos autores Virginia Kastrup Eduardo Passos e Liana da Escócia ( 2010). Para estes autores a ideia de que cartografar coaduna-se com o objetivo destes estudos que é o acompanhar dos processos, que por sua vez é uma das pistas discutidas neste livro. O método de pesquisa cartográfico foi formulado com base nas ideias de Gilles Deleuze e Félix Guattari (1995) e propõe-se a acompanhar e analisar processos

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distancia-se da proposição de criar um conjunto de regras abstratas a serem realizadas em cada pesquisa.

Os referenciais estéticos e imagéticos têm como base os figurinos nas artes cênicas, no entanto julga-se necessário refinar a pesquisa em busca de trabalhos que tratam especificamente do figurino para a dança. Assim, a tese de mestrado intitulada: Vestíveis em fluxo: a relação implicada entre corpo, movimento e o que se veste na cena contemporânea da dança, de autoria de Caroline de Paula Diniz utiliza os termos “dança” e “figurino” e pareceu ser a mais adequada à proposta de estudos e pesquisa do presente trabalho. A tese investiga a relação entre o corpo e o figurino na dança contemporânea. Além de ser um dos principais referenciais epistemológicos deste trabalho, serve como ponte para outros referenciais teóricos utilizados, a título de exemplo vale citar: a tese de Amabilis de Jesus Silva Figurino-penetrante: um estudo sobre a desestabilização das hierarquias em cena (2010), o livro O Design de aparência de atores, e a comunicação em cena de Ramos (2013) bem como, o Dicionário de Teatro de Patrice Pavis (2007).

Um caminho bastante conhecido na criação em dança inicia-se com a investigação ou proposição de movimentos, a coreografia, e o movimento. Estes são os primeiros elementos a serem pensados, e os demais elementos cenográficos são acrescidos ao longo do processo como destaca Diniz (2012, p.50) “(...) a ordem comumente utilizada num processo de criação em dança, em que, primeiramente se constrói a coreografia para que, depois, os elementos venham a “emoldurar” o que já está organizado no corpo.”.

Nessa perspectiva, os elementos da cena ganham vida e significado através do ator ou bailarino a partir de suas ações, porém quando o contato com alguns elementos cênicos acontece próximo à apresentação do processo criativo, podem sobrepor àquilo que já foi construído e podem causar insegurança ao intérprete ou ficar obsoletos em cena, caso não sejam bem explorados. O ideal é que a interação entre os elementos cênicos e o corpo do intérprete aconteça de forma coesa e orgânica.

Para pensar a proposição do figurino, uma série de fatores técnicos deve ser levada em conta, como a escolha criteriosa do tecido, corte e costura que serão efetuados com o objetivo de dar conforto e segurança ao bailarino. No entanto, além de conhecimentos técnicos, desenho e construção do figurino, um figurinista também deve

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conhecer as particularidades de cada linguagem artística: dança, cinema, teatro, artes visuais, dentre outras, embora as diferentes formas de arte possam dialogar entre si e relacionarem-se, cada uma possui especificidades cênicas, estéticas, expressivas e dramatúrgicas.

O figurino deve ser criado e idealizado em seus aspectos estéticos, a saber: forma, cor, dentre outros, assim pretende-se investigar como tais aspectos relacionam-se e apresentam-se na dramaturgia da dança contemporânea, e como pensá-los no processo de construção do figurino para a cena de dança. Tais aspectos estéticos serão discutidos através da análise de três processos criativos que foram desenvolvidos dentro das disciplinas do curso de Licenciatura em Dança da UFRN: Laboratório de Composição Coreográfica I e Laboratório de Composição Coreográfica II.

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2. O FIGURINO DA DANÇA

2.1 Breve Histórico

“Em todas as sociedades e culturas permanece a necessidade de investir o corpo com signos e símbolos que organizam o sujeito, o qual corporifica os nexos de sentido estabelecidos em cada ambiente.” (DINIZ, 2012, p. 22) O figurino enquanto elemento estético faz parte da visualidade da cena, e por suas potencia de traduzir e transmitir signos e sentidos torna-se um elemento dramatúrgico, a partir da ação que é construída na cena. Ao longo da história, o figurino transformou seus modos e funções e esteve por muitas vezes ligado à moda e principalmente aos costumes de cada época, e por muito tempo serviu apenas para embelezar os corpos do bailarino. Destaca-se aqui, alguns marcos importantes na história do figurino, especialmente os figurinos da dança, a partir da proposta do Balé de Ação, onde houve uma transformação importante na técnica e estética da dança.

Com o advento da estética naturalista/realista os figurinos passam a ter uma relação maior com as representações artísticas, assume a função de caracterizar os personagens, distingue idade, classe social, características de personalidade e de contexto histórico. Na dança, o balé de ação proposto por Jean-Georges Noverre (1727 – 1810) oferece a dança expressividade e autonomia, desloca-se dos palácios, da corte de Luís XIV com seus trajes suntuosos e danças para divertimento, e transporta-se para o teatro, assim, a dança assume uma nova estética, inclusive em seus figurinos que passam a dar liberdade de movimentação e expressão ao corpo do bailarino (DINIZ, 2012).

Graças às inovações propostas por Noverre em seus figurinos cheios de leveza e drapeados surgem outras inovações estéticas no figurino para dança que merecem destaque, a partir do vestuário de duas bailarinas e suas proposições cênico-dramatúrgicas: Marie Anne de Cupis de Camargo (1710 – 1770) e Marie Sallé (1702 – 1756), ambas contemporâneas de Noverre, diminuíram as saias e deram mais movimentos a roupa e aos seus corpos, a atitude dessas bailarinas foi considerada ousada para a época. O figurino de Marie Sallé consistia em uma túnica drapeada, de estilo grego. A bailarina La Camargo, cuja dança era de característica vivaz, diminui sua

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saia e segundo Bourcier (2000) “Conta-se que, em virtude da elevação de sua dança, ela inventou a “ceroula de preocaução”, ancestral do collant.” (BOURCIER, 2000, p. 181).

No período do balé romântico, Marie Taglione (1804 – 1884) foi a figura mais emblemática da época, segundo Bourcier (2000) foi graças a ela que o balé evoluiu. O balé La Sílfide (1932), foi fundamental para essa evolução do ballet, que foi tanto técnica quanto estética. Neste espetáculo Marie Taglione, inaugura o que será o tutu romântico e consolida a técnica das sapatilhas de ponta, seu figurino consiste em:

“um vestido esvoaçante, confeccionado com anáguas de musseline, as quais produzem um volume na saia de crepe branca inaugura um figurino, desenhado por Eugenio Lami e inspirado na moda da época, o qual cristalizou a imagem da bailarina replicada até os dias atuais.” (DINIZ, 2012, p. 35).

Figura 1 - La Sílfide

Fonte: http://www.wikiwand.com/pt/La_Sylphide

A dança ganha novos rumos na virada do século XIX para o século XX com o advento da dança moderna, que visa traduzir em movimentos a expressão humana, a valorização do indivíduo, suas emoções, e a sua relação com a natureza. Dentre os vários artistas que fizeram parte deste movimento, destaca-se Isadora Duncan (1877 – 1927) e Loie Fuller (1862 – 1928), por suas contribuições dadas a cena de dança, e seus respectivos figurinos.

Com o desejo de traduzir a expressão humana, expressar sua paixão pela vida e romper com o tecnicismo do balé clássico, Isadora Duncan inspira-se na tragédia grega

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para criar suas danças e seus figurinos. Isadora Duncan dança descalça e seu corpo é adornado com túnicas em estilo grego que proporcionam a seu corpo liberdade de movimentos e expressividade.

“Isadora acreditava em uma dança que pudesse expressar a beleza das formas na embriaguez do corpo em plena vibração. Para ela, tais possibilidades da dança, outrora vividas na tragédia grega, haviam sido negadas pela metodicidade e artificialidade do balé clássico. O dionisíaco ressaltado por Isadora, como em Nietzsche, é aquele que se encontra na união entre a essência e a aparência.” (PORPINO, 2006, p. 31).

Loie Fuller nasceu em Chicago, e no começo de sua carreira mudou-se para Paris, ficou famosa a partir de sua proposta de “dança luminosa” que relaciona corpo, movimento, luz e figurino. Seu figurino consiste em longos tecidos, parte presos ao corpo e partes soltas. Os tecidos são manipulados através de varetas presas aos braços da bailarina, prolongando o alcance do tecido no espaço. A harmonia entre os elementos dispostos na cena cria uma dança hipnótica e transforma o corpo da bailarina em diversas formas encontradas na natureza, que compõe os seus espetáculos: a serpente, a orquídea, a mariposa, a nuvem, dentre outras formas.

“[...] a artista estrutura sua dança poética e hipnótica, por meio da ação relacional entre movimento, figurino, luz e cor. O vínculo entre os elementos organiza uma dança que só acontece nesse jogo de coimplicância e simultaneidade entre todos eles. O figurino reconfigura o corpo de Fuller em um espaço mutante, mutável, o qual funciona como extensão fluida que, vinculado ao corpo em movimento, projeta e esculpe a cor no espaço.” (Diniz, 2012, p. 39).

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Figura 2 - Loie Fuller

Fonte: http://www.absolutmadrid.com/el-arte-de-la-danza-de-loie-fuller-en-la-casa-encendida/

Esse breve relato histórico é fundamental na compreensão deste extenso universo que o figurino da dança representa, bem como auxilia na compreensão de como se dá as proposições do figurino na contemporaneidade.

2.2 Conceitos Possíveis e Contemporaneidade

Afinal o que é o figurino? Um conjunto de elementos que tem como função vestir o ator ou bailarino para a cena, seja ele um elemento caracterizador do personagem, ou do contexto histórico-social da peça ou vestes que valorizam e destacam o desenho do corpo, o figurino revela contornos do corpo do intérprete no espaço cênico. Estes são os conceitos mais clássicos do figurino na contemporaneidade, os quais multiplicam e transformam suas funções e possibilidades na cena espetacular.

Pavis (2007) destaca a função sinalética do figurino e sua relação com o dentro-fora da obra teatral. O dentro para Pavis significa a relação coesa entre o figurino, a encenação, e os demais elementos da cena. O fora faz referência ao mundo e ao cotidiano, assim, o figurino emite signos que se relacionam para além do universo fictício da obra. Pavis também argui sobre as funções caracterizadoras do figurino, tanto da personagem quanto do contexto histórico ao qual o espetáculo esta inserido. No entanto, acredita-se que essa relação com o interno e o externo da obra também pode acontecer na dança contemporânea para além da função caracterizadora da personagem

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ou situação. A criação artística em dança contemporânea utiliza signos (ou símbolos) do cotidiano apresentando-os de forma a subverter seus significados, como parte da dramaturgia da cena.

Figura 3 - Bandoneon

Fonte: http://www.bam.org/artists/pina-bausch

Um exemplo de ressignificação de um símbolo da estética clássica é a obra Bandoneon da coreógrafa alemã Pina Baush (1940 – 2009), nesta obra apresenta-se em cena um bailarino usando um traje feminino típico de ballet clássico, um vestido branco comsaia longa em forma de tutu romântico, que são as saias das bailarinas no balé clássico, compostas por várias camadas de tecido. A ambientação cênica desta dança é um baile, ao som de músicas características do tango, o bailarino vestido com o tutu repete a mesma partitura de movimento sem obedecer ao ritmo musical. Esta ação destoa das demais bailarinas que usam trajes sociais e tem sua partitura diferente daquela executada pelo bailarino. Esse figurino subverte questões gênero, pois o bailarino do sexo masculino utiliza traje de balé geralmente utilizado pelo corpo de baile feminino. Essa inversão de papéis é fundamental para a dramaturgia da obra e suscita diferentes questões e atitudes sociais, numa perspectiva irônica, paródica e risível. Elementos conceitualmente tratados pela arte pós-moderna também presentes na obra de Pina Bausch e na dança contemporânea.

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A estética clássica destaca cada detalhe de sua dramaturgia, e a mensagem estética que deseja transmitir. Nos balés de repertório do período romântico, a proposta dramatúrgica dá ênfase ao aspecto etéreo do corpo da bailarina. A ilusão e a fantasia configuram a atmosfera de sonho e irrealidade do espetáculo. Estes Elementos estão presentes no todo da obra em correspondência com a movimentação dos corpos dos bailarinos.

Na cena contemporânea de dança observam-se jogos de oposições na mensagem coreográfica constituída de caos, de ironia e de criticidade, características conceitualmente presentes nas artes pós-modernas. Nessa perspectiva, a dança contemporânea, e consequentemente o figurino criado para esta possuem referências diversificadas que não encerram um único conceito ético ou estético.

Segundo Agambem (2008) ao usar Nietzsche como referência, o contemporâneo lida com o intempestivo, e lança um olhar sobre o presente. O estado de ser contemporâneo é aquele que não se encaixa perfeitamente no seu tempo, e por ter uma visão distanciada deste tempo, compreende e apreende melhor o presente. De acordo com as reflexões do autor acima citado, a criticidade do olhar é fundamental para a compreensão do que é a contemporaneidade. Alguns conceitos permeiam a contemporaneidade, sem, no entanto dar uma definição exata, assim, a impermanência, a inexatidão, e o lidar com as coisas fora do lugar fazem parte da vida na contemporaneidade.

Ainda de acordo com as ideias de Agambem (2008), a contemporaneidade não está presa as questões fechadas, mas, sobretudo, aos questionamentos, as provocações, as fissuras abertas, aos terrenos movediços, e aos significados que transformam-se a cada segundo. Faz-se necessário esclarecer que não é pretensão deste trabalho elaborar um manual de regras sobre figurino, mas sim construir uma direção, ou caminhos possíveis que possam facilitar a criação de novas propostas de figurino para a dança, oriundas da pesquisa e investigação de diferentes materiais, e de inovações tecnológicas capazes de corroborar apropriadamente com a cena contemporânea de dança.

Neste viés, a confecção de um figurino na cena da dança contemporânea não é uma tarefa fácil. O que nos leva a seguinte questão: como um figurinista de dança pode elaborar um figurino em universos de complexidades e diferentes opções cênico-artísticas?

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Para muitos figurinistas da dança contemporânea essa pergunta é respondida da seguinte forma: recomenda-se nas coreografias o uso de roupas “neutras” ou “cotidianas”, afim de não perturbar o corpo com mensagens ou signos indesejados. Neste sentido, faz-se necessário compreender bem o porquê dessa escolha:

“Por revelarem em suas pesquisas um interesse em investigar a condição do corpo e suas múltiplas subjetividades, as quais não encerram o sujeito em envoltórios identitários, pode-se afirmar que o figurino é, muitas vezes, escolhido no processo de criação, pelo próprio propositor e tratado como um componente o qual se ajusta ao corpo no intuito, não de espetacularizá-lo, mas, antes, de propiciar uma aparência a qual não perturbe o corpo com mensagens, signos, os quais produziriam leituras não desejadas por parte dos artistas.” (DINIZ, 2012, p. 100).

Os autores que tratam do figurino na contemporaneidade têm feito críticas ao conceito clássico de figurino enquanto elemento que apenas veste o ator ou bailarino na cena espetacular, com objetivo de caracterizar, embelezar ou simplesmente vestir o corpo para a cena. Nessa perspectiva, consideram-se tais conceitos insuficientes para designar a concepção estética deste figurino na contemporaneidade. Nessa perspectiva, o figurino na contemporaneidade é um elemento relacional, interligado a dramaturgia da cena e a plasticidade do corpo do bailarino. Novas formas, funções e meios de organização do figurino fazem-se presente na contemporaneidade do vestir nas artes cênicas. Assim, a concepção contemporânea de criação do figurino volta-se para a construção processual do figurino para cena de dança ou de teatro. Deixa-se de lado um figurino pré-estabelecido, pré-concebido, ou seja, sem uma relação intrínseca com a obra artística.

Ramos (2013) lança um olhar sobre a caracterização visual de atores e destaca que embora haja um déficit de trabalhos teóricos sobre o tema, existem uma grande diversidade de criações artísticas na construção da aparência de atores, e faz uma distinção entre os termos figurino e design de aparência de atores. A autora entende como figurino a produção de um desenho que serve como referência primária ao espetáculo e ao personagem, o figurino em sua função caracterizadora. A autora propõe o design de aparências como uma criação processual, resultado de um projeto que exige do profissional mais que alguns conhecimentos em desenho, corte e costura ou história da indumentária: “Isso porque o que se cria não é apenas uma roupa, mas uma nova

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informação figurada sobre o corpo, com o intuito de gerar aparências inusitadas.” (RAMOS, 2013, p. 41).

Outro entendimento de figurino é a proposta de Vestíveis em Fluxo, proposto por Diniz (2012), onde a autora traz uma proposição ampliada, entendendo o figurino como um elemento relacional entre o corpo e o que veste este corpo, não limitando-se apenas as vestes, mas outros elementos que possam em determinado momento relacionar-se com o corpo e vesti-lo das mais diversas formas, entende-se que a ação de vestir como “um dos meios pelos quais o corpo produz imagens, corporalidades e aparências” (DINIZ, 2012, p. 87,88). Segundo esta autora, o nu, ainda que isento de elementos organiza uma fala e gera sentidos. O jogo de vestir o corpo com a luz, projeções e a sua relação com objetos cênicos também fazem parte do entendimento dos vestíveis em fluxo. A ideia de fluxo é a transformação do figurino ou de seus sentidos ao longo da performance.

“A proposição dos Vestíveis em Fluxo deriva, então, da noção de Fluxos Vestimentares, ressaltando a relação do corpo e o que se veste, considerado a partir do jogo entre suas materialidades. Ao ser proposto no campo da dança contemporânea, a noção de Vestíveis em Fluxo também se relaciona com as ideias de simultaneidade,

possibilidade e transitoriedade (grifo nosso), na medida em que, o

que se escolhe para vestir o corpo em cena transita (grifo nosso) entre funções e signos, os quais vão, ao longo da perfomance, reconfigurando e alterando os sentidos e as formas do corpo em cena. A ideia de vestível em fluxo também suscita a possibilidade (grifo nosso) de ser algo a ser vestido, ou seja, em algum momento pode vir a cumprir a função de vestir o corpo, mas não necessariamente, se limita a ela (...)” (DINIZ, 2012, p. 91).

Na tese dos vestíveis em fluxo de Diniz, três obras de dança contemporâneas são escolhidas pela autora como objeto de análise: In-organic de Marcela Levi (2007), Amarelo da artista Elisabete Finger (2007) e Self Unfinished do artista Xavier Le Roy (1998), tais obras se aproximam no tratamento dado aos figurinos e elementos cênicos que se transformam ao longo das performances, gerando signos diversos, ambíguos, gerando sentidos inacabados ou que transformam-se ao longo da performance.

Ainda Diniz em sua tese discorre sobre a discrepância na fala dos autores acima citados, ao afirmarem que o figurino não é uma questão relevante nos processos nestas

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falas residem uma contradição destes artistas, pois, observa-se no trabalho dos mesmos o uso meticuloso nas escolhas dos materiais e a sua relação com o corpo, aspectos fundamentais na execução da obra. Essas obras e o devido cuidado com o figurino ilustram que nem só de roupa neutra e cotidiana vive a dança contemporânea.

Figura 5 – Amarelo – Elisabete Finger Fonte: https://elisabetefinger.com/projects/amarelo/

Figura 6 - Self Unfinished - Xavier LeRoy

Fonte: http://alisoncroggon.tumblr.com/post/134575446561/watching-xavier-le-roy

Diniz (2012) e Ramos (2013) propõem novas nomenclaturas para designar o termo figurino, no entanto o foco do trabalho não é sugerir uma nova nomenclatura ou tentar universalizá-la. A compreensão de figurino que tratamos aqui fundamenta-se na compreensão dos autores sobre o figurino contemporâneo como um elemento estético, dramatúrgico e relacional para a cena de dança. Construído de forma processual, o figurino para a dança deve ser analisado e pensado no conjunto da obra. Assim, compreende-se que o figurino para as artes cênicas ultrapassa a fronteira do apenas vestir o corpo para a cena, mas, sobretudo observar a diversidade dos elementos que se

Figura 4 - In-Organic - Marcela Levi Fonte: http://marcelalevi.com/brasil/in-organic/

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relacionam de forma compositiva, complementar e intrinsecamente relacionados com o corpo.

3 – PROCESSOS CRIATIVOS E SEUS FIGURINOS

O trabalho agora se debruça sobre os figurinos de três processos criativos que foram desenvolvidos nas disciplinas de Laboratório de Composição Coreográfica I e II do curso de Licenciatura em Dança da UFRN, dois deles de nossa autoria: Ter/Ser e Amaré. O terceiro e último processo criativo em análise intitulado Entrepele é de autoria da discente e nossa colega do curso de licenciatura em Dança Janine Leal.

O componente curricular Laboratório de composição coreográfica tem como finalidade o aprofundamento dos processos criativos individuais dos discentes, ou seja, trata-se de processos criativos, interpretativos e coreográficos na modalidade solo. Os processos criativos citados acima trazem questões relevantes acerca da construção do figurino para a dança contemporânea à luz do que tratam os autores que constituem o referencial teórico e epistemológico do presente trabalho.

3.1 - Ter/ser

Processo de minha autoria que trata da questão dos estereótipos sociais e a pressão de viver nos padrões socioculturais apontados como ideais pela sociedade. A sociedade contemporânea é multireferencial, fala-se em corpos híbridos, segundo David (1993 apud LOUPPE, 2000, p. 32) “oriundo de formações diversas, acolhendo em si elementos díspares, por vezes contraditórios (...)”. No entanto, ainda observa-se um pré- julgamento quanto à imagem que o individuo precisa ter perante a sociedade, deste modo, o indivíduo considerado diferente, ou seja, que apresenta gostos, preferências sexuais, ou que se veste de forma não convencional, geralmente não são bem aceitos pela sociedade, talvez isso demonstre uma ausência de visão acerca da diversidade humana necessária a convivência na contemporaneidade.

Para representar diferentes estereótipos sociais utilizei no processo criativo Ter/Ser sapatos com cores, tamanhos e designers diferentes, os quais constituem elementos dramatúrgicos na composição coreográfica. A dramaturgia desse processo gira em torno de crenças sociais que generalizam e impõem padrões de comportamento

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ou de vestuário ao indivíduo, poses e gestos tido como clichês femininos compõem parte da movimentação.

O Ter em detrimento do Ser em nosso processo criativo apresentou-se numa cena em que diferentes tipos de sapatos foram dispostos, e na condição de interprete criadora ao calçar cada um desses diferentes sapatos adquiri diferentes modulações de tônus corporal, bem como diferentes estados sensório-motores. Essas observações e sensações permitiram adentrar na composição do personagem para a cena de dança a partir dos estereótipos sociais pesquisados na vida cotidiana.

Embora os sapatos na composição coreográfica representem estereótipos construídos socialmente, a proposta criativa não insere-se apenas para a representação de papéis ou personagens, mas sim, na construção de personagens a partir de um fluxo de imagens criadas através dos sapatos.

Além dos sapatos usei um vestido preto, básico, com um detalhe branco, sem estampas ou detalhes chamativos, e embora o trabalho enfoque questões como: a beleza e a sensualidade, a função do figurino não foi deixar o corpo bonito para a cena, mas sim, ser um elemento estético de diálogo com os sapatos que estavam em cena, visando compor a dramaturgia do espetáculo.

Figura 7 - Ter/Ser Fotografia de: Duarte Júnior

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3.2 – Amaré

O processo de construção de Amaré iniciou-se na disciplina de Laboratório de Composição Coreográfica II, e foi adquirindo novos elementos ao longo de outras disciplinas durante as aulas do curso de graduação em dança. Amaré é uma dança em processo que no momento presente configura-se no formato de vídeo-dança, e assim amplia as possibilidades, tanto na execução técnica quanto em seus aspectos estéticos e expressivos para a cena de dança contemporânea mediada pelas novas tecnologias.

Inicialmente este trabalho origina-se na pesquisa de movimento. O tema principal da disciplina é o espaço e a influencia deste em nossos diferentes estados corporais, ou seja, como a cinesfera pessoal, circunscrita ao espaço do indivíduo, o seu entorno, a cinesfera coletiva, e o ambiente relaciona-se com outros corpos, e como estes elementos implicados influenciam, alteram e variam a qualidade do movimento dançado.

O sistema desenvolvido por Rudolf Laban conhecido por Expressividade/forma foi um dos referenciais epistemológicos do componente curricular Laboratório de composição coreográfica II. A categoria Forma se divide em forma fluida, forma direcional e forma tridimensional, sendo a forma fluida, segundo Fernandes (2001), “[...] relacionamento do corpo consigo mesmo, entre suas partes; movendo-se a partir da respiração, voz, órgãos e líquidos corporais.”.

A forma fluida foi tema de investigação de movimento em um dos laboratórios do componente curricular já citado, e a partir dessas vivencias cria-se partituras de movimentos de características ondulatórias que servem de base e motivação para a continuidade dos processos criativos e investigativos. Estes processos proliferam-se a partir dos movimentos ondulatórios e das sensações corporais advindas das estratégias dos líquidos corporais. A ênfase nos movimentos ondulatórios corresponde por analogia aos movimentos das ondas do mar, assim a forma da onda, tornou-se o tema central do trabalho.

A concepção do figurino aconteceu próxima à apresentação do processo de criação de Amaré na disciplina. Este figurino inspira-se nos vestidos usados pela cantora Belinda no videoclipe da música En el amor hay que perdonar. Trata-se de um

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vestido longo na cor azul, de tecido leve, com bastante volume na saia, a fim de proporcionar liberdade aos movimentos.

Próximo à mostra final de Laboratório de Composição Coreográfica II os trabalhos eram apresentados como uma prévia da apresentação com o objetivo de ver a evolução do mesmo. Em uma dessas mostras prévias, o figurino usado foi uma calça e uma camisa larga branca de botões, a observação da professora Patrícial Leal quanto a este vestuário foi que o mesmo apresentava-se como uma boa opção de figurino, pois, a oposição entre a dureza do jeans, e os movimentos do corpo criam efeitos de contraste na cena.

O figurino na dança contemporânea passa a ser analisado sobre a ótica e a estética dramatúrgica, ou seja, o olhar sobre o figurino passa a ter uma perspectiva da ação da cena de dança. O vestido azul elaborado para a composição Amaré foi concebido a partir da ideia de um figurino leve, fluido e que dialogasse com a organicidade dos movimentos dançados. A oposição estética entre os figurinos usados numa mesma concepção em momentos distintos colabora com a dramaturgia corpo-cênica que constrói a personagem feminina urbana e enclausurada em oposição à personagem de uma mulher selvagem, com base nas ideias apresentadas no livro Mulheres que Correm com os Lobos de autoria de Clarissa Pínkola Estes.

Nos parágrafos anteriores destaca-se que a ordem comumente utilizada na criação em dança inicia com a coreografia e em seguida os demais elementos cênicos são acrescidos ao processo, Silva (2010) subverte essa ordem ao propor que o figurino apareça no começo do processo. “[...] intento pensar no figurino como parte do processo de criação inicial da cena, sendo impulsionador da ação.” (Silva, 2010, p. 14). Além de impulsionar a ação, a proposição de dois possíveis figurinos, deram ao trabalho Amaré uma nova dramaturgia e, portanto novos contornos cênicos.

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Figura 8 - Amaré Fotografia de: Lucas Dantas 3.3 – Entrepele

O trabalho Entrepele chama a atenção por suas visualidades cênicas: o diálogo com o recurso tecnológico do vídeo, as tintas, as cores que vestem o corpo para a cena, bem como, a nudez. As mensagens veiculadas em Entrepele são extremamente importantes para o presente trabalho. Vale citar as palavras da intérprete-criadora deste trabalho: “Entrepele é um trabalho em construção que partiu de uma inquietação sobre modificações corporais e o porque de fazermos elas. Tomando como eixo principal relatos de pessoas que fizeram modificações no cabelo e na pele, a composição tenta passar a ideia do eu-inicial, que altera a própria imagem em busca do sentir-se bem em uniformidade com seus desejos de aceitação social.”

Em Entrepele observa-se a interação entre a intérprete com a projeção do vídeo, que contem imagens de dança em um prédio abandonado, As imagens contrastam com a tinta vermelha que escorre pelo corpo da intérprete, seus movimentos e as paredes de cor cinza que compõe a ambientação cênica, dramatúrgica e coreográfica do vídeo-dança. Essa interação corpo-imagem-dança amplia nossos olhares, vincula novas informações para a cena e para o corpo da intérprete-criadora. A cena coreográfica em determinados momentos parece vestir com as projeções o corpo da intérprete-criadora, que funciona como uma tela irregular. Sobre essa interação entre dança e cultura digital Ivani Santana (2006, p. 5) afirma que “As emergências provocadas pelo contato entre a dança e a Cultura Digital promovem novas questões, pois se insere em novos pressupostos espaço-temporais.”.

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A ideia de usar a tinta no corpo surgiu no segundo laboratório de criação segundo a própria autora de Entrepele, no intuito de cobrir a nudez que surgiu no processo. Vários materiais foram testados, no entanto acabaram ficando transparentes, e a solução encontrada pela intérprete-criadora foi a utilização da tinta guache devido a consistência cremosa da mesma. O figurino que aparece no começo do processo é um collant cor da pele, que será retirado pela intérprete num segundo momento. A finalidade deste collant é cobrir as tatuagens que são partes significativas da dramaturgia coreográfica e símbolos das modificações corporais enfocadas na criação.

A nudez e as projeções no corpo da intérprete produzem efeitos de sentidos e de presença cênica. Entende-se que tais elementos fazem parte dos estudos de criação do figurino a partir da perspectiva dos vestíveis em fluxo proposto por Diniz (2012):

“O campo do vestir também abarca o corpo nu, o qual não implica um ponto “neutro”, no sentido de que o corpo, ao apresentar-se isento de artifícios não organiza uma “fala”. O corpo nu incorpora uma condição sígnica específica, traduz diferenciados discursos a depender do contexto apresentado” (Diniz, 2012, p. 91).

Figura 9 - Entrepele Fotografia de: Tiago Lima

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28 3.4. Elementos Estéticos

“As possibilidades do campo do vestir, considerado a partir das características materiais inerentes ao que se veste: cor, forma, amplitude, flexibilidade, peso, em relação dialógica com o corpo, o imbuí por uma “multiplicidade de estados”, os quais corporificam um sujeito cambiante na vida e na cena, o qual não instaura sentidos, mas que, por sua vez, flui entre eles.”. (DINIZ, 2012, p. 91)

Para compreender a importância de analise dos aspectos materiais e estéticos de uma vestimenta, que transmite sensações para o espectador, toma-se como referência a fala de Oliveira (2008, p. 99, apud DINIZ, 2012, p. 90):

“Com seu cromatismo, materialidade, corporeidade e forma, a roupa no corpo tem amplitude; tem espessura; tem movimentos, tem peso, tem flexibilidade, tem textura. Distribuídas no eixo vertical, essas propriedades atuam no eixo horizontal que penetram em retas, curvas, diagonais, perpendiculares, pois o próprio corpo vestido como vertical movente é o seu dinamismo com uma actorialidade, espacialidade e temporalidade da vida. Ao vestir o corpo com essas variáveis, o sujeito, pela sua aparência, é levado a assumir uma multiplicidade de estados ou enfatizar um deles pela sua força estética ou pela sua força estésica; pela sua força funcional ou pela sua força simbólica.”.

As cores são um elemento estético muito marcante, transmitem sensações, despertam memórias, possuem uma simbologia muito forte dentro da sociedade, não é a toa que existem estudos voltados para a influência das cores no cérebro e seu uso principalmente na publicidade. Johann Wolfgang Von Goethe criou a “Teoria da Cor”, e fala sobre a relação entre a cor e as sensações humanas: “cada cor tem uma atuação característica sobre o psiquismo humano: elas nos causam estados anímicos específicos e provocam em diferentes indivíduos sensações, reações e comportamentos similares.” (Possebon, 2009, p. 27).

A partir destas ideias, acredita-se que uma escolha criteriosa das cores pode vir a aproximar o espectador da cena, na medida em que esta influencia diretamente o indivíduo e sua fruição estética.

Em cada sociedade existem simbologias associadas às cores, o vermelho, por exemplo, em nossa cultura, remete ao sangue, à intensidade, às paixões, à vivacidade. A cor vermelha está presente no trabalho de Janine Leal e também no espetáculo Amarelo de Elisabete Finger. Em ambos os trabalhos as autoras afirmam que a escolha da cor relaciona-se com a dramaturgia da cena. No caso de Entrepele, de Janine Leal, existe,

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segundo a autora, um efeito de continuidade e uniformidade entre a tinta e a cor dos seus cabelo pintados de vermelho.

Na coreografia de Elisabete Finger há uma seleção de cores dos elementos cênicos e figurino, que se relacionam entre si: “Amarelo, pardo e vermelho, as cores atuando como força do conjunto imagético produzido pela artista.” (DINIZ, 2012, p. 58).

A forma, enquanto característica estética e material do figurino, destaca-se neste trabalho por sua possibilidade de alterar a plasticidade do corpo do bailarino e sua silhueta, possivelmente uma das primeiras características a serem percebidas pelo olhar no corpo do bailarino, ainda que a distância. O formato do figurino, o tipo de tecido, cortes mais retos ou sinuosos, tecidos mais pesados ou leves e fluidos, possibilitam sensações distintas para a cena, e consequentemente para a fruição estética do espectador.

Diferentes formas plásticas de figurino foram vistas ao longo deste trabalho, desde os figurinos do balé triádico, até as configurações estético-coreográficas que derivam da interação entre luz, tecidos e movimento criados pela bailarina Loie Fuller. Faz-se necessário destacar no presente trabalho a análise sobre o jogo de oposição e contraste observado na cena de dança contemporânea. As formas do corpo geralmente se opõem as formas estéticas concebidas para vestir o corpo que dança. O todo da cena da dança contemporânea cria oposições, sentidos inacabados, a atenção a estes aspectos corrobora com uma práxis artística embasada em diferentes áreas de conhecimento.

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30 4. O QUE? COMO? POR QUÊ?

No intuito de responder as perguntas iniciais “o que vou usar em cena?”, “Como criar/usar?” e “Por que/para que usar?”, foram analisados e discutidos três processos criativos distintos e seus respectivos figurinos. À luz destes processos retomaremos as três questões acima citadas, a fim de fornecer pistas para novos processos criativos.

O que usar? Uma calça, um vestido, nada? O “O que?” parece ser comumente o primeiro questionamento acerca da construção do figurino, questionamento este que nem sempre aparece no começo do processo criativo, muitas vezes a procura por respostas rápidas culmina num processo sem aprofundamentos sejam eles técnicos, estéticos ou dramatúrgicos.

No caso deste trabalho, o olhar se volta para a dança contemporânea e para compreender suas questões torna-se fundamental a construção de um figurino que atenda as demandas do processo criativo. Os aspectos conceituais e estéticos da dança contemporânea arguem, questionam e provocam. Nessa perspectiva, o processo de concepção do figurino torna-se mais importante do que o produto em si, sobre isso Diniz (2012, p 97) propõe que “(...) a novidade, não reside no “o que” (a informação em si), mas no “como” (o modo) organizam-se as informações no contexto da dança contemporânea.”.

Como criar ou executar um figurino? Como o figurino se organiza na cena e no corpo do bailarino? No momento em que estas perguntas aparecem, e a forma como respondemos a mesma caracteriza o processo de construção deste figurino, que pode ser diferenciado de espetáculo para espetáculo. Exemplos de figurinos que originam-se de olhares distintos do intérprete do coreógrafo e do figurinista já foi dito anteriormente nestes escritos, contudo, estes figurinos são idealizados desde o começo dos trabalhos de modo compositivo e complementar. Sabe-se que alguns figurinos não nascem desde o início da concepção coreográfica, mas sim, ao longo do processo de construção da obra coreográfica, nesse sentido, o figurino pode ter resultados positivos no todo da obra ou resultados negativos.

“Entre o figurino que veste o corpo para a dança e o que se organiza de modo implicado com os outros elementos, existem nuances, modos e vínculos diferenciados e possíveis e, no contexto da dança

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contemporânea, esses modos coexistem, pertinentes às necessidades específicas de cada processo compositivo.” (DINIZ, 2012, P. 11).

Compreender a contemporaneidade pode ser a chave para os questionamentos levantados nesta parte do texto, um olhar crítico sobre o presente, o cotidiano, sobre a arte contemporânea, e até sobre o conceito atual de moda pode fornecer pistas teóricas e imagéticas que venham a corroborar com os processos criativos na concepção do figurino para a dança. Muitas vezes limitamos o nosso olhar apenas para àquilo que dominamos e nos propomos a criar, no entanto ampliar nossos horizontes pode ser fundamental para nos desenvolvermos enquanto artistas e criadores.

A moda aparece associada ao estudo do figurino em diversas ocasiões, como uma referência social, histórica e cultural:

“As modas interferem com diferentes intensidades na plástica do corpo e, ao se tratar do vestir na cena da dança, em muitos momentos, será possível observar, os modos pelos quais os sistemas da moda e da dança encontram-se emaranhados, influenciando-se mutuamente, ora a moda das ruas influencia a moda dos palcos e vice-versa.”. (DINIZ, 2012, p. 27).

Pensando na relação entre moda, figurino e dança o Caderno Inova Moda – criação, desenvolvido pelo SENAI e SEBRAE, em sua edição de Verão ano 15/16 chamou atenção em relação aos conceitos abordados, é um material interessantíssimo enquanto referencial imagético e teórico que facilita a compreensão de Arte contemporânea por abordar conceitos como referências estéticas a desmaterialização, mutações, liquefação, hibridismo, contrastes, ultrarrealismo e inspirações futuristas, com imagens e ilustrações de criações de artistas, designers, estilistas e até chefs de cozinha.

Pensar o “Por quê?” é abordar a importância do figurino para a cena de dança, embora muitos artistas aleguem que o mesmo não é um elemento fundamental para a cena. A relação com o público inevitavelmente vai suscitar observações e leituras por parte do espectador, além disso, o cuidado com a escolha das vestes e suas características estéticas por parte de alguns artistas e figurinistas revela que “o figurino, longe de não se constituir uma questão, é considerado como uma das materialidades relacionais, a qual está envolvida em várias camadas de sentidos” (DINIZ, 2012, p. 82).

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Além disso, convém estabelecer a finalidade do figurino dentro da obra, a partir de questões como: porque usar alguns elementos e materiais numa performance, e não utilizá-los em outra. Talvez isso se deva as diferentes estéticas utilizadas nas composições em dança. Assim, corpo, coreografia e figurino compõem a dramaturgia do espetáculo.

Quando as demais questões são respondidas com propriedade, o “O que?” surge como resultado do processo de criação. Quais materiais usar, formas e cores, ainda que o figurino seja tirado do próprio guarda roupa, teremos uma resposta coesa com a dramaturgia da dança.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho objetiva pensar o figurino para dança em seus aspectos técnicos e estéticos próprios. Trata-se de um trabalho teórico que se origina de vivências práticas e estudos imagéticos sobre o figurino para a área das artes cênicas, em especial, para a dança. Acredita-se que a dança ainda carece de referências mais específicas sobre o assunto. Espera-se que este trabalho seja capaz de levantar questões que possam contribuir na idealização e na concepção estética do figurino para a cena de dança.

Este trabalho estrutura-se a partir dos conhecimentos acerca do figurino para a dança sob uma perspectiva de criação processual, numa dimensão pós-moderna contemporânea. As questões afetas ao figurino são pensadas no presente trabalho correlacionando estes estudos à criação artística em dança.

Acredita-se que a dança na escola pode beneficiar-se destes estudos de figurino para que os alunos pensem a relação entre a dança e o figurino, desenvolvendo a potência criativa do aluno e a qualidade da produção artística em dança no ambiente escolar.

Nessa perspectiva, o presente trabalho também contribui para pensar em uma metodologia de criação do figurino para a dança dentro e fora do ambiente escolar, numa perspectiva futura de concepção, customização e confecção do figurino para a cena espetacular de dança. Pensar em uma proposição estética do figurino numa perspectiva educacional de criação pode ser um devir na pesquisa e criação do figurino para dança nas escolas.

De uma forma geral, a análise do figurino na dança possui inúmeras possibilidades de investigação e conceitos a serem desenvolvidos, sejam eles estéticos, , ou técnicos, ou relacionados aos estudos ergonômicos do figurino associados ao corpo e à movimentação do bailarino.

Outras questões se apresentam no decorrer deste trabalho e aponta possibilidades futuras de investigar as diferenças do figurino para a dança sem mediação tecnológica e a dança mediada pela tecnologia.

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Compreende-se que o trabalho ora apresentado é significativo para estabelecer conexões e aportes entre o corpo do intérprete, o coreógrafo, o figurinista e a dramaturgia cênico-espetacular na dança contemporânea pós-moderna.

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REFERÊNCIAS

BOURCIER. Paul. HISTÓRIA DA DANÇA NO OCIDENTE. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

DINIZ, Carolina de Paula. Vestíveis Em Fluxo: A Relação Implicada Entre Corpo, Movimento E O Que Se Veste Na Cena Contemporânea Da Dança. 2012.

106 p. Tese (mestrado em dança) UFBA – Universidade Federal da Bahia.

FERNANDES, C. Esculturas líquidas: a pré-expressividade e a forma fluida na dança educativa (pós) moderna. Caderno CEDES, Campinas, vol.21, no.53, Apr. 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/>. Acesso em: 06 dez. 2016.

PASSOS, E.; KASTRUP, V.; ESCÓSSIA L. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade.

PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999.

PORPINO, Karenine de Oliveira. Dança é educação: interfaces entre corporeidade e estética. Natal: EDUFRN – Editora da UFRN, 2006.

POSSEBON, Ennio Lamoglia. A teoria das cores de Goethe hoje. 2009. Tese (Doutorado) USP – Universidade de São Paulo, faculdade de Arquitetura e Urbanismo.

RAMOS, Adriana Vaz. O design de aparência de atores e a comunicação em cena. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2013.

SILVA, Amabilis de Jesus da. Figurino-penetrante: um estudo sobre a desestabilização das hierarquias em cena. 2010. 182 p. Tese (Doutorado) UFBA – Universidade Federal da Bahia, Escola de Teatro.

Referências

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