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Movimentos Migratórios e Redes de Indocumentados no Estado do Amazonas: antigos problemas, novas reflexões

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Academic year: 2021

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Movimentos Migratórios e Redes de Indocumentados no Estado do

Amazonas: antigos problemas, novas reflexões

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Carlos Augusto dos Santos Fundação Joaquim Nabuco/IESAM

1.INTRODUÇÃO

A migração de indocumentados no Estado do Amazonas, pode estar apontando para a continuidade das tendências dos fluxos migratórios apresentadas ao longo dos últimos anos. No que tange os conflitos sociais nos países vizinhos, sobretudo na Venezuela e na Colômbia, de onde se originam a maioria dos fluxos de indocumentados observados no Estado do Amazonas, como é o caso dos Peruanos, Colombianos e Bolivianos, acenam para novas e interessantes questões envolvendo diferenciados movimentos migratórios que ainda necessitam ser mais bem analisados sob o ponto de vista de suas causas e conseqüências.

A manutenção da tendência do fluxo migratório de indocumentados, por exemplo, a colônia de Peruanos, para o Estado do Amazonas, acabou proporcionando uma rede social de apoio a estes indocumentados e que, embora pequena, começa a ser mais bem estruturada, o que torna o tema possível de ser melhor explorado.

Contudo, soma-se a esta tendência de migração de indocumentados, outros movimentos de migrantes em situação de ilegalidade, que acabam aportando no Estado e que estão sendo alvo permanentes das malhas da Polícia Federal, como é o caso de Coreanos, Albaneses, Paquistaneses, Africanos, dentre outros povos, e que já estão se tornando freqüentes na seção policial da imprensa Amazonense. Em comum, possuem o fato de que seus passaportes, na maioria dos casos, são oriundos de falsificações realizadas no Peru, na França ou em outros países da Europa. É nítida a constatação de que há uma rota do tráfico de migrantes que passa por essa região com conexão na Europa, nos Estados Unidos e em outros países vizinhos.

* Trabalho apresentado no XIII Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, realizado

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Outro movimento interessante de ser analisado se referente ao tráfico de mulheres para a prostituição em uma rota que passa por Manaus, seguindo para Boa Vista (Rr) ou para a Guiana Francesa rumando para a Europa. Esta rota alcançou um estágio de tamanha significância, que ganhou novos contornos com o pedido de instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembléia legislativa do Estado do Amazonas.

De modo geral, os estudos demográficos sobre as mais diferentes correntes migratórias ocorridas no Amazonas, ou para os Estados que a compõem a Região Norte, vêm sendo alvo de estudos e renovadas pesquisas onde se tem tentado compreender, não apenas as causas deste fenômeno, mas também suas conseqüências e implicações nos lugares de seu destino.

Todavia, se o componente da migração interna ainda requer estudos mais aprofundados na busca e nas tentativas de conhecimento das verdadeiras causas, conseqüências e dos efeitos das correntes migratórias no conjunto da região e de seus estados, um outro tipo de imigração passa a ganhar e merecer, neste contexto de globalização, uma maior atenção.

Trata-se da imigração de estrangeiros, incluindo aqueles em situação de ilegalidade, indocumentados ou clandestinos, que torna, ou deveria tornar, esta discussão ainda mais importante e de preocupação para com esta região, sobretudo quando se têm noções dos conflitos existentes em países que fazem fronteira com o Brasil e que envolve a questão do tráfico de drogas, de mulheres e a biopirataria. Tais constatações deveriam, por si só, demandar a necessidade de aprofundar o caráter deste fluxo migratório que ora se apresenta com um caráter humanitário, tais como os “desplazados” (deslocados dentro de seu próprio país, como o que ocorre atualmente na Colômbia) que são forçados a fugir de guerras e conflitos políticos e sociais, como os de caráter de segurança nacional, estando em questão o tráfico internacional de drogas, o que ensejaria por parte das autoridades responsáveis pela segurança interna e das fronteiras, a oportunidade de aprofundar o conhecimento sobre a realidade sócio-demográfica dos fluxos migratórios ocorridos para esta região e, principalmente, aquela direcionada para o Estado do Amazonas.

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O objetivo principal deste trabalho é o de analisar estes novos componentes desse fluxo migratório no Estado do Amazonas: os indocumentados, ou seja, a construção de uma rede dos novos fluxos de indocumentados para além dos países vizinhos e o tráfico de mulheres para a prostituição que extrapola as fronteiras do nosso continente.

A principal fonte de informações tem por base a imprensa escrita do estado do Amazonas e documentações advindas da imprensa local e nacional, além das informações do núcleo do Serviço Pastoral dos Migrantes da Arquidiocese de Manaus (Serviço ligado ao setor social da Conferência nacional dos Bispos do Brasil - CNBB).

A perspectiva é a de poder sinalizar para uma reflexão, que possa contribuir para uma melhor compreensão, desses diversos e antigos problemas e para os novos aspectos desta migração de indocumentados, pouco considerada no estudo dos grandes movimentos migratórios.

2. ASPECTOS HISTÓRICOS DA IMIGRAÇÃO DE ESTRANGEIROS NO ESTADO DO AMAZONAS

Para se compreender alguns aspectos do processo da migração de estrangeiros no Estado do Amazonas, é necessário levar em consideração alguns pormenores de caráter histórico que vão corroborar para a compreensão de como foi sendo processado os fluxos e as correntes migratórias no Estado.

Em relação ao contexto internacional, pode-se mesmo dizer que é somente a partir da criação do Estado do Amazonas, datado do ano de 1850 quando este passa a elevação de Província, que em nível internacional dois fatos se tornam de grande importância, não apenas para que seja compreendido o processo migratório, mas também para vislumbrar aquilo que vai ensejar o início de profundas mudanças, que passarão a ocorrer em nível mundial e que irão causar fortes impactos na formação cultural, social, política e econômica do país e, conseqüentemente, na Região Norte e no Amazonas.

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O primeiro deles refere-se ao advento da Revolução Francesa que vai proporcionar, ainda no final do século XIX, um grande legado a Humanidade: a Declaração Universal dos Direitos que vai proporcionar inúmeros questionamentos sobre a liberdade das pessoas, ecoando posteriormente no Brasil, trazendo novo alento à todos aqueles que lutavam pelo fim da escravidão.

Outro fato de grande importância foi o advento da chamada Revolução Industrial. Esta revolução culminou provocando profundas mudanças no modo de produção capitalista gerando, ao longo dos anos vindouros, mudanças que afetaram todas as sociedades que passaram a aderir a esta nova forma de produção que irá se alastrar por todos os quatro cantos do mundo. Da mesma forma que o mundo se defrontou com os impactos destas grandes mudanças, também no Brasil não foi diferente, embora chegando sempre com um atraso relativo à demora na travessia dos mares e também pelos meios de comunicação utilizados na época.

No que se refere às análises de população, um aspecto mais do que importante vai ser o primeiro recenseamento geral realizado no país permitindo, deste modo, que o país conhecesse sua população. Como se pode observar, é somente vinte e dois anos depois da criação da Província do Estado do Amazonas que o estado vai poder conhecer mais profundamente e com um caráter oficial a população que residia e/ou estava presente no Estado a partir do ano de 1872. É praticamente a partir deste momento que se inicia o processo de análise sobre a participação dos imigrantes estrangeiros em solo amazonense.

Conforme é apresentado na Tabela 1 deste texto, o Estado do Amazonas passa, praticamente, por três grandes momentos, profundamente associados com as etapas de crescimento e de desenvolvimento impetrados no Estado.

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Tabela 1

Distribuição Populacional e Taxa de Crescimento Estado do Amazonas e Município de Manaus – 1872-1890 Período Amazonas T.C Manaus T.C M/A (%)

1872 57.610 29.334 50,92 5,38 1,55 1890 147.915 38.720 26,18 5,38 2,65 1900 249.756 50.300 20,14 1,89 2,07 1920 363.166 75.704 20,85 0,94 1,72 1940 438.008 106.399 24,29 1,49 2,75 1950 507.628 139.620 27,50 3,39 2,21 1960 708.459 173.703 24,52 3,03 6,02 1970 955.235 311.622 32,62 4,12 7,35 1980 1.430.089 633.392 44,29 3,57 4,35 1991 2.103.243 1.011.501 48,09 2,58 2,73 1996 2.389.279 1.157.357 48,44 4,42 4,94 2000 2.840.889 1.403.796 49,41 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, 1936 e Censos

Demográficos, 1920, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000 e Contagem Populacional de 1996.

Os três momentos históricos mais importantes para o processo de desenvolvimento e crescimento econômico do estado estão correlacionados com os fluxos migratórios no Estado são conhecidos como: Ciclo da borracha, a implantação da Zona Franca de Manaus e, mais recentemente, o chamado Terceiro Ciclo, voltado para o desenvolvimento agrícola e para o ecoturismo. Todas estas etapas são, de um modo ou de outro, representativas dos processos de crescimento do estado.

Em relação ao Ciclo da borracha, nunca é demais recordar que o fluxo migratório que o precedeu foi aquele das pessoas que vinham para a exploração das chamadas “drogas do sertão”, este período estende-se aproximadamente do ano de 1872 até o final da década de 20 quando o ciclo apresenta-se em fase de declínio absoluto.

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Neste período, o contingente populacional do Estado passa de 57. 610 pessoas para 249.756 em 1920. A taxa de crescimento indica que a velocidade do declínio foi bastante acentuada uma vez que passa de 5,38% a. a (período de 1872/1890) para 1,89% a . a. (período de 1900/1920).

É necessário registrar que o fluxo migratório nesta etapa ocorre tanto com a vinda de pessoas, expressivamente, oriundas da Região Nordeste, e do Estado do Pará, com pouco aceno para outros estados do país, bem como de estrangeiros advindos de vários outros países interessados no comércio da borracha, e que serão abordados em momento oportuno no interior deste trabalho.

Um outro momento importante para o processo de desenvolvimento do Estado do Amazonas ocorre com a criação e implementação da Zona Franca de Manaus (ZFM) que vai dar um impulso para o processo de desenvolvimento que por sua vez, passa a atrair grandes contingentes populacionais, sobretudo de pessoas oriundas de outros estados, uma vez que o número absoluto de estrangeiros havia declinado muito nesta etapa.

O contingente populacional do Estado, neste período, passa de uma população da ordem de 708.459, 955.235 e 1.430.089, respectivamente para os anos de 1960, 1970 e 1980 com taxas de crescimento do valor de 3,03 % a.a. (período 1960/170) para 4,12% a. a. (período 1970/80). Nunca é demais lembrar que nas décadas de 60 e 70 a Região Norte se associa ao projeto adotado pelo regime militar, onde prevalecia a idéia da Lei de Segurança Nacional e dela a concepção de ocupação de todos os espaços vazios do território.

Sob esta ótica, vários projetos foram implantados e desenvolvidos como, por exemplo, a Zona Franca de Manaus, a Transamazônica, Projeto Jarí e Trombetas que passam a convocar pessoas para ocupar as chamadas Fronteiras Agrícolas de Expansão, que vão cobrir as Regiões Centro-Oeste e Norte do país, como forma de integração nacional.

Mais recentemente, durante as décadas de 80 e 90, o Estado do Amazonas passou, assim como todo o restante do país, por problemas de ordem econômica que vão afetar os processos migratórios. Neste período, o contingente populacional do Estado, passa de uma população da ordem de 1.430.089 para 2.103.243 habitantes com taxas de

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crescimento declinantes quando passa de 3,57% a.a. (período 1980/91) para 2,58% a. a. (período 1991/96).

Nas décadas de 80 e 90, ocorreram mudanças significativas nos processos migratórios. Destacam-se três destes aspectos, indicando os mais importantes: primeiramente a década de 80, considerada economicamente como uma “década perdida”, com o arrefecimento das tendências migratórias registradas anteriormente e com o advento da chamada migração de retorno; a segunda diz respeito ao processo de des-ruralização e finalmente; finalmente, se observa, sobretudo no Estado de São Paulo, um intenso fluxo migratório em direção ao interior do Amazonas. A imigração de estrangeiros, conforme a tabela 2, vai acompanhar a trajetória das etapas de desenvolvimento no estado onde a capital, Manaus, sofre grande impacto.

Deste modo, em 1920, período de declínio do ciclo de opulência e riqueza da borracha, verifica-se que a população estrangeira residente no Estado era da ordem de 16.986 pessoas sendo que pouco mais da metade deste contingente (52%) residiam na cidade de Manaus.

Em 1940, quando as taxas de crescimento declinam substancialmente, tabela 2, a população de estrangeiros também diminui seu contingente absoluto na ordem de 6.796, sendo que a maioria (58%) concentrava-se na capital.

A tendência de declínio no número de imigrantes estrangeiros indica que este movimento teve seu ápice na década de 80 com concentração de 81,23% residindo na cidade de Manaus.

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Tabela 2

População Estrangeira e Taxa de Crescimento Estado do Amazonas e Município de Manaus - 1872-1890

Ano Amazonas Período T.C. Manaus Período T.C. 1872 1872/90 1872/90 1890 1890/00 1890/00 1900 1900/20 1900/20 1920 16.986 8848 1920/40 -4,48 1920/40 -3,93 1940 6.796 3971 1940/50 -3,42 1940/50 -3,39 1950 4.797 2814 1950/60 -1,15 1950/60 -0,55 1960 4.273 2664 1960/70 -2,40 1960/70 -0,57 1970 3.351 2515 1960/70 1,18 1960/70 1,98 1980 3.767 3060 1980/91 -3,97 1980/91 -100,00 1991 2.412 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, 1936 e Censos demográficos.

3. DEMOGRÁFICOS

Um dos principais problemas enfrentados pelos estudiosos do fenômeno migratório na Região e no Estado do Amazonas se situa nas fontes de dados que vão acabar resultando muitas vezes, em análises que em nada vão contribuir para que as autoridades públicas desenvolvam políticas públicas, seja para o atendimento de sua população local, seja para o atendimento daquelas pessoas que chegam com as correntes migratórias.

Em relação ao Estado do Amazonas, foram identificadas quatro fontes de dados que, se não permitem uma caracterização plena dos migrantes estrangeiros vivendo no estado, ao menos possibilitam provocar a discussão sobre quais e como utilizar as diferentes fontes de dados na questão das correntes migratórias. Para um melhor entendimento, optou-se por fazer uma apresentação em sub-tópicos de cada uma das fontes existentes e dos resultados, em valores absolutos, extraídos de cada uma delas.

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3.1 CENSOS DEMOGRÁFICOS

Os Censos demográficos são, em termos oficiais, a principal fonte de dados para os estudos de população. Os principais problemas com os quais o pesquisador se depara, em dependendo do tipo de análise a ser realizada, é de duas ordens: a primeira delas pela periodicidade em que é realizada (a cada dez anos - decenal) o que nem sempre acaba permitindo uma observação mais atenta das tendências demográficas relativas às correntes migratórias. Neste caso, várias foram as mudanças verificadas desde que realizou-se o primeiro recenseamento geral datado de 1872. A outra dificuldade, embora tenha existido um grande esforço para que não houvesse problema no censo de 2000, é ainda o problema de cobertura para os Estados da Região Norte acarretando, muitas vezes, dificuldades adicionais na confiabilidade dos dados extraídos dos censos para a região. Contudo, os esforços dos estudiosos da área mais técnica dos estudos de população fazem com que se avance, cada vez mais, no refinamento estatístico fazendo com que tais informações possam ser consideradas como confiáveis, embora ainda sigam sendo questionáveis.

Conforme se observa na tabela 2, os dados apontam para uma tendência histórica de um declínio que vai se acentuando, ou revertendo, acompanhando o crescimento econômico do estado. Deste modo, se em 1920 o estado possuía um contingente de estrangeiros da ordem de 16.986 pessoas e a capital 8.848, em 1960 estes valores eram representados por 4.273 e 2.664 pessoas, respectivamente para o estado e para a capital.

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Tabela 3 População Estrangeira Segundo Continentes de origem Estado do Amazonas - 1872-1991

TOTAL Americano Europeu Asiático Africano Oceania S. Esp.

1920 16.986 16.986 1940 6.796 0 3.591 297 0 0 2.908 1950 4.797 1.733 2.510 200 347 0 7 1960 0 1970 3.351 348 1.314 645 128 0 916 1980 3.767 367 1.284 707 66 0 1.343 1991 2.414 1.371 618 401 24 0 0 Total 38.111 3.819 9.317 2.250 565 0 22.160 1920 100,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 100,00 1940 100,00 0,00 52,84 4,37 0,00 0,00 42,79 1950 100,00 36,13 52,32 4,17 7,23 0,00 0,15 1960 1970 100,00 10,38 39,21 19,25 3,82 0,00 27,34 1980 100,00 9,74 34,09 18,77 1,75 0,00 35,65 1991 100,00 56,79 25,60 16,61 0,99 0,00 0,00 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, 1936 e Censo demográficos.

O número de migrantes estrangeiros revela, por outro lado, a própria importância que a capital, Manaus, passa a ter a partir do declínio do ciclo da borracha e posteriormente com a criação da ZFM. Neste processo, observa-se que a própria forma migratória se transforma, passando de uma migração onde o interior do Estado retinha um significativo número de migrantes estrangeiros, para um predomínio significativo da capital enquanto pólo de desenvolvimento e de atração para a migração dentro do Estado e mesmo de outros estados vizinhos, como já apontado em estudo realizado por Moura e Lacerda (1990).

Um aspecto importante quando se analisa, ao longo das décadas, o fluxo migratório no Estado são as mudanças dos migrantes estrangeiros que adentraram ao Estado, conforme Tabela 3, que vai demonstrar como aumenta o interesse por alguns países em relação ao espaço amazônico.

Um outro aspecto importante é verificar onde foram residir estes migrantes estrangeiros no Estado do Amazonas. Como se pode observar na Tabela 4, dentro do próprio Estado as mudanças implicam os elos de desenvolvimento que o estado detém.

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Assim, é possível buscar uma explicação por que em sua imensa maioria, os estrangeiros acabam por residir na Microregião de Manaus onde, na verdade, se concentra todo o capital econômico e financeiro advindo do maior polo de desenvolvimento no Estado que é a ZFM e seu distrito industrial e também de alguns projetos desenvolvidos em municípios próximos a capital do Estado.

Tabela 4 População Estrangeira Segundo as microrregiões Estado do Amazonas 1970-1991 T.C. T.C. 1970 1980 1991 1970 1980 1991 1970/80 1980/199 1 Total 3319 3767 2412 100,00 100,00 100,00 1,27 -3,97 Alto Solimões 219 357 623 6,60 9,48 25,83 5,01 5,19 Boca do Acre 26 4 5 0,78 0,11 0,21 -17,07 2,05 Coari 54 24 14 1,63 0,64 0,58 -7,79 -4,78 Itacoatiara 94 45 32 2,83 1,19 1,33 -7,10 -3,05 Japura 17 13 0 0,51 0,35 0,00 -2,65 -100,00 Jurua 21 16 7 0,63 0,42 0,29 -2,68 -7,24 Madeira 44 21 8 1,33 0,56 0,33 -7,13 -8,40 Manaus 2574 3074 1609 77,55 81,60 66,71 1,79 -5,72 Parintins 105 72 80 3,16 1,91 3,32 -3,70 0,96 Purus 21 27 0 0,63 0,72 0,00 2,54 -100,00 Rio Negro 76 75 34 2,29 1,99 1,41 -0,13 -6,94 Rio Preto da Eva 0 0 0 0,00 0,00 0,00

Tefé 68 39 0 2,05 1,04 0,00 -5,41 -100,00

Fonte: Censos Demográficos, 1970, 1980, 1991.

De 1872 até a década de 50, os maiores contingentes de estrangeiros que residiam no Estado do Amazonas eram aqueles formados por pessoas oriundas do Continente Europeu sendo que, em sua prevalência, eram pessoas naturais de países como: Portugal, Espanha e Itália. Estes fluxos resultam, basicamente, tanto da primeira como da Segunda guerra mundial e revelam compasso semelhante às demais correntes de migrantes estrangeiros verificadas no Sul e Sudeste do Brasil para o mesmo período.

A partir da década de 60, começa a prevalecer uma migração preponderante de pessoas oriundas dos países vizinhos, principalmente do Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana Inglesa e Bolívia. Nestas novas vagas também se encontram migrantes

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pertencentes a países como: Estados Unidos, Japão e China. Estas novas correntes denotam a percepção das mudanças econômicas verificadas no mundo inteiro, onde os Estados Unidos, um dos grandes vencedores da Segunda Guerra mundial, o Japão e Coréia (os chamados Tigres Asiáticos por causa do desenvolvimento econômico dos países da Ásia) posteriormente na década de 80, vão redimensionar as economias e o capital do mundo globalizado.

Se a microrregião de Manaus concentrava a maior parte dos migrantes estrangeiros durante as décadas de 70 e 80, na década de 90 já se percebe uma mudança em relação à localização destes migrantes; neste caso, aumenta a importância da microrregião do Alto Rio Negro. Este aumento pode estar diretamente associado com o interesse de Organizações Não Governamentais – ONGs em conhecer e auxiliar as populações indígenas localizadas nesta região. Por outro lado, também há que considerar que se trata de uma das áreas de fronteira com a Colômbia, que convive com as catastróficas conseqüências do Plano Colômbia (a interferência direta dos Estados Unidos no plano político deste país). O conflito armado entre paramilitares e guerrilheiros, que dura mais de quatro décadas, se agravou intensamente com o Plano Colômbia e se transformou num grande vetor de migração forçada que vem deslocando um grande contingente populacional que, embora não tendo os dados necessários, é possível fazer uma conjectura e inferência sobre a presença desta população nesta área de fronteira.

Em toda a extensão da Colômbia, verificam-se verdadeiros contingentes de migrantes deslocados (aqueles pequenos proprietários que são expulsos de suas terras e deslocados para outras regiões em grandes blocos), os desplazados (aqueles que foram expulsos de vastas áreas de plantação de coca ou de café e não foram mandados para outras reservas dentro do próprio país e são obrigados a sair por causa das perseguições acirradas que sobrecai aos mais desprovidos), os exilados políticos e os migrantes internos, provenientes do grande êxodo rural ou dos pequenos lugarejos, que vão se concentrando no entorno das grandes cidades. Todos esses movimentos, com freqüência se direcionam para o Amazonas. Na grande maioria dos casos, o ingresso desses migrantes se dá de forma clandestina. Grupos inteiros se aventuram a desafiar as guardas fronteiriças, convencidos do êxito que muitas vezes é frustrado. Uma vez em solo brasileiro, iniciam uma verdadeira maratona para garantia de sobrevivência e

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segurança pessoal. Os grupos acabam se dizimando por causa das estratégias de sobrevivência e da manutenção da clandestinidade “segura”. Com freqüência são “caçados” pelas operações organizadas pela Polícia Federal com o reforço do Exército e das Forças Armadas que fazem uma verdadeira varredura nas fronteiras, espalhando uma intencionada xenofobia a esses migrantes que muitas vezes são associados com atividades ilícitas como o narcotráfico. Os poucos que conseguem ingressar no Brasil, com um mínimo de documentação, partem em busca de garantias de permanência. O pedido de refúgio é o mais comum na maioria dos casos. Bem por isso, Manaus passa a ser simplesmente uma rota de passagem para São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília, lugares de referência para a tramitação de tais processos.

Nesse contexto tão complexo, quando se procura analisar os dados dos Censos Demográficos, a sensação que se têm é que os mesmos estão subestimados na medida em que este contingente populacional apresenta-se muito menor do que aquele observado e, sobretudo quando passa a ser comparado com outras fontes de dados, como veremos na seqüência.

Frente a tudo isso, é importante registrar e tecer comentários sobre este fato, uma vez que esta população, principalmente dos migrantes oriundos dos países vizinhos e de fronteira com o Estado do Amazonas, acaba sendo objeto de grande discriminação e xenofobia por parte de muitas autoridades. Também uma boa parcela da população amazonense, reproduz esse mesmo tratamento, encarando os migrantes como usurpadores de bens e equipamentos sociais sem se dar conta que se tratam de grupos vitimados em frágil condição de ilegalidade (tal questão será abordada no tópico referente aos indocumentados).

Deste modo, cremos que o censo demográfico deverá sofrer, por parte dos pesquisadores da área de população, uma reflexão maior sobre quais os quesitos e as variáveis que poderiam estar sendo utilizadas no sentido de poder, não apenas captar, mas também, atender a análises mais refinadas desta população especifica.

3.2 OUTROS DADOS OFICIAIS

Ainda considerado a questão das fontes de dados sobre esta população de migrantes estrangeiros uma fonte, embora oficial, pode ser considerada como

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alternativa, refere-se aos dados da Superintendência da Policia Federal (PF) que é a responsável constitucional pela entrada e saída de estrangeiros no país. Todavia, os números encontrados acabam por apresentar uma série de questões que devem ser consideradas na mensuração desta análise de contingente populacional.

De acordo com as informações oficiais do Estado, as atividades da Guarda e Proteção de Fronteiras da Policia Federal, abrangem praticamente todo o território Estadual através de sua Superintendência localizada em Manaus e em seus três postos avançados instalados nos municípios de Tabatinga, Tefé e São Gabriel da Cachoeira. A coleta de dados no Departamento de Estrangeiros da PF, que abrange apenas o período entre os anos de 1995 a 20001, conforme Tabela 5, haviam sido concedidos um total de 2.553 prorrogações de prazo de turista2 e 1.053 prorrogações de prazo temporário, tendo dada entrada ainda 539 pedidos de permanência e 54 pedidos de naturalização.

No período de 1998 a 1999, 2.521 estrangeiros permanentes foram recadastrados e 611 foram anistiados. É importante considerar que a diferença entre os que entraram e os que saíram, que no conjunto implicariam num total de 15.543 pessoas, são aquelas que por algum motivo, acabam solicitando e tendo seu prazo de permanência prorrogado.

Quanto aos dados oficiais da PF, os números indicam para a necessidade de uma reflexão conjunta entre os pesquisadores e as autoridades de segurança, na medida em que para a Superintendência da PF não existem pessoas clandestinas, uma vez que são consideradas ilegais, aquelas pessoas que não portam a licença ou visto de entrada, que são obrigatórios a todos estrangeiros que entram em solo brasileiro e amazonense por uma de suas quatro portas de entrada, acima mencionadas. Assim sendo, para a PF do Amazonas, não existem clandestinos nesta localidade. Porém, considerando os dados e cruzando entradas e saídas legais, já obtemos uma diferença muito significativa que contradiz por completo tal afirmação. Ou seja, todas as saídas, conforme informações repassadas pela própria PF, devem ser comunicadas à Superintendência do estado onde estas pessoas deram entrada. Uma vez que os vistos se encontram vencidos, (conforme indica a nota de rodapé), se as pessoas esgotaram o prazo concedido no visto de entrada

1 Para maiores detalhes ver trabalho de Santos, Moura e Brasil (2000) sobre a migração de estrangeiros

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ou não deram entrada ao processo de Pedido de permanência com base em prole, cônjugue, reunião familiar ou contrato internacional de trabalho, conforme rege a Lei, automaticamente se encontram ilegais no país, passando à condição de clandestinos.

Tabela 5

Estado do Amazonas – Migração de Estrangeiros segundo Entrada e Saída

1995/2000 Tipo de Movimento

Anos Entrada Saída Diferença

1995 11.015 9.570 1.445 1996 22.323 18.908 3.415 1997 18.437 16.805 1.632 1998 22.184 20.338 1.846 1999 20.648 18.005 2.643 2000* 12.174 7.612 4.562 TOTAL 106.781 91.238 15.543 Fonte: Superintendência da Policia Federal no Estado do Amazonas. Nota: * Levantamento preliminar até o mês de Maio de 2000.

Ainda assim, quando consideramos os dados da PF, nota-se que o volume de pessoas é muito maior do que aquele registrado pelo censo, o que acabaria sendo natural uma vez que estas pessoas geralmente não permanecem ao longo da década na mesma localidade, impossibilitando assim, sua captação e mensuração pelo censo.

3.3 DADOS DOS CONSULADOS

Uma vez constatada a carência de dados oficiais e a dificuldade de se traçar uma planilha comparativa entre esses órgãos já mencionados, uma das alternativas, para comparação, seriam os dados oriundos dos consulados.

No Estado do Amazonas, as representações diplomáticas existentes, através de consulados que representam as Embaixadas localizadas em Brasília, pertencem aos seguintes países: Japão, Estados Unidos, Finlândia, Peru, Venezuela, Colômbia, Portugal, Espanha, Itália, Alemanha, México, Países Baixos e Grécia.

É evidente que os dados dos consulados possuem uma dificuldade adicional que é o fato de que nem todos os estrangeiros procuram seus respectivos consulados, a não ser quando surge algum problema que necessita da interferência do mesmo. Ou seja, o

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migrante ou turista só se dirige ao seu respectivo consulado quando se encontra de posse dos documentos que lhes asseguram a legalidade ou para tramitá-los, salvo algumas raras circunstâncias. Mesmo assim, como se trata de uma análise sobre as diferentes fontes de dados, é importante registrar as diferenças entre todas as disponíveis.

Como não poderia ser diferente, também esta fonte acena para as dificuldades que existem em estar mensurando esta população. Considerando as limitações de cada um e a dificuldade de acesso a alguns, convencionou-se optar pelos dados do Consulado do Japão por três motivos: o primeiro deles pela participação que esta comunidade possui desde a realização do primeiro recenseamento geral datado de 1872; também pela participação desta comunidade na vida econômica e social do Estado de forma mais relevante; e o terceiro motivo importante é pela organização que o consulado detém em relação aos dados desta comunidade (o que não ocorre em muitas outras representações consulares, principalmente aquelas em que o representante não é natural do país pelo qual responde).

Partindo da análise dos números, o que chama a atenção num primeiro momento, é a disparidade entre os dados observados pelo censo e aquele registrado pelo Consulado. É interessante notar que somente quando da publicação dos dados do censo 2000, é que se pôde estar realizando uma análise mais consistente dos números. No caso do contingente de pessoas originárias do Japão, o consulado informa que entre os anos de 1990 até o ano de 2000, o número de pessoas que foram registradas e que residem no Estado do Amazonas era da ordem de aproximadamente 1.300 pessoas enquanto que o censo demográfico de 1991, aponta para uma população de nipônicos de apenas 348 pessoas residentes no Estado. Como se pode notar, a diferença entre as fontes são enormes indicando a preocupação que se deve ter com referência ao tema da migração de estrangeiros no Estado e, quiçá, na Região Norte.

3.4 DADOS EXTRA-OFICIAIS

Em relação à imigração estrangeira, outra fonte de dados que pode ser considerada, embora com restrições, é o núcleo do Serviço Pastoral dos Migrantes

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(SPM) da Arquidiocese de Manaus3. Sua atuação se dá em nível pastoral com cunho social, através de vínculos com as dioceses e prelazias espalhadas no interior de todo o Estado do Amazonas. Mais precisamente na sua sede em Manaus atende aos migrantes nacionais e estrangeiros que vem geralmente em busca de informações e de auxílio. Em muitos casos, os estrangeiros buscam recursos financeiros para tramitar o processo de legalização de sua permanência no país, o que muitas vezes foge ao alcance do SPM. Outro apoio decorre da busca de informações ou apoio jurídico para a condução do processo ou então para serviços de intermediação devido a fatores como dificuldade de entender o idioma ou traduções oficiais.

De acordo com o SPM, esta população de imigrantes estrangeiros residindo ou em trânsito ou ainda com permanência no Estado é de aproximadamente quarenta mil pessoas, ou seja, aqui incluí-se tanto as pessoas consideradas como legais e ilegais ou conhecidas como clandestinas. Esta estimativa baseia-se no conjunto das informações colhidas pelo SPM espalhadas pelo Amazonas. Embora podendo parecer um número elevado, este não corresponde a 2% da população amazonense. Quando comparado com outros dados disponíveis em estudos sobre migração de estrangeiros4, este contingente populacional apresenta-se muito reduzido.

Segundo os arquivos do SPM, num levantamento sobre a realidade migratória para encaminhar os processos dos estrangeiros interessados na Anistia (concedida aos estrangeiros residentes no Brasil, iniciando seu processo em junho de 1997, quando houve o levantamento e na seqüência o cadastro dos interessados, finalizando a tramitação em 07 de Dezembro de 2000), cerca de trinta e três mil e quatrocentos peruanos viviam no Estado do Amazonas naquela ocasião. Os dados foram coletados nas Paróquias, Áreas Missionárias e comunidades das respectivas dioceses e prelazias da Igreja Católica do Amazonas, bem como houve informações também de algumas outras Igrejas interessadas.

Os dados revelam também que desses mais de trinta mil peruanos espalhados pelo Amazonas, uma grande maioria se concentra na capital do Estado. Esse mesmo

4 Ver trabalhos apresentados no Seminário Internacional Migrações Internacionais – Contribuições para

Políticas Brasil 2000 dos quais citamos BOGUS, L., BASSANEZI, M.S. “Brasileiros (as) na Itália: ‘Nuovo Citadini’ ou ‘Extracomunitari’?; VIDA, S. “Africanos no Brasil: uma ameaça ao paraíso racial”; BAENINGER, R. “Brasileiros na América Latina: o que revela o Projeto IMILA/CELADE”.

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levantamento para a Anistia detectou que em quase todos os bairros de Manaus, há presença de peruanos com moradia fixa ou temporária (imóveis alugados). Os arquivos revelam ainda, inúmeros casos de peruanos que se cadastraram através dos vários postos de atendimento, mas que não conseguiram se beneficiar da Anistia, nem tão pouco efetivar seu cadastro oficial junto ao Ministério da Justiça, via Polícia Federal, por causa das altas taxas exigidas por lei para a tramitação dos processos. O mesmo se passa com os pedidos de permanência5. Além das taxas federais exigidas, mais as traduções oficiais juramentadas e as diversas cópias autenticadas e com firmas reconhecidas em cartórios, o interessado deve estar em dia com a justiça eleitoral de seu país, devendo comparecer diante do representante consular com sua “libreta electoral” a cada eleição transcorrida, sendo penalizado com generosas multas caso não compareça. O estrangeiro deve ainda estar cadastrado com sua “inscripción consular” e com seu passaporte em dia.

Esse conjunto de taxas se beira a quase mil reais. Recurso este, inviável para a grande parcela de migrantes que sobrevivem, à duras penas, do trabalho ou do mercado informal. Outros ainda, conseguiram dinheiro para a primeira parte do processo, mas quando chegou o tempo da finalização (de agosto a 07 de dezembro de 2000), não dispuseram dos recursos para o pagamento das últimas taxas e conseqüentemente, voltaram à condição de clandestinos. Devido a estas tantas exigências se justifica a presença irregular (sem medo de chutar) de mais de 70% dos peruanos que vivem no Estado do Amazonas.

Ainda de acordo com as informações obtidas junto ao SPM, os principais contingentes de imigrantes estrangeiros no Estado do Amazonas são oriundas dos países vizinhos. A partir do seu contato diário com os migrantes estrangeiros, o SPM acredita que as motivações que atraem estes imigrantes estão relacionadas com a busca de uma melhoria em suas condições de vida, o que incluí a “liberdade de expressão” da qual não dispõem em seus respectivos países de origem. Isso se deve às sucessivas crises de natureza econômica, social e política experimentadas por alguns destes países e que conferem ao Brasil algum efeito de atração sobre os migrantes latino-americanos. Estes fatores vão ser facilitados pela proximidade territorial e mesmo pela grande semelhança

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entre os idiomas espanhol e português. Como já mencionado em trabalho anteriormente (Santos, 2000), as informações fornecidas pelo SPM, também levam à suspeita de existir uma forte subestimação do contingente de migrantes estrangeiros captado pelos levantamentos estatísticos convencionais (Censo, Contagem, PNAD's, etc.).

3.5 OUTRAS POSSIVEIS FONTES ALTERNATIVAS

Embora carecendo de estudos mais aprofundados, a preocupação com aquilo que está sendo apontado como um grande crescimento da migração para a cidade de Manaus6, tem possibilitado que outras fontes de dados comecem a surgir no Estado do

Amazonas que, também por possuir características muito diferenciadas de outros estados, em parte pela sua imensa rede fluvial e sua área de fronteira; o surgimento de novas possíveis fontes de dados que, sem lugar à dúvida, ainda necessitam ser melhor analisadas mas, já sinalizam para alternativas viáveis para o entendimento e acompanhamento desta população.

Assim, duas são as fontes aqui consideradas. A primeira delas corresponde aos dados fornecidos pela Secretaria de Trabalho (SETRAB) do estado do Amazonas que, através do Programa de Atendimento ao Cidadão, localizado em diversos pontos da cidade de Manaus, presta atendimento à população. Esta fonte de dados é interessante a partir do momento em que captam, tanto o número de migrantes internos quanto aqueles de estrangeiros que se dirigem aos postos de atendimento para preencher fichas de cadastro para emprego na cidade de Manaus. Deste modo, os dados, que poderiam efetivamente ser mais bem aperfeiçoados, podem se configurar numa boa fonte de pesquisa. De qualquer modo, são estes dados que o Governo do Estado e mesmo a Prefeitura da Cidade de Manaus, se utiliza para mostrar que o processo migratório está crescendo na cidade e no Estado.

Todavia, é necessário aqui ressaltar que, embora os números absolutos sejam pequenos, a importância reside no fato desta fonte, além de ser oficial, é uma forma de poder visualizar esta população. Por outro lado, aqui se tem, mais uma vez, o problema por tratar-se de uma população, no caso dos migrantes internos, sobre os quais não se

6 Conforme matérias publicadas recentemente em jornais locais. Ver “A Critica” e “Amazônia em

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sabe de sua mobilidade dentro mesmo do espaço da cidade de Manaus (como período de residência e tempo de permanência na cidade). Muito se comenta que esta população estaria corroborando para com duas visões muito em voga na cidade e que diz respeito tanto ao fato de esta população, que viria em grande número de outros estados da região e que estaria sendo responsável pelo aumento nas e das áreas de invasões e de ocupações de terra no município gerando ainda mais problemas de natureza social, como este estaria representando um êxodo rural devido à quase completa inexistência de políticas agrárias voltadas para o desenvolvimento econômico do interior do Estado.

Outra preocupação que está contida nesta relação entre as fontes de dados e as correntes migratórias, sobretudo no caso dos migrantes estrangeiros, associa-se à questão da chamada biopirataria através de pessoas que, muitas vezes entram de forma legal no país e que, ao sair, acabam, levando material da flora e fauna, violando os direitos de patentes e denunciando um outro grave problema: o não investimento na pesquisa e tecnologia para este fim. A preocupação com este tipo de “roubo” fez com que uma grande autoridade militar se manifestasse dizendo que no Estado existem cerca de 10.000 clandestinos, referindo-se a este problema da biopirataria. Neste caso, apenas o ex-general do Comando Militar da Amazônia poderia prestar esclarecimentos sobre como chegou a estes números.

Uma outra questão pertinente ao tema que é aquela de não se possuir, muitas vezes, informações de órgãos que detém informações e/ou metodologia para enumerar esta população de estrangeiros. Mas, em se tratando do espírito deste trabalho, é salutar o registro de que existe concretamente uma possibilidade de enumeração desta população no Estado.

4. OS INDOCUMENTADOS

A título de exemplificação de como vivem muitas das pessoas indocumentadas no Estado do Amazonas, e para dar uma visão de conjunto dos problemas que cercam esta população específica, optou-se por uma sucinta apresentação das características dos peruanos residentes e espalhados pelo território amazonense. Esta opção baseou-se no fato de que é esta população a mais numerosa e aquela que cujos dados coletados pelo

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SPM permitiu uma avaliação, ainda que baseada em uma pequena amostra, porém significativa, do universo dos estrangeiros indocumentados.

As principais características sócio-demográficas, desta população de imigrantes indocumentados é que esta estava constituída em maior número por indivíduos do sexo masculino, cujo estado civil era de solteiros e que pertenciam aos grupos etários entre 25 a 34 anos. No conjunto desta população, a maioria era portadora de escolaridade de nível técnico7.

Aqueles que eram casados ou em união consensual no Peru, optaram por deixar suas famílias, esposa e filhos, e só busca-los para junto de seu convívio, quando já estivessem devidamente instalados no Estado. No que diz respeito ao número médio de filhos destes casais encontra-se numa média de dois filhos por cada casal.

Quanto aos aspectos econômicos, este contingente, ora analisado, trabalha principalmente no comércio ambulante, prestando assistência técnica em domicílios, ou como carpinteiros e em serviços gerais, ou seja, no mercado informal. Normalmente, as condições de vida que levam são precárias, sobretudo no que se refere ao acesso aos equipamentos e serviços básicos de educação, saúde, saneamento e também ao emprego formal, o que gera dificuldades adicionais em termos de cidadania, ainda que pertencente ao grupo de migrantes estrangeiros e considerando o seu nível de escolaridade.

Normalmente, a entrada desses imigrantes no Estado do Amazonas ocorre, tato por via terrestre, como por via fluvial, através dos diversos barcos que atracam nos portos fluviais existentes no Estado. Acredita-se que um dos motivos para demanda é o preço acessível da passagem, o que facilita a viagem e, também, por tratar-se de uma população carente de recursos, o que inviabiliza o ingresso por via aérea que exige também um rigor maior na documentação.

Alguns depoimentos destes imigrantes alegam que os mesmos sofrem vários constrangimentos de toda natureza como, por exemplo, a exploração no trabalho, por parte de brasileiros, e até mesmo de seus compatriotas que se aproveitam da sua condição de clandestinidade. Um acompanhamento mais direto denuncia as situações

7 No caso dos peruanos, a maioria possuí nível secundário, uma vez que, no Peru, normalmente acabam

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desumanas em que vive a maioria desses migrantes em habitações precárias, às margens dos igarapés ou nas distantes periferias da cidade. Todas estas dificuldades fazem com que esta população desenvolva diversas estratégias para sua sobrevivência. Como já apresentado em trabalho anteriormente citado (Santos, 2000) e de acordo com as informações coletadas junto ao SPM, passamos a reproduzir alguns dos resultados deste processo em questão. .

4.1 As Estratégias de Sobrevivência dos Imigrantes Estrangeiros

Várias são as estratégias de sobrevivência adotadas pela população estrangeira “indocumentada” que, muitas vezes, tenta superar ou minimizar situações de flagrante e de total desrespeito aos princípios elementares dos direitos humanos. Dentre elas, conforme a Pastoral dos Migrantes, é possível referir:

- Em relação ao trabalho, como já foi dito, os imigrantes, por não possuírem registro de trabalho (carteira assinada) geralmente se vinculam ao setor informal da economia, correndo o risco de serem explorados e não pagos, sem o direito de reagir nem denunciar aos órgãos competentes por receio de implicar em expulsão ou deportação do denunciante;

- Outra estratégia detectada envolve o casamento de brasileiras e estrangeiros com o fim único de garantir a legalização da documentação, uma vez que tal prática dá ao estrangeiro o direito de solicitar a permanência em território nacional pelo Pedido de Permanência com base em cônjugue brasileiro. Caso semelhante se dá com a “aquisição” de filhos brasileiros que lhes assegura o Pedido de Permanência com base em prole brasileira. Estas esposas e filhos nem sempre têm vínculos afetivos com os interessados, o que muitas vezes gera mulheres e filhos abandonados ao próprio destino (OLIVEIRA, 2000);

- O fato de muitos imigrantes freqüentemente serem ludibriados quando de seu ingresso no país. Embora não lhes seja necessário visto de entrada em território brasileiro, os imigrantes necessitam de um documento emitido pela PF que indica a

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legalidade do referido ingresso. Ocorre que, para a obtenção deste documento, têm de adquirir documentação básica que muitas vezes não sabem ser falsificada8;

- No caso das mulheres, uma outra implicação, além daquelas que dizem respeito aos homens, refere-se aos casos de violência. Ao sofrerem algum tipo de violência (violência física, abuso sexual, etc.), as mulheres e/ou crianças não podem procurar as autoridades policiais competentes para fazer as respectivas denúncias, com receio de toda uma série de conseqüências, tanto para o agressor (por exemplo, o marido, no caso de violência doméstica), quanto para a vítima, se esta também for clandestina. Pelo fato de a mulher estar residindo de forma ilegal no país, ou ser portadora de documentos falsificados, não pode denunciar a violência, em face do risco de ter de responder a processo por falsidade ideológica e estelionato, situação esta em que, além de permanecer presa, expõe-se a um processo que pode durar de um a sete anos. Outro aspecto importante a ser mencionado concerne ao registro de alguns casos envolvendo mulheres estrangeiras como vitimas de exploração sexual9;

- Com relação aos filhos de imigrantes “indocumentados”, o grave problema consiste em não poderem freqüentar escolas e ter acesso;

- Outros equipamentos e serviços sociais. Para isto necessitariam de documentação cuja obtenção, colocaria seus pais em risco de serem descobertos pelas autoridades competentes, serem autuados, multados e deportados.

5. A QUESTÃO DAS FONTES ALTERNATIVAS E DOS APORTES TEÓRICOS

Várias são as reflexões que podem ser extraídas do tema da migração de estrangeiros no Estado do Amazonas e que podem ser mencionadas, em suas naturezas diversas que se confluem, e que podem ser consideradas sobre dois aspectos: o das fontes de dados e de análise que vão desembocar nos aportes teóricos deste tipo de migração em um Estado como o do Amazonas, que possui uma diferença enorme em

8 No momento em que escrevíamos este trabalho chegou a informação de que a PF, situada em Tefé,

acabava de deportar 80 migrantes indocumentados sendo em sua maioria de nacionalidade Peruana e Colombiana.

9 O tráfico internacional de mulheres na Região Norte e no Estado é alvo de investigação da Policia

Federal devido a exploração sexual de mulheres tanto de migrantes indocumentadas como de brasileiras que são levadas principalmente para a Venezuela e Guiana, uma vez que o transporte é feito pela BR-174

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relação aos parâmetros utilizadas em outros estados e regiões. É evidente que as formas com que os modos de produção são organizados, acabam por determinar certas teorias que, em nosso entendimento não conseguem explicar em todo, ou em parte, a realidade que emerge destas correntes migratórias no Estado.

Em relação às fontes de dados, nota-se que estas se apresentam com resultados díspares entre si. É evidente que por utilizarem metodologias diferentes, obviamente os dados apresentariam alguma discrepância. Todavia, os números indicam que estas discrepâncias são muito grandes o que, sem sombra de dúvidas, acaba influenciando no conjunto das análises auferidas a partir destas fontes.

No que diz respeito às fontes oficiais, os principais problemas encontrados, além da periodicidade, com referência aos quesitos e a continuidade das variáveis que foram sendo modificadas ao longo dos anos e que nem sempre permitem estabelecer uma relação de continuidade para a população estrangeira, o que ocorre apenas em menor grau com a migração interna.

Por outro lado, as demais fontes oficiais, extra-oficiais ou alternativas, como a Policia Federal, o SPM e a SETRAB, indicam que estas podem, com sérias restrições e, várias mudanças e adequações, representar uma grande alternativa para cobrir o intervalo entre a realização de um censo e outro.

Em relação à PF, os dados mostram que o conjunto destas informações pode ser de grande utilidade para o acompanhamento dos migrantes estrangeiros que entram no Estado do Amazonas. Possivelmente, uma mudança no questionário a ser preenchido pelos estrangeiros indicaria que estas informações poderiam ser muito bem aproveitadas. Também os dados fornecidos pelos Consulados, poderiam estar representando uma boa fonte alternativa de dados.

No caso do SPM, a aplicação contínua e sistemática, de um questionário específico para todos aqueles migrantes, e não apenas para aqueles que vão dar entrada ao acompanhamento do processo de legalização, pode se constituir em uma boa alternativa, sobretudo quando se pensa que este serviço atende, em sua imensa maioria, a uma população desprovida de recursos.

que faz a rota Manaus-Boa Vista-Venezuela como pode ser vista em matéria realizada pelo Jornal “A Crítica” da edição do dia 25/06/2000 .

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As mesma circunstâncias poderiam ser aplicadas aos serviços desenvolvidos pela SETRAB e mesmo junto a outros órgãos do governo estadual ou municipal. Neste caso, a vantagem deste procedimento, da implantação de um questionário com caráter continuo, é que aqui a população alvo seria a de migrantes internos, o que contribuiria em muito para futuros trabalhos e pesquisas nesta área de conhecimento.

A outra fonte de dados, relativa ao Comando Militar da Amazônia (CMA), ainda requer um aprofundado estudo, tanto sobre as fontes, bem como para a confiabilidade da mesma, seja para uma mensuração ou para efeito de avaliação.

Os aportes teóricos sobre a questão da migração de estrangeiros, principalmente no caso do Estado do Amazonas, ainda carecem de um aprofundamento. A partir da constatação de que alguns aspectos devem ser tomados em consideração e que se associam diretamente com as diferentes abordagens situadas ao caráter peculiar que envolve a Região e o Estado, percebe-se que estas, jamais podem ser deixadas de lado quando se trata de aportes teóricos. Passamos a apresentar apenas três destes, dos quais serão tecidos alguns comentários, tais como:

- A Amazônia no Contexto Nacional e internacional;

- Os efeitos das correntes migratórias de estrangeiros, sobretudo dos indocumentados, suas causas, conseqüências e efeitos;

- A abrangência da questão dos Direitos Humanos, relacionada ao tema desta migração específica.

No tocante a questão da inserção dentro do contexto nacional e internacional, os aportes teóricos jamais podem deixar de levar em consideração, como visto em seus aspectos históricos, que as correntes migratórias para o Estado do Amazonas foram realizadas dentro de um contexto nacional e internacional de integração, dentro de um processo de re-ordenamento e de novas configurações do modo de produção, que fez com que o Continente Americano passasse a ser novamente objeto de uma exploração por parte das nações mais desenvolvidas. Inclua-se aqui a Região Amazônica e suas potencialidades o que acabaria deslocando muito do debate sobre a migração de estrangeiros para o campo da segurança, pública e de território.

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Neste movimento de deslocamento de pessoal e de capital (através de suas empresas e projetos), fez com que a Amazônia ganhasse importância tanto interna como internacionalmente. As etapas de desenvolvimento do ciclo da borracha e, posteriormente, da ZFM apontam para a importância destes para os detentores de capital.

No que tange as correntes migratórias internas, como visto anteriormente, estas inserem-se no contexto da necessidade, dentro da óptica do regime militar, de uma integração da Região Amazônica e dos seus estados, com os demais estados brasileiros garantindo, deste modo, uma integração que possibilitaria, no seu entendimento, a segurança deste vasto espaço geográfico com tão pouca densidade demográfica. Porém, as mudanças do modo de produção e da forma de atuação do capital nacional e internacional, acabaram por fazer com que também as migrações dentro do Estado refletissem este movimento mudando o caráter dos fluxos migratórios. O êxodo rural fez com que o governo do Estado levasse adiante a idéia de um desenvolvimento do interior como medida para fixar o homem no campo e também no próprio interior do estado.

È a partir deste contexto que devemos considerar as migrações de estrangeiros, sobretudo dos indocumentados, no Estado do Amazonas. O que deve ser considerado, quando pensamos em termos de outros movimentos migratórios é que a fronteira com países que durante muitos anos vivem em conflitos, inclusive armados, como é o caso da Colômbia, acabam por indicar que os aportes teóricos não podem ser pensados se não, obviamente, a partir do próprio contexto da região. A diferença entre os demais movimentos é que as fronteiras da Amazônia são de grande distância e de difícil acesso, o que faz com que as opções migratórias contrastem com algumas das teorias observadas.

Neste sentido, por exemplo, o fato daqueles imigrantes que entram pela cidade de Tabatinga que dista aproximadamente uma semana de viagem de barco, com mais de 1.000 Km de distância da cidade de Manaus, o maior pólo de desenvolvimento do Estado, acaba comprometendo uma análise mais compacta. Isso faz com que as informações sobre, por exemplo, as migrações por etapas, sejam reconsideradas, bem como explica o por que da vinda de tantos peruanos para a cidade de Manaus e para o

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Amazonas e não para outros estados até com menor distância de deslocamento. Deste modo, como interpretar e como considerar os aportes teóricos conhecidos sem considerar a importância cada vez maior da Amazônia? Como inserir nesta discussão a questão da integração nacional dentro da ótica da questão ambiental que cerca o debate da preservação da floresta, entre outros, que nem sempre são considerados como deveriam? Quais os motivas que determinam por que a região norte ainda continua a merecer um plano concreto de desenvolvimento e de integração nacional?.

6. ALGUNS INDICADORES DE PESQUISAS JÁ REALIZADAS

Quando os pesquisadores do Instituto de Estudos Sobre a Amazônia (IESAM) procuraram analisar alguns dados e informações pertinentes a um fluxo migratório pouco estudado na Região Norte e no Estado do Amazonas no ano 2000 (SANTOS, 2000), detectaram lacunas enormes a cerca do tema.

Tal análise resultou num posterior sensacionalismo criado por parte de alguns órgãos de imprensa nacional, gerando controvérsias perante algumas autoridades locais que, acabou lançando um enorme desafio aos pesquisadores da área da migração na medida em que se percebeu que o estudo deste tema requer uma busca intensa de novas fontes alternativas para pesquisas deste porte.

Passados dois anos do estudo realizado pelos pesquisadores do IESAM, vários foram os aspectos de natureza política, econômica e social que merecem ser considerados e que podem estar contribuindo para as tendências observadas no processo da migração de estrangeiros e de indocumentados no Estado do Amazonas. Em outras palavras é necessário conhecer um pouco mais o cenário que pode estar servindo de possível atração para que se mantenha, ou não, as tendências migratórias de indocumentados no Estado.

Por outro lado, a questão da chamada internacionalização da Amazônia, os conflitos sociais, políticos e armados que continuam pertinentes nos países vizinhos e a persistente idéia de como desenvolver econômica e socialmente o interior do Estado acabam por gerar um belo suporte para novas discussões, tendo como pano de fundo a questão migratória e, de modo especifico, a migração de indocumentados envolvendo relevantes questões como as fronteira e a Segurança Nacional, o tráfico de drogas e de

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pessoas, as relações internacionais, a biodiversidade, a ecologia, os Direitos Humanos, o desenvolvimento econômico sustentável e social e tantas outras.

É no bojo de todos estes processos, e tendo como fulcro central a migração de indocumentados, que este trabalho se propõe a fazer uma reflexão sobre os “antigos problemas” da migração de indocumentados e procurar lançar luz sobre alguns aspectos importantes que envolvem esta migração como é o caso das redes migratórias, o tráfico de migrantes e de prostituição de mulheres em rotas migratórias.

Se por um lado os dados analisados neste trabalho se configuram como de grande escassez, exatamente por expressar as dificuldades da clandestinidade, por outro lado, somente o fato de se poder denunciar a situação já é altamente relevante na medida em que se pode despertar interesses cada vez maiores por este tipo de estudos. Isso, com certeza, provocaria mais e mais a busca de novos caminhos.

No plano da política nacional e estadual dois aspectos estão subjacentes á questão da migração no Estado. Uma delas diz respeito a manutenção dos incentivos fiscais á Zona Franca de Manaus através da prorrogação do atual modelo econômico de desenvolvimento da Região. Esta discussão fez com que, no plano estadual, o Governo e a oposição se unissem na defesa da Zona Franca.

Os que defendem a manutenção da atual estrutura administrativa defendem a mudança no modelo, com ênfase no desenvolvimento do interior através de pólos de desenvolvimento. Um dos argumentos interessantes é que se a distância fosse problema, municípios próximos de Manaus não viveriam situação de pobreza como a observada.

Por sua vez, no último ano o Governo do Estado lançou uma grande ofensiva através do lançamento de mais de 500 obras envolvendo a construção de estradas, escolas, pronto-socorro e hospitais, delegacias, renovação da frota policial em praticamente todos as áreas da capital e dos municípios do Estado, sendo considerada a mais importante delas a criação da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) que nasce com “campus” espalhados por algumas cidades do interior do estado. A demanda reprimida é de tal magnitude que no primeiro vestibular o número de candidatos superou a casa dos 150 mil inscritos.

No plano da política internacional, os conflitos de mais de quatro décadas da qual o povo Colombiano é vitima, deixa esta área de fronteira em um constante estado

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de alerta. Deste modo, de tempos em tempos operações militares são realizadas pelas Forças Armadas Brasileira com o argumento de manter a fronteira do país protegida, não apenas contra os guerrilheiros das Forças Revolucionárias da Colômbia (FARC), mas também do tráfico internacional de drogas oriundas deste país, como também da Bolívia e do Peru.

Neste processo de ocupação da zona de fronteira do Amazonas pelas Forças Armadas Brasileira, na maioria das vezes em atuação conjunta com a Policia Federal, acabam produzindo operações como a COBRA e mais recentemente a TAPURU que fazem emergir outros problemas.

È o caso, por exemplo, da ocupação de terras indígenas em processo de demarcação. Acusações de abuso sexual por parte de homens das Forças Armadas Brasileira e maus tratos aos povos indígenas, apenas revelam os processos que deveriam demandar mais atenção e rapidez pelo Congresso Nacional devido a enorme tensão provocada nestas áreas. Por outro lado, a contradição repousa na própria Constituição que define que todas as terras de fronteira, em uma distância de 100 quilômetros são de responsabilidade Forças Armadas Brasileira e da União. Assim, ocorre que muitas das terras indígenas a serem demarcadas são ocupadas por garimpeiros gerando ainda mais conflitos e tensões. A espera por uma decisão do congresso nacional completou dez anos sem que uma solução fosse encontrada.

Recentemente, os conflitos sociais e políticos na Venezuela também geraram expectativas em relação a um possível aumento na migração de indocumentados para solo brasileiro, ainda mais quando se sabe que somente algumas horas separam um país do outro. Contudo, até o presente momento esta expectativa não vem se concretizando. Uma provável hipótese, a ser confirmada, é que o Brasil parece não significar uma rota promissora para os Venezuelanos.

É no bojo de toda esta conjuntura que se observa que as tendências de migração de indocumentados no Estado, se mantém praticamente inalterada, sendo que o contingente de Peruanos, de Colombianos e de Bolivianos se mantém de forma muito semelhante, inclusive em suas tendências, aquela verificada no ano de 2000.

Apenas a título de esclarecimento é necessário que se tenha claro que neste trabalho parte da concepção de que os migrantes indocumentados são todos aqueles que

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entram de forma clandestina no país ou legalmente e, na maioria dos casos, ao término de seus vistos optam por permanecerem no Brasil, ainda que de forma ilegal e clandestina, correndo o risco de serem presos de posteriormente deportados. Este esclarecimento se faz importante na medida em que o SPM atua de forma a orientador os migrantes sem, contudo, existir qualquer forma de incentivo para sua permanência em solo brasileiro como poderia ser interpretado por qualquer pessoa que não saiba do trabalho realizado.

São todas estas questões que permanecem ao redor da questão da migração de indocumentados no Estado do Amazonas e, principalmente, na Cidade de Manaus. Uma das indagações mais intrigantes refere-se a busca de redes de apoio e solidariedade para estes migrantes. Se existem, onde e de que modo funcionam? Se não existem quais seriam as razões para este fato? É o que segue.

7.1.1 Redes de Migrantes

Configurou-se considerar a concepção de rede ao conjunto de relações sociais onde o migrante ao sair de seu local de origem estabelece ou estabelecerá no seu local de destino. São os mais diferentes e diversos espaços sociais ou institucionais no momento da chegada e posteriormente que garantem a muitos migrantes uma certa segurança e estabilidade no país de destino.

Por espaços sociais se entende desde a casa de pessoas que, mesmo não sendo conhecidas, são indicações seguras para o processo inicial de adaptação até o consulado mais próximo, espaço institucional, onde sempre é possível a obtenção de informações e de amparo quando necessário. Um aspecto importante das redes e aquela que considera os aspectos psicológicos dos migrantes na medida em que o apoio advindo da simples conversa ou do exemplo daqueles migrantes com mais experiência são de suma importância para que a saudade de casa, dos amigos e de todo o conjunto de situações, sejam superadas (Ver texto de Pe. Danillo Ravanello por ocacião do Seminário: Migração na Amazônia - um panorama atual. 14 de junho de 2001).

É assim que se configuram pontos importantes de referência os bares, os restaurantes, as igrejas, as associações das mais variadas, onde, em muitos casos, permitem referência para alocação de trabalho, problemas de saúde entre outros

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aspectos de importância vital para o migrante que optou em tentar a sorte em outro país onde o fator do idioma e as barreiras culturais nem sempre tornam a adaptação algo de acalanto. São estes locais, de trabalho ou não, referência e pontos estratégicos de sociabilidade para este processo migratório, independente do mesmo ser realizado nos Estados Unidos, na França, no Japão ou mesmo no Brasil para os estrangeiros, conforme se observa em trabalhos realizados por Sales (1998) e Elisa (2000) para a migração internacional e Salim (1996), entre inúmeros outros que procuraram retratar a situação da migração estrangeira em solo brasileiro.

É evidente que atualmente este processo se faz de modo um tanto quando mais simples, embora não dificultoso, do que em seu inicio, ainda nas décadas de 80 e 90 quando as primeiras levas de brasileiros procuravam, sobretudo nos Estados Unidos e posteriormente no Japão, na migração internacional saída para os problemas que encontravam no pais em seu processo de abertura e redemocratização. Soma-se a este movimento aquele realizado por brasileiros no lado Paraguaio.

Quanto á migração de estrangeiros, é provável que poucos foram os Estados das regiões brasileiras que não conheceram o deslocamento de pessoas estrangeiras em busca de novas terras ou abrigos em tempos de guerras. Deste modo, se configurou um amalgama de culturas e povos permitindo o contraste encontrado de modo permanente na feição dos rostos, na forma do falar, da culinária e dos costumes. O Estado do Amazonas não ficou distante deste processo. A contribuição de Portugueses, Árabes, Judeus, Japoneses, entre outros, podem ser notadas até os dias de hoje. Seja em suas formas e no estilo arquitetônico, seja no deslumbrar da cidade em seus mais recônditos e diferentes espaços sociais.

Contudo, a rede migratória implica em uma solidariedade que perpassa a simples idéia de que se nasce em um mesmo país. Vai para muito mais além. Se expressa em uma noção de direitos e oportunidades que apenas não significa um estender as mãos ao outro que acaba de chegar. Trata-se, na verdade, de uma idéia de que é possível construir juntos um espaço onde os compatriotas sintam que as chances existem, para todos, e que as agruras passadas não devem ser repetidas. Todavia, não é isto que se observa em relação aos Peruanos, Colombianos e Bolivianos que aportam no Estado do Amazonas.

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O primeiro aspecto que devemos considerar, e que chama a atenção para a questão das redes sociais da migração estrangeira, é aquela referente ao atendimento em seus respectivos consulados. Poucos são aqueles consulados onde o Cônsul é realmente nativo e oriundo do país de origem sendo, na maioria dos casos, representantes honorários, ou seja, brasileiros que são nomeados para representar este país no Estado do Amazonas.

Neste sentido, este procedimento gera inúmeros problemas para os estrangeiros, sobretudo quando estes se vêem em situação de clandestinidade. Outro problema é mesmo a falta de certo interesse na procura de soluções para alguns casos que envolvem papéis e documentação deixando, em muitos casos, uma sensação de profunda desesperança naqueles que procuram seus consulados e não encontram apoio. Felizmente, as exceções existem.

Uma característica importante, principalmente quando se trata dos peruanos, é a completa ausência de solidariedade entre eles. A sensação é a de que aqueles que chegaram antes não querem saber daqueles que estão chegando. No Estado do Amazonas, onde uma parcela considerável de peruanos que já está legalizada seja porque possuem filhos brasileiros, por matrimônio ou reunião familiar, enfim, estão com sua situação legalizada, dificilmente se interessam pelo destino de seus compatriotas sendo que, em grande parte, acabam trabalhando em ramos e locais semelhantes. Quando se indaga a razão deste fato as respostas normalmente representam um “não sei” sem muito entusiasmo ou prolongamento no assunto.

Poucos são, na Cidade de Manaus, os bares e restaurantes pertencentes a comerciantes peruanos. Quando encontrados, trata-se de bares e restaurantes simples, na maioria das vezes acanhados e alguns “escondidos”. Os pratos típicos, como “cebiche” serve de acalanto para a “nostalgia” sentida do país, dos familiares e, em grande parte, dos filhos deixados para trás onde a esperança de trazê-los um dia faz com que resistam as situações de adversidade. A música que invade o ambiente são recordações que tornam os rostos um pouco mais sisudos, fechados. Para aqueles que já se ambientaram e se encontram legalizados o contraste é gritante se manifestando em uma alegria daqueles que possuem apenas as preocupações normais cotidiana de qualquer brasileiro.

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Porém, nem tudo é considerado distanciamento ou isolamento. Os instantes de solidariedade existem se concretizando na forma da divisão de alguns espaços comuns como, por exemplo, as barracas instaladas e espalhadas pelo centro da cidade onde são expostos materiais de artesanato e todos os tipos de produtos que possam ser comercializados sejam comidas, roupas ou materiais que possam ter um retorno fácil e rápido garantindo, deste modo, o sustendo cotidiano e o pagamento de aluguel de quartos e pensões ou então, para os melhores aquinhoados, de pequenos apartamentos.

Quando reunidos na praça, a sensação é de que se sentem mais seguros em relação ao seu destino, ainda que muitos vivam em condições de penúria. Contudo, uma idéia muito percebida é o distanciamento, que os já legalizados procuram ter em relação aqueles que possam lhes causar prejuízos. Neste caso, o afastamento daqueles que lidam com drogas é maior, o que lhes garante uma certa proteção por parte da incômoda ação da policia quando das operações desencadeadas em busca de traficantes sempre que um carregamento de vulto é objeto de denúncia ou apreensão por parte da Polícia civil ou Federal.

O sentimento narrado por alguns revela o medo por parte dos policiais da policia civil do Estado do Amazonas maior do que por parte da Policia Federal. O argumento é de que muitos, em situação irregular, acabam “tendo que pagar propinas” para estes maus policias que ainda acabam chamando a PF para cuidar do caso. Neste sentido o prejuízo é duplo: além de perder o pouco que possuem ainda se vêem em situação de se defrontarem com os problemas inerentes a uma ida à PF, nem que seja apenas o transtorno de ir e voltar perdendo, em muitos casos, um tempo precioso de suas vidas.

Enfim, as redes de solidariedade para os migrantes estrangeiros indocumentados no Estado do Amazonas, no caso dos peruanos, é praticamente inexistente. Para os Colombianos e Bolivianos esta situação é ainda mais agravada na medida em que a situação da guerrilha e dos conflitos internos em seus países e o menor número de pessoas aqui residentes, as torna ainda mais vulneráveis a esta situação onde as dificuldades do atendimento nos consulados e mesmo por parte das instituições governamentais que atuam no Estado que não estão preparadas para este tipo de atendimento torna ainda mais penoso a sua existência em solo amazonense.

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