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A cura do câncer na agenda setting: crenças, leis e política se sobrepondo à evidência científica

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Academic year: 2021

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Título do Artigo

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ste artigo tem a proposta de promover uma reflexão acerca da qualida-de da informação difundida pelas mídias convencional e especializada desde que o tema “pílula do câncer” foi introduzido no noticiário. Nes-ta análise, buscamos contextualizar a importância da Comunicação em saúde e ciência ao levar informação clara e objetiva para a sociedade e, desta forma, minimizar os riscos de o público-leigo alimentar a crença de que uma substância, não submetida a um estudo clínico que comprovasse sua eficácia e segurança, simbolize a cura do câncer.

Palavras-chave: cobertura jornalística; comunicação, divulgação científica,

co-municação em saúde.

José de Moura Leite Netto

Mestre e doutorando em Ciência com ênfase em Oncologia pelo A. C. Camargo Cancer Center Pós-graduado em Comunicação Jornalística pela Faculdade Cásper Líbero E-mail: mouraleitenetto@gmail.com

setting: crenças, leis e política se

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Artigo

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Este artículo propone promover una reflexión sobre la calidad de la información difundida por los medios de comunicación convencionales y especializados desde que el tema “píldora del cáncer” se introdujo en la agenda del periodismo brasileño. En este trabajo, la misión es hablar sobre la importancia de la comunicación en la salud y la ciencia información clara y objetiva para la sociedad, y de esta forma minimizar el riesgo de que el público tenga la creencia de que una sustancia, no sometida a un estudio clínico que confirme su eficacia y seguridad, represente la cura para el cáncer.

Palabras-clave: Cobertura periodistica; Comunicación; Divulgación científica;

Comunica-ción en salud.

La cura para el cáncer en el establecimiento de

la agenda periodista: creencias, leyes y políticas

se superponen la prueba científica

This article has a proposal to offer a reflection about the quality of information widespread by conventional and specialized media in according to the theme “cancer pill” since the subject was introduced in the brazilian press. In this analysis, we seek to contextualize the importan-ce of health and scienimportan-ce communication, by taking a clear and understandable information to society and to offer information about cancer that minimizes risks from peolple’s belief about a substance that have never been tested in clinical trials, with eficience and security, representing the cure of cancer.

Keywords: journalistic coverage; communication; scientific divulgation; health communication.

The cure of cancer in the agenda setting theory:

beliefs, laws and politics overlapping the

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Introdução

Com mais de 14 milhões de novos casos e 8 milhões de mortes por ano, o câncer é a segunda causa de óbitos no mundo, superada apenas pelas doen-ças cardiovasculares. No Brasil, as mortes não naturais, como consequência da violência, ocupam o segundo lugar, enquanto o câncer é a terceira causa de mortalidade no país. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), esti-ma-se que mais de 32 milhões de pessoas vivam hoje após terem recebido o diagnóstico da doença. Nesse contexto, trata-se de uma doença que deve ser vista como um problema de saúde pública.

Plural e complexo, o câncer reúne diferentes capacidades biológicas e, desta forma, cada tumor pode ser desenvolvido a partir de vias e mecanismos específicos. A partir de Hannahan e Weinberg (2011, p.646), observa-se que o câncer é capaz de inibir a ação de genes que têm a função de suprimir o desenvolvimento da doença; de impedir que o sistema imunológico seja ca-paz de reparar os danos ao DNA; de criar um microambiente favorável para a replicação de células doentes e de gerar uma instabilidade no genoma e de adquirir características mais agressivas, inclusive com potencial de promover o desenvolvimento de metástase, que é a capacidade da doença se espalhar do local de origem para outros órgãos.

Nesse cenário, o que se busca é oferecer a cada paciente um tratamento personalizado, ou seja, desenhar uma abordagem terapêutica para cada perfil de tumor. Uma forma de explicar essa complexidade e a importância dessa per-sonalização das terapias é exemplificar a partir do câncer de mama.

O câncer de mama, clinicamente, é uma doença heterogênea e categoriza-da em três prevalentes grupos terapêuticos, conforme destaca o Cancer Genome Atlas Network, estudo multicêntrico publicado em 2012 na Nature. O principal subtipo molecular de câncer de mama é o hormônio positivo, doença cujos fa-tores de risco são a mulher ter passado por muitos ciclos menstruais resultan-tes, por exemplo, de menarca precoce, menopausa tardia, nuliparidade (nunca ter tido filhos), primeira gravidez em idade mais avançada, ter tido poucos fi-lhos e ter amamentado pouco ao longo da vida. Além disso, a questão hormonal também é ponto chave para o tratamento. Essas pacientes costumam responder bem à terapia com tamoxífeno, que diminui também o risco de recorrência da doença. (Iyeyasu, 2013, p.401). Por sua vez, aproximadamente 20% dos casos de câncer de mama são associados a uma mutação no gene HER-2, sendo que essas pacientes não respondem ao tratamento convencional e sim ao trastuzumabe (Herceptin), droga que atua justamente no gene alterado, responsável por desen-cadear a doença. Há também os tumores chamados triplo negativos (não são

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es-trogênio ou progesterona positivos, nem relacionados com mutação no HER-2) e, consequentemente, menos responsivos aos tratamentos descritos acima. Ou-tras variáveis também são fundamentais, como idade da paciente no momento do diagnóstico, estadiamento (fase em que a doença é descoberta), localização (se está restrita ao ducto da mama ou se espalhou para as axilas), ocorrência de metástase (se espalhou para outros órgãos), etc.

Essa complexidade não se restringe ao câncer de mama. Há tratamento personalizado para determinados tumores pulmonares, renais, colorretais, gas-trointestinais, dentre outros. Rodrigues-Antona e Taron (2015, p. 204) afirmam que o número de drogas oncológicas desenhadas para marcadores biológicos específicos excede qualquer outro campo médico, sendo que a Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador dos Estados Unidos, relaciona mais de 150 rótulos de farmacogenética, sendo um terço deles para tratar o câncer.

Inserido na agenda jornalística, o câncer não costuma ser visto em sua complexidade pelas redações, pois há uma deficiência de conhecimento pré-vio e substituição da evidência científica pelo apelo emocional. Na visão de Foucault (2003, p.34), muito em razão do despreparo do jornalista, a cobertura jornalística da ciência vem encontrando um grande entrave, que é o discurso jornalístico impregnado de sensacionalismo e de uma pseudomedicina.

O exemplo mais atual do despreparo dos jornalistas ao abordar temas voltados à ciência é a cápsula que traz o composto fosfoetanolamina sintética, denominada pela mídia como a “pílula do câncer”. O tema está presente na

agenda setting desde agosto de 2015 e tem gerado um grande impacto social,

envolvendo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com ampla reper-cussão internacional e muita desinformação para o público-leigo.

O presente artigo tem por objetivo analisar a qualidade da informação di-vulgada pela mídia em relação ao tema fosfoetanolamina sintética, pontuando e comparando os extremos, que são a cobertura sensacionalista e a difusão de informação baseada em evidência científica.

A agenda de um jornalismo que cura o câncer

Uma das linhas de pesquisa que vem trazendo resultados efetivos de ini-bição do câncer é a de desenvolvimento de drogas antiangiogênicas. Angiogê-nese é o processo pelo qual há um crescimento anormal de vasos sanguíneos que levam ao desenvolvimento e suprimento de tumores. Se há hoje uma série de inibidores desse processo, como endostatina e angiostatina, é resultado de décadas de estudos que iniciaram em laboratórios e que foram precedidos por ensaios clínicos em humanos.

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A teoria de que o câncer teria um de seus processos interrompidos por in-termédio do bloqueio de seu suprimento sanguíneo foi proposta por Moses Judah Folkman (1971, p.1182). O autor sugeriu que a inibição da angiogênese talvez fosse uma estratégia capaz de impedir a formação de tumores e também de metástases. Quase três décadas depois, ainda não havia evidências suficientes que pudessem confirmar a aplicabilidade no tratamento de tumores em humanos. No entanto, uma euforia tomou conta dos veículos de comunicação. Em entre-vista ao The New York Times (1998, online), Folkman, ao ser questionado sobre o que ele diria aos pacientes que ansiavam por uma nova opção terapêutica, afir-mou que se o paciente tivesse um câncer e ele fosse um rato, já haveria coisas boas para cuidar dele.

Por mais que Judah Folkman tivesse dados que mostravam o quanto ele estava no caminho certo, não seria ético fazer qualquer afirmação antes da realização dos ensaios clínicos em seres humanos. Quatro anos depois, Folkman publicou os resultados do primeiro inibidor de angiogênese a ser utilizado em humanos, o Interferon alfa, abrindo caminho para essa nova classe de drogas. O próprio autor é o responsável por descrever essa trajetória.

[...] inibidores da angiogênese estão a emergir como uma nova classe de drogas. Eles foram estudados no laboratório por mais de 25 anos, antes que eles começassem a ser traduzidos em aplicações clínicas cerca de 10 anos atrás. Eles inibem ou desligam o excessivo crescimento anormal de vasos sanguíneos em tumores e metástases, bem como nas doenças do olho, da artrite, e em outras doenças. Atualmente, há mais de vinte e quatro desses inibidores da angiogênese em ensaios clínicos para o câncer em mais de 110 centros médicos nos Estados Unidos. (Folkman, 2002, p. 361).

A conduta ética de Judah Folkman não foi reproduzida por cientistas brasi-leiros responsáveis pelas pesquisas com a fosfoetanolamina sintética. O químico, livre-docente e aposentado pela USP, Gilberto Chierice, concedeu uma entrevista para a emissora EPTV, filial da Rede Globo na região de São Carlos e Araraquara, no interior de São Paulo, na qual foi dada ênfase para a fosfoetanolamina sintética como sendo uma substância que, nas palavras do pesquisador, imita uma subs-tância presente no organismo e sinaliza células cancerosas para a remoção pelo sistema imunológico. A matéria, reproduzida no Portal G1 (2015, online), com um título que exalta uma fala do cientista ‘Pesquisador acredita que substância desen-volvida na USP cura o câncer”, ressalta que o composto, sintetizado pelo grupo desde o fim dos anos 1980, não tinha sido comercializado até então apenas pela má vontade das autoridades. A fosfoetanolamina sintética, no entanto, até aquele momento, nunca tinha sido submetida a qualquer tipo de teste de eficácia, nem de segurança em humanos. Em consequência da reportagem, intensificou-se o desejo de pacientes de exigir a distribuição, pela via judicial, da pílula milagrosa.

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Após a ampla repercussão do assunto que, a partir da publicação da repor-tagem do G1 (2015b, online) foi inserido na agenda setting da mídia brasileira, o mesmo veículo trouxe, duas semanas depois, uma reportagem cujo discurso buscava contrapor o texto anterior, desta vez cumprindo o papel de ouvir opi-niões díspares e contextualizando a importância da pesquisa clínica por meio do detalhamento do passo a passo de cada etapa que envolve o desenvolvimento de uma nova droga. No entanto, o alarde já estava feito e o assunto, quase um ano depois, não saiu do noticiário nacional e repercute, como abordaremos neste artigo, também na mídia convencional e em revistas científicas internacionais.

A pílula do câncer, termo cunhado pela mídia, ao figurar e permanecer na

agenda-setting theory (teoria do agendamento), afeta diretamente a sociedade,

pois essa hipótese da Comunicação é determinada pela imposição daquilo sobre o qual o público falará e discutirá. O que ocorre acerca da fosfoetanolamina sin-tética, visto sob o olhar desta teoria comunicacional, faz com que procuremos respostas para o motivo desse assunto estar tão longevo na mídia.

A Teoria do Agendamento, conforme descreveu Lippmann (1922, online), sugere uma relação causal entre a agenda midiática e a agenda pública. Mais adiante, McCombs e Shaw (1971, p. 176) descrevem que a mídia tende a determi-nar a pauta que irá repercutir na sociedade, a mídia é capaz de determidetermi-nar quais temas são mais abordados, negligenciados ou até mesmo ofuscados e ignorados. A tendência é que as pessoas, segundo Wolf (2001, p. 144), incluam ou ex-cluam dos seus próprios conhecimentos aquilo que os meios de comunicação em massa incluem ou excluem do seu próprio conteúdo, atribuindo àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase dada pela mídia de massa aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas.

Desta forma, a agenda setting faz com que seja real apenas aquilo que aparece na mídia. Nesse sentido, Marilyn e McCombs (1994, p. 249), observam que as notícias afetam as vidas das pessoas, desde a maneira como elas se ves-tem, qual caminho seguem, o que planejam como opção de lazer para o fim de semana e o que a eles proporciona bem-estar ou segurança.

Colocando como objeto de análise apenas o evento pílula do câncer, a de-finição de Wade (1971, p. 679) para a teoria de agenda setting, é emblemática. Para o autor, a cobertura midiática sobre o câncer precisa ter a preocupação de não gerar falsas esperanças, apresentando os principais tópicos sobre câncer de maneira equilibrada.

Da mesma forma que a cura do câncer está intrínseca no discurso midiático em torno da fosfoetanolamina sintética, nossos resultados apresentados em dis-sertação de mestrado (Leite Netto, 2015, p. 76), apontam que, nas 244 reporta-gens analisadas no estudo, a cura da doença foi o tema prevalente, figurando em 51% dos documentos, enquanto que morte apareceu em 36% e cuidados

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palia-tivos em apenas 2% dos casos. Outros assuntos negligenciados, segundo nossos dados, foram radioterapia e síndromes hereditárias.

Observamos que, além dos oncologistas, cientistas e demais profissionais de diferentes áreas da assistência, ensino e pesquisa do câncer, os jornalistas tam-bém estão em busca da cura do câncer e, consequentemente, de noticiar este feito em primeira mão, configurando o chamado ´furo jornalístico´, ou seja, tra-zer o fato para o público antes de todos os concorrentes. Essa busca incessante resulta em uma cobertura jornalística relacionada ao câncer com discurso exage-radamente otimista e, muitas vezes, sensacionalista.

A história de uma paciente diagnosticada com câncer de ovário abriu uma reportagem do programa Bem Estar, da TV Globo, produzida pela filial da emis-sora em São Carlos, a EPTV. A paciente em questão, conforme descreve a ma-téria (Bem Estar. 2016, online), parou o tratamento com quimioterapia após a primeira sessão e passou a ingerir a pílula de fosfoetanolamina. A filha, sentada no sofá ao lado da mãe (que é a paciente), afirma que foi nítida a melhora clínica da mãe, após tomar a pílula, e que proibir a sua distribuição era impedir essa evo-lução. A mãe aparecia, aos prantos, em planos de câmera bem fechados. Acredi-tando no discurso otimista que envolve a pílula milagrosa, a paciente não apenas acreditou na eficácia da substância, como interrompeu o tratamento oficial que fora preconizado a ela de acordo com critérios clínicos.

Na mesma reportagem, outra paciente que não tem mais acesso à distribui-ção da substância aparece na cama, respirando com auxílio de aparelhos, acom-panhada de seus filhos que se aproximam, tocam nela e choram. Tudo em um ritmo lento e carregado de apelo emocional.

Vale ressaltar que o propósito deste artigo não é deslegitimar o desejo de pacientes, familiares e demais cuidadores pela cura do câncer para os casos em que a medicina e a ciência ainda nãos são capazes de proporcionar êxito e, sim, propor uma reflexão sobre o cenário de histeria coletiva resultante do alarmismo promovido por muitos veículos de comunicação.

O fenômeno da histeria, introduzido por Breuer e Freud (1883, p. 3) foi descrito como consequência de uma experiência, real ou imaginária, a qual o pa-ciente não gosta de discutir ou, principalmente, porque ele é, segundo os autores, incapaz de lembrá-la e muitas vezes não tem qualquer suspeita da relação causal entre o evento em si com a patologia que apresenta.

Por sua vez, a histeria coletiva, conforme descreve Costa (2013, p. 146), citando Charles Melman, é uma expressão da neurose histérica manifestada co-letivamente, o que produz efeito de epidemia. Analisamos que, neste contexto, a histeria coletiva é alimentada pela espetacularização do noticiário acerca do tema fosfoetanolamina sintética.

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O espetáculo, afirma Costa, é cada vez mais dominante e crescente na sociedade. Como se o espetáculo fosse um dos caminhos ideais para se entrar no mundo. Um outro caminho, segundo ela, seria o comunitarismo, que ocorre pela reunião de diversas vozes separadas a fim de se transformar numa recla-mação. Pois, separadas, as vozes dos sujeitos ignorados no campo da represen-tação, são vozes mudas.

Portanto, a espetacularização promovida pela mídia oferece uma voz co-letiva para pacientes que veem na pílula do câncer a cura da doença e solução para todo o mal-estar que a enfermidade acarreta. Além disso, une as vozes que falam sobre a existência de uma possível conspiração protagonizada por médicos, cientistas e indústria farmacêutica, agentes que teriam interesses econômicos em não permitir o avanço de possíveis estudos que comprovassem a eficácia da substância.

A espetacularização e o desprestígio do bom jornalismo são cada vez mais evidentes na cobertura midiática nos dias atuais.

[...] a fronteira que separava o jornalismo sério do escandaloso e sensacionalista foi perdendo a nitidez, enchendo-se de buracos até em muitos casos se evaporar, ao ponto de ser difícil nos nossos dias atuais estabelecer a diferença nos vários meios de comunicação. Porque uma das consequências de converter o entretenimento e a diversão no valor supremo de uma época é que, no campo da informação, insensivelmente isso vai produzindo também uma inversão escondida das prioridades: as notícias passam a ser importantes ou secundárias sobretudo, e às vezes exclusivamente, não tanto pelo seu significado econômico, político, cultural e social e mais pelo seu caráter original, surpreendente, insólito, escandaloso e espetacular [...] (Llosa, 2012, p. 50).

Tal sensacionalismo, conforme analisaremos a seguir, alimenta o desinte-resse dos cumprimentos de preceitos éticos, como garantir ao paciente um trata-mento seguro e eficaz, baseado em evidências cientificas.

Descumprimento dos preceitos éticos

Durante mais de 20 anos, a pílula contendo fosfoetanolamina sintética foi distribuída no campus de São Carlos da Universidade de São Paulo para pacientes com diagnóstico de câncer, sem que esse processo estivesse inserido em um estu-do controlaestu-do e aprovaestu-do por algum Comitê de Ética de Pesquisa em humanos.

O assunto ganhou repercussão internacional, ocupando páginas de duas das mais prestigiadas revistas científicas do mundo, a Science e a Nature. A re-portagem publicada na Nature (Ledford, 2015, p. 420) relata a forma como o público leigo saúda a fosfoetanolamina como símbolo da cura do câncer, mesmo

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sendo uma substância que tem revelado algum potencial antitumoral apenas em ensaios in vitro e com camundongos. O autor alerta que drogas que se mostram promissoras em estudos de laboratórios e em modelos animais têm uma taxa no-toriamente baixa de êxito em ensaios com humanos e, apesar disso, os químicos brasileiros vinham fabricando e distribuindo as pílulas.

Na Science, os textos (Escobar, 2016a, p. 18) e (Escobar, 2016b, online) con-textualizam a história dos acontecimentos, desde a sintetização da fosfoetano-lamina em laboratório e sua distribuição aleatória para pacientes com nenhum controle de eficácia e segurança; passando pela decisão tardia da Universidade de São Paulo de proibir a produção da pílula dentro do campus em São Carlos, até a apropriação do tema pelos poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, que in-cluem aprovação da distribuição da pílula em votação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal e sanção da então presidente, hoje afastada, Dilma Rousseff. Diante desse cenário envolvendo todos os Poderes, o Governo Federal reu-niu um grupo de cientistas não vinculados aos trabalhos anteriores com a subs-tância para avaliar sua possível eficácia. O documento oficial ressalta que:

[...] Diante da repercussão de notícias vinculadas na imprensa sobre a produção e distribuição da fosfoetanolamina (FOS), para fins terapêuticos no tratamento do câncer, pelo Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da Universidade de São Paulo (USP), e tendo em vista as audiências públicas realizadas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o Ministério da Saúde decidiu criar um Grupo de Trabalho (GT) para apoiar o desenvolvimento de pesquisas que possam fornecer as informações necessárias para a determinação da eficácia e da segurança dessa substância (...). (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, 2016).

Os primeiros relatórios foram produzidos e desconstroem argumentações dos que são favoráveis à produção e distribuição. No primeiro deles, revelou-se que a pílula contém, no máximo, 32% de fosfoetanolamina e que essa molécula, segundo análise in vitro, é pouco eficaz ou até mesmo inócua contra tumores de pâncreas e melanoma. Os relatórios subsequentes também não demonstraram qualquer eficácia do composto. Um dos relatórios mostrou taxa de resposta em células de melanoma em ratos expostos ao composto, porém inferiores ao trata-mento convencional com cisplatina. (UOL, 2016, online).

Conforme reforça reportagem de capa da revista Pesquisa Fapesp, o fato de uma determinada substância apresentar alguma resposta antitumoral, em mo-delos in vitro ou animais, não representa, necessariamente, êxito na pesquisa em humanos: “(...) moléculas candidatas a serem reconhecidas como medicamentos precisam passar pela pesquisa pré-clínica antes de serem testadas em pessoas sadias ou pacientes.” Nessa etapa, a toxicidade e os possíveis efeitos terapêuticos do composto são observados in vitro, em células de animais ou humanas

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vadas em laboratório, e in vivo, em modelos animais, geralmente camundongos, com uma versão da doença humana a que o pretenso fármaco se destina. Sem apresentar resultados satisfatórios, cerca de 90% das moléculas pesquisadas não passam dessa fase. As que se mostram seguras e com potencial de combater al-guma patologia podem se tornar alvo de estudos clínicos, ou seja, serem testadas em seres humanos (...). Pesquisa Fapesp. 2016a, p. 16.

A mesma reportagem descreve que o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) lidera um estudo multicêntrico para investigar a eficácia e segu-rança da droga em estudos clínicos com humanos, cujo protocolo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde (Conep-CNS) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão fe-deral que regula o registro de medicamentos e alimentos. Um trâmite que, enfim, respeita os preceitos éticos.

A distribuição da pílula ocorrida por duas décadas lembra o período da Segunda Guerra Mundial. Durante anos, humanos foram envolvidos em experi-mentos impostos pelo governo nazista, sem a existência de diretrizes bioéticas. O Código de Nuremberg surgiu no pós-Guerra justamente como um conjunto de princípios éticos que regulamentassem a pesquisa com seres humanos.

O Código de Nuremberg, de 1947, determinou a obrigatoriedade do con-sentimento do voluntário; que os resultados devessem ser para o bem maior da sociedade; que a pesquisa seja conduzida com o propósito de evitar sofrimento físico/mental e lesões; os riscos não podem superar os benefícios; ser encerra-da quando lesões, incapaciencerra-dades ou mortes ocorressem, dentre outras mediencerra-das, descritas em documento editado por Wolstenholme e O´Connor (1966, p. 2016). O importante caminho introduzido pelo Código de Nuremberg passou por ajustes e assim originou o Código de Helsinque, que traz os princípios éticos que regem atualmente a pesquisa com seres humanos. Redigido pela Associação Médica Mundial em 1964, passou desde então por sete revisões em seu texto, sendo a mais recente em 2013. É considerado o primeiro padrão internacional de pesquisa biomédica e constitui a base da maioria dos documentos subsequentes. E, em nenhuma hipótese, prevê a distribuição, sem evidência científica, de uma substância em forma de pílula.

Por uma cobertura baseada em evidências científicas

O excesso de otimismo em torno da pílula do câncer não é um evento isolado. Fórmulas milagrosas de cura da doença já haviam sido propagadas. Substâncias extraídas do ipê roxo, gel de babosa, dentre outras informações equivocadas que ganham ainda mais força com o crescimento do compartilha-mento via mídias sociais, são associadas com a eliminação de tumores

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malig-nos. No entanto, essas notícias contendo falácias não são reproduzidas apenas no campo do senso comum, como também por formadores de opinião, princi-palmente por veículos de comunicação não especializados.

Conforme observa Bonalume Neto (2004, p. 95) é grande a falta de pre-paro de jornalistas para tratar de temas específicos, havendo, de acordo com o autor, uma minoria de repórteres especializados e mesmo esses cometem erros, assim como os próprios cientistas, o que demonstra a necessidade de estudos e atualização constante na divulgação dos fatos.

Na opinião de Hartt (2014, online) a oncologia é um mundo de com-plexidade e querer, por exemplo, que o mesmo jornalista cubra o jogo de fute-bol na quarta e na quinta acompanhe uma coletiva em um congresso de onco-logia é uma opção que não vai funcionar.

É preciso, portanto, aproximar a ciência da população leiga. Um exemplo recente é o evento Pint of Science, um festival criado na Inglaterra em 2013 com a intenção de aproximar os pesquisadores de um público mais amplo além da universidade (Pesquisa Fapesp, 2016b, online). Realizado pela segunda vez no Brasil, o movimento, que leva assuntos científicos para dentro de bares e res-taurantes, ocorreu em sete cidades do país em 2016.

Essa aproximação é fundamental. Com múltiplas facetas, o câncer é uma doença complexa tanto para os cientistas como para o público leigo, trazendo a insegurança de se tratar de algo desconhecido. Ao realizar a cobertura de te-mas relacionados a essa doença, cabe aos veículos de comunicação saber fazer uso de estratégias comunicacionais e, desta forma, conseguir difundir questões que estimulem na sociedade a aceitação do tema.

Para ser eficaz é necessário que a informação seja transmitida com clareza e objetividade. Segundo Martins (1997, p. 15), a simplicidade é condição essen-cial no texto jornalístico, para que a todos os leitores seja garantido o direito de entender o texto.

Acreditamos que o ato de expandir os horizontes do leitor, oferecendo a ele a oportunidade da obtenção de um maior repertório frente aos assuntos relacionados ao câncer, favorece um cenário no qual o público se torna um re-ceptor que poderá compreender, de fato, o conteúdo gerado pela mídia. Na opi-nião de Luz (2010, p. 257), somente com a compreensão das matérias é que se atingem os objetivos do jornalismo científico, pois uma matéria bem redigida, afirma a autora, tem o poder de motivar o leitor a se informar com seu médico sobre a prevenção e o tratamento de doenças.

O cenário estabelecido em torno do tema fosfoetanolamina exige um po-sicionamento decisivo e constante por parte da comunidade médico-científica e também dos jornalistas especializados das editorias de saúde e ciência, assim como dos demais profissionais que promovem difusão científica, no sentido que

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todos unam forças em elucidar dúvidas da sociedade sobre a importância de se respeitar cada uma das etapas do rito do fazer científico, inclusive do desenvolvi-mento de novas drogas durante cada uma das etapas de pesquisa clínica.

(...) o jornalismo científico é de máxima importância na área da comunicação, pois coloca a serviço da maioria os conhecimentos da minoria. É importante também para a ciência, pois lhe permite sair das torres de marfim de seus laboratórios e gabinetes de trabalho para acercar-se do povo em um exercício da mais difícil democracia, a da cultura (...). Abramczyk (2013, p. 249).

O que se vê, no entanto, é que assim como há uma distância acentuada entre a pesquisa básica e o que, de fato, é transposto para a clínica, ocorre tam-bém um distanciamento entre o que, de fato, pensam jornalistas, cientistas e o público em geral. Na opinião de Gabriel García Márquez, em discurso publi-cado no Observatório da Imprensa (1996, online), as redações são laboratórios assépticos para navegantes solitários, onde parece mais fácil se comunicar com fenômenos siderais do que com o coração dos leitores.

Portanto, promover uma Comunicação eficaz que esteja embasada por dados validados, pode diminuir o abismo que hoje separa a sociedade da com-preensão da amplitude da complexidade do câncer e do quanto é importante haver o cumprimento de cada uma das etapas do desenvolvimento de novas drogas. Isso feito, não sobrará espaço para que crenças em fórmulas milagrosas ganhem espaço e se sobreponham à evidência científica.

Apesar da ausência de evidências com os estudos pré-clínicos, o primeiro ensaio em humanos de fase I com a fosfoetanolamina sintética teve início no fi-nal do mês de julho. Nesta fase inicial, com foco em determinar a segurança da dose, a substância está sendo avaliada em 100 pacientes recrutados pelo ICESP.

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