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SAMUEL PEDRO FERREIRA SILVA

DIREITO À MORADIA: JUDICIALIZAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E

EFETIVAÇÃO

LAVRAS – MG

2019

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SAMUEL PEDRO FERREIRA SILVA

DIREITO À MORADIA: JUDICIALIZAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E

EFETIVAÇÃO

Artigo apresentado à Universidade Federal de Lavras, como parte das exigências do Curso de Direito, para a obtenção do título de Bacharel.

Profª. Dra. Isabela Neves Silveira Orientadora

Prof. Me. Vinícius Nascimento Cerqueira Co-orientador

LAVRAS – MG 2019

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SAMUEL PEDRO FERREIRA SILVA

DIREITO À MORADIA: JUDICIALIZAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E EFETIVAÇÃO THE RIGHT TO HOUSING: JUDICIALIZATION, PUBLIC POLICY AND

EFFECTIVENESS

Artigo apresentado à Universidade Federal de Lavras, como parte das exigências do Curso de Direito, para a obtenção do título de Bacharel.

Profª. Dra. Isabela Neves Silveira Orientadora

Prof. Me. Vinícius Nascimento Cerqueira Co-orientador

LAVRAS-MG 2019

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, o criador de todas as coisas, sem Ele eu nada seria. Em segundo lugar, agradeço à minha orientadora, Professora Isabela. Mulher de garra, determinação e capacidade impecáveis, que foi minha inspiração durante toda a graduação e certamente continuará sendo durante toda a carreira que se apresenta no horizonte. Muito obrigado pela confiança, pelos ensinamentos, pela paciência e pela amizade. Nunca me esquecerei que “a pesquisa é uma atividade solitária”, que “carro apertado é que anda” e do “Vamos que vamos!”.

Agradeço também ao meu co-orientador Professor Vinícius, com quem aprendi que não importa o quanto a situação pareça sem saída, sempre há um caminho. Muito obrigado pelas conversas, pelos excelentes apontamentos, pelas indicações, pela paciência, pela companhia e pela amizade, serei eternamente grato.

Não poderia deixar de agradecer aos meus pais, Denilcio e Solene, sem os quais nada teria sido possível. Fontes da minha inspiração e razão do meu viver. Devo a eles, além de tudo o que sou, o meu caráter. Espero um dia poder ser um homem tão íntegro quanto o meu pai e uma pessoa com tanta excelência quanto minha mãe.

Ao meu irmão, Raphael, agradeço por ter sido desde sempre o meu melhor amigo e meu maior parceiro. Nos meus piores dias, era dele que tirava a força e a motivação para seguir em frente, de cabeça erguida. Jamais me esquecerei que “As coisas mais fáceis da vida são aquelas que se pode tentar de novo” e que “Falar é prata, ouvir é ouro”.

Agradeço imensamente a todos os meus amigos, em especial ao Leandro, Leonardo, e Gustavo, assim como ao meu amigo e mestre Janderson, companheiros que tive ao meu lado durante esta dura caminhada e que muito me ensinaram, ainda que sem o desejo de lecionar. Agradeço por terem me suportado e compreendido os momentos em que não pude estar com eles.

Por fim, agradeço a todos que estiveram comigo durante esta caminhada, familiares e amigos, dos quais eu não poderia deixar de citar meus primos Iago e Phillippe, assim como minha madrinha Laudiene, minha Avó Marlene e minha Tia Marli. Sem eles, eu certamente teria desistido. Muito obrigado!

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RESUMO

O Direito à moradia é um direito de fundamental importância na atual conjuntura da sociedade brasileira, e sua efetivação é vital para uma concretização do Estado democrático de Direito. Neste sentido, existem alguns institutos e fenômenos do Direito, voltados à efetivação do direito à moradia, como a judicialização de políticas públicas, e o estudo deles revela aspectos transformadores da garantia dos direitos fundamentais por parte do Estado.

Este trabalho, através do método de pesquisa teórico-exploratória, busca analisar o Direito à moradia, sua natureza, judicialização e efetivação, e lidar com pontos críticos como a suposta necessidade de concessão de um imóvel a cada cidadão para a efetivação do direito a moradia, a legitimidade do judiciário para a judicialização de políticas públicas e outras possíveis formas de se buscar a garantia do direito à moradia.

Dessa forma, foram apresentados como resultados a atenção para a diferença existente entre direito à moradia e direito de habitação - apesar de estes serem intimamente correlatos -, com o intuito de desconstruir a alegação referente à necessidade de concessão de um imóvel, supramencionada; o conceito de políticas públicas e de judicialização; a demonstração de propostas alternativas de efetivação do direito à moradia, que não a judicialização e as políticas públicas; e a análise de uma política pública de acesso à moradia já existente, assim como sua relação com o cenário atual da efetivação deste direito.

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ABSTRACT

The right to housing is a right of critical importance in the actual state of brazlian society, and its effectivenes is vital for the stablishment of the Democratic State of Law in Brazil. Thus, there are some figures and phenomena of law, oriented to the effectiveness of the right to housing, as the judiciliaziation of public policy, and its studies reveal transformative aspects of the protection of fundamental rights by the government.

This paper, through the exploratory method of theorical research, intends to analize the right to housing, its nature, judicialization and effectiveness, beyond dealing with critical questions such as the alleged need of granting a property to each citizen in order to make the rought to housing effective, the legitimacy of the Judiciary Power to execute judicialization of public policy and other possible ways of granting the right to housing.

Thus, as results of the research, were presented the difference between the right to housing and the right to inhabiting – even though they are similar -, with the intent to put down the alegation that granting a property is needed, as mentioned; the concepto f public policy and of judicialization; the demonstration of alternative proposals of right to housing effectiveness, other than judicizalizing it; and the analysis of a current right to housing public policy, with its relation to the actual scenary of such an important right.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 8

2. JUDICIALIZAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS. ... 9

3. DIREITO À MORADIA X DIREITO DE HABITAÇÃO ... 11

4. DESAFIOS À JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSO À MORADIA. ... 14

5. EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: PROPOSTAS ALTERNATIVAS. ... 17

5.1. A USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO ... 18

5.2. A CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA. ... 19

6. ANÁLISE PRÁTICA: O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ... 20

7. CONCLUSÃO ... 24

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1. INTRODUÇÃO

A tutela dos direitos fundamentais é um tema que tem ganhado cada vez mais espaço nas discussões do direito brasileiro nos últimos tempos. Com o aumento da disponibilidade de informações e o desenvolvimento da cidadania da população, os cidadãos têm obtido cada vez mais noção de quais sãos os seus direitos, especialmente os resguardados pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), e como o Estado deve efetivá-los, para além de assegurá-los formalmente.

Foi nessa seara que, nos últimos anos, tem acontecido o fenômeno que leva o nome de judicialização de políticas públicas. Uma forma de se buscar a efetivação de um direito fundamental por meio da movimentação do Poder Judiciário, chamado a manifestar-se a respeito da inclusão de um cidadão em uma política pública já existente, sua implementação ou a criação de uma adequada.

Assim, diversos direitos fundamentais tiveram sua efetivação buscada por meio da judicialização de políticas públicas, e o tema foi ganhando espaço e complexidade, envolvendo discussões a respeito de sua possibilidade, adequação e até sobre a legitimidade do Judiciário para atuar nesse sentido. Entre eles se inclui o direito à moradia, que está previsto no Art. 6º da CRFB/88, e é um dos temas centrais do presente artigo.

Nesse sentido, a fim de tratar da importância do direito à moradia, bem como da judicialização de políticas públicas, o objetivo é, inicialmente trazer à tona os conceitos elaborados de judicialização e de políticas públicas, para que se possa, então compreender o que significa o fenômeno que leva o nome da junção destes dois conceitos.

Em seguida, o tema em tela será o direito à moradia, a fim de que se possa compreender sua natureza, importância e peculiaridades, para, em conseguinte, distingui-lo do direito de habitação, o que será importante para o ponto seguinte, no qual a ideia será diagnosticar quais são os desafios a serem vencidos pela judicialização de políticas públicas de acesso à moradia.

Dando sequência, tratar-se-á de formas alternativas à efetivação do direito à moradia, que não a judicialização de políticas públicas, sendo elas a concessão de uso especial para fins de moradia e a usucapião especial de imóvel urbano, com o intuito de demonstrar que, possivelmente, essas formas podem evitar ao menos algum dos desafios mencionados no tópico anterior.

Por fim, será feita uma breve análise de uma política pública de acesso à moradia, uma forma convencional de efetivação desse direito. Será trazido à tona o Programa Minha Casa Minha vida e os impactos dele para o direito à moradia no Brasil.

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Com o escopo de atingir ao objetivo proposto, foi utilizado o método de pesquisa teórico-científico, na definição de Myracy Barbosa de Souza Gustin e Maria Teresa Fonseca Dias1, através de consulta a livros, artigos, periódicos, teses e demais fontes científico-jurídicas.

2. JUDICIALIZAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS.

Para que se possa falar em judicialização de políticas públicas, é necessário que primeiro se discutam alguns temas e conceitos chave para a sua compreensão. Isto porque a judicialização de políticas públicas é um fenômeno jurídico de certa complexidade, cujo próprio nome traz conceitos que envolvem seus próprios sentidos e estudos: Judicialização e políticas públicas.

Em primeiro lugar, será abordada a definição do termo políticas públicas. Diversos autores brasileiros discutem, sob inúmeras abordagens diferentes, o que são políticas públicas e qual o seu papel. A própria discussão sobre o que são e qual é a sua serventia envolve conceitos maiores como Estado e democracia. No entanto, para os fins aos quais se destina o presente artigo, e com o objetivo de alcançá-los em tempo adequado, a definição aqui utilizada dos conceitos mencionados acima será a trazida por Eduardo Appio.

Appio2 define as políticas públicas como instrumentos de efetivação dos objetivos do Estado, com o fim de gerar igualdade material de oportunidades e uma vida mais digna a todos. Segundo ele, elas podem ser:

[...] de natureza social e de natureza econômica, ambas com um sentido complementar e uma finalidade comum, qual seja, de impulsionar o desenvolvimento da Nação, através da melhoria das condições gerais de vida de todos os cidadãos.3

E têm como característica marcante a utilização de ferramentas de intervenção do Estado para sua execução, aspecto do qual surge o vínculo feito popularmente entre as políticas públicas e o Estado como seu maior realizador 4.

Celina Souza, por sua vez, menciona, além da existência de diferentes conceitos de políticas públicas, que elas são, além de ações do governo para a solução de problemas e

1 GUSTIN, Myracy Barbosa de Sousa. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática .3º Ed. rev. E atual.

pela NBR 14.724, de 30/12/05, da ABNT- Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

2 APPIO, Eduardo. O controle judicial das políticas públicas no Brasil. Tese (Doutorado). Florianópolis,

2004. 473 p.

3 Idem. p. 218. 4 Idem.

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efetivação de direitos, campos multidisciplinares. De acordo com a autora, se relacionando com a política social, repercutindo na economia, na política, nas relações internas do Estado e até com a sociedade, as políticas públicas alcançam ainda maior relevância, de modo que “uma teoria geral da política pública implica a busca de sintetizar teorias construídas no campo da sociologia, da ciência política e da economia” 5. Em uma definição concreta, no

entanto, elucida a autora:

Pode-se, então, resumir política pública como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o governo em ação” e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente). A formulação de políticas públicas constitui-se no estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real. 6

Neste sentido, revela Souza, admitindo-se que políticas públicas são um campo do conhecimento, se reconhece que esta possibilita estudos de diferentes áreas, e analisadas sob diferentes abordagens. Entretanto, isto não faz com que estas careçam de “[...] coerência teórica e metodológica [...]” 7. Elas podem ainda possuir diversos modelos de formulação e

análise, sendo os mencionados pela autora os de: tipo da política pública, incrementalismo, ciclo da política pública, “garbage can”, coalizão de defesa, arenas sociais, “equilíbrio interompido” e os modelos influenciados pelo “novo gerencialismo público” e pelo ajuste fiscal. Segundo ela, uma vez elaboradas pelos governos as políticas públicas serão implementadas, e o cumprimento de seus objetivos ficará sujeito a acompanhamento e avaliação não só do próprio Executivo.

A autora ainda destaca outro elemento vital que se pode extrair do estudo que busca a definição de políticas públicas. Segundo ela, mediante tal estudo, é possível perceber que, por meio das políticas públicas podem-se compreender quais são os objetivos do governo – o que ele pretende fazer – e quais são os atos praticados por ele para tal – como ele faz –. É por meio da execução de políticas públicas, portanto, que se dará o cumprimento dos objetivos da República Federativa do Brasil citados no Art. 3º e a garantia dos direitos fundamentais elencados no Art. 5º e dos direitos sociais do Art. 6º - entre os quais se encontra o direito à moradia - todos da CRFB/88.

5 SOUZA, Celina. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, nº16, p. 20-45,

jul/dez. 2006. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/soc/n16/a03n16 >. Acesso em 01 jun. 2019.

6 Idem. p. 26. 7 Idem. Ibidem.

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Igualmente, há ainda de ser trazido o conceito aqui chamado de judicialização, que por sua vez é batizado por alguns autores de controle judicial 8. O controle judicial se dá mediante a intervenção do Poder Judiciário na liberdade de atuação dos outros poderes, atividade possível em um Estado democrático de Direito, a fim de se evitar que existam discricionariedades nas ações controladas 9. Há de se mencionar que tal controle pode suscitar

questões relativas à legitimidade do Judiciário para realizá-lo, as quais foram tratadas em oportunidade anterior10, razão pela qual aqui se considera o Judiciário como legítimo.

Trazidos os dois conceitos, é possível que já se comece a estipular uma definição para o que será, por sua vez, o controle judicial – ou a judicialização – de políticas públicas. Como o próprio nome sugere, o controle judicial de políticas públicas é a intervenção do Judiciário nas políticas públicas elaboradas pelo Executivo. Contudo, este controle é dotado de características únicas, dada a peculiaridade das políticas públicas que, como mencionado anteriormente, podem ser de diferentes naturezas: O controle judicial de uma política pública pode se dar em diferentes etapas de uma política pública, sejam elas o momento em que é formulada, executada ou avaliada 11.

Este é o fenômeno sobre o qual se pretende debruçar neste artigo. Muito embora ele se trate de “[...] fenômeno absolutamente inédito, pois implica a substituição de um ato de vontade dos governos eleitos por um ato de vontade de juízes não-eleitos.” 12, é um fenômeno de vital importância para que se possa buscar a efetivação do direito à moradia, este compreendido na forma como se pretende apresentar a seguir.

3. DIREITO À MORADIA X DIREITO DE HABITAÇÃO

No ordenamento pátrio, o direito à moradia é direito social tratado no Art. 6º da CRFB/88, adicionado pela redação trazida com a Emenda Constitucional nº 26, de 14 de

8 Vide GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle das políticas públicas pelo poder judiciário. Revista do Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito. São Paulo, v. 7, n. 7, p. 10-37, 2010. Vide APPIO,

Eduardo. O controle judicial das políticas públicas no Brasil. Tese (Doutorado). Florianópolis, 2004. Orientador: Professor Doutor Sérgio Cademartori. 473 p.

9 APPIO, Eduardo. O controle judicial das políticas públicas no Brasil. Tese (Doutorado). Florianópolis,

2004. Orientador: Professor Doutor Sérgio Cademartori. 473 p.

10Vide SILVA, Samuel Pedro Ferreira. A atividade jurisdicional democrática e o direito à moradia. In: NEVES, Isabela Dias (Coord.). Processo Civil Democrático: A função jurisdicional e as políticas públicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018. P. 237-260.

11 APPIO, Eduardo. O controle judicial das políticas públicas no Brasil. Tese (Doutorado). Florianópolis,

2004. Orientador: Professor Doutor Sérgio Cademartori. 473 p.

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Fevereiro de 2000 13. Contudo, o direito à moradia, cuja compreensão possa parecer intuitiva, é um direito dotado de alta complexidade, cujo significado é mais amplo do que ao qual apenas a interpretação superficial das palavras pode levar.

Esta complexidade se dá em razão de diversos fatores, entre eles o fato de, por exemplo, ser tratado por diversos autores tanto como direito humano quanto como direito fundamental social 14. No pensamento de Marcelo Milagres 15, o direito à moradia chega a transcender a própria noção de direito fundamental social e de mínimo existencial, alcançando status de direito de personalidade, intrinsecamente ligado com a existência do sujeito.

Apesar de diversos outros direitos como a propriedade, a posse e institutos como o domicílio e a residência, guardarem relação com o direito à moradia, este é ainda mais vital que todos os outros, de modo que os primeiros podem acabar por ser apenas “[...] instrumentos de realização de interesses existenciais.” 16.

A dificuldade do reconhecimento do direito à moradia enquanto dotado de tamanha importância reside no fato de que a moradia guarda relação com a identidade, a privacidade, a intimidade e a dignidade da pessoa humana, mas não se confunde com nenhum desses valores. O direito à moradia está vinculado a um aspecto substancial da pessoa humana porque o local de morada se relaciona diretamente a este aspecto 17·.

É um direito autônomo, cujas objeções à sua autonomia se devem ao fato de que ele se expressa externamente em reflexos patrimoniais, o que será retomado posteriormente no artigo. Relaciona-se com a identidade da pessoa em razão de o local de morada, o endereço, o local no qual o sujeito reside, estar totalmente ligada à noção que ele tem de si mesmo e projeta no mundo. Com a intimidade por ser também uma expressão do direito à moradia o ambiente no qual o sujeito exerce sua existência privada, local no qual se sente protegido da interferência alheia 18.

E com a dignidade da pessoa humana em razão da vital relação que guarda com a forma de vivência do ser humano. “[...] o ser humano sempre procurou um “cantinho” para sua intimidade, um espaço para seus sonhos e devaneios. [...] é um ser espacial, sua intimidade tem a necessidade de uma morada.” 19.

13 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. 14 Idem.

15 Idem. 16 Idem. p. 111.

17 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. 18 Idem.

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Desse modo, vista a natureza e importância do direito à moradia, uma última diferenciação com um direito que muito se relaciona a ele é necessária: a distinção entre direito de habitação e direito à moradia.

Assim, como mencionado, o direito à moradia, dada a sua complexidade, confunde-se facilmente com outros direitos e institutos semelhantes a ele, mas que, embora guardem relação, são apenas manifestações exteriores de seus reflexos patrimoniais.

Dentre estes direitos que podem ensejar confusão com o direito à moradia encontra-se o direito de habitação. Este sim relacionado com a exterioridade do direito à moradia, com o seu reflexo patrimonial, com um bem imóvel, podendo ser gratuito ou oneroso, e com caráter de direito real 20. Neste sentido, o direito de habitação enquanto compreendido como um reflexo do direito de propriedade:

[...] Incide sobre bens jurídicos de natureza patrimonial. Esses bens, conforme o momento histórico, político, social e econômico de cada sociedade, apresentam-se com um grau variável de necessidade social. Consequentemente, a intensidade do intervencionismo estatal ocorre em maior ou menor grau no tocante a sua destinação. As restrições e imposições incidentes no direito de propriedade, especialmente o jus in re própria, não é uma novidade da sistemática constitucional vigente. 21

Assim, relacionando-se com o direito de habitação, em razão de seus efeitos patrimoniais, tem-se o direito à propriedade; este previsto no Art. 5º, XXII, da CRFB/88, que também possui status de direito fundamental e integra a complexa relação entre moradia, habitação, Estado e dignidade da pessoa humana. A previsão destes direitos na Constituição e a busca por sua efetivação por meio de políticas públicas possibilitaram ao Estado democrático de direito a execução dos seus objetivos fundamentais e a garantia dos direitos do cidadão 22.

Isso demonstra, todavia, que, ainda que distinto, o direito de habitação tem sua importância, esta residente na própria distinção que aquele tem com o direito à moradia, em virtude do aspecto patrimonial. O direito de habitação – entendido enquanto direito de propriedade -, por também se relacionar com o princípio da dignidade da pessoa humana,

20 SOUZA. Sergio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação. Jornal Carta Forense. 03 de Jan. de 2012. Entrevista concedida ao Jornal Carta Forense. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/direito-a-moradia-e-de-habitacao/8111>. Acesso em 11 Maio. 2018.

21 PAGANI, Elaine Adelina. O direito de propriedade e o direito à moradia: Um diálogo comparativo entre o

direito de propriedade urbana imóvel e o direito à moradia. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009. p. 54. Disponível em: <https://bit.ly/2wGAAOV>. Acesso em 01 Jun. 2019.

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assim como o direito à moradia, exerce papel crítico no sentido de possibilitar efetivação a este princípio, porque:

O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e a identidade do indivíduo forem objeto de ingerências indevidas [...] não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana[...]. 23

Ainda, no mesmo sentido, de se demonstrar a correlação entre os dois direitos – habitação e moraria – e a importância do primeiro, pode-se observar, por exemplo, que na suspensão do direito de habitação, em hipóteses como a de despejo com tempo hábil para a desocupação, embora o direito de habitação sofra suspensão, o direito à moradia ainda é respeitado. O mesmo pode ser observado em hipóteses como a inviolabilidade do domicílio que é regra, só podendo ser desrespeitada em raras exceções onde outros direitos com maior importância no caso em questão.24

Tal distinção é necessária pra melhor compreensão dos argumentos que serão abordados a seguir, especialmente porque mais aspectos relativos ao necessário à efetivação do direito à moradia serão trabalhados, entre eles um ponto polêmico quanto à necessidade ou não de concessão de um imóvel para que tal efetivação se realize.

De toda forma, expostos os conceitos de controle judicial de políticas públicas e as particularidades do direito à moradia e ode habitação, já podem ser feitas hipóteses sobre a judicialização de políticas públicas de acesso à moradia. No entanto, demonstrar-se-á que esta não é feita sem barreiras, e que precisa superar determinados desafios a fim de se concretizar e trazer efetividade ao direito à moradia.

4. DESAFIOS À JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSO À MORADIA.

Tratando-se da efetivação do direito à moradia por meio da judicialização de políticas públicas, alguns desafios, de diferentes categorias, se fazem presente, tornando-se obstáculos reais. Na atuação do judiciário ao intervir nas políticas públicas, como bem demonstrou Ada

23 PAGANI, Elaine Adelina. O direito de propriedade e o direito à moradia: Um diálogo comparativo entre o

direito de propriedade urbana imóvel e o direito à moradia. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009. p. 181. Disponível em: <https://bit.ly/2wGAAOV>. Acesso em 01 Jun. 2019.

24 SOUZA. Sergio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação. Jornal Carta Forense. 03 de Jan. de

2012. Entrevista concedida ao Jornal Carta Forense. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/direito-a-moradia-e-de-habitacao/8111>. Acesso em 11 Maio. 2018.

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Pellegrini 25, a observância da reserva do possível e a garantia do mínimo existencial se apresentam como limites, o que não é diferente com as políticas públicas de acesso à moradia. Entretanto, o respeito a esses limites pode, sem maiores problemas, acontecer junto a uma decisão que ainda resguarde o direito à moradia.

Contudo, neste momento, o objetivo é lidar com problemas mais relacionados à efetivação de tal direito, quando já se obteve o acesso ao Judiciário e o trato da questão. Deste modo, a fim de que se possa discutir o assunto levantado, há de se tratar de um ponto de altíssima relevância no tocante à natureza do direito à moradia.

Como mencionado anteriormente, por se tratar de direito elencado no rol de direitos fundamentais e sociais, Art. 5º, XI e Art. 6º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), o direito à moradia é de natureza complexa, podendo sua compreensão variar a depender da interpretação doutrinária. Neste sentido, o que se entende como suficiente para sua efetivação também varia.

Assim, como primeiro ponto de desafio à efetivação do direito à moradia, e de choque quanto à sua natureza, está uma questão crucial: Efetivar o direito à moradia é conceder um imóvel a cada cidadão?

Muito embora a resposta possa parecer óbvia, há divergências. Contudo, grande parte da doutrina posiciona-se no sentido de dar resposta negativa a essa questão. Como leciona Marcelo de Oliveira Milagres, “[...] o direito à moradia configura direito fundamental de segunda geração [...] de conteúdo mínimo, objeto de implementação gradativa mediante a realização de políticas públicas.” 26. Desse modo, sua efetivação não está ligada à concessão imediata de um imóvel.

Milagres destaca ainda que o direito à moradia é dotado de autonomia. Apesar de ter como função resguardar a privacidade, a intimidade, a identidade e de guardar estreita relação com a dignidade da pessoa humana, o local de morada é bem jurídico autônomo.

Em posicionamento semelhante, afirma Mattos 27:

Importa destacar, entretanto, que tal entendimento não autoriza dizer que a norma reconhece a obrigação do Estado de dar uma casa para cada indivíduo, assim como a norma estabelecida no artigo 7º da Constituição não reconhece o direito subjetivo a um emprego e, sim, a criação genérica de oportunidades de trabalho e proteção ao trabalhador.

25 GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle das políticas públicas pelo poder judiciário. Revista do Curso de

Direito da Faculdade de Humanidades e Direito. São Paulo, v. 7, n. 7, p. 10-37, 2010.

26 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. p. 63.

27 MATTOS, Liana Portilho. Nova ordem jurídico-urbanística: função social da propriedade na prática dos tribunais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 79.

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Assim, superado o pressuposto – que já é um desafio em si – de que a efetivação do direito à moradia requer a concessão de uma casa a cada indivíduo, resta analisar quais são os desafios que precisarão ser superados pelas outras possíveis formas de efetivação.

O principal deles, ocupando aqui tal posição em razão de ser também trazido como justificativa à impossibilidade da concessão de uma casa a cada indivíduo, e de ser ponto de partida de todos os outros, é o econômico. É frequente a alegação do Estado de que seria economicamente impossível tal feito. Embora não vá se tratar aqui da procedência de tal afirmação, pretende-se afastar sua possibilidade mediante a constatação de um ponto já anteriormente trazido, estabelecido por Milagres: A autonomia do direito à moradia. Autonomia esta que não se limita a ditar que o direito à moradia não existe sem o resguardo à intimidade, privacidade e identidade, mas aplica-se também no sentido de revelar que “[...] os óbices que se apresentam a essa autonomia decorreriam do caráter externo do bem moradia, de seus reflexos patrimoniais e ainda de sua alegada disponibilidade.”28.

Explica-se: A barreira econômica não deve se aplicar como óbice à efetivação do direito à moradia porque este não é intrinsecamente econômico. Embora a concessão do bem moradia, isolado, careça sim de maiores fundos do que os que podem ser comumente destinados à garantia dos direitos sociais dos cidadãos, a efetivação do direito à moradia não carece.

A economicidade do direito à moradia deriva do reflexo patrimonial que ele carrega. A moradia não deve ser confundida com o direito de posse ou de propriedade, ou com a escolha de domicílio. Trata-se de direito dotado de certa singularidade, que tem a característica de transcender aspectos materiais29.

Como destaca Milagres 30, “A essencialidade do espaço existencial 31 não pode ser confundida com as formas de sua realização, com objetos sobre os quais incide o poder de seu titular”.

Neste ínterim, há como contraponto o argumento de que a própria disponibilidade do direito à moradia confere a este o referido aspecto econômico necessário ao óbice levantado. Entretanto, há se de lembrar: “A possibilidade de a morada ser objeto da autonomia privada,

28 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. p. 133. Grifo meu.

29 Idem. Ibidem.

30 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. p. 133.

31 “Espaço existencial” é um termo utilizado pelo autor para se referir ao local de morada, relacionando-o à

realização do direito à moradia, fazendo honras à sua ligação à dignidade da pessoa humana – à existência do indivíduo.

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sendo negociável, com manifesta repercussão econômica ou patrimonial, também não suprime sua natureza de bem de personalidade” 32.

Segundo Milagres 33 a relativização da indisponibilidade do direito de personalidade se faz presente em nossa sociedade. Muitas pessoas, por exemplo, comercializam sua imagem e voz, e nem por isso tais direitos perdem sua característica principal: a de serem direitos de personalidade.

Sendo assim, percebe-se que o direito à moradia, dotado de toda sua importância, afastado de só poder ser garantido mediante a concessão de uma casa a cada cidadão, e separado da economicidade que acompanha seu objeto de efetivação – mas não ele próprio – enseja várias possibilidades de ser efetivado. A mais comum delas sendo a realização de políticas públicas.

Passa-se então à análise de outras possíveis formas de efetivação do direito à moradia, com a expectativa de que estas não se apresentem tão economicamente inviáveis de serem realizadas pelo Estado.

5. EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA: PROPOSTAS ALTERNATIVAS.

Em continuidade, seguindo o objetivo de se elencar outras possíveis formas de efetivação do direito à moradia que evitem a judicialização de políticas públicas, deve-se destacar que elas existem, e têm, de alguma maneira, exercido seu papel.

Contudo, destaca-se de pronto que, apesar de serem formas que não recorrem à judicialização, não são formas completamente distantes e isentas do contato com o Poder Judiciário. Por ser o direito à moradia um direito de tamanha importância, como mencionado, é de se esperar que ele fosse objeto de alguns institutos destinados à sua proteção e efetivação. Porém, se a existência de tais institutos era esperada – considerando seus objetivos – não seria de se esperar, também, que houvesse efetivação plena do direito à moradia, e que, portanto, não houvesse a necessidade de se recorrer à judicialização de políticas públicas? É possível se dizer que sim.

Todavia, tais institutos são dotados de requisitos mais específicos, assim como de trâmites, de forma que se distanciam um pouco daqueles cidadãos que são os mais necessitados de terem efetivado o seu direito à moradia. Tal distanciamento não se dá, em sua

32 MILAGRES, Marcelo de Oliveira. Direito à moradia. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2011. p. 133. 33 Idem. p. 134.

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maioria, nas políticas públicas, pois essas, ao serem elaboradas, têm determinada parte da população como alvo específico, e consideram suas peculiaridades e necessidades.

Da mesma forma, apesar de ter sido mencionado que o direito à moradia não se resume a apenas com o espaço físico em que habita o sujeito, ou ao direito de habitação, mesmo sendo as formas que aqui serão mencionadas relacionadas a estes aspectos, elas continuam formas passíveis de realização dos interesses essenciais relativos ao direito à moradia.

Destarte, as chamadas formas alternativas têm sua função, e podem ser de grande ajuda na efetivação do direito à moradia, como uma maneira de evitar os desafios enfrentados pela judicialização. No geral, existem muitas destas que aqui estão sendo chamadas de formas alternativas, mas para os objetivos aos quais se dedica este artigo, serão abordadas duas delas: A usucapião especial de imóvel urbano e a concessão de uso especial para fins de moradia.

5.1. A USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO

Como primeira forma alternativa de se efetivar o direito à moradia aqui apresentada, tem-se a usucapião especial de imóvel urbano, mas quanto a ela, são necessárias algumas advertências iniciais.

Apesar de, anteriormente, ter-se buscado afastar a noção de que o direito à moradia é necessariamente vinculado à sua natureza material, deve ser lembrado de que seu objeto ainda é vinculado a esta natureza. Desta forma, deve-se atentar para o fato de que, ainda que, como será demonstrado, a usucapião especial tenha o objetivo de conferir a propriedade do imóvel ao beneficiado, ela tem como requisito que este o use para sua moradia34, o que necessariamente acaba por servir ao fim de dar efetividade ao direito à moradia.

Ainda, ressalta-se que a usucapião especial de imóvel urbano é dotada de maiores complexidades em sua origem e objetivo, assim como processuais, podendo ser objeto de um trabalho singularmente destinado a tratar desses aspectos. Entretanto, aqui pretende-se apenas elencar seus requisitos, e demonstrar que ela pode cumprir o papel de efetivar o direito à moradia.

Assim sendo, o referido instituto tem previsão no Art. 183 da CRFB/88, e está regulamentado, na sua forma coletiva ou individual, na Seção V do Capítulo II do Estatuto da Cidade. Com ele, se pretendeu dar maior efetividade ao direito à moradia, especialmente à

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população de baixa renda concentrada em grandes centros urbanos 35. Seus requisitos estão previstos também no Art. 1240 do Código Civil de 2002, e são: 1) Imóvel deve estar em área urbana; 2) Deve ter área máxima de 250m²; 3) Deve ser possuído pelo(s) autor(es) por, no mínimo cinco anos ininterruptos sem oposição; 4) Deve ser utilizado como moradia; e 5) Deve ser o único imóvel rural ou urbano possuído pelo(s) autor(es).

Por fim, como destaca o §3º do Art. 183 da CRFB/88, há de se relembrar que os imóveis públicos não podem ser usucapidos. Todavia, isto não exclui que estes possam ser usados para dar efetividade ao direito à moradia dos cidadãos necessitados. Para tais, existe a possibilidade, por exemplo, da utilização de outros institutos, como a concessão de uso especial para fins de moradia 36.

5.2. A CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA.

O instituto da concessão de uso especial para fins de moradia, que também pode ser utilizado nas modalidades individual e coletiva, teve, originalmente, previsão em cinco artigos do Estatuto da Cidade que foram vetados pelo Poder Executivo. No entanto, a Medida Provisória 2220/01 o reintroduziu, solucionando os problemas que levaram ao veto 37.

Tem como objetivo conceder o uso de um imóvel público, especialmente para os fins de moradia, àquele(s) que, cumprindo os requisitos eventualmente requisitar(em). Objetivo este que confere ainda mais efetividade ao direito à moradia, ao assegurar que imóveis públicos que não estejam sendo utilizados para seus fins, possam ser ocupados por cidadãos buscando seu direito à moradia. É válido mencionar, em ligação ao anteriormente exposto no início do item 2, que o instituto aqui referido é demonstração evidente da não necessidade de vinculação do direito à moradia ao seu aspecto material. O indivíduo beneficiado pela concessão de uso especial para fins de moradia, ainda que, diferente da usucapião, não se torne proprietário do imóvel, poderá ter como protegido seu direito à moradia.

Os requisitos da concessão de uso especial para fins de moradia estão previsto no Art. 1º (individual) e 2º (coletiva) da Medida Provisória 2220/01, e muito se assemelham aos da usucapião especial de imóvel urbano.

35 LOPES, Roberta Castilho Andrade. A construção do direito à moradia no Brasil: da Formação da Norma

até a Judicialização no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 2014. 227p. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Área de concentração: Habitat) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.

36 Idem. 37 Idem. p. 102.

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Assim, percebe-se que a concessão de uso especial também é uma forte aliada à efetivação do direito à moradia, especialmente se utilizada em conjunto à usucapião especial de imóvel urbano. Os dois institutos, conjuntamente, podem ter a utilidade de serem aplicados sem que impliquem na judicialização de políticas públicas de acesso à moradia, e, consequentemente, enfrentem os mesmos problemas enfrentados por esta, citados anteriormente.

Ainda, válida é a menção ao fato de que, muito embora aqui tenham sido elencadas apenas duas das chamadas formas alternativas de efetivação, existem muitas outras que, com a merecida atenção, poderiam contribuir de maneira crítica à tutela do direito à moradia. Inobstante, apresentados os dois institutos aqui mencionados, uma proposta de concretização maior da efetivação do direito à moradia já se apresenta, elevando-se em meio às inúmeras discussões acerca da importância de tal direito, assim como acerca da judicialização de políticas públicas.

Dessa forma, tenso sido demonstradas algumas das formas alternativas de efetivação do direito à moradia, passar-se-á, como sugerido anteriormente, a uma análise mais prática, ainda que não tão profunda, de uma forma não alternativa de efetivação: Uma política pública de acesso à moradia.

6. ANÁLISE PRÁTICA: O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA.

Tendo como estabelecida a possibilidade de dar efetividade ao direito à moradia de diferentes formas, resta analisar na prática, ainda que de forma sucinta, uma das mais comuns escolhidas pelo Estado.

A realização de políticas públicas é um dos principais meios pelos quais o Poder Público busca concretizar direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente no que tange ao direito à moradia. Nesse sentido, relativa a tal direito, uma das políticas públicas mais famosas é o programa Minha Casa Minha Vida, que causou diferentes reações nos diversos espectros da população, mas sendo, em geral, defendido politicamente.

No ano de 2015 foi publicado o livro “Minha casa...e a cidade?”, pela editora Letra Capital, que tratou do referido programa sob vários aspectos, analisando sua atuação em seis estados brasileiros. Contudo, aqui serão utilizados apenas pontos específicos da pesquisa relatada na obra, a fim de demonstrar, de forma geral, os impactos do programa.

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[...] a análise e compreensão de um programa habitacional das dimensões do Minha Casa Minha Vida requer uma observação ampla e cuidadosa do desenho político e financeiro e dos seus impactos indeléveis sobre as cidades, que ultrapasse a análise mais imediata das quantidades ou das aparências urbanísticas e arquitetônicas dos empreendimentos. O “Minha Casa Minha Vida” é, antes de tudo, uma “marca”, sob a qual se organiza uma série de subprogramas, modalidades, fundos, linhas de financiamento, tipologias habitacionais, agentes operadores, formas de acesso ao produto “casa própria” – esta sim uma característica que unifica as diferentes experiências. 38

Passa-se à análise. O Minha Casa Minha Vida era, originalmente, um programa econômico, tendo sido lançado como medida provisória em Março de 2009 (MP 459), apoiado em dados do déficit habitacional da época, que à época estava calculado em 7,2 milhões de moradias, das quais 90% correspondiam a moradias de pessoas com renda inferior a três salários mínimos. Neste ponto, logo do lançamento do programa, se inseriu a primeira crítica: Os dados apontavam um índice de 90% das moradias deficitárias na faixa de renda para a qual o programa destinava apenas 40% das unidades, em evidente desproporção39.

Segundo a pesquisa, os críticos:

Apontavam também a prevalência dos interesses dos setores imobiliário e da construção civil no processo de formulação do Programa, pois os 60% restantes das moradias para rendas superiores já tinham se consolidado como mercado para esses setores pelo menos nos cinco anos que antecederam o lançamento do Minha Casa Minha Vida.40

Tal fato já dava indícios do que seria uma das maiores críticas feitas ao programa até os dias atuais. De qualquer forma, por cima das críticas, o programa perdurou. Atendeu grande parte de suas promessas iniciais, cujo sucesso quantitativo o fez alçar nível de abrangência nacional. O programa cresceu, e com o crescimento se tornou mais complexo. Critérios mais específicos para a participação de entidades públicas foram elaborados, especificações mínimas para as construções foram definidas e permitiu-se até a atuação em municípios com menos de 50 mil habitantes 41.

Tornou-se “um programa em permanente construção e que, no momento de disputa eleitoral do fim do ano de 2014, teve sua continuidade garantida nos discursos e plataformas

38 AMORE, Caio Santo (Org.). SHIMBO, Lúcia Zanin (Org.). RUFINO, Maria Beatriz Cruz (Org.). Minha casa... e a cidade? Avaliação do programa minha casa minha vida em seis estados brasileiros. - 1. ed. - Rio

de Janeiro : Letra Capital, 2015. p. 15.

39AMORE, Caio Santo (Org.). SHIMBO, Lúcia Zanin (Org.). RUFINO, Maria Beatriz Cruz (Org.). Minha casa... e a cidade? Avaliação do programa minha casa minha vida em seis estados brasileiros. - 1. ed. - Rio

de Janeiro : Letra Capital, 2015. p. 17.

40 Idem. Ibidem. 41 Idem. p. 18.

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de todos os candidatos à Presidência da República[...]” 42. Tal compromisso resultou em elaboração de novas fases do programa, com promessa de contratação de um número ainda maior de moradias e constante revisão dos benefícios segundo as faixas de renda, assim como das próprias faixas em si.

O programa chegou a conceder benefício integral para as famílias inseridas na menor das faixas, mais ainda garantia descontos no uso do FGTS e subsídios de assistência técnica e equilíbrio econômico e financeiro às outras faixas 43.

Todavia, nem tudo que reluz é ouro. Não que o programa tenha sido um desastre ou absolutamente incapaz de dar efetividade ao direito à moradia, mas, apesar do sucesso quantitativo e político, problemas continuaram existindo, e o programa contribuiu também para a perpetuação de condições de dominação de poder comuns no Brasil. Como revelaram os autores:

O padrão periférico de inserção urbana dos empreendimentos do PMCMV alimenta a especulação imobiliária, uma vez que a conversão direta de terras rurais ou periurbanas em áreas urbanizadas promove uma rodada de valorização fundiária, inclusive dos terrenos vazios situados nos interstícios entre os loteamentos e malha urbana contínua, deixados por proprietários fundiários como reserva de terra à espera de valorização. A segregação socioespacial resultante condiciona os moradores a longos deslocamentos aos centros urbanos em busca de oportunidades de emprego e acesso efetivo aos serviços e aos equipamentos, responsáveis pela manutenção de condições dignas de vida. Além disso, a localização periférica dos empreendimentos, frequentemente não é contemplada pelo atendimento adequado de transportes, em um sistema viário sem conexão com as áreas mais centrais, o que eleva consideravelmente seus custos e tempo com deslocamentos. 44

Nesta lógica, pode-se perceber que o programa soluciona o problema da moradia, sem se preocupar com os que deste vão surgir. Ainda que o direito à moradia seja dotado de autonomia, este ainda possui relação firme com a dignidade da pessoa humana. Condições dignas de moradia incluem as necessárias à manutenção deste direito, no caso, as de poder se deslocar em busca de emprego e de acesso a serviços. Tal fator, como destacado, acarreta em custos consideráveis aos atendidos pelo programa:

As implicações relacionadas aos custos decorrentes da moradia regular – como os custos de condomínio, energia elétrica, os custos do próprio financiamento da habitação e de bens de consumos a ela relacionados, adquiridos por meio do programa “Minha Casa Melhor” – apresentaram

42 Idem. Ibidem. 43 Idem. p. 20. 44 Idem. p. 386.

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também um impacto importante na renda das famílias, mais importantes ainda no caso das famílias mais pobres dentro da mesma faixa de renda. 45

Há ainda de se mencionar que, a respeito da qualidade das moradias concedidas pelo programa, alguns pontos são críticos. Por adotar um padrão de construção, numa lógica de larga escala, constatou-se que o programa não se atenta a divergências regionais, topográficas e climáticas dos diferentes locais em que atua, de modo que em raras vezes corresponde ao modo de vida anterior das populações beneficiadas (AMORE, et al. 2015) 46. Em um país vasto como o Brasil, é inevitável perceber que há uma exigência clara de diferenciação do padrão de construção de uma região para a outra.

Ainda segundo os autores,

Não é surpreendente também o alto grau de satisfação dos moradores entrevistados com o fato de terem conseguido a “casa própria”, enquanto uma condição positiva de segurança social e de possibilidade de sair de situações de extrema precariedade, de alto comprometimento da renda familiar com o aluguel ou mesmo de coabitação forçada. 47

Mencionam também que, quanto à renda mensal das famílias beneficiadas, constata-se que são adequadas aos critérios do programa 48.

Entretanto, apontam melhorias necessárias ao programa:

A análise empreendida nos indica que o aprimoramento do Programa é desejável e necessário sob diferentes aspectos. Uma das lacunas existentes é uma definição melhor dos condicionantes do Programa que contribuam para fortalecer o papel de gestores urbanos dos municípios no processo de operacionalização. Ainda que o Programa seja estruturado majoritariamente para a produção privada, o papel do poder público municipal, e mesmo estadual, é altamente relevante no que diz respeito às estratégias relacionadas à gestão do solo urbano, de expansão urbana, na oferta de infraestrutura urbana e de gestão na escala metropolitana dos impactos gerados por essa produção. 49

E revelam que, da mesma forma, aprimoramentos quanto a parâmetros de implementação de infra-estrutura urbana e parâmetros arquitetônicos também são necessários, a fim de evitar os problemas acima citados. Por fim, sugerem que o programa, em razão de

45 AMORE, Caio Santo (Org.). SHIMBO, Lúcia Zanin (Org.). RUFINO, Maria Beatriz Cruz (Org.). Minha casa... e a cidade? Avaliação do programa minha casa minha vida em seis estados brasileiros. - 1. ed. - Rio

de Janeiro : Letra Capital, 2015. p. 387.

46 Idem. Ibidem. 47 Idem. Ibidem.

48 AMORE, Caio Santo (Org.). SHIMBO, Lúcia Zanin (Org.). RUFINO, Maria Beatriz Cruz (Org.). Minha casa... e a cidade? Avaliação do programa minha casa minha vida em seis estados brasileiros. - 1. ed. - Rio

de Janeiro : Letra Capital, 2015. p. 387

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lidar com condições como renda e outros aspectos urbanos, busque interação com outras políticas públicas 50.

Em suma, considerando-se isoladamente o direito à moradia, aceitando-se que proporcionar a morada é suficiente à efetivação deste direito, o programa Minha Casa Minha Vida é excelente. Entretanto, se levado em conta que outros problemas podem surgir da concessão do acesso à moradia a qualquer custo – que podem perpetuar outras desigualdades - e que o mesmo padrão de moradia não é digno em qualquer região do Brasil, o programa carece de atenção séria. Ainda, outro ponto ao qual se deve atentar, é ao fato de que políticas públicas, apesar de poderem ser utilizadas em parceria com o objetivo de mobilizar a economia, não devem ser vistas como objeto de lucro e exploração econômica por setores específicos desta, sob pena de se tornarem apenas produtos, ao invés de ferramentas do Estado para a efetivação de direitos fundamentais.

7. CONCLUSÃO

As discussões a respeito da efetivação dos direitos fundamentais, especialmente por meio da judicialização de políticas públicas, têm se tornado cada vez mais frequentes no âmbito da pesquisa jurídica atual, e isto é vital para o desenvolvimento de um Estado Democrático de Direito mais maduro.

O controle judicial de políticas públicas se apresenta como uma saída, um fenômeno do qual o cidadão pode dispõe caso se veja perante uma omissão por parte do Poder Público em executar políticas públicas capazes de dar efetividade aos seus direitos.

Neste bojo encontra-se o direito à moradia, com suas peculiaridades e sua gigantesca importância, visto que se trata de direito que vai ainda além de ser um direito fundamental social, ligado à própria existência digna do ser humano, e enfrenta seus próprios desafios quando em face de ser efetivado por via do controle judicial de políticas públicas. Ponto em que se inserem como alternativas, ainda que mais próximas de aspectos relativos à materialização, ao aspecto patrimonial do direito à moradia, entre outras, as formas de efetivação aqui trabalhadas. Mesmo que ainda utilizando do Poder Judiciário como forma de efetivação, a concessão do uso especial para fins de moradia e a usucapião especial de imóvel urbano se mostram como alternativas recorríveis para a efetivação ao menos de um aspecto do direito à moradia.

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Por fim, muito embora tais discussões – as concernentes à necessidade de efetivação dos direitos fundamentais e sociais - tenham fundamental importância para que se possa identificar os problemas que carecem de solução no tocante ao tema, há de se lembrar que o Direito, inevitavelmente, trata-se de área do conhecimento à qual constantemente se recorre para a solução de problemas, de modo que não pode se esquivar de, ao elencá-los – ou diagnosticá-los – propor soluções, e foi a isto que se propôs este trabalho. Ainda que tais soluções estejam em institutos já amplamente conhecidos, para que estes possam se tornar dignos de uma nova análise, aplicados dentro de uma nova lógica que nasce com o avanço do Estado Democrático de Direito no Brasil.

REFERÊNCIAS

AMORE, Caio Santo; SHIMBO, Lúcia Zanin; RUFINO, Maria Beatriz Cruz (Orgs.). Minha casa... e a cidade? Avaliação do programa minha casa minha vida em seis estados brasileiros. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital, 2015.

APPIO, Eduardo. O controle judicial das políticas públicas no Brasil. Tese (Doutorado). Florianópolis, 2004. Orientador: Professor Doutor Sérgio Cademartori. 473 p.

GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle das políticas públicas pelo poder judiciário. Revista do Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito. São Paulo, v. 7, n. 7, p. 10-37, 2010.

GUSTIN, Myracy Barbosa de Sousa. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática .3º Ed. rev. E atual. pela NBR 14.724, de 30/12/05, da ABNT- Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

LOPES, Roberta Castilho Andrade. A construção do direito à moradia no Brasil: da Formação da Norma até a Judicialização no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 2014. 227p. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Área de concentração: Habitat) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.

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<http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/direito-a-moradia-e-de-habitacao/8111>. Acesso em 11 Maio. 2018.

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