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Competências para a atenção primária à saúde : uma proposta para a atuação do nutricionista

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS – UNICAMP FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

CRISTINA GARCIA LOPES ALVES

COMPETÊNCIAS PARA A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

– UMA PROPOSTA PARA A ATUAÇÃO DO NUTRICIONISTA

Campinas 2018

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CRISTINA GARCIA LOPES ALVES

COMPETÊNCIAS PARA A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

– UMA PROPOSTA PARA A ATUAÇÃO DO NUTRICIONISTA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa Pós-Graduação em Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Doutora em Ciências, na área de concentração em “Ensino em Saúde”.

Orientador: Prof. Dr. Luís Fernando Farah de Tófoli

Este exemplar corresponde à versão final

Tese defendida pela aluna Cristina Garcia Lopes Alves E orientada pelo Prof. Dr. Luís Fernando Farah de Tófoli

Campinas 2018

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BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

CRISTINA GARCIA LOPES ALVES

ORIENTADOR: PROF. DR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI

MEMBROS:

1. PROF. DR. PROF. DR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI

2. PROF. DR. PAULO EDUARDO NEVES FERREIRA VELHO

3. PROFA. DRA. DANIELE POMPEI SACARDO

4. PROF. DR. MICHEL CARDOSO DE ANGELIS PEREIRA

5. PROF. DR. TÚLIO DA SILVA JUNQUEIRA

Programa de Pós-Graduação em Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

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à memória da minha mãe, ausente, mas preciosa...

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Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito, e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer.

Me movo como educador, porque, primeiro, me movo como gente.

É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal maneira que num dado momento a tua fala seja a tua prática.

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AGRADECIMENTOS...

...são muitos, descritos aqui por ordem de lembrança, e não de importância...

Aos colegas de profissão que tanto me inspiraram na reflexão sobre a prática enquanto nutricionista...

Aos alunos que tive durante a minha trajetória docente, que tanto me fizeram repensar posturas e conceitos e, portanto, foram parceiros nesse processo...

Aos colegas professores da minha instituição de ensino, que me apoiaram e acreditaram nesse trabalho, incluindo a professora Verônica, parceira do projeto.

Ao meu orientador, por sua confiança e respeito a esta pesquisa, e pelas sugestões valiosas que ajudaram a dar corpo ao emaranhado de questões inicialmente colocadas...

Aos membros da banca de defesa, que dispuseram seu tempo e sua atenção à análise desse trabalho...

A todos os profissionais (professores, supervisores de estágio, ex-alunos) que participaram desta pesquisa e trouxeram sua visão singular, capaz de abrir perspectivas para novas e futuras construções...

Aos colegas e professores do curso de doutorado, com quem partilhei tantos momentos preciosos e únicos...

Aos meus amigos do FAIMER, cujas mensagens me acompanharam durante todo esse tempo como momentos de afeto e de partilha...

Aos meus familiares e amigos que estiveram comigo nessa trajetória, com direito a um sarau de poesia no meio do caminho....

Ao meu marido com seu sorriso luminoso, que me socorreu tantas vezes com sua alegria nos momentos de desânimo...

E como não poderia me esquecer, meus companheiros de viagem, minha pequena “família” de quatro patas, que se aninhava aos meus pés enquanto eu escrevia...

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RESUMO

Como as demais profissões de saúde, a formação do nutricionista prevê o desenvolvimento de competências e habilidades que efetivem sua atuação. A inserção do nutricionista no Sistema Único de Saúde (SUS) tem sido fortalecida pela implantação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família, com ampliação do número de profissionais, especialmente na atenção primária.

Desde a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais em 2001, tem havido a inclusão, nos currículos de Nutrição, de disciplinas relacionadas tanto à compreensão dos princípios e diretrizes do SUS quanto ao desenvolvimento de competências e habilidades específicas. Porém, apenas a inclusão dessas disciplinas não garante o efetivo desenvolvimento das competências e habilidades.

Buscando contribuir com o tema, este estudo buscou analisar a formação acadêmica do nutricionista no Brasil e a sua inserção no SUS, visando à construção de uma matriz de competências específicas e habilidades para a atuação na atenção primária à saúde, amparada na discussão nas competências gerais para os profissionais de saúde. Esta matriz foi utilizada como foco para entrevistas semiestruturadas com docentes e discentes de cursos de Nutrição, assim como por supervisores do estágio em Nutrição Social. As entrevistas tiveram o objetivo não apenas de avaliação da matriz elaborada, mas também buscaram a incorporação de novos elementos à mesma, num processo de construção e reconstrução, em conformidade com a metodologia escolhida.

Além da revisão bibliográfica e análise documental, como técnica de coleta de dados foi utilizado o círculo hermenêutico-dialético. As entrevistas foram gravadas para posterior transcrição, e analisadas a partir da análise hermenêutico-dialética. O foco da apreciação da matriz foi o estágio curricular em Nutrição Social, especialmente na atenção básica do SUS.

Os resultados das entrevistas permitiram avaliar o instrumento, assim como aprofundar a reflexão sobre a formação acadêmica do nutricionista, especialmente na atenção primária. Fragilidades na formação acadêmica foram apontadas pelos três grupos de entrevistados, mas as condições existentes na rede, incluindo a organização do trabalho, também foram destacadas como impactantes para o desenvolvimento das ações do nutricionista na atenção básica. Houve percepção de que as atividades desenvolvidas pelo nutricionista afetam o

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desenvolvimento das atividades do estágio, interferindo no desenvolvimento das suas próprias competências e habilidades. Também houve reconhecimento da necessidade de inserção dos acadêmicos em atividades na rede o mais precocemente possível, e durante toda a graduação.

Foi considerada a importância de uma melhor definição das atribuições do nutricionista na rede como forma de organização da atenção nutricional, e a atuação do nutricionista em atividades de gerenciamento e gestão foi destacada, assim como a necessidade de ocupação de novos espaços de atuação, incluindo o controle social.

A matriz de competências e habilidades gerada poderá ser utilizada como apoio na organização da atenção nutricional no SUS, na definição de conteúdos nas disciplinas do campo da Saude Coletiva e Nutrição Social, assim como na elaboração de projetos para o estágio curricular na atenção básica, com foco no desenvolvimento de competências e habilidades.

PALAVRAS-CHAVE: Atenção primária à saúde; Educação baseada em competências; Nutricionistas.

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ABSTRACT

Similar to the other health professions, in the training of nutritionists the development of competencies and skills is necessary for their effective performance. The inclusion of the nutritionist in the Brazilian National Health System (SUS) has been strengthened by the implantation of the Family Health Support Nuclei (NASFs), increasing the number of professionals, especially in primary care.

Since the establishment of the National Curricular Guidelines in 2001, the curricula of Nutrition courses have been updated with disciplines related both to the understanding of SUS principles and guidelines and to the development of specific competencies and skills. However, only the implementation of these disciplines does not guarantee the effective development of competencies and skills.

The aim of this study is to analyze the academic formation of the nutritionist in Brazil and their insertion in the health system and to build a matrix of specific competences and abilities for working in primary health care, supported by the discussion of the competencies for health professionals. This matrix was used as subject for semi-structured interviews with teachers and students of Nutrition courses, as well as internship supervisors in Social Nutrition. The interviews aimed to not only assess the elaborated matrix, but also to incorporate new elements into it, in a process of construction and reconstruction, in accordance with the chosen methodology.

In addition to the bibliographical review and documentary analysis, the hermeneutic-dialectical circle was used as the data collection technique. The interviews were recorded for later transcription, and analyzed using thematic analysis. The focus of the appreciation of the matrix was the curriculum internship in Social Nutrition, especially in SUS primary care.

The results of the interviews indicated that the instrument can be evaluated, as well as it can be used to deepen the reflection on the academic formation of the nutritionist, especially in primary care. Fragilities in academic training were pointed out by the three groups of interviewees, but the conditions existing in the health system including work organization were also highlighted as having an impact at the development of the performance of the nutritionist in primary care. There was also a perception that the activities developed by the nutritionist affect the

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development of the activities of the internship, interfering in the development of their own competencies and skills. There was also a recognition that students need to be included in activities in the health system as early as possible, during the entire course.

The importance of a better definition of the attributions of the nutritionist in the health system was perceived as a way of organizing nutritional care, The nutritionist's role in management and management activities was also highlighted, as well as the need to occupy new spaces for participation, including social control.

The matrix of competences and skills that has been built could be used as support in the organization of the nutritional care in the SUS, in the definition of contents in the disciplines of the field of Collective Health and Social Nutrition, as well as in the elaboration of projects for the curricular internship in primary care, with focus on developing competencies and skills.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 – Círculo hermenêutico-dialético

Pág.

110

FIGURA 2 – Operacionalização da pesquisa a partir da definição de categorias analíticas

115

FIGURA 3 – Resultados das entrevistas com os docentes nos três contextos identificados, com a apresentação dos temas derivados da analise.

166

FIGURA 4 – Resultados das entrevistas com os supervisores nos três contextos identificados, com a apresentação dos temas derivadas da analise.

175

FIGURA 5 – Resultados das entrevistas com os estagiários em três diferentes contextos, com a apresentação dos temas derivados da analise.

(13)

LISTA DE QUADROS

PÁG. Quadro 1 - Década de 1930 a 1940 – A implantação dos primeiros cursos

e as primeiras associações de classe.

45

Quadro 2 - Décadas de 1950 e 1960 – A regulamentação da profissão 46 Quadro 3 - Décadas de 1970 a 1980 - A expansão dos cursos e as discussões sobre a formação acadêmica.

47

Quadro 4 - Década de 1980 a 1990 – As avaliações de curso. 49 Quadro 5 - Década de 1990 a 2000 – A constituição do Sistema Único de Saúde, a expansão dos cursos de graduação e a PNAN.

50

Quadro 6 - Década de 2001 a 2011 – As Diretrizes Curriculares Nacionais e a definição das ações na Atenção Básica à Saúde.

51

Quadro 7 - Critérios utilizados para seleção de material e revisão de literatura.

100

Quadro 8 - Consensos e demais documentos utilizados, com seus títulos e ano de publicação, além da forma de organização das competências.

118

Quadro 9 - Documentos relacionados à formação em saúde, com referências ao desenvolvimento de competências e sugestões de formas de organização das mesmas.

120

Quadro 10 - Artigos e teses selecionadas sobre competências na atenção primária ou temas equivalentes.

121

Quadro 11 - Grupos de Competências identificadas na análise temática, com a denominação dos domínios utilizados, elementos-chave utilizados na análise temática e as respectivas referências.

123

Quadro 12- Matriz de Competências Gerais para a APS descritas por domínios e categorias de análise, incluindo as referências utilizadas.

125

Quadro 13 - Matriz de Competências Específicas e Habilidades do Nutricionista para atuação na APS - Domínio 1 (Dimensão Político-Administrativa e Organizativa)

138

Quadro 14 - Matriz de Competências Específicas e Habilidades do Nutricionista para atuação na APS – Domínio 2 (Atenção à Saúde)

139

Quadro 15 - Matriz de Competências Específicas e Habilidades do Nutricionista para atuação na APS – Domínio 3 (Competências Humanísticas e Culturais)

141

Quadro 16 - Matriz de Competências Específicas e Habilidades do Nutricionista para atuação na APS – Domínio 4 (Competências Sociais e de Comunicação)

143

Quadro 17 - Matriz de Competências Específicas e Habilidades do Nutricionista para atuação na APS – Domínio 5 (Competências Técnicas e Metodológicas)

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEM Associação Brasileira de Educação Médica ABENUT Associação Brasileira de Educação em Nutrição

ABS Atenção Básica à Saúde

ACS Agente Comunitário de Saúde

APS Atenção Primária à Saúde

ASBRAN Associação Brasileira de Alimentação e Nutrição

CEPANDAL Conferências sobre a Formação de Nutricionistas da América Latina

CFN Conselho Federal de Nutricionistas

CGAN Coordenação Geral de Alimentação e Nutrição

CGPAN Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição

CNE Conselho Nacional de Educação

CONSEA Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional COMSEA Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional CRN Conselho Regional de Nutricionistas

DCN Diretrizes Curriculares Nacionais DCNT Doenças Crônicas Não Transmissíveis DHAA Direito Humano à Alimentação Adequada EAN Educação Alimentar e Nutricional

ESF Estratégia Saúde da Família

FNEPAS Fórum Nacional de Educação das Profissões na Área da Saúde

IES Instituição de Ensino Superior

MEC Ministério da Educação

MS Ministério da Saúde

NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organizações Não Governamentais

OPAS Organização Panamericana de Saúde

OPSAN Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição

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PAT Programa de Alimentação do Trabalhador PNAB Política Nacional de Atenção Básica

PNAN Política Nacional de Alimentação e Nutrição SAN Segurança Alimentar e Nutricional

SAPS Serviço de Alimentação e Previdência Social SISVAN Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional

SISAN Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

SUS Sistema Único de Saúde

UAN Unidade de Alimentação e Nutrição

UBS Unidade Básica de Saúde

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SUMÁRIO APRESENTAÇÃO... 18 1 - INTRODUÇÃO... 20 2 - OBJETIVOS... 25 2.1 – OBJETIVO GERAL ... 25 2.2 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS... 25 3 - REVISÃO DE LITERATURA... 26

CAPÍTULO 1 - HISTÓRICO DA FORMAÇÃO DO NUTRICIONISTA, COM ÊNFASE NA NUTRIÇÃO SOCIAL... 26

A Trajetória da Profissão no Brasil... 26

A Constituição e Emergência do Campo da Nutrição Social ... 35

Reformas Curriculares, avaliações de curso, e a repercussão no Campo da Nutrição Social... 40

Resumo dos principais eventos relacionados à formação do nutricionista, com foco na constituição da Nutrição Social... 45

CAPÍTULO 2 – A ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE... 55

Princípios e Diretrizes da Atenção Primária à Saúde... 55

As Bases Conceituais da Atenção Primária à Saúde... 56

A Estratégia Saúde da Família... 60

A Inserção do Nutricionista na ESF e nos NASF ... 61

As Ações de Alimentação e Nutrição na Atenção Primária... 68

A Formação do Nutricionista para atuação na Atenção Primária à Saúde... 72

O Estágio Supervisionado em Nutrição Social... 79

CAPÍTULO 3 – O MODELO DE COMPETÊNCIAS NA FORMAÇÃO EM SAÚDE... 84

Conceitos de Competência na Educação... 85

O Modelo Curricular por Competências... 87

As Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de saúde e o modelo de competências... 92

4 - PERCURSO METODOLÓGICO... 98

4.1 - Etapas da Pesquisa... 99

4.1.1 - 1ª Etapa – Revisão Bibliográfica e Análise Documental... 99

4.1.2 - 2ª Etapa – Elaboração de uma Matriz de Competências e Habilidades para o Nutricionista na Atenção Primária... 102

4.1.3 - Etapa Entrevistas para Avaliação da Matriz de Competências... 103

4.1.3.1 - A definição da amostra e procedimentos iniciais para a coleta de dados... 104

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4.1.3.2 - Aplicação do Círculo Hermenêutico-Dialético... 109

4.2 - Análise dos Dados... 111

4.3 - Considerações Éticas... 116

5 - RESULTADOS... 117

5.1 - Competências Gerais para os Profissionais de Saúde no âmbito da APS... 117

5.1.1 – Discussão sobre a Matriz de Competências para os Profissionais de Saúde na APS... 129

5.2 - Matriz de Competências e Habilidades para o Nutricionista no âmbito da APS ... 135

5.2.1 - Discussão sobre a Matriz de Competências e Habilidades do Nutricionista para a APS... 146

5.3 - Apreciação da Matriz de Competências e Habilidades do Nutricionista para a APS... 149

5.3.1 – Resultados da análise das entrevistas... 151

5.3.1.1 - Primeiro Momento Interpretativo – Sobre o contexto e os sujeitos da pesquisa... 151

5.3.1.2 - Segundo Momento Interpretativo – Análise das entrevistas dos três grupos de participantes... 155

5.3.1.2.1 - Análise dos relatos das entrevistas com as docentes, considerando a avaliação da matriz de competências e habilidades do nutricionista para a APS... 155

5.3.1.2.2 - Análise dos relatos das entrevistas com as supervisoras de estágio, considerando a avaliação da matriz de competências e habilidades do nutricionista para a APS... 167

5.3.1.2.3 - Análise dos relatos das entrevistas com os estagiários, considerando a avaliação da matriz de competências e habilidades do nutricionista para a APS... 175

5.3.3 – Discussão sobre os resultados das entrevistas... 183

5.4 – Considerações Finais... 188

6 – CONCLUSÃO... 190

7 - REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS... 192

APÊNDICES... 210

APÊNDICE A – Sínteses Finais das Entrevistas... 211

APÊNDICE B – Corpus das entrevistas analisadas... 237 ANEXOS... 244-270

(18)

APRESENTAÇÃO

O tema desenvolvido nessa tese partiu de indagações sobre a formação acadêmica do nutricionista e sua adequação ao modelo de saúde vigente no país, considerando a potencialidade de atuação do nutricionista frente às atuais demandas para a atenção nutricional dentro do SUS. Tais indagações são frutos da minha experiência como supervisora de estágio, enquanto ainda profissional da área, e também como docente, função exercida posteriormente em cursos de Nutrição, atuando em Nutrição e Saúde Coletiva, e também orientando estágios supervisionados em Nutrição Social.

Sendo formada em formada em Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa, em 1990 e, na minha prática como profissional, tive a oportunidade de exercer a função de supervisora de estágios com estudantes de Nutrição na Prefeitura de Juiz de Fora, quando trabalhei como nutricionista dos programas sociais do município citado. Posteriormente, como docente de curso de Nutrição na rede privada, eu também vivi a experiência de ser orientadora de estágios nessa área. Passando depois à coordenação do mesmo curso, tive que assumir a responsabilidade de estabelecer os convênios e definir os locais onde os estágios poderiam ser realizados, além de permanecer na função de docente e orientadora de estágios em Nutrição Social. A percepção de fragilidades nesse modelo de formação, com estágios sendo desenvolvidos na rede sem um contato prévio do aluno com as ações desenvolvidas na atenção básica, sempre foram para mim fonte de questionamentos, assim como de reflexão sobre os conteúdos curriculares e as estratégias de ensino pertinentes a essa formação. Dificuldades também eram percebidas entre os supervisores dos estagiários, muitas vezes sem nenhuma base conceitual ou prática para conduzir o estágio, desde o planejamento das atividades até a avaliação dos mesmos.

Sendo atualmente professora de curso de graduação em Nutrição de uma instituição pública de ensino superior, e permanecendo na função tanto de docente de disciplinas da área de Saúde Coletiva quanto de orientadora de estágios em Nutrição Social, tive a oportunidade de trazer algumas questões já percebidas nessa trajetória profissional e acadêmica quanto à formação do nutricionista como objeto desta pesquisa, dando ênfase à questão do estágio enquanto momento de

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aprendizado e desenvolvimento de competências e habilidades específicas, adequadas a cada campo de atuação profissional.

A discussão das competências e habilidades surge, então, como uma possibilidade de reflexão sobre a formação, a partir da orientação das DCN, com potencial, inclusive, de apoiar a condução das atividades do estágio. O tema da atenção primária emerge, aqui, como campo de conhecimento específico para subsidiar a reflexão sobre a construção da prática do nutricionista na atenção básica, possibilitando a articulação com as demais profissões de saúde, sob o enfoque da interdisciplinaridade.

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1 – INTRODUÇÃO

A formação dos recursos humanos em saúde é um tema recorrente na discussão das políticas e programas de saúde, considerada como condição essencial para o alcance de uma atenção à saúde resolutiva e de qualidade. No Brasil, a partir da constituição do Sistema Único de Saúde (SUS), esse tem se constituído como o ordenador da formação dos profissionais de saúde em geral, e prevê a construção de práticas baseadas em determinados princípios e diretrizes, tais como a integralidade da atenção.

Em função disto, várias iniciativas têm sido tomadas com a intenção de adequar a formação em saúde aos princípios e diretrizes do SUS, considerando tanto os diferentes níveis de atenção, quanto as dimensões das ações desenvolvidas, o que inclui a assistência, a reabilitação, a prevenção e a promoção da saúde. As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de saúde, implantadas desde 2001, são exemplo dessas iniciativas.

A formação acadêmica do nutricionista é um tema que vem sendo discutido mesmo antes da constituição do SUS, buscando-se articular as ações de alimentação e nutrição junto às políticas públicas, e responder às necessidades para a atenção nutricional, tanto em nível individual quanto coletivo. Os conteúdos e práticas relacionados à formação do nutricionista para o SUS são considerados dentro do campo da Nutrição Social, a qual se expande para as ações de alimentação e nutrição em outras áreas sob a gestão pública, como a alimentação escolar, as políticas de educação e de assistência social, e na área de segurança alimentar e nutricional (SAN).

A implantação do Programa Saúde da Família (PSF) em 1998 no SUS, mais tarde se caracterizando como Estratégia Saúde da Família (ESF), buscou dar resolutividade às ações de saúde desenvolvidas na rede pública de saúde, com a implantação de um novo modelo que tem a atenção primária à saúde como porta de entrada no sistema. A ESF é considerada como estratégia reorientadora do modelo de atenção no SUS para o desenvolvimento das ações de saúde na rede de serviços, considerando o processo de territorialização e regionalização a partir da atenção básica.

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Na busca de ampliar o escopo das ações desenvolvidas, e sob o enfoque interdisciplinar, foram criados, em 2008, os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), como expansão deste modelo. A partir dos NASF, outros profissionais, além da equipe básica de saúde da família, foram inseridos na atenção básica, incluindo o profissional de Nutrição. Por meio dos NASF, o número de nutricionistas atuando no âmbito da atenção básica se ampliou de forma significativa nos últimos anos e promoveu novas discussões sobre as atribuições do profissional na atenção básica, repercutindo também na formação acadêmica.

Considerando que as DCN para o curso de graduação em Nutrição, de forma semelhante às outras profissões de saúde, orientam para a construção de projetos pedagógicos com base no modelo de desenvolvimento de competências e habilidades, com ênfase no SUS, cabe repensar se a formação atual do nutricionista permite o desenvolvimento dessas competências a partir dos conteúdos e práticas de ensino presentes nos projetos pedagógicos dos cursos, incluindo a inserção dessas atividades na rede de saúde.

A atenção primária, na sua equivalência como atenção básica no Brasil, tem sido, portanto, o âmbito de atenção de maior inserção dos nutricionistas na rede, considerando o campo de saberes e práticas da Nutrição Social. É nesse âmbito de atenção que também são desenvolvidos os estágios curriculares nesse campo, como um dos locais que recebe os acadêmicos de Nutrição para os estágios supervisionados em Nutrição Social.

O objetivo principal deste estudo foi a construção de uma matriz de competências específicas e habilidades do nutricionista para a atenção primária à saúde, e apreciação da mesma, tendo como foco o estágio em Nutrição Social. Especificamente, buscamos: investigar a trajetória da profissão no Brasil, com foco na constituição do campo da Nutrição Social e a inserção do nutricionista no SUS, como forma de compreensão da temática da formação acadêmica e sua relação com o modelo vigente de atenção à saúde, dentro dos princípios e diretrizes do SUS; elaborar uma matriz de competências e habilidades para a atuação do nutricionista na atenção primária à saúde, a partir das atuais referências bibliográficas e técnicas utilizadas para orientar as ações dos profissionais de saúde na atenção primária no Brasil e no exterior; e submeter esta matriz à avaliação de docentes e discentes de cursos de Nutrição, assim como supervisores de estágio em Nutrição Social, com utilização de uma técnica de entrevista que permite a

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incorporação de novos elementos à mesma por meio das contribuições dos entrevistados.

O trabalho de revisão foi desenvolvido em três capítulos que buscaram abranger a temática a partir de vários ângulos pertinentes a essa discussão. Inicialmente, no primeiro capítulo, buscamos levantar a trajetória profissional do nutricionista no Brasil, incluindo a discussão sobre a formação acadêmica que acompanhou a ocupação dos espaços para o exercício profissional. Prioritariamente, buscou-se estabelecer o campo da Nutrição Social, considerando que esse campo pode subsidiar a análise da construção da prática desenvolvida pelo nutricionista no sistema de saúde, especialmente na atenção básica, repercutindo na construção dos projetos pedagógicos do curso.

O segundo capítulo traz os principais conceitos sobre a atenção primária e a relevância do mesmo para a organização atual do sistema de saúde no modelo de atenção pretendido. Também apresentamos uma reflexão sobre a atuação do nutricionista na atenção básica, incluindo a Estratégia da Saúde da Família e os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF).

No terceiro capítulo, apresentamos uma discussão sobre o conceito de competências e sua utilização na educação, especificamente na formação dos profissionais de saúde, buscando mostrar tanto as vantagens quanto as fragilidades desse modelo de formação, reconhecendo a complexidade do tema dentro na educação superior.

Esta análise de literatura permitiu a elaboração de uma matriz de competências gerais para a atuação dos profissionais de saúde na atenção primária. Optamos por manter o termo “atenção primária à saúde” em função da articulação desse termo com os estudos internacionais utilizados também como referenciais para essa construção. A partir deste modelo, foi construída uma matriz de competências específicas e habilidades para o nutricionista na atenção primária; a base de construção desse segundo instrumento, em articulação com o primeiro nas suas categorias de análise, foram os documentos que referendam a atuação do nutricionista na atenção básica no Brasil, desde as DCN até documentos e portarias do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN).

Uma vez construído o instrumento, matriz de competências e habilidades do nutricionista para a atenção primária, o mesmo foi utilizado como foco para entrevistas semiestruturadas com docentes e discentes de cursos de graduação em

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Nutrição (estagiários), assim como com supervisores do estágio em Nutrição Social, que fossem nutricionistas da rede local de serviços de saúde.

A metodologia utilizada nessa fase da pesquisa foi o círculo hermenêutico-dialético (CHD) para a coleta de dados. Essa metodologia permitiu que os grupos de interesse fizessem não apenas uma apreciação da matriz elaborada, mas também que fossem incorporados, à mesma, novos elementos advindos das contribuições dos entrevistados, num processo interativo de construção e reconstrução, de modo que esta matriz pudesse traduzir, mais potencialmente, as possibilidades de aprendizagem considerando os cenários de prática.

Foram entrevistados 5 docentes, 6 graduados de Nutrição (na categoria de estagiários) e 5 supervisores de estágio. Os resultados das entrevistas foram analisados pelo método hermenêutico-dialético, em concordância com o método de coleta empregado, e permitiu reavaliar o instrumento e ampliar as discussões sobre o objeto da pesquisa.

A metodologia utilizada se mostrou adequada aos objetivos de acordo com os resultados obtidos. Fragilidades na formação acadêmica foram apontadas pelos três grupos de entrevistados, mas as condições existentes na rede, incluindo a organização do trabalho, também foram destacadas como impactantes para o desenvolvimento das ações do nutricionista na atenção básica.

Houve percepção de que as atividades desenvolvidas pelo nutricionista (supervisor) afeta o desenvolvimento das atividades do estágio, uma vez que o modo como o estagiário reconhece a atuação do profissional interfere no desenvolvimento das suas próprias competências e habilidades. Também houve reconhecimento da necessidade de inserção dos acadêmicos em atividades na rede o mais precocemente possível, e durante toda a graduação.

Foi considerada também a importância de uma melhor definição das atribuições do nutricionista na rede (não apenas no âmbito da atenção básica) como forma de organização da atenção nutricional e de dar resolutividade às demandas percebidas, na perspectiva da integralidade. A atuação do nutricionista em atividades de gerenciamento e gestão foi muita destacada, assim como a necessidade de ocupação de novos espaços de atuação, incluindo o controle social.

Em síntese, embora reconhecendo o modelo de competências e habilidades como proposta viável para mudanças curriculares, nós acreditamos que

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a reconfiguração do campo de atuação, assim como a constituição das atribuições profissionais em decorrência desse processo, deve ocorrer previamente a qualquer proposta de revisão da formação acadêmica do nutricionista.

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2 – OBJETIVOS

2.1 – OBJETIVO GERAL

Construção de uma matriz de competências específicas e habilidades do nutricionista para a atenção primária à saúde, com base na literatura de referência para as competências dos profissionais de saúde em geral, e apreciação da mesma, tendo como foco o estágio em Nutrição Social.

2.2 - OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Investigar a constituição do campo de conhecimentos e práticas da Nutrição Social como forma de compreensão da temática da formação acadêmica do nutricionista para atuação na atenção primária;

- Revisar a literatura existente sobre competências dos profissionais de saúde para a atenção primária à saúde;

- Apresentar proposta de matriz de competências específicas e habilidades do nutricionista na atenção primária, com base na revisão de literatura sobre as competências gerais dos profissionais de saúde;

- Submeter o instrumento elaborado à apreciação de docentes da área de Nutrição Social, supervisores de estágio e graduados em Nutrição, por meio de uma metodologia de avaliação interativa e responsiva, visando ao aprofundamento da discussão sobre a formação acadêmica do nutricionista para atuação na atenção primária.

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3 – REVISÃO DE LITERATURA

CAPÍTULO 1 – HISTÓRICO DA FORMAÇÃO DO NUTRICIONISTA, COM ÊNFASE NA NUTRIÇÃO SOCIAL.

A Trajetória da Profissão no Brasil

“o profissional surge dentro do setor saúde, tendo como objetivo de trabalho a alimentação do homem no seu plano individual ou coletivo” (YPIRANGA e GIL, 1989)

Os primeiros cursos de Nutrição datam do período entre as duas guerras mundiais, tanto na Europa quanto no continente americano, quando também foram criados os institutos e centros de pesquisa em Nutrição. Na América Latina, a primeira inciativa foi feita pelo médico argentino Pedro Escudero, criador do Instituto Nacional de Nutrição em 1926, da Escola Nacional de Dietistas em 1933, e do curso de médicos “dietólogos” da Universidade de Buenos Aires (VASCONCELOS, 2002). Conforme o mesmo autor, o curso de Nutrição no Brasil surge dentro de um projeto de modernização da economia brasileira conduzido pelo chamado Estado Nacional Populista, entre os anos de 1930 a 1940, configurando a transição para uma sociedade capitalista urbano-industrial no país.

Costa (2002) afirma que a institucionalização da profissão do nutricionista ocorre em um momento em que também desponta no país uma política social de cunho assistencialista, ou seja, políticas de prestação de serviços assistenciais patrocinados pelo Estado, por intermédio dos órgãos públicos de saúde criados na década de 1940. Desse período podemos destacar o Serviço de Alimentação e Previdência Social (SAPS), órgão destinado à execução de parte da política social do Estado, vinculado ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, considerado o primeiro órgão de política de alimentação instituído pelo Estado, auxiliar da política trabalhista de Vargas. No SAPS, enquanto as funções diretivas eram exercidas por médicos nutrólogos, viu-se a necessidade de formar profissionais de copa, cozinha e atividades afins ligadas à alimentação, entre eles o dietista. O SAPS, como instituição formadora, deu início em 1943 Ao curso de

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auxiliar técnico em alimentação, com duração de um ano, passando a ter dois anos de duração, posteriormente, com a formação de dietistas.

Em 1939 são criados os primeiros cursos de Nutrição em São Paulo e no Rio de Janeiro, caracterizando-se como cursos técnicos em Nutrição e Dietética (ABN, 1991 citado por LOTTERMAN e JARDIM, 2015; VASCONCELOS e CALADO, 2011). Como cursos técnicos de nível médio, a duração do curso era de apenas um ano, como foi o caso do curso de auxiliar técnico em alimentação do SAPS; posteriormente, os cursos de dietistas passaram a ter de dois a três anos para formação. Apenas em 1972 o curso de Nutrição passou a ter quatro anos de duração (VASCONCELOS, 2002; VASCONCELOS e CALADO, 2011).

Portanto, o nutricionista surge no Brasil como dietista, profissional de nível médio, dentro de uma equipe técnica de caráter individualista, responsável tanto por prestar assistência ao paciente quanto pela alimentação (COSTA, 2002). A designação de nutricionista-dietista na América Latina surgiu na década de 50, como forma de adaptação à terminologia usada nos Estados Unidos, onde então eram formados os dois profissionais, o dietista e o nutricionista (Bazó, 1977, citado por COSTA, 2002). No Brasil, essa designação foi diferenciada, dando-se preferência ao termo nutricionista, ficando a designação dietista para o técnico de nível médio ou auxiliar de Nutrição (YPIRANGA e GIL, 1989).

Ainda em relação ao contexto histórico, Costa (2002) afirma que no período de criação dos primeiros cursos, conforme citado, além da tentativa do Estado em assumir a alimentação do trabalhador visando ao atendimento das empresas privadas, dá-se também a expansão da indústria de alimentos em consonância com o Estado, com a criação de órgãos como o Serviço Técnico de Alimentação Nacional, em 1942, e o Instituto de Tecnologia de Alimentos, em 1944. A profissão de nutricionista nesse período era vista como exclusivamente feminina, passando também a ser vista como “jovem e promissora” pelo surgimento da preocupação com o problema alimentar e nutricional da população brasileira, e pela emergência da medicina comunitária, que empregava o trabalho de outras categorias profissionais como complementares ao ato médico. Nesse contexto, a educação alimentar era vista como a ferramenta necessária para “libertar a sociedade humana da doença e da fome” (Santos, 1988, citado por COSTA, 2002)

Nas décadas de 1950 e 1960 houve um grande desenvolvimento industrial no país, coincidindo com a criação de novos cursos superiores de

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Nutrição. Em função da grande expansão do ensino superior promovida pela reforma universitária, Lei 5540 de 1968, houve ampliação da formação profissional em todos os cursos da área de saúde. A partir de então, houve a formação de grande número de nutricionistas no país, principalmente nas instituições privadas de ensino superior (COSTA, 2002).

A ascendência do nutricionista na década de 1960, conforme Santos (1988), ocorre no momento em que o modelo capitalista de desenvolvimento se unia à política populista da década de 1940. Vale ressaltar que a política naquele momento era marcada pelo assistencialismo-populista e o profissional nutricionista era bastante útil a essa política, o que estimulou a continuidade da formação dos recursos humanos nessa área com a expansão dos cursos. A administração da alimentação do trabalhador pelo nutricionista era vista, então, como mais uma ferramenta de alívio das tensões sociais (YPIRANGA e GIL, 1989).

O reconhecimento do Curso de Nutricionistas como curso superior ocorreu em 1962, com definição de um currículo mínimo e do tempo de duração do curso (ABN, 1991 citado por VASCONCELOS e CALADO, 2011; VASCONCELOS, 2002; CFN, 2017a). Um avanço no processo de regulamentação da profissão se deu com a promulgação da Lei Nº 5276, de 24 de abril de 1967, que reconheceu a profissão do nutricionista, regulando o seu exercício, o que seria depois revogada por nova legislação. Em 1968, por solicitação da Associação Brasileira de Nutricionistas (ABN), a Portaria Ministerial nº 3.424 incluiu os nutricionistas ou dietistas como pertencentes à categoria de profissionais liberais (CALADO, 2003).

Muito antes disso, o então deputado Dr. Josué de Castro1 havia apresentado na Câmara Federal, em 1959, um projeto de lei que dispunha sobre o ensino superior de Nutrição, regulava o exercício da profissão de dietista (nutricionista) e dava outras providências (ASBRAN, 2014a). A regulamentação da profissão só foi acontecer em 1991, através da Lei Nº 8.234, de 17 de setembro de 1991 (BRASIL, 1991).

Nota 1: Josué de Castro (1908-1973) foi médico, pensador e ativista político brasileiro nascido no Recife. Entre a sua vastíssima produção intelectual, de abrangência internacional, composta por mais de 200 títulos, se destaca “A Geografia da Fome”, publicado em 1946 (Vasconcelos, 2008).

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Essa lei estabelece, em seu artigo 3º, as seguintes atividades privativas do nutricionista:

I - direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação em nutrição;

II - planejamento, organização, direção, supervisão e avaliação de serviços de alimentação e nutrição;

III - planejamento, coordenação, supervisão e avaliação de estudos dietéticos;

IV - ensino das matérias profissionais dos cursos de graduação em nutrição;

V - ensino das disciplinas de nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins;

VI - auditoria, consultoria e assessoria em nutrição e dietética;

VII - assistência e educação nutricional e coletividades ou indivíduos, sadios ou enfermos, em instituições públicas e privadas e em consultório de nutrição e dietética;

VIII - assistência dietoterápica hospitalar, ambulatorial e a nível de consultórios de nutrição e dietética, prescrevendo, planejando, analisando, supervisionando e avaliando dietas para enfermos. (BRASIL, 1991).

A abertura de novos cursos de Nutrição se deu especialmente a partir de 1976, após a instituição do II Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (II PRONAN), que teve como uma das principais diretrizes instigar o desenvolvimento e a capacitação de recursos humanos em Nutrição (YPIRANGA e GIL, 1989). A partir dessa época, registrou-se um acelerado processo de criação de novos cursos no país, com aumento expressivo do número de vagas nesses cursos. Até 1981, já havia 30 cursos de Nutrição no Brasil (VASCONCELOS, 1999a; YPIRANGA e GIL, 1989). Essa grande expansão também foi relacionada à necessidade de mão de obra devido à participação do nutricionista no mercado de trabalho pelo Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), criado em 1976 (BOSI, 1988; VASCONCELOS, 1999b).

De acordo com Vasconcelos (2002), a expansão dos cursos de Nutrição a partir da década de 1970, impulsionada pela instituição do II PRONAN, forjou a ampliação e a diversificação do mercado de trabalho, assim como o processo de

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organização, mobilização e luta da categoria profissional em prol dos seus interesses e necessidades específicas.

Bosi (1988) apontou a participação da iniciativa privada na expansão dos novos cursos de Nutrição no país, com aumento significativo de vagas para cursos privados a partir de 1975; a autora também destaca a distribuição das vagas no território nacional, com concentração na região Sudeste, polo de industrialização, o que teria relação com o modelo de desenvolvimento predominante na época.

Em 1983 ocorre a modificação do nome do curso de nutricionistas para Curso de Nutrição pela Resolução número 08, de 20 de maio, do CFE/MEC. Também é desse período a criação dos primeiros cursos de pós-graduação de Nutrição no país (ABN, 1991).

Vasconcelos (1999b) destacou a importância, para o processo de consolidação do campo de atuação do nutricionista, da inserção desse profissional nos programas e nas políticas públicas, não apenas com o PAT, mas também com a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), aprovada pela Portaria Nº 648 de março de 2006 (BRASIL, 2006a; BRASIL, 2012a), e o Programa de Alimentação Escolar (PNAE), já existente desde 1955. Vale ressaltar que, a partir de 2006, foi tornada obrigatória a presença do nutricionista como Responsável Técnico pelo PNAE (BRASIL, 2006b). Quanto à PNAB, embora o nutricionista não faça parte das equipes de saúde estabelecidas pela legislação, a implantação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), pela Portaria Nº 154 de janeiro de 2008, ampliou a possibilidade de inserção do nutricionista na APS, com aumento de vagas para o profissional no sistema de saúde.

A ocupação dos espaços de atuação pelo nutricionista, conforme exemplificado acima, pode ser discutida também a partir de outra abordagem, amparada na evolução do conhecimento que respaldou a construção da prática. Sobre esse tema, merece destaque o desenvolvimento conceitual da Educação Nutricional, atualmente referida como Educação Alimentar e Nutricional (EAN). Boog (1997) lembra que a Educação Nutricional se constitui como importante estratégia de ação em Saúde Pública, e faz parte das ações do nutricionista em todos os campos de atuação. Analisando o desenvolvimento dessa área de conhecimento, esta autora analisa a evolução da Educação Nutricional a partir de documentos que foram utilizados como fonte de informação neste campo a partir da década de 1950, mostrando os paradigmas que vigoraram na definição dos objetivos para a atuação

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na área e também as fragilidades decorrentes de uma visão tecnicista, mais próxima da instrução, voltada a técnicas e procedimentos, e descontextualizada dos problemas alimentares que vigorou durante muito tempo, focada no adestramento de grupo de pessoas. Tal visão teria afetado a atuação do nutricionista junto a programas de saúde e alimentação e estagnado a área enquanto produção de novos conhecimentos e práticas.

Sobre esse mesmo tema, Valente (1989) também teceu críticas ao que ele chamou de “educação nutricional tradicional”, ou seja, a educação nutricional que propõe ações mais emergenciais e descontextualizadas das verdadeiras causas dos problemas alimentares, como, por exemplo, focar em mudanças alimentares para resolver problemas relativos à forme e à desnutrição. Como alternativa este autor propõe a educação nutricional crítica, que teria, entre seus atributos, a difusão de conteúdos necessários para a transformação da realidade dos grupos sociais.

A importância de uma educação nutricional que permitisse ao educador em Nutrição compreender em profundidade o fenômeno da alimentação humana, que levasse em conta o indivíduo, permitindo o encontro entre educador e educando, é proposta por Boog (1997) para a formação acadêmica do nutricionista e para a constituição da prática profissional. Essa visão é compartilhada por Rezende, Murta e Machado (2011) que também discutem a evolução do conhecimento nessa área, enfatizando a complexidade do fenômeno alimentar, e a importância da EAN na definição das ações do nutricionista. Ambos os estudos citados enfatizam tanto a necessidade de produção de conhecimento na área como forma de respaldar as ações do nutricionista, quanto a potencialidade da EAN na formação profissional.

Ampliando essa discussão, Boog (2008) também afirma que as novas competências requeridas para o nutricionista como educador exigem um redirecionamento dos cursos para isso, pois o caráter muito biológico da formação ainda constitui o denominador comum. Embora não seja objetivo deste estudo aprofundar a discussão conceitual sobre a EAN, reconhecemos que a evolução do conhecimento na área trouxe impacto na constituição da prática profissional, ampliando a percepção da complexidade dos problemas alimentares e, consequentemente, afetou a busca pela ocupação de novos espaços de atuação.

Outros eventos podem ser destacados como tendo influência na constituição do campo de atuação do nutricionista, como a fixação do segundo currículo mínimo, pelo Conselho Federal de Educação (CFE), definindo uma carga

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horária total de 2880 horas e a duração de 4 anos para o curso de Nutrição, e a realização dos I e II Diagnósticos dos Cursos de Nutrição. Também merecem destaques a criação do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais de Nutricionistas, em 1979, além da constituição da Federação Brasileira das Associações de Nutricionistas (FEBRAN), em 1972, entidade de caráter técnico-científico e cultural que passou a assumir as funções da antiga ABN (Associação Brasileira de Nutrição), de 1949. É nessa época também que se inicia o processo de criação das associações profissionais (ou pré-sindicais), que dariam origem aos sindicatos de nutricionistas no país (VASCONCELOS, 1999a).

Sobre o papel da FEBRAN, Vasconcelos (1999a), ressalta que esta entidade teve o papel de estabelecer tanto o campo de atuação do nutricionista, quanto a definição das atividades privativas desse profissional, assim como os instrumentos legais para a sua identificação, o que reforçou o papel dos conselhos como órgãos de fiscalização do exercício da profissão.

Durante a década de 1970, modificações do currículo mínimo do curso de Nutrição foram propostas, considerando que ele não contemplava as questões técnicas, científicas, e nem atendia às necessidades da realidade brasileira (COSTA, 2002). Em decorrência desse processo, houve uma fragmentação nas três principais áreas de formação do nutricionista: Nutrição Social, Nutrição Clínica e Alimentação Institucional (LOTTERMAN e JARDIM, 2015).

Os diversos campos de atuação do nutricionista foram estabelecidos pela Resolução Nº380 do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), de 2005, que dispõe sobre a definição das áreas de atuação do nutricionista. Essa resolução define as seguintes áreas de atuação do nutricionista: I - Alimentação Coletiva, relacionada às atividades de alimentação e nutrição realizadas nas Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN); II - Nutrição Clínica, relativa às atividades de alimentação e nutrição realizadas nos hospitais, clínicas, ambulatórios, entre outros locais, incluindo atendimento domiciliar; III - Saúde Coletiva, relativa às atividades de alimentação e nutrição realizadas em políticas e programas institucionais, de atenção básica e de vigilância sanitária; IV - Docência, relacionada às atividades de ensino, extensão, pesquisa e coordenação relacionadas à alimentação e à nutrição; V - Indústria de Alimentos, relacionada às atividades de desenvolvimento e produção de produtos relacionados à alimentação e à nutrição; VI - Nutrição em Esportes, que trata das atividades relacionadas à alimentação e à nutrição em academias, clubes esportivos

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e similares; VII. Marketing na área de Alimentação e Nutrição, relativa às atividades de marketing e publicidade científica relacionada à alimentação e à nutrição (CFN, 2005).

Pelo que foi visto, a criação de novos cursos de Nutrição impulsionou o mercado de trabalho para os nutricionistas, expandindo a profissão dos hospitais e Serviços de Alimentação da Previdência Social (SAPS) para efetivamente assumir as escolas, os restaurantes de trabalhadores, docência, indústria, marketing, nutrição em esportes, saúde suplementar, núcleos de assistência à saúde da família (ASBRAN, 2014a).

Paralelamente à expansão dos cursos, modificações foram propostas para o currículo do nutricionista, com novas discussões sobre o papel do profissional. Conforme Barreto (1991), o foco da discussão sobre a formação permaneceu na parte teórica e prática para as Ciências da Nutrição, ou seja, a formação mais tecnicista. Com o advento do Movimento da Reforma Sanitária no país, e com as demandas geradas pela implementação do SUS em 1990, os debates sobre a formação inadequada dos profissionais de saúde foram ampliados, assim como a necessidade de modificações nas orientações curriculares (SOARES e AGUIAR, 2010).

Em resumo, a expansão da profissão permitiu ao nutricionista ocupar diversos espaços de atuação, tanto na esfera pública quanto na privada, o que naturalmente leva à incorporação de novos saberes e práticas. Hoje, a prática do nutricionista envolve ações diversas, não apenas voltadas para a doença, como para a promoção da saúde, como pode ser observado na atuação do nutricionista nas áreas de esporte e também em comunidades. As leis e políticas que regem o setor vêm organizando estas práticas desde os anos 40, no contexto da emergência de novos padrões de desenvolvimento econômico e industrial (CFN, 2006).

Em consulta recente à plataforma eletrônica do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), podemos observar o grande crescimento do número de profissionais no país nos últimos 15 anos. O número total de nutricionistas cadastrados no CFN no ano de 2000 era de 28983, considerando todas as regiões brasileiras. No ano de 2010 já eram 71337, passando para 108758 profissionais cadastrados ao final do ano de 2015, ou seja, um número quase 4 vezes maior de nutricionistas em um período de 15 anos (CFN, 2017b; CFN, 2017c; CFN, 2017d).

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De acordo com a mesma fonte de dados, a distribuição do número de profissionais entre as regiões do país permanece diferenciada, com grande concentração na região Sudeste, seguida pelas regiões Nordeste e Sul, situação já citada por Bosi (1988). Dados do CFN para o ano de 2015 apontam para um total de 56588 nutricionistas cadastradas nos estados do Sudeste, em contraste com 21000 na região que compreende todos os estados do Nordeste, e 18665 totalizando os estados da região Sul. As regiões Norte e Centro-Oeste possuem um número menor de nutricionistas cadastrados, com 4478 e 8027, respectivamente.

Em relação aos cursos de graduação em Nutrição, uma consulta à plataforma eletrônica do Ministério da Educação (e-MEC) revelou a existência de 561 cursos presenciais de bacharelado em Nutrição, além de mais 12 cursos de bacharelado à distância, o que gera um total de 576 cursos de Nutrição credenciados no país no ano de 2017. Desse total, apenas 67 cursos estão em instituições públicas (ensino gratuito), o que representa apenas 12% dos cursos presenciais. A grande maioria dos cursos de graduação em Nutrição no país está na esfera privada (total de 494), incluindo os cursos à distância, pertencendo todos à esfera privada. Embora seja previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) (BRASIL, 2001a) a possibilidade de cursos de Nutrição ser oferecidos também como Licenciatura, nenhum curso deste tipo foi localizado no e-MEC com cadastro ativo (BRASIL, 2017).

A Associação Brasileira de Educação em Nutrição (ABENUT), discutindo sua inserção no Fórum Nacional de Educação das Profissões da Área da Saúde (FNEPAS), apresenta dados que demonstram a supremacia do setor privado na formação do nutricionista no Brasil, mesmo considerando o período de expansão do ensino superior na esfera pública a partir do Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI, de 2003 (VELOSO, ANTUNES e PEIXOTO, 2012). De acordo com a ABENUT, em 2009, 89,4% das Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil eram privadas e apenas 10,6% públicas. O sistema de educação superior era majoritariamente não universitário, ou seja, ofertam o ensino de graduação sem que haja integração com a pesquisa e a extensão. Analisando os dados do ENADE de 2007, a ABENUT constatou que, dos 19.989 estudantes participantes, 84,7% eram do setor privado; além disto, a maior participação era da região Sudeste. Em relação à organização

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acadêmica, a maior participação foi de instituições universitárias (130), seguidos das Faculdades (88) e Centros Universitários (53).

O fato de um maior número de profissionais se graduarem na esfera privada possivelmente influencia a formação e a atuação do nutricionista, embora não seja objeto de discussão deste estudo; não podemos, porém, deixar de perceber essa realidade como capaz de trazer algum impacto sobre o tema gerador desta pesquisa, ou seja, a atuação de nutricionista na rede pública de saúde, de acordo com os princípios e diretrizes do SUS, em especial no âmbito da APS, considerando a possibilidade de haver algum tipo de limitação para o desenvolvimento de atividades de ensino dentro do sistema de saúde.

A Constituição e Emergência do Campo da Nutrição Social

De acordo com Vasconcelos (2002), no momento de constituição dos primeiros cursos de Nutrição, o principal desafio colocado para o nutricionista era a superação do perfil epidemiológico nutricional presente naquele contexto,

caracterizado por doenças carenciais associadas às condições de

“subdesenvolvimento”, de pobreza, de fome, de desigualdades regionais. O mesmo autor afirma que, para os dias atuais, somam-se a esse perfil as doenças nutricionais degenerativas e às condições da vida moderna, o que acarreta em novos dilemas e desafios para o nutricionista.

Em contraponto, Bosi (1988) afirma que os primeiros cursos se destinavam à formação de profissionais voltados para a prática individual, com ênfase na prática curativa, conhecida como “dietoterapia”; por outro lado, atividades de assistência alimentar ao trabalhador também eram enfatizadas, o que estaria de acordo com a fase populista da política vigente nas décadas de 1930/1940, considerando-se que a força de trabalho era um dos sustentáculos do modelo industrial que se implantava no país.

Costa (2002) lembra que no período que se estende da década de 1930 até a década de 1950, a atenção médica se fortalece, tornando-se o hospital o espaço privilegiado para esse tipo de atenção. Também é desse período o desenvolvimento da medicina estatal e da incorporação da assistência médica como contribuição do Estado para o cuidado individual. Com isto, Costa (2002) afirma que a profissão do nutricionista surge em um momento de divisão técnica do trabalho no

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setor saúde, até então centrado na figura do médico, o que faz com que a prática do nutricionista nasça ligada à prática médica exercida na área clínica, dentro dos hospitais, sem participação direta em ações de promoção e prevenção de doenças. Segundo Bosi (1988), as primeiras propostas de currículo, assim como as reformas curriculares, enfatizavam os aspectos biológicos e individuais em detrimento do social, situação que foi alvo de grande discussão no desenvolvimentos dos cursos de Nutrição.

Sobre esse tema, Vasconcelos (2002), citando Coimbra et al. (1982) e L‟Abbate (1988), aponta duas correntes do saber médico que influenciaram a constituição do campo da Nutrição nos primeiros anos da década de 1930. De um lado, uma corrente que é denominada como perspectiva biológica, onde a preocupação estava essencialmente nos aspectos clínico-fisiológicos relacionados ao consumo e à utilização biológica dos nutrientes, preocupação essa influenciada por concepções das Escolas de Nutrição e Dietética norte-americanas e de centros europeus. Os médicos integrantes do núcleo inicial da perspectiva biológica da Nutrição desenvolviam uma atuação voltada para o individual, o doente, a clínica, a fisiologia e o laboratório. De outro lado, havia a corrente denominada como sendo de “perspectiva social”, com seus adeptos demonstrando uma preocupação com aspectos relacionados à produção, à distribuição e ao consumo de alimentos pela população brasileira. Os médicos integrantes do núcleo inicial da perspectiva social da Nutrição eram influenciados, principalmente, pelas concepções do pioneiro da Nutrição na América Latina, Pedro Escudero, e sua atuação era voltada para o coletivo, a população, a sociedade, a economia e a disponibilidade de alimentos.

Conforme o mesmo autor, foi essa segunda vertente que, a partir de 1940, deu origem à Alimentação Institucional (área da Alimentação Coletiva) e, nos anos 1950 e 1960 originou a Nutrição em Saúde Pública, voltada ao desenvolvimento de ações de caráter coletivo. De acordo com Ypiranga e Gil (1989), a área denominada Nutrição em Saúde Pública tinha o objetivo de contribuir para garantir que a produção e distribuição de alimentos fossem adequadas e acessíveis a todos os indivíduos da sociedade, visão que reforça a discussão feita por Valente (1989) e Boog (1997) quando à EAN nesse período.

Como resultado desse processo, importantes produções científicas surgiram na área, podendo-se destacar a pesquisa “As Condições de Vida das Classes Operárias no Recife”, de Josué de Castro, considerada como o primeiro

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inquérito dietético-nutricional feito no país, e cujos resultados serviram de base para outras pesquisas similares, resultando no estudo que serviu de base para a regulamentação da lei do salário mínimo e da formulação da chamada “ração essencial mínima” de 1938 (VASCONCELOS, 2002).

Portanto, conforme Vasconcelos (2002), a consolidação do campo da Nutrição no Brasil se deu pela confluência dessas duas vertentes, a biológica e a social, ao longo da década de 1930. Em função disso, os primeiros nutrólogos desenvolveram estudos sobre consumo e hábitos alimentares e sobre o estado nutricional da população brasileira, o que buscava dar legitimidade e especificidade a esse novo campo científico, além de evidenciar uma aproximação com o chamado Estado Populista, “contribuindo para a formulação das primeiras medidas e instrumentos da Política Social de Alimentação e Nutrição, os quais começavam a ser implantados no país”. Em resumo, o processo de formação do nutricionista até esse momento enfatizou a capacitação de um profissional para atuar tanto em Nutrição Clínica quanto em Alimentação Institucional (ou Alimentação Coletiva).

Em uma análise crítica, Lima (2000) aponta que no mesmo período, entre 1934 e 1939, já se esboçava o entendimento, por parte dos intelectuais do país, que o problema alimentar era uma questão de Estado, evidenciando a dimensão política do conhecimento sobre alimentação e nutrição. Porém, o problema ainda era visto sob a ótica do higienismo, e a ciência da Nutrição, em formação nesse período, adquiria uma feição mais instrumental, na perspectiva da aplicação imediata e pragmática dos dados fisiológicos e da natureza social, visando a determinação da alimentação racional nas várias regiões brasileiras, a ser implementada pelo Estado.

Outros autores situam a emergência do campo da Nutrição em Saúde Pública dentro de um contexto maior, a partir do momento em que alguns organismos e associações internacionais são constituídos especialmente no interior de agências como a Organização das Nações Unidas (ONU), tais como a (United Nations International Children‟s Emergency Fund (UNICEF), Food and Agriculture Organization (FAO), Organização Mundial de Saúde (OMS) e Organização Panamericana de Saúde (OPAS); tais organizações surgiram no contexto do pós-guerra, criadas com o intuito de administrar conflitos de uma nova ordem mundial, a chamada ”guerra fria” (COIMBRA et al.,1982; L‟ABBATE, 1988 citado por VASCONCELOS, 2002).

Referências

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