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Animais não-humanos e governo eletrônico: ferramentas de e-gov na promoção e proteção dos animais

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

ELIZEU DE OLIVEIRA SANTOS SOBRINHO

ANIMAIS NÃO-HUMANOS E GOVERNO ELETRÔNICO: Ferramentas de E-Gov na promoção e proteção dos animais

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Florianópolis 2019

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Elizeu de Oliveira Santos Sobrinho

ANIMAIS NÃO-HUMANOS E GOVERNO ELETRÔNICO: Ferramentas de E-Gov na promoção e proteção dos animais

Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de Mestre em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Clarindo Epaminondas de Sá Neto.

Florianópolis 2019

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Àqueles que se preocupam com o silêncio dos bons e lutam, todos os dias, com todas as forças, para salvar a sociedade de si mesma.

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AGRADECIMENTOS

A Ele por ter soprado em minhas narinas o fôlego vida, dom que jamais serei capaz de agradecer o suficiente. Agradeço pelos triunfos, percalços e derrotas. Embora o sol se vá como o andarilho, e a escuridão e pedras dominem meu caminho, ainda assim em sonhos estarei, mais perto de ti meu Rei.

A Laisla Françoase Sieves, ela, minha paixão, que tem o dom encantador de me cativar todos os dias. Ela sempre esteve ao meu lado durante o decorrer deste mestrado, incentivando-me e realizando as mais diversas atividades a fim de que eu tivesse tempo e oportunidade de estudar. Compreendeu minha ausência, não sem certo pesar, e com todos os seus defeitos e qualidades, soube ser a pessoa certa todos os dias, desde o primeiro. Abraçou meus sonhos e não pestanejou quando as dificuldades apareceram, e como apareceram. Somente eu e você sabemos o que foi enfrentar esses dois anos de mestrado e eu não poderia ter escolhido outra pessoa para dividir a experiência do que você. Seu incentivo e compreensão foram fundamentais para que eu chegasse até aqui. Você é, para mim, como a areia da praia. Não posso pedir mais nada, pois em você em tenho tudo. Daqui até a eternidade.

Ao senhor Felipe de Oliveira Santos e a senhora Eleni dos Santos por enfrentarem os temores da vida sempre de cabeça erguida, sem se deixar corromper por vis atalhos, criando 4 filhos com os mais elevados valores e princípios. Saibam que o enfrentamento dos obstáculos e sofrimentos e a incrível resiliência de vocês me trouxe até aqui e disso eu serei eternamente grato. Espero um dia poder retribuir tudo o que vocês fizeram e são para mim. A academia ensina muitas coisas, mas caráter e criação digna, um lar onde nossas raízes se deitam e podemos buscar alento, isso não cabe na academia. Tenho orgulho em ter concluído esta etapa acadêmica, mas meu maior orgulho, aquilo que mais me emociona, é ser seu filho.

Aos meus 3 irmãos, Cleber, Priscila e Matthew, por me ensinarem tanto, todos os dias. Com vocês aprendi o significado da palavra companheirismo. Muito obrigado por sempre lotarem a casa e nunca me deixar sozinho. Tive a grande honra de concluir a graduação com dois de meus irmãos, Cleber e Priscila. Quanto ao Matthew, atualmente leciono para ele na graduação e sem dúvida está em meus planos acompanha-lo em alguma graduação, talvez história ou filosofia.

Laisla me proporcionou um outro presente e aqui eles não poderiam faltar. Agradeço minha segunda família, meu sogro Michael,

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minha sogra Ingelore e meu cunhado Richard, por tão bem terem me recebido em sua família e não medir esforços para que minhas empreitadas fossem bem-sucedidas.

Agradeço imensamente ao meu orientador, professor Dr. Clarindo Epaminondas de Sá Neto, que mesmo sem me conhecer aceitou o convite para ser orientador da presente dissertação e o fez de modo brilhante e com uma presteza sem igual. Estou em grande débito com o senhor. Além de compreender minha situação e permitir que o trabalho se desenvolvesse sem buscar direcionar seus resultados, o senhor estendeu com bondade a mão para tornar este trabalho possível. Assim, agradeço pelas conversas, conselhos e advertências e afirmo que esta dissertação não seria possível sem você.

Ao professor Dr. Arno Dal Ri Jr., Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFSC, por compartilhar seu vasto conhecimento e ser um professor e coordenador exemplar, ouvindo com atenção e sempre sendo prestativo e célere na oferta de respostas, soluções e auxílios.

Aos eternos mestres e amigos Cheila da Silva dos Passos Carneiro, Carlos Alberto, Daniel Mayerle, Eduardo Passold Reis, Renata Lima da Silva, Rosa Maria Kahl Lehmkuhl, Saul José Busnello e Walter Carlos Seyfferth, cuja contribuição em minha formação acadêmica não pode ser expressa em palavras. Tive a grande honra de ouvir, aprender e dividir academia com esses mestres durante a graduação e lembro com carinho de suas lições.

A Universidade Federal de Santa Catarina por proporcionar todas as ferramentas que tornaram esse sonho possível e ser referência nacional no estudo do Direito.

Ao Centro Universitário Para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (Unidavi), por ter me recebido durante a graduação e por me receber agora como um dos membros de seu corpo docente. Estendo os agradecimentos as minhas primeiras turmas da graduação, é um privilégio lecionar para mentes tão privilegiadas, que diante das minhas falhas, me ensinam muito todos os dias.

Aos membros do Grupo de Estudos em Direito, Inovações e Bioética (GEDIB). As discussões nas reuniões mensais me mantinham motivado e disposto a trilhar o árduo caminho da pesquisa. De modo especial, agradeço o fundador e coordenador do GEDIB, professor Mickhael Erik Alexander Bachmann, por ser um pesquisador e irmão incansável, não permitindo que eu relaxasse em minhas posturas e pesquisas e, mais importante, por não permitir que eu me desviasse do caminho do justo e da verdade. Obrigado, Mickha, por acompanhar de

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perto minha trajetória acadêmica e por ser exceção num país em que as regras servem a propósitos escusos. Te agradeço, mais uma vez, por fazer a academia, no Brasil, valer a pena.

Agradecimentos são sempre complicados, de modo que caso eu tenho esquecido de alguém que tenha sido relevante para a confecção do presente trabalho ou me auxiliado durante essa jornada chamada vida, deixo aqui registrado meus agradecimentos e a justificativa de que tal esquecimento não foi de modo algum proposital.

A você, leitor, que encontrou um precioso tempo em nossa sociedade complexa e caótica, para ler a presente dissertação.

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Eu estou ciente das diversas objeções à severidade de minha linguagem. Mas não há motivos para tal severidade?

Eu serei rigoroso como a verdade e inflexível como a justiça. Sobre esses assuntos, eu não quero pensar, falar, ou escrever com moderação. Não! Não! Vá dizer a um homem, cuja casa está em chamas, para dar um alarme moderado; diga a ele para resgatar moderadamente a sua esposa das mãos do estuprador; diga a uma mãe para retirar gradualmente seu filho do fogo no qual caiu; mas não me peça para ser moderado frente a uma causa como a presente. Eu estou aqui a sério… Eu não me equivocarei, não me desculparei, não recuarei um milímetro que seja. E eu serei ouvido. A apatia das pessoas é o bastante para

fazer com que cada estátua que existe lance-se de seu pedestal e apresse a ressurreição dos mortos. (William Lloyd Garrison, do editorial inaugural de 1-1-1831, To the Public, do jornal The Liberator)

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RESUMO

A presente pesquisa busca realizar uma análise acerca da possível utilização de ferramentas de governo eletrônico na promoção e proteção dos direitos dos animais humanos. Atualmente, os animais não-humanos são legal e moralmente considerados como propriedades dos seres humanos, podendo ser utilizados para alcançar quaisquer fins por eles almejados. A razoabilidade e coerência dos argumentos utilizados para a manutenção dessa condição imposta aos animais precisam ser ponderadas e, caso julgadas insuficientes, substituídas por posturas mais razoáveis e sensíveis a causa animal. Nesse sentido, as ideias de autores como Peter Singer, Tom Regan e Gary Francione, que, por caminhos diferentes, buscam o reconhecimento da importância moral e jurídica dos interesses e direitos dos animais, merece uma cuidadosa análise e avaliação. Os argumentos de tais autores trazem luz para discussões mais amplas e fazem com que os humanos repensem sua relação com os não-humanos. Esse ato irá implicar na alteração da condição de propriedade dos animais e demandará iniciativas governamentais para garantir a promoção e proteção dos interesses e direitos destes seres. A administração pública brasileira passou por substanciais reformas ao longo dos anos e encontra-se hoje baseada no denominado modelo gerencial, modelo pautado na busca por eficiência nas ações governamentais e que permite a reflexão sobre novas formas de governar. Uma dessas novas e possíveis formas a ganhar espaço com o modelo gerencial é o governo eletrônico, que se demonstra uma via para o aprimoramento da prestação de serviços públicos no país. A utilização de ferramentas de governo eletrônico para aprimorar a prestação de serviços públicos e garantir o direito de acesso à informação dos atos e decisões públicas vem ganhando especial atenção da administração brasileira nos anos recentes. Por meio das ferramentas e benefícios proporcionados pelo governo eletrônico, o cidadão passa a ter acesso às informações e serviços públicos de forma célere e em qualquer lugar em que se encontre, além de participar mais efetivamente na gestão, aplicação e controle dos atos, decisões e gastos públicos. Se devidamente empregadas na questão dos direitos dos animais, as ferramentas do governo eletrônico podem ser utilizadas para garantir e aprimorar a prestação de serviço público no país no que tange a promoção e proteção dos animais não-humanos. Essa constatação é possível e provável se levado em consideração um caso que vem colhendo bons frutos no estado de São Paulo, o caso da Delegacia

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Eletrônica de Proteção Animal (Depa). Para elaboração da presente pesquisa utilizou-se o método hipotético-dedutivo. O Método de procedimento foi o monográfico e o levantamento de dados realizou-se por meio da técnica da pesquisa bibliográfica e documental.

Palavras-chave: Administração pública. Governo eletrônico. Animais não-humanos. Promoção e proteção.

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ABSTRACT

This research seeks to analyze the possible use of e-Government tools to promote and protect non-human animals legal rights. Non-human animals are now legally and morally considered as properties of human beings, and can be used to achieve any purpose they find needed. The reasonableness and consistency of the arguments used to maintain this condition imposed on animals needs to be weighted and replaced by more reasonable and animal-sensitive positions. For that matter, the ideas of authors like Peter Singer, Tom Regan and Gary Francione, who seeks the recognition of the moral and legal importance of animals interests and rights, through different paths, deserves a careful analysis and evaluation. Such arguments bring light to broader discussions and cause humans to rethink their relationship with nonhumans. This doing will involve changing the property condition of animals and will require governmental initiatives to ensure the promotion and protection of the interests and rights of these beings. The Brazilian public administration underwent major reforms over the years and is today based on the so-called managerial model, a model based on the search for efficiency in governmental actions and that allows the consideration of new ways of governing. One of these new and possible ways to gain space with the managerial model is e-government, which demonstrates a way to improve public services in the country. The use of e-government tools to improve public services and guarantee the right to access information about public acts and decisions has been gaining special attention by the Brazilian administration in recent years. Through the tools and benefits provided by e-government, citizens will have access to public information and services quickly and everywhere, as well as a more active participation in management, application and control of acts, decisions and public expenditures. If properly applied in the animal rights issue, e-government tools can be used to ensure and enhance public service delivery nationwide in terms of promoting and securing non-human animals. This finding is possible and probable if we take into account a case that has been receiving good results in the state of São Paulo, the case of the Electronic Animal Protection Office (Depa). The hypothetical-deductive method was used to elaborate the present research. The procedure method was the monograph and data collection was done through bibliographical technique and documentary research. Key-words: Public administration. E-government. Non-human animals. Promotion and Protection.

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LISTA DE QUADROS

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Abinpet – Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação

Alesc – Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina Alesp – Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

Art. – Artigo

B.O – Boletim de Ocorrência

CF – Constituição Federal

CIGA – Comitê Interministerial Governo Aberto

CEGE – Comitê Executivo de Governo Eletrônico

CC – Código Civil

CCJ – Comissão de Constituição e Justiça

CNJ – Conselho Nacional de Justiça

CP – Código Penal

CPC – Código de Processo Civil

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

DASP – Departamento Administrativo do Serviço Público Depa – Delegacia Eletrônica de Proteção Animal

DEPASC – Delegacia Eletrônica de Proteção Animal de Santa Catarina

DH – Direitos Humanos

E-commerce – Eletronic Commerce

E-gov – Governo Eletrônico

E-government – Eletronic Government

E-MAG – Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico

EGC – Engenharia e Gestão do Conhecimento

EUA – Estados Unidos da América

G2B – Government to Business

G2C – Government to Citizen

G2G – Government to Government

GEDIB – Grupo de Estudos em Direito Inovações e Bioética GTI – Grupo de Trabalho Interministerial

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IN – Instrução Normativa

Ind. – Indireta

IR – Imposto de Renda

MP – Ministério Público

MPF – Ministério Público Federal

NPM – New Public Management

ONG – Organização Não Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PATRI – Patriota

PC – Polícia Civil

PEN – Partido Ecológico Nacional

PETA – People for the Ethical Treatment of Animals

PICIS – Princípio da Igual Consideração de Interesses Semelhantes

PM – Polícia Militar

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PR – Paraná

RENAPI – Rede de Pesquisa e Inovação em Tecnologias Digitais

RJ – Rio de Janeiro

SC – Santa Catarina

SDUV – Sujeito-de-uma-vida

Sifeba – Sistema Federal de Proteção Animal

SP – São Paulo

SSP-SP – Secretaria da Segurança Pública de São Paulo

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TIC’s – Tecnologias da Informação e comunicação

TJ – Tribunal de Justiça

UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina

Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

Unidavi – Centro Universitário Para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí

V.g. – Verbi Gratia

W3C – World Wide Web Consortium

WCAG – Web Content Accessibility Guidelines

Web – Internet

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 23 CAPÍTULO L: DOS ANIMAIS NÃO-HUMANOS: “É PECADO MATAR UM ROXINOL”... 31

I.I APRESENTANDOTERMOS,ACLARANDO

CONCEITOSEESTABELECENDO

DIFERENCIAÇÕES...31 I.I.I Sobre a senciência... 35 I.I.II Uma questão complicada: entre normas morais e

normas jurídicas... 38 I.I.III Entre positivismo e jusnaturalismo: a resposta

pós-positivista... 45 I.I.IV Ética consequencialista ou deontológica?... 48

I.II OSTATUSMORALDOSANIMAISNÃO-HUMANOS:

DAIDADEMÉDIAACONTEMPORANEIDADE... 52 I.II.I Das tradições religiosas judaico-cristãs...55 I.II.II Dos gregos ao nascimento do movimento de libertação

animal... 58

I.III OSANIMAISNÃO-HUMANOSNOORDENAMENTO

JURÍDICOBRASILEIRO... 63 I.III.I Os animais não-humanos nos diplomas constitucional

e civil brasileiro...65 I.III.II Os animais não-humanos na esfera penal brasileira...69

CAPÍTULO II: OBJEÇÕES, RESPOSTAS E ARGUMENTOS PELOS DIREITOS DOS

ANIMAIS... 75

II.I OBJEÇÕESAORECONHECIMENTOMORALDOS

ANIMAISNÃO-HUMANOSECOMO

RESPONDÊ-LAS... 76

II.II EMDEFESADACONSIDERAÇÃOMORALDOS

ANIMAIS:ASTEORIASDEPETERSINGER,TOM REGANEGARYFRANCIONE...84 II.II.I Peter Singer: o argumento dos casos marginais e o

princípio da igual consideração de interesses semelhantes (PICIS)...86 II.II.II Tom Regan: sujeitos-de-uma-vida e valor inerente... 92 II.II.III Gary Francione: o direito de não ser tratado como

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II.III ODILEMADOBOTESALVAVIDAS:VOCÊOU OCÃO?ARESPOSTADEREGAN,FRANCIONE ESINGER... 108 CAPÍTULO III: FERRAMENTAS DE GOVERNO ELETRÔNICO NA PROMOÇÃO E PROTEÇÃO DOS DIREITOS DOS ANIMAIS NÃO-HUMANOS...115

III.I GOVERNOELETRÔNICO:UMAALTERNATIVAA

ARCAICAEINEFICIENTEGOVERNANÇA

BRASILEIRA... 115 III.I.I Sobre a (des)governança na administração

brasileira... 119 III.I.II Aspectos fundamentais para a compreensão do

governo eletrônico... 126 III.I.III A recente história do governo eletrônico no Brasil

e as dificuldades para sua implementação...133 III.II INOVAÇÕESEGOVERNANÇA:FERRAMENTAS

DEGOVERNOELETRÔNICONAPROMOÇÃOE

PROTEÇÃODOSDIREITOSDOSANIMAIS NÃO-HUMANOS... 139 III.II.I A utilização das principais ferramentas de governo

eletrônico na promoção e proteção dos direitos e

interesses dos não-humanos... 141 III.II.II Um caso promissor: a Delegacia Eletrônica de

Proteção Animal (Depa) em São Paulo e sua influência em Santa Catarina... 149 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 155

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INTRODUÇÃO

Na clássica obra da norte-americana Rachel Carson, Primavera Silenciosa, o oitavo capítulo intitulado E nenhum pássaro canta, é dedicado a um interessante relato que evidencia como o meio ambiente deve ser enxergado sob uma ótica universal, uma vez que as ações humanas, ainda que praticadas localmente, em pequena escala e dotadas de boas e sinceras intenções de preservar uma espécie, interferem substancialmente na vida de inúmeras outras espécies, seja de forma positiva ou de forma negativa.1 A obra de Carson é uma tentativa de

compreender como se processa a relação dos seres humanos com o ambiente que os cerca, sendo que dessa relação pode resultar o esmorecimento e a ausência do canto de pássaros que durante muitos anos eram constantemente ouvidos e enchiam de vida as cidades, surgindo em seu lugar um silêncio, isto é, ausência de vida.

Muito tempo passou desde a publicação de Primavera Silenciosa, mas as crises em nível ambiental, social, político e cultural continuam ocorrendo com forte intensidade. Suas consequências desastrosas não atingem apenas uma parcela isolada da população ou de um país, mas assumem caráter transnacional, atingindo o meio ambiente e toda a biodiversidade existente. Por meio dessas crises a problemática ambiental ganhe um caráter sistêmico que exige um tratamento conjunto (medidas educativas, políticas, jurídicas e tecnocientíficas), pautado no enfrentamento dos problemas relacionados a construção de um futuro sustentável.2 Para evitar a ocorrência dos nefastos cenários narrados por

Carson, a emergência de posturas sensíveis às alterações ambientais e a sua capacidade de suporte devem ser adotadas e difundidas, tanto em nível pessoal quanto em nível social e político.

Muitas pessoas demonstram compaixão por animais e declaram ser favoráveis a um tratamento respeitoso para seus pet’s. Muitos sentem-se indignados diante de casos noticiados ou compartilhados em redes sociais envolvendo abusos e maus-tratos praticados contra animais. Por outro lado, percebe-se uma grande indiferença em relação a

1 CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. Tradução de Raul de Polillo. 2. ed. São

Paulo: Melhoramentos, 1962. Título original: Silent spring. p. 113.

2 FERRER, Gabriel Real; GLASENAPP, Maikon Cristiano; CRUZ, Paulo Márcio.

Sustentabilidade: um novo paradigma para o direito. Revista Novos Estudos Jurídicos, Edição Especial, vol. 19, n. 4, 2014, p. 1433-1464. Disponível em: <https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/nej/article/view/6712>. Acesso em: 08 mai. 2018. p. 1461.

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condição desses animais, sendo que trilhões deles são mortos e explorados todos os anos para os mais variados fins (v.g alimento, vestuário, pesquisas e lazer), demonstrando a ausência e despreocupação em se levar a sério o direito dos animais. Defender diretamente e efetivamente esses seres não está nos objetivos das muitas pessoas que demonstraram um posicionamento inicial favorável aos direitos dos animais.

Diante desse cenário, o Direito parece estar falhando por não fomentar a melhora progressiva nas relações entre os seres humanos e a natureza. Urge, assim, repensar e reconfigurar as instituições e estruturas políticas e o próprio Direito, que diante das profundas alterações ocorridas nos últimos tempos e que ainda estão em marcha, testemunhou o agravamento dos problemas sociais, ambientais e ecológicos, “gerando múltiplas e complexas situações de injustiça socioambiental e dificuldades de governança”.3 Evidentemente este ato irá perpassar por

variados temas, mas no decorrer da dissertação dois receberão destaque: governo eletrônico e Direito Animal.

O governo eletrônico pode ser inicialmente compreendido como a utilização e ampliação, por parte do Poder Público, das novas Tecnologias de Informação e Comunicação, com foco especial na internet, para aprimorar a prestação de serviços públicos, disseminar informações relevantes, proporcionar maior transparência e accountability aos atos administrativos e ampliar as possibilidades de participação democrática na gestão pública.4 Ao conjugar o governo

eletrônico com variados temas de políticas públicas no âmbito nacional é possível perceber variados benefícios para o aprimoramento da governança em tais temas. Um possível e necessário tema a receber esses benefícios é o direito dos animais não-humanos, definindo esses últimos, inicialmente, como quaisquer animais não pertencentes a espécie humana,5 o que vai além de gatos e cães, englobando vacas,

porcos, galinhas, cavalos, ratos e demais animais à exceção dos humanos.

3 BODNAR, Zenildo; CRUZ, Paulo Márcio. A governança transnacional ambiental na

Rio+20. Revista do CEJUR/TJSC: Prestação Jurisdicional, v. 1, n. 01, p. 79-103, dez. 2013. p. 84-85.

4 QUADROS, Jaqueline Maria. Governo Eletrônico e Direito Administrativo. In:

ROVER, Aires José (Org.). Direito e informática. São Paulo: Manole, 2004. p. 238.

5 HORTA ÁLVAREZ, Oscar. Un desafío para la bioética: la cuestión del especismo.

2007. 1327 p. Tese (Doutorado em Filosofia). Faculdade de Filosofía, Departamento de Lóxica e Filosofía Moral, Universidade de Santiago de Compostela. p. 1.

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A utilização de ferramentas de governo eletrônico para aprimorar a prestação de serviços públicos e garantir o direito de acesso à informação dos atos e decisões públicas vem ganhando especial atenção da administração brasileira nos anos recentes. A administração brasileira passou por substanciais reformas e encontra-se hoje baseada no denominado modelo gerencial. Neste modelo ganha especial destaque a eficiência, transformada em princípio constitucional por meio da Emenda Constitucional nº 19 de 1998,6 e que incentiva e recomenda

novas práticas administrativas que tornem as rotinas e serviços públicos mais céleres e dinâmicos.

Com tais incentivos e recomendações, iniciativas envolvendo as ferramentas de governo eletrônico no auxílio da promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos são bem vindas pela administração gerencial. Por ser uma novidade, seu alcance, desafios, obstáculos e benefícios podem por vezes parecer distantes e improváveis, mas é preciso ter disposição e seguir os argumentos pela melhora na condição jurídica e moral dos animais não-humanos, seja por meio das ferramentas aqui analisadas ou por outras, pelo caminho que eles levam, sem a pretensão de alterar este caminho ou ignorar seu destino.7

Desse modo, o problema de pesquisa que motivou o presente estudo é o seguinte: é possível utilizar as ferramentas de governo eletrônico na promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos?

Seu objetivo geral consiste na realização de uma análise acerca da possível utilização de ferramentas de governo eletrônico na promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos.

Os objetivos específicos consistem em a) verificar a atual condição moral e jurídica dos animais não-humanos; b) analisar a razoabilidade e coerência das justificativas dessa condição; c) demonstrar a necessidade e importância de alterar a atual condição moral e jurídica dos animais não-humanos a partir de posturas mais razoáveis e sensíveis a causa animal; d) elencar as ideias e teorias de

6 BRASIL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 19, DE 04 DE JUNHO DE 1998.

Modifica o regime e dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, servidores e agentes políticos, controle de despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc19.htm>. Acesso em: 04 jan. 2019.

7 SINGER, Peter. Practical ethics. 3. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2011.

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Peter Singer, Tom Regan e Gary Francione em busca do reconhecimento dos direitos e interesses dos animais não-humanos; e) comparar as teorias bem-estarista e abolicionistas em relação ao status moral e legal dos animais; f) demonstrar o desenvolvimento histórico da administração pública brasileira; g) analisar o conceito de governo eletrônico, demonstrando a necessidade e importância de se refletir a implantação de mecanismos de governança eletrônico para o aprimoramento da prestação de serviços públicos no país; h) elencar algumas ferramentas oriundas do governo eletrônico que podem ser utilizadas para a melhoria da prestação de serviço público no país no que tange aos animais não-humanos; e i) conferir casos promissores de implantação de ferramentas de e-gov na promoção e proteção dos direitos dos animais.

Para responder a essa indagação e alcançar os objetivos delimitados, parte-se da hipótese de que seja plenamente possível utilizar as ferramentas de governo eletrônico na promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos.

Para tanto, o primeiro capítulo dedica-se a traçar algumas considerações sobre o conceito e os problemas relacionados a senciência. De um modo amplo, a senciência refere-se a capacidade de um ser de experimentar dor e prazer, e problemas emergem diante da definição dos requisitos e condições pelos quais um ser vivo pode ser considerado senciente. A senciência é de grande importância no momento de averiguação dos seres que serão sujeitos de preocupações morais e legais. Para o australiano Peter Singer, a senciência é o único critério delimitador defensável de consideração pelos interesses de outros indivíduos.8

Ainda neste capítulo são apresentados alguns traços distintivos entre normas de cunho moral e normas de cunho legal/jurídico, que não serão tomadas como sinônimas no decorrer da dissertação, ainda que as normas morais tenham influenciado substancialmente a formação das normas jurídicas.9 Essa discussão reacende debates envolvendo as

teorias positivistas, jusnaturalistas e pós-positivistas. Em razão das

8 Para evitar a exposição repetitiva das referências em sua integralidade, o autor optou por

anotar suas referências da seguinte forma: a primeira vez em que uma obra é citada ela o será de forma integral; caso a mesma obra seja novamente objeto de referência, esta se dará pelo nome do autor seguido do nome da obra e a página. Sendo assim, como a mesma obra de Peter Singer já fora integralmente referenciada, a anotação da referência da presente nota é a seguinte: SINGER, Peter. Practical ethics. p. 50-51.

9 HART, H. L. A. O conceito de direito. Tradução de Antônio de Oliveira Sette-Câmara.

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discussões sobre o pós-positivismo, os postulados da ética consequencialista e da ética deontológica são analisados para analisar os fundamentos pelos quais se sustenta a considerabilidade moral dos animais não-humanos.

Seguindo a ideia de separação entre normas morais e normas legais, ainda no primeiro capítulo é realizado bosquejo histórico sobre o desenvolvimento do status moral dos animais não-humanos, passando-se pelas tradições religiosas judaico-cristãs, pelas filosofias gregas, pelo movimento renascentista e iluminista, pela teoria da evolução de Charles Darwin, até o berço do movimento pela libertação animal em Oxford. O status legal/jurídico dos animais não-humanos no ordenamento jurídico brasileiro é verificado em seguida, onde é posto em análise o tratamento dispensado aos animais nos diplomas constitucional, civil, penal e processual. Para mencionado ordenamento, os animais não-humanos são considerados como propriedade a livre disposição dos seres humanos, meras res.

Dando continuidade ao trabalho, o segundo capítulo é aberto com a exposição dos principais argumentos contrários e as mais comuns objeções a ideia de incluir seres não-humanos no âmbito de consideração moral e jurídica. Esses argumentos são apresentados nos mais diversos contextos e para que a causa animal se desenvolva é indispensável apresentar respostas e contra-argumentos válidos. Desse modo, os argumentos contrários a considerabilidade moral dos animais são questionados e refutados e às objeções são ofertadas respostas que são direcionadas aos equívocos logico-argumentativos por parte dos objetores.

Num primeiro momento, ao apresentar os contra-argumentos e respostas aos objetores, não se adentra propriamente na demonstração de teorias positivas e prescritivas favoráveis aos animais, que intentam superar as noções e objeções daqueles que manifestam posicionamento contrário a considerabilidade moral dos animais não-humanos. Essa é realizada em seção específica, onde são exploradas as teorias que buscam a inclusão dos interesses e direitos dos animais não-humanos nas deliberações morais e jurídicas realizadas pelos seres humanos.

Tais teorias são dividias em duas correntes: a) bem-estar animal e b) abolicionismo animal. Dos três mais destacados escritores no âmbito da ética animal, dois pertencem a última, Tom Regan e Gary Francione, e um a primeira, Peter Singer. Os principais argumentos presentes nas teorias desses três autores são expostos e analisados individualmente e, posteriormente, são o objeto de uma análise comparativa. Tal análise é realizada mediante o experimento mental do que ficou conhecido como

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o dilema do bote salva vidas ou dilema do caso do cão no bote salva vidas.10

Encerrando a presente dissertação, o terceiro capítulo tem início com alguns esclarecimentos preliminares acerca de alguns conceitos e questões que antecedem as discussões envolvendo o governo eletrônico, tais como o conceito e características do Estado e no que difere dos conceitos, características e funções de governo, governança e governabilidade. Tais expressões são plurissignificativas e complexas podendo levar a erro o leitor não familiarizado com a temática, que poderá toma-las como expressões sinônimas.

Esses esclarecimentos são pertinentes pois auxiliam na compreensão dos antigos modelos de administração que vigoravam no Brasil e como esses modelos causaram a ineficiência da administração pública e a revolta e insatisfação dos cidadãos, que culminaram no surgimento de alguns movimentos pautados na modernização do Estado brasileiro. Inicialmente, o governo instaurado no Brasil possuía características de um estado oligárquico, dominado por uma elite de senhores de terra e políticos patrimonialistas.11 A primeira tentativa de

reforma na administração pública brasileira buscou a superação do modelo inicial e a implantação de um modelo baseado na administração burocrática, ou weberiana. A administração burocrática representou certo avanço, mas foi logo superada pelo modelo que ainda se encontra em vigor na administração brasileira, o modelo gerencial.

A administração gerencial é pautada no princípio da eficiência, e proporcionou a ampliação das discussões envolvendo a implantação do governo eletrônico no Brasil. A conceituação do governo eletrônico é árdua, fazendo com que no terceiro capítulo seja elaborada um quadro com possíveis conceitos de governo eletrônico, cuja adoção de um dos conceitos dependerá da área da atuação do pesquisador e dos objetivos por ele propostos no decorrer da pesquisa. Juntamente com os possíveis conceitos de e-gov, são abordadas suas características, funções, principais atores envolvidos no processo de implantação do e-gov, seus benefícios e beneficiários.

10 REGAN, Tom. The case for animal rights. 2. ed. Los Angeles: University of

California Press, 2004. p. 351.

11 MEZZAROBA, Orides; BERNIERI, Juliana; BIER, Clerilei. Os desafios da

governança no novo século, as reformas estatais e a accountability. In: ROVER, Aires José; GALINDO, Fernando; MEZZAROBA, Orides (Orgs.). Direito, governança e tecnologia: princípios, políticas e normas do Brasil e da Espanha. Florianópolis: Conceito Editorial, 2014. p. 19.

(31)

Após realizar breve panorama histórico sobre o desenvolvimento do e-gov em solo brasileiro, apontando sua origem, desenvolvimento e algumas dificuldades atuais na sua implantação, a dissertação avança em busca de seu objetivo geral, estudar a possível utilização de ferramentas de governo eletrônico na promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos. Tais ferramentas são analisadas pautando-se num dos principais canais e contribuições do governo eletrônico, os portais eletrônicos. Esses portais são classificados em quatro diferentes estágios e cada em cada um desses estágios é possível pensar em mecanismos de melhora na promoção e proteção dos animais não-humanos.

Entre os mecanismos de aprimoramento da promoção e proteção dos direitos dos animais não-humanos presentes nessa ferramenta podem ser citados o acesso amplo e ininterrupto de informações, legislação e demais tópicos pertinentes a questão animal, divulgação do contato de empresas e parceiros da administração na atenção aos animais, o que proporciona desenvolvimento econômico a região em que for implementado o e-gov, um canal de denúncia de fácil alcance e acesso do cidadão, onde não há necessidade de deslocamentos e burocracias para a formalização de denúncia de maus-tratos contra animais, um sistema de registro de identificação e busca de cães, gatos e demais animais, entre outros.

Todas essas comodidades e benefícios estariam à disposição do cidadão por meio de um simples smartphone com acesso à internet. Os dados e informações colhidas podem ser utilizadas para o planejamento e execução de políticas públicas em torno dos animais. No estado de São Paulo foi criada a primeira Delegacia Eletrônica de Proteção Animal (Depa) que mesmo não possuindo todas as funcionalidades acima delineadas, vem registrando bons frutos na promoção e proteção dos animais não-humanos. O funcionamento dessa Delegacia é objeto de análise pormenorizada na seção que encerra a presente dissertação.

O método de pesquisa utilizado na elaboração desta Dissertação foi o hipotético-dedutivo. O Método de procedimento foi o monográfico. O levantamento de dados realizou-se através da técnica da pesquisa bibliográfica e documental.

O presente estudo pode ser visto como uma tentativa de contribuir para a pesquisa em Governo Eletrônico e Direito Animal e como forma de chamar a atenção para algo que não parece estar sendo tão discutido no Brasil, mas que já está na pauta de discussão de diversos outros países desde a década de 1980, a utilização de ferramentas de governo eletrônico a fim de proteger e promover os direitos dos animais não-humanos. Espera-se que aliando as ferramentas

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disponíveis num modelo de governo eletrônico com a proteção e promoção dos direitos dos animais não humanos seja possível cumprir com os preceitos morais e normativos contrários as práticas de exploração animal, que submetem os animais a crueldade, bem como auxilie na mudança de paradigma no que tange a atual condição moral e jurídica dos animais não-humanos.

Vastos interesses perpetuam atividades que, por qualquer padrão ético mínimo, perderiam a plausibilidade. Muitas pessoas são ignorantes em relação ao grau em que os animais são prejudicados ou fazem vista grossa a esse sofrimento para evitar uma mudança em seus comportamentos e um maior comprometimento com o sofrimento alheio. Pensando no bem-estar animal,12 uma simples alteração nos

hábitos dos indivíduos enquanto consumidores já poderia reduzir o abuso e sofrimento a que são submetidos os animais, como a redução do consumo de alimentos de origem animal.13 Para tornar tais alterações

comportamentais uma realidade e incentivar práticas mais favoráveis aos seres não-humanos, é indispensável que os consumidores recebam de forma fidedigna e eficiente as informações e serviços de competência do poder público.

12 Essa estratégia funciona para os defensores do bem-estar animal, mas seria criticada

pelos abolicionistas. O que são e o que defendem bem-estaristas e abolicionistas será objeto de análise na presente dissertação.

13 BOYD, David R. The rights of nature: a legal revolution that could save the world.

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CAPÍTULO l: DOS ANIMAIS NÃO-HUMANOS: “É PECADO

MATAR UM ROXINOL”14

I.I APRESENTANDO TERMOS, ACLARANDO CONCEITOS E ESTABELECENDO DIFERENCIAÇÕES

Pela leitura do título do capítulo já é possível perceber que seu objeto de estudo são os animais não-humanos. Falar em direito dos animais pode provocar as mais diversas reações nos interlocutores. Haverá aqueles que imediatamente manifestarão um desdém e apresentarão, convictos, razões contrárias ao reconhecimento dos direitos dos animais. Alguns demonstram certa curiosidade e atenção na discussão, concordando com as premissas, mas permanecendo inertes às conclusões, não comprometendo-se a alterar hábitos manifestamente prejudiciais aos animais.

Poucos são aqueles que realmente ponderam os argumentos e a partir dessa ponderação reavaliam e alteram seus hábitos por práticas não-prejudiciais e favoráveis a causa animal.

Esse número reduzido de pessoas dispostas a um comprometimento em levar os interesses e direitos dos animais a sério

14 Frase marcante do clássico romance da escritora norte-americana Harper Lee, O sol é

para todos, do inglês To kill a mockingbird. O romance se passa no início dos anos 1930 e é narrado pela pequena Jean Louise Finch (apelidada de Scout), que mora na cidade de Maycomb com seu irmão Jem e seu pai, o advogado Atticus Finch. Quando o negro Tom Robinson é acusado de estuprar uma moça branca, Mayella Ewell, Atticus é chamado para defender Robinson no júri e vê a cidade inteira voltar-se contra sua família, pois consideravam ultrajante um advogado branco defender voluntariamente um homem negro. A referência ao rouxinol pode ser vista como uma representação da inocência, da pureza e da fragilidade de algo ou alguém que não pode ou não possui capacidades de se defender das injustiças e humilhações impostas pela sociedade. Talvez a passagem que melhor esclareça essa representação seja quando Atticus presenteia Scout e seu irmão Jem com rifles de ar comprimido:

“- Preferia que você atirasse em latas no quintal, mas sei que vai atrás dos passarinhos. Atire em todos os gaios que quiser, se conseguir acertá-los, mas lembre-se: é pecado matar – um rouxinol.

Foi a única vez que ouvi Atticus dizer que alguma coisa era pecado e comentei com a Srta. Maudie.

- Seu pai tem razão. O rouxinol não faz nada além de cantar para o nosso deleite. Não destrói jardins, não faz ninho nos milharais, ele só canta. Por isso é um pecado matar um rouxinol.” (LEE, Harper. O sol é para todos. Tradução de Beatriz Horta. 21. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2017. Título original: To kill a mockingbird. p. 118.). Com temas persistentes como o racismo, machismo, justiça e igualdade, a obra é vencedora do Prêmio Pulitzer de ficção em 1961.

(34)

passa pela ridicularização das ideias sustentadas pelos defensores da causa animal. Quando alguém defende a necessidade de cessar ou alterar a forma pela qual os humanos exploram os animais não-humanos, logo é visto como excessivamente emocional e carente de qualquer raciocínio lógico. Na maioria das situações não é possível estabelecer um debate honesto, onde os argumentos são apresentados de forma clara.

No que tange aos animais não-humanos, uma espécie de senso comum teórico15 domina o debate e impede seu avanço. O conteúdo

desse senso comum é variado, mas geralmente inclui a suposta superioridade racional e evolutiva dos humanos, a preferência pelas vontades e assuntos do interesse dos seres humanos, a constatação que o tratamento concedido aos animais é uma questão já enraizada culturalmente nos indivíduos, entre outros. O segundo capítulo elenca em maior profundidade e quantidade o conteúdo desse senso comum teórico.

Quando os meios de comunicação divulgam a notícia de que um ato de crueldade foi cometido contra um animal, 16 as pessoas costumam

recordar que alguns animais possuem direitos. Geralmente a recordação recaí sob os animais considerados domésticos. A notícia rapidamente se espalha e causa grande comoção pública e repulsa pelo agressor. Uma miríade de discursos de proteção e respeito pelos animais inunda as

15 A expressão senso comum teórico dos juristas é utilizada por Luís Alberto Warat para

caracterizar metaforicamente “o senso comum teórico como a voz “off” do direito, como uma caravana de ecos legitimadores de um conjunto de crenças, a partir das quais, podemos dispensar o aprofundamento das condições e das relações que tais crenças mitificam.” (WARAT, Luís Alberto. Saber crítico e senso comum teórico dos juristas. Seqüência: Estudos Jurídicos e Políticos, Florianópolis, p. 48-57, jan. 1982. ISSN 2177-7055. Disponível em:

<https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/17121>. Acesso em: 26 nov. 2018. p. 54.)

16 Alguns casos de grande repercussão saltam a mente, como recente episódio em que um

funcionário de uma grande rede de supermercados espancou até a morte um cachorro vira-latas (BETIM, Felipe. A brutal morte de um cachorro vira-lata em um Carrefour leva o Brasil ao divã. In: El país. 06 dez. 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/12/05/politica/1544035820_647759.html>. Acesso em: 22 dez. 2018.), o caso dos ativistas que invadiram um laboratório de pesquisa em animais após denúncias de abusos e maus tratos (APÓS denúncia de maus-tratos, grupo invade laboratório e leva cães beagle. In: G1 São Paulo. 18 out. 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2013/10/ativistas-invadem-e-levam-caes-de-laboratorio-suspeito-de-maus-tratos.html>. Acesso em: 22 dez. 2018.) ou as reiteradas práticas da chamada farra do boi que são noticiadas todos os anos (TORRES, Aline. Farra do boi: mesmo proibida por lei, prática sangrenta ainda é comum em Santa Catarina. In: BBC News Brasil. 30 mar. 2018. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/geral-43601409>. Acesso em: 20 out. 2018.)

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redes sociais, mas poucas pessoas param para refletir que seus hábitos diários abonam a crueldade contra os animais. Estado, empresários e consumidores, todos possuem responsabilidade nesse ciclo de produção, comercialização e consumo de animais para todos os fins humanos, da alimentação ao lazer.17

Deixando claro a participação e responsabilização de todos nessa cadeia destrutiva, não se pretende realizar uma propaganda em favor de determinada organização ou grupo político relacionado a proteção aos animais, nem mesmo se pretende difamar determinados segmentos estatais, empresariais ou indivíduos que auferem lucros na exploração animal. Trata-se de identificar uma determinada prática ou um conjunto de práticas (exploração animal) e a partir da análise dos fundamentos e consequências dessa prática gerar reflexões morais e legais acerca da sua permissibilidade e razoabilidade. A academia é o locus adequado para esse tipo de tratamento.

Para tanto, serão apresentados alguns conceitos recorrentes e essenciais às discussões que giram em torno da questão animal, bem como dos percalços que se fazem presentes quando do estabelecimento de seus significados e aplicações. Ainda, são apresentados os fundamentos e as perspectivas basilares do atual status moral imposto aos animais não-humanos e como esse status molda as concepções e institutos jurídicos presentes nos ordenamentos modernos, como é o caso do ordenamento brasileiro.

O interesse não está em bendizer determinados grupos (ONG’s) ou autores e eleger outros como os grandes vilões, mas seguir os argumentos pelo caminho que eles levarem,18 sem ignorar suas

conclusões. Muitos associam a causa pelo direito dos animais com aquilo que defendem e praticam determinados grupos, o que pode tirar o foco dos argumentos e discussões ou confundi-los diante dos atos praticados por esses grupos.19 Nessa mesma linha, deixando claro o

interesse nos argumentos, a utilização de premissas com forte conteúdo

17 FELIPE, Sônia T. Dos direitos morais aos direitos constitucionais: para além do

especismo elitista e eletivo. Revista brasileira de direito animal, Salvador-BA, vol. 2, n. 2, p. 169-185, Jan./Jun. 2007. Disponível em:

<https://portalseer.ufba.br/index.php/RBDA/article/view/10300/7358>. Acesso em: 22 nov. 2018. p. 184.

18 SINGER, Peter. Practical ethics. 3. ed. Cambridge: Cambridge University Press,

2011. p. 48.

19 Nesse sentido, as ações da People for the Ethical Treatment of Animals (PETA) podem

causar alguns benefícios a causa animal, mas essas ações recebem muitas críticas em razão de seu forte tom apelativo e radical, o que pode acabar dificultando a aceitação de suas ideias e afastando as pessoas da causa animal.

(36)

voltado a comoção e que apelem para os sentimentos e emoções será evitado.20 Em muitas situações esse apelo gera bons resultados na

conscientização da causa animal, mas em outras pode ser interpretado como um radicalismo ou uma fragilidade na própria argumentação.

Para tratar da questão dos direitos dos animais não-humanos, far-se-á utilização das expressões moral e ética que assumem muitos significados no cotidiano das pessoas, mas geralmente estão ligadas a uma ideia de comportamento correto e conforme as normas sociais. Tais expressões serão tomados como sinônimos,21 ainda que alguns autores

optem por realizar uma distinção entre ética e moral,22 para referir-se ao

estudo das razões ou argumentos a favor ou contra a prática de uma determinada conduta.23 Desse modo, evitam-se confusões conceituais

desnecessárias, já que o termo moral é a tradução latina do termo ética, que tem origem no grego e significa costumes, estilos de vida, ação.24

As principais teorias morais que visam dar respostas a questão dos animais serão exploradas na seção I.I.IV, onde se analisará as duas principais correntes morais no debate contemporâneo, a corrente consequencialista, que defende a moralidade de condutas que produzam

20 “Algumas dessas pessoas pensam que uma defesa ética dos animais implica

necessariamente em adorar ou se emocionar ao ver um deles, ou mesmo gostar de tê-los como companhia em casa. Não é o caso: filósofos da condição animal não precisam ser “amigos dos bichos”. Da mesma forma, alguém não precisaria ter filhos para mostrar que respeita crianças ou para denunciar a exploração infantil.” (NACONECY, Carlos Michelon. Ética & animais: um guia de argumentação filosófica. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006. p. 18.)

21 MURCHO, Desidério. Ética e direitos humanos. Crítica. 27 nov. 2009. Disponível em:

<https://criticanarede.com/valoresrelativos.html>. Acesso em: 09 set. 2018.

22 A filósofa brasileira Sônita T. Felipe realiza uma distinção entre os termos moral e

ética no seguinte molde: “A moral é um conjunto de práticas valorativas institucionalizadas e internalizadas pelos indivíduos em cada sociedade para assegurar que, desde sua infância, sigam o padrão valorativo e façam suas escolhas em função do que se considera o melhor naquela tradição, [...] nesse sentido, quando usamos o termo moral, falamos de algo relativo a cada cultura, religião, ideologia, etc. Entretanto, se quisermos agir de modo a não causar danos a nenhum outro ser senciente, é preciso que nossos princípios não estejam amarrados nos valores típicos de nossa cultura ou tradição, pois ela pode ser bastante falha. Ética [...] é um exercício crítico de expurgar da concepção moral tudo o que estiver baseado na discriminação de raças, sexo e espécie, tudo o que for sinal da ruindade moral, da defeituosidade moral humana para com os animais outros que não os humanos.” (FELIPE, Sônia T. Acertos abolicionistas: a vez dos animais: crítica à moralidade especista. São José: Ecoânima, 2014. p. 27.)

23 MURCHO, Desidério. Ética e direitos humanos.

24 GONTIJO, Eduardo Dias. Os termos 'ética' e 'moral'. Mental, Barbacena , v. 4, n. 7,

p.127-135, nov. 2006. Disponível em:

<http://pepsic.bvsalud.org/pdf/mental/v4n7/v4n7a08.pdf>. Acesso em: 12 dez. 2019. p.128-129.

(37)

as melhores consequências, e a corrente deontológica, que localiza a moralidade em determinados direitos e deveres universais que devem ser observados, independentemente das consequências da conduta adotada.25

A questão dos animais não-humanos permanece um problema aberto para a filosofia e recebe especial atenção da Ética Animal.26

Durante muito tempo, falar da condição moral e legal dos animais causava certa suspeição e até mesmo desprezo da comunidade acadêmica. Alguns poucos pensadores se preocuparam isoladamente com o tema, de modo que nos dois últimos séculos os limites éticos da conduta humana em relação aos animais limitaram-se a proscrever a crueldade intencional contra os não-humanos.27

É somente nas décadas recentes (a partir de 1970) que os pensadores reúnem esforços para tentar estender seus escritores e contribuições éticas ao domínio dos não-humanos de forma sistematizada e expressa. Isso se deve a superação das preocupações ética vetustas limitadas com a constatação que a maior parte do sofrimento animal não é proveniente de atos de crueldade intencional, mas da utilização normal e socialmente aceita dos animais não-humanos.28 A importância dada ao sofrimento animal é uma constante

em muitas teorias éticas voltadas aos não-humanos e seu entendimento compreende preocupações com a questão da senciência, termo que será recorrente no presente trabalho.

I.I.I Sobre a senciência

Em sua definição clássica, a senciência representa a capacidade de um ser de experimentar um estado de sofrimento, de prazer ou felicidade.29 Formada a partir de dois outros termos, consciência e

sensibilidade, senciência designa a condição mental, afetiva, emocional e consciente dos animais de perceber estímulos dolorosos e prazerosos que afetam seu organismo, sua prole e pares sociais. A senciência,

25 LAFOLLETTE, Hugh (ed.). Ethics in practice: an anthology. 2. ed. Londres:

Blackwell, 2002. p. 09-10.

26 A ética do tratamento dos animais (não-humanos) por parte dos humanos.

(NACONECY, Carlos Michelon. Ética & animais: um guia de argumentação filosófica. p. 17.)

27 NACONECY, Carlos Michelon. Ética & animais: um guia de argumentação

filosófica. p. 17.

28 NACONECY, Carlos Michelon. Ética & animais: um guia de argumentação

filosófica. p. 17-18.

(38)

portanto, não é privilégio apenas dos seres humanos.30 Definir com

precisão os atributos fisiológicos e evolutivos responsáveis pela emergência da senciência em animais e humanos, o que permitiria afirmar sem margem para dúvidas quais animais são senciência, não é uma tarefa simples.

Alguns autores defendem que todos os animais, diante de sua condição de natureza animada, sem exceção de qualquer espécie, são detentores de sensibilidade e consciência, logo, são seres sencientes.31

Ancorados na Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não Humanos,32 esses autores defendem que seres

humanos, cães, vacas, polvos, aves, abelhas, mosquitos, esponjas e estrelas do mar, vertebrados e invertebrados, todos os animais possuiriam em comum a senciência:

A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente como a capacidade de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência.33

30 FELIPE, Sônia T. Acertos abolicionistas: a vez dos animais: crítica à moralidade

especista. p. 28.

31 FELIPE, Sônia T. Acertos abolicionistas: a vez dos animais: crítica à moralidade

especista. p. 28-29.

32 A Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não

Humanos, mais conhecida como Declaração de Cambridge, é um documento emitido em 7 de julho de 2012, na Universidade de Cambridge, por um proeminente grupo internacional de neurocientistas cognitivos, neurofarmacologistas, neurofisiologistas, neuroanatomistas e neurocientistas computacionais, que reuniram-se para reavaliar os substratos neurobiológicos da experiência consciente e comportamentos relacionados em animais humanos e não humanos.

33 LOW, P.; PANKSEPP, J.; REISS, D.; EDELMAN, D.; VAN SWINDEREN, B.;

KOCH, C. The Cambridge declaration on consciousness. In: Francis Crick Memorial

Conference, Cambridge, England. Disponível em:

<http://fcmconference.org/img/CambridgeDeclarationOnConsciousness.pdf>. Acesso em: 18 nov. 2018. Tradução do autor, no original: “The absence of a neocortex does not appear to preclude an organism from experiencing affective states. Convergent evidence indicates that non-human animals have the neuroanatomical, neurochemical, and neurophysiological substrates of conscious states along with the capacity to exhibit intentional behaviors. Consequently, the weight of evidence indicates that humans are not

(39)

Argumentando em um sentido um pouco mais restrito, alguns autores defendem que é necessário que um ser possua um determinado conjunto de fatores fisiológicos, comportamentais ou evolutivos para ser considerado senciente.34 A divergência entre quais e quantos fatores

seriam necessários para a emergência da senciência é o que causa as discussões entre esses autores. Como esses fatores não são os únicos existentes e ao longo do tempo muitos outros foram utilizados, ainda que arbitrariamente, para tentar delimitar uma fronteira entre a senciência e a não senciência, estabelecer com precisão irreparável que animal é senciente torna-se uma tarefa hercúlea. Tal dificuldade é acentuada quando se leva em consideração a vastidão de espécies de seres existentes.35

Para muitos autores, a presença ou ausência de um sistema nervoso central (critério fisiológico) é um fator determinante para o estabelecimento da senciência em seres vivos. Essa ideia toma maior força quando aliada a investigações comportamentais, por estudos comparativos entre a anatomia e fisiologia cerebral e considerações sobre a continuidade evolucionária entre as espécies. Todos os mamíferos e os vertebrados em geral compartilham a mesma anatomia básica do cérebro. Até mesmo os cérebros estruturalmente diferentes podem ser neurodinamicamente semelhantes, de modo a permitir inferências razoáveis sobre a consciência animal.36

Inferências razoáveis, pois, alguns animais não se enquadram nos critérios e sobre muitos outros há dúvidas e discussões se se enquadrariam. Muitos desses critérios não são claros nem para alguns seres humanos (idosos, deficientes, v.g.). De todo modo, diante dos critérios para aferição de senciência, parece razoável afirmar que todos os seres sencientes são animais, mas nem todos os animais são

unique in possessing the neurological substrates that generate consciousness. Nonhuman animals, including all mammals and birds, and many other creatures, including octopuses, also possess these neurological substrates.”

34 ÉTICA ANIMAL. Critérios para reconhecer a senciência. Disponível em:

<http://www.animal-ethics.org/senciencia-secao/senciencia-animal-intro/criterios-reconhecer-senciencia/>. Acesso em: 11 nov. 2018.

35 Para uma consulta mais robusta acerca das discussões sobre os critérios demarcatórios

da senciência ver ALLEN, Colin; TRESTMAN, Michael. Animal consciousness. The Stanford Encyclopedia of Philosophy. 2017 Edition. Disponível em: <https://plato.stanford.edu/archives/win2017/entries/consciousness-animal/>. Acesso em: 11 nov. 2018.

36 EDELMAN, D. B.; BAARS, B. J.; SETH, A. K. Identifying hallmarks of

consciousness in non-mammalian species. Consciousness and cognition, v. 14, n.1, 2005, p. 169–187.

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sencientes. Como a questão acerca da senciência permanece insolúvel, adotou-se um parâmetro fisiológico para sua determinação, isto é, os animais dotados de sistema nervoso centralizado serão considerados sencientes.37

E nos casos de dúvida, talvez a posição mais sensata e virtuosa seria considerar o animal como um ser senciente e adotar uma “ética de respeito pela vida” animal, militando a dúvida em favor deste. Diante da ignorância em distinguir animais sencientes é melhor que um princípio ético peque pela abrangência desmedida do que pela permissão de sofrimento em alguns animais.38

I.I.II Uma questão complicada: entre normas morais e normas jurídicas

Por mais que percorram vários caminhos e argumentos, a questão basilar com que sempre se deparam os debatedores é: afinal, os animais não-humanos possuem direitos? Essa simples questão possui vários desdobramentos e suas múltiplas respostas, sejam afirmativas ou negativas, trazem consigo uma série de implicações. Antes de buscar respostas para essa indagação, convém primeiramente delimita-la um pouco melhor, aclarando e analisando seus termos e possibilidades, o que auxiliará na compreensão do conteúdo do presente trabalho.

Seguindo a ordem das expressões presentes na indagação, o primeiro termo posto em análise é animais não-humanos. O termo animais não-humanos é utilizado para referir-se aos animais de espécie distinta da humana,39 comumente chamados apenas de animais.

Contudo, a simplicidade do conceito pode causar uma certa confusão e omitir uma série de dificuldades e indagações sobre quais animais o presente trabalho faz referência e a quais se aplicam as considerações aqui delineadas.

Alguns animais são facilmente incluídos no conceito, como cães, gatos, porcos, galinhas, vacas, lebres e outros conhecidos do público em geral, mas, ao refletir sobre os poríferos (esponjas do mar),

37 ÉTICA ANIMAL. O problema da consciência. Disponível em:

<http://www.animal-ethics.org/senciencia-secao/introducao-a-senciencia/problema-consciencia-pt/#fn1>. Acesso em: 11 nov. 2018.

38 BIRNBACHER, Dieter. Ethical principles versus guiding principles in environmental

ethics. Philosophica, v. 39, 1987, p. 70-72.

39 HORTA ÁLVAREZ, Oscar. Un desafío para la bioética: la cuestión del especismo.

2007. 1327 f. Tese (Doutorado em Filosofia). Faculdade de Filosofía, Departamento de Lóxica e Filosofía Moral, Universidade de Santiago de Compostela. p. 01.

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equinodermos (estrela e ouriço do mar) e cnidários (medusas, caravelas e anémonas do mar), dúvidas começam a surgir diante de sua inclusão ou não no conceito de animais não-humanos.

Numa análise abrangente do conceito, poríferos, equinodermos e cnidários seriam animais não-humanos, pois sua classificação taxonômica inicia-se pelo reino Animalia e sua espécie não é a humana. Todavia, para os fins desta dissertação, ao utilizar o termo animais não-humanos, estar-se-á fazendo referência a membros do reino Animalia, que sejam sencientes, vertebrados e em alguns casos invertebrados, possuidores de um sistema nervoso central cujo órgão central (essencialmente um cérebro) seja desenvolvido e que necessariamente não pertença à espécie homo sapiens sapiens (espécie humana).40

Por vezes o texto poderá conter apenas a expressão animais ou não-humanos, mas o significado de ambas deverá remeter a um animal que não seja da espécie humana nos moldes referidos no parágrafo anterior. A espécie humana é referida ao longo do texto como seres humanos, humanos ou humanidade.

Com o novo significado de animais não-humanos, os poríferos, equinodermos e cnidários não seriam animais não-humanos em razão dos primeiros não possuírem um sistema nervoso e dos dois últimos não possuírem um sistema nervoso centralizado. Tais animais podem reagir a estímulos externos, e até mesmo empenhar-se para locomoção, assim como o fazem algumas plantas, mas, não há evidências fisiológicas indicativas de senciência nesses animais.41

A questão acerca da posse de senciência como critério definidor de animal não-humano acarreta novos problemas quando analisada a condições de alguns animais do filo Arthropoda, como é o caso das abelhas, formigas, aranhas e escorpiões.42 Alguns dos animais desse filo

40 Elaborado a partir de ÉTICA ANIMAL. Que seres são conscientes? Disponível em:

<http://www.animal-ethics.org/senciencia-secao/senciencia-animal-intro/seres-nao-sao-conscientes/>. Acesso em: 10 nov. 2018.

41 Elaborado a partir de ÉTICA ANIMAL. Que seres não são conscientes? Disponível

em: <http://www.animal-ethics.org/senciencia-secao/senciencia-animal-intro/seres-nao-sao-conscientes/>. Acesso em: 10 nov. 2018.

42 Allen-Hermanson, Sean. Insects and the problem of simple minds: are bees natural

zombies? Journal of Philosophy, v. 105, n. 8, 2008, pp. 389-415. No artigo o autor explora que alguns animais invertebrados possuiriam uma “mente simples”, e seriam, no conceito filosófico, zumbis naturais, posto que usam seus sentidos de maneira inteligente, mas sem o fenômeno da consciência. A noção filosófica de zumbis foi proposta por David Chalmers em seu livro The Conscious Mind (A Mente Consciente), e representaria criaturas microscopicamente idênticas a qualquer ser humano e que produziriam comportamentos indistinguíveis de qualquer outro ser humano, mas essas criaturas

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