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Desafios da pesquisa participante na atuação

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da Igreja Hoje*

Edla Eggert

Estamos necessitando de desafios e mudanças em todas as áreas. A pesquisa participante é uma tentativa, entre outras, de trazer novas co­ res à aquarela da relação teoria e prática. M otivada por este sentim ento de busca por desafios e mudanças, apresento o tem a da pesquisa partici­ pante na certeza de que a leitora e o leitor acrescentarão a discussões posteriores a sua experiêcia de pesquisa na vivência cristã.

1 — A s p e c to s G e ra is d a P e s q u is a P a rtic ip a n te

O term o pesquisa participante é recente e foi popularizado na Am érica Latina, na sua m aneira particular, de "conhecer transform an­ d o ". Possui vários enfoques1 e nomes diferentes como:

— Pesquisa-Ação; Pesquisa-Ativa; Pesquisa M ilita n te ; Investigação- Ação; Investigação Com prom etida; Investigação Participativa; etc.

A pesquisa participante no Brasil tem suas origens nos m ovim en­ tos de Educação Popular, a partir dos anos sessenta. Segundo alguns au­ tores, ela surge através das idéias de Paulo Freire que enfatizou a pes­ quisa tem ática2. E pesquisando o pensar do grupo social que a Educação

* O presente te xto fo i a p re s e n ta d o po r m im em do is m o m e n to s im p o rta n te s: Na Escola S u pe rior de T e o lo g ia da IECLB em 0 8 /0 6 /8 8 , co m o p re la ç ã o in a u g u ra l e com o tra b a lh o de ingresso na F ra te rn id a d e T e o ló g ica L a tin o -a m e ric a n a .

1 — Os e n fo q u e s são distin to s, com o no caso da p e sq u isa -a çã o de M ic h e l T h io lle n t, q u e já possui um a m e to d o lo g ia m ais d e fin id a .

2 — Cf. C elso R. BEISIEGEL, P o lític a e E ducação P o p u la r. Cap. II — A pesquisa te m á tic a fo i usada na a lfa b e tiz a ç ã o de a d u lto s. Fazia-se um e stu do sobre o m o d o de v id a das pessoas da lo c a li­ d a d e a través de e n tre vista s, q u e , d e p o is era u tiliz a d o em fo rm a d e tem as g e ra d o re s na a lfa ­ be tiza çã o .

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Popular e a pesquisa participante possuem muitas coisas em comum. Talvez a mais significativa seja a proposta de uma nova relação entre su­ jeito e objeto na pesquisa. Ambas, Educação Popular e pesquisa partici­ pante, possuem um caráter político claro, buscando a consciência crítica da sociedade a partir da re a lid ad e do dia -a-dia. Poderíamos dizer que é através da Educação Popular que a pesquisa participante entra em cena propondo uma " n o v a " concepção de fazer pesquisa.

A tualm ente, não existe na A m érica Latina um m odelo único de pesquisa participante. Ela é, antes de tudo, um enfoque e um m ovim ento que insere e com prom ete a intelectual. Justamente por estar em ergindo num continente tão diversificado e porque, em alguns casos, os países só se identificam na opressão e na dependência externa, é que a pesquisa participante na A m érica Latina não possui um discurso acabado, mas em construção.

Existem duas vertentes para a pesquisa participante: Uma é edu­ cacional e a outra sociológica.3

A vertente educacional está preocupada em contrapor ao "p o s iti­ vismo p ed a g ó g ic o " e às form as tradicionais de fazer educação uma edu­ cação participativa e que visa uma mudança social. Questiona a separa­ ção do político e do científico, da teoria e da prática.

Na vertente sociológica a discussão passa desses lim ites entre teo­ ria e prática e chega à im portância epistem ológica da "a ç ã o para a pes­ q u is a " e à acepção política da noção do social. A partir destas discussões oportunizam -se novos enfoques m etodológicos. Entre outros, O rlando Fais Borda4 tem contribuído significativam ente na sistematização da teo­ ria da pesquisa participante na Am érica Latina. Também os simpósios m undiais de Cartagena em 1977 e o da loguslávia em 1980, os três p ri­ meiros sem inários latino-am ericanos de pesquisa participante realizados respectivam ente no Perú em 1980, M éxico em 1982, São Paulo em 1984, tratam das tendências e alternativas m etodológicas da pesquisa partici­ pante na A m érica Latina.

3 — M a rc e la GAJARDO, P esqu isa P a rtic ip a n te na A m é ric a L a tin a , p. 12-18.

4 — S o ció lo g o c o lo m b ia n o p io n e iro de um a pesquisa p a rtic ip a n te no ca m p o g e ra l da s o c io lo g ia crítica.

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2 — C o n c e itu a ç ã o e P ro p o s iç õ e s

A partir desta rápida visão, podemos nos perguntar o que vem a ser a pesquisa participante. De form a bastante am pla poderíam os dizer que é

"Um estílio de pesquisa e um espaço para o qual convergem reiterados esforços para desenvolver enfoques de pesquisa que sejam condizentes com a realidade dos países latino- americanos. Esforços reiterados para conformar estilos de tra­ balho científico que permitam vincular a produção e a comuni­ cação de conhecimentos aos processos de transformação sócio- política."5

Esta conceituação am pla desdobra-se basicamente em três propo­ sições: 1) A postura ideológica d e fin id a ; 2) A nova relação sujeito- objeto; 3) A produção coletiva de conhecim ento.

1. Postura Ideológica D efinida

A realidade política dos países latino-am ericanos é, na m aioria dos casos, autoritária. A re a lid ad e sócio-econôm ica é extrem am ente de­ pendente do capital estrangeiro. Neste contexto, a pesquisa participante quer assumir este continente oprim id o e quer dar um enfoque ideológico d e fin id o em sua atuação junto à universidade e à com unidade. Isto é, proporcionar pesquisa de cam po acadêm ica não é mais, para a pesquisa participante, distanciar a pesquisadora da re a lid ad e pesquisada ao pon­ to de neutralizar a relação pesquisadora-pesquisada. Será justamente um com prom etim ento da pesquisadora com a re a lid ad e das pessoas ou grupos pesquisados de m aneira que se produza e se com unique conheci­ mento para a transform ação social. Na pesquisa participante entende-se a neutralidade como conivência ao poder dom inante, dono do saber e direcionador das pesquisas. Por isto, quem deseja realizar a pesquisa participante tem sempre que fazer a pergunta: " A quem e ao quê está servindo na produção e na com unidade de conhecim ento?". A postura ideológica pode ser d e fin id a e dem arcada nas relações sociais e, por isso a

"Objetividade não pode mais ser sinônimo de descomprometi- mento e de imparcialidade sob pena de transformar-se em ci­ nismo e insensibilidade".^

5 M a rc e la GAJARDO, P esqu isa P a rtic ip a n te na A m é ric a L a tin a , p. 49.

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A pesquisa participante não pesquisa somente para inform ar, mas para questionar o próprio grupo pesquisado. Para tanto, ela necessita da o b je tivid a de a fim de concretizar tais objetivos. Salientamos, porém , que o b je tivid a de não pode ter a conotação de neutralidade.

Fazer pesquisa com uma postura d e fin id a em favo r dos grupos m arginalizados é sempre de novo estar se posicionando criticam ente com relação ao o b jetivo da produção de conhecim ento. Pesquisar desta form a visa mostrar as lim itações do tem a da im parcialidade na pesquisa tradicional, da separação do político da ciência.

2 — A N o v a R e la ç ã o S u je ito -O b je to

A pesquisa tradicional exclui do cam po educacional e sociológico o contexto social do objeto pesquisado, incorporando-o como mero dado condicionante. Os grupos m arginalizados e seu contexto, numa típica re­ lação sujeito-objeto, são apenas descritos pela pesquisadora tradicional como objetos a serem conhecidos. Assim, a pesquisa pode ser um reflexo da sociedade capitalista onde quem possui os meios de produção e xplo ­ ra quem vende sua força de trabalho. A pesquisa tradicional é realizada por alguém que sabe e pode sobre alguém que não sabe e não pode. Desta inform ação coletada surgem novos dados que d ific ilm e n te chega­ rão às mãos do objeto pesquisado e nem sempre serão im portantes para seu viver diá rio . Faz-se uma pesquisa sobre o grupo social, para contro­ lar este grupo, não com ele, no sentido de a ju d á -lo a descobrir-se como sujeito capaz de construir a história.7

Os Estados Unidos, no início dos anos cinqüenta, utilizaram a ciên­ cia social e a pesquisa tradicional como repressora dos m ovim entos em ergentes no Terceiro M undo. Criaram inúm eros estudos e, dentro des­ tes países, d ifun d ira m a id e olo g ia norte-am ericana como o m odelo ideal de sociedade em contraposição ao "fa n ta s m a " do com unism o.8

A form a como o produto da pesquisa tradicional, supostamente neutro, está colocado a serviço da dom inação fica clara no exem plo dos acordos entre o MEC e a AID (Agência para o Desenvolvim ento Interna­ cional). Estes acordos nortearam a reform a do Ensino Superior, em 1968,

7 — O za rin a SILVA, R e fle tin d o a P esqu isa P a rtic ip a n te , p. 18 8 — Cf. Ibd em .

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registrada na lei 5.540/68.9 Uma equipe norte-am ericana ficou responsa­ bilizada pela reform ulação da universidade brasileira. Independente da boa intenção e suposta neutralidade daqueles pesquisadores, percebe- se o quanto os instrumentos científicos são usados pelo poder dom inante de m aneira que a q u ilo que é pesquisado numa relação de neutralidade pode pacificam ente, ser usado na preservação do poder de dom inação. Esta fa lta de com prom etim ento por parte das pesquisadoras, não só no m om ento da pesquisa, mas depois com os resultados da mesma, revela o aspecto im plícito e intrínseco da dom inação.

A nova relação sujeito-objeto na pesquisa participante observa que a lógica da pesquisadora deve ser a mesma do grupo social investi­ gado. Carlos Rodrigues Brandão apresenta a pesquisadora não como aquela que vai se fantasiar de operária para conhecer tal realidade, mas que, como cientista e com sua ciência, com promete-se no engajam ento e na luta pela d ig nid a de do outro, " a quem mais do que conhecer para explicar, a pesquisa pretende com preender para s e rv ir."10 Nesta d in â ­ mica, a proposta da pesquisa participante quer ressaltar que a pesquisa­ dora possui um saber e a pesquisada tam bém possui um saber. Nesta re­ lação dos dois saberes, o o bjetivo fin a l da pesquisa participante será o de propor uma relação entre sujeitos, em que o objeto não será mais um grupo quantificado, mas serão as dificuldades daquele grupo social que necessitam ser solucionadas.

Esta nova relação sujeito-objeto com prom ete a produção de co­ nhecim ento com os grupos excluídos da sociedade. Redimensiona a re la ­ ção distanciada pretensam ente neutra, tão fortem ente acentuada na pesquisa tradicional, tornando a convivência e o d iá lo g o possíveis entre pesquisadora e pesquisada. Se na pesquisa tradicional pesquisa-se sobre o grupo social para, em últim a análise, m elhor dom iná -lo, a pesquisa participante pesquisa com o grupo social e para este, o bjetiva n do a sua organização. Isto acontece de várias form as: a) No envo lvim en to contí­ nuo e gradual das pesquisadas na pesquisa; b) Na produção de conheci­ m ento; c) Na devolução da pesquisa para o grupo social pesquisado; d) Quando um grupo já organizado faz a sua própria pesquisa ou pede au­ xílio da presença técnica, etc.

9 — V e ja -se O ta íza ROMANELLI, H is tó ria d a E ducação n o B ra s il, cap. v. A a u to ra a p ro fu n d a o estu­ d o da e d u ca çã o após 1964, os a co rdos MEC-USAID. O utros a u to re s com o M o a c ir GADOTTI,

C once pção D ia lé tic a d a E ducação e B arb ara FREITAG, Escola, E stado e S o cie d a d e , a n a lis a m as

con seqüê ncias desses acordos. A d e p a rta m e n ta liz a ç ã o , a d e se stru tu ra çã o d o e n sin o das c iê n ­ cias hu m ana s e a te c n ific a ç ã o dos cursos c o n trib u íra m m a g is tra lm e n te pa ra o e m p o b re c im e n ­ to d o Ensino S u pe rior no Brasil.

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3 — P ro d u z ir C o n h e c im e n to C o le tiv a m e n te

Segundo Paulo Freire11, a convivência horizontal e a postura críti­ ca da educadora — educanda geram a vontade de transform ar a re a lid a ­ de social existente. A pesquisa participante proporciona a produção de conhecim ento coletivo quando a pesquisadora, numa relação sujeito (pesquisadora e grupo social) e objeto (problem as), d ia log a e questiona

com o grupo na busca de soluções. Esta pesquisa visa despertar o grupo

social m a rginalizado sobre a opressão que vivência, a uxilia n d o -o na busca de mudanças e na elaboração de meios para realizá-la.

As necessidades concretas de sobrevivência do grupo social m ar­ g in a liza d o exigem a produção de um conhecim ento im ediato e que ve­ nha de encontro com a "c u ltu ra popular e a leitura que os setores popu­ lares fazem da re a lid a d e ."12 A reflexão dos resultados conseguidos a partir desta prática apresenta a possibilidade de identificação coletiva na obtenção de novas form as para a utilização dos recursos existentes. Nes­ ta identificação coletiva o grupo recupera sua história e conceitua sua realidade. Tudo isto se apresenta de m aneira co n flitiva , que nem sempre chega a organizar o grupo social, porém oportuniza a re fle xão para que se busque o espaço pedagógico há m uito tem po perdido na escola. Entre a re fle xão coletiva e a organização do grupo social não existem lim ites que divid am estas atividades. Am bas devem ser distinguidas pelas pes­ soas que se preocupam com esta dinâm ica.

Conform e O rlando Fals Borda13 o "co n he cim en to p o p u la r" p ro pi­ cia a criação de novos conhecim entos a partir de "recursos n atu ra is" pro­ venientes do local. Por isso, não se pode absolutizar o conhecim ento científico. A fin a l, ele pode m udar de acordo com os objetivos do grupo social envolvido. Este autor relaciona seis itens, chamados de princípios m etodológicos, para que a produção coletiva de conhecim ento aconte­ ça:

1) A u te n tic id a d e e Com prom isso: Por parte da intelectual, sem que ela

perca os seus méritos sobre o que já sabe sistematicam ente. Isto não pre­ cisa ser escondido, mas tam bém não precisa ser "e n d e u s a d o ".

2) A n tid o g m a tis m o : Q uando se aplica rigidam ente uma idéia ou princí­

pio ideológico, muita coisa pode ser desperdiçada. Por não ser sensível a

11 — V eja-se P aulo FREIRE, P e d a g o g ia do O p rim id o .

12 — M a rc e la GAJARDO, P esqu isa P a rtic ip a n te na A m é ric a L a tin a , p. 48. 13 — V e ja -se O rla n d o Fals BORDA, A s p e c to s T e ó ric o s d a P esqu isa P a rtic ip a n te .

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alguns momentos, algum as intelectuais se fecham para a política e para a ciência.

3) R estituição S istem ática: É necessário restituir o conhecim ento para a

ação organizada. A restituição não pode ser arrogante, mas de form a simples e c la ra .14

4) Feedback Para os Intelectuais: O feedback acontece dialéticam ente

das bases para os intelectuais que optaram por lutar com os grupos so­ ciais m arginalizados. Toda vivência popular pode encontrar novo espaço dentro da ciência.

5) Ritmo e E quilíbrio da A ção-R eflexão: A reflexão não acontece apenas

num nível de erudição. Ela deve voltar à base para ter validação. A pes­ quisadora deve estar em contato constante com o trabalho de campo.

6) Ciência M odesta e Técnicas D ialogais: Ciência modesta não quer d i­

zer de baixo nível. No entanto, a pesquisadora precisa abandonar a a r­ rogância de erudita. A prender a ouvir discursos das mais diferentes esfe­ ras culturais e adotar a hum ildade das pessoas que realm ente desejam aprender e descobrir para transformar.

II — L im ita ç õ e s d a P e s q u is a P a r tic ip a n te

Os autores que defendem a pesquisa participante não deixam de mostrar aspectos problem áticos desta proposta de trabalho. Existe pouca sistematização sobre o que é realizado. Há poucas avaliações sobre as pesquisas participantes que já ocorreram em determ inados grupos. M u i­ tas vezes fa lta rigor científico na form ulação de hipóteses pré- estabelecidas, pois dependem da realidade de cada grupo. Isto d ificu lta a o bjetividade, a validação e a possibilidade de em pregar conhecim en­ tos já produzidos numa determ inada pesquisa participante para outra possibilidade de pequisa participante.

Também a pesquisa tradicional critica a pesquisa participante em relação a estes itens (o bjetividade, validação e arm a ze na m e nto ).15

Pedro Demo aponta para o perigo de se cair no ativism o, a le r­ tando que é im portante retornar à teoria para

14 — Borda con sid e ra q u e as técnicas d e v e m ser acessíveis ao g ru p o de fo rm a q u e a m e to d o lo g ia ve n h a a ser d o m in a d a p e lo g ru p o e este possa, a p a rtir de e n tã o , re a liz a r suas p ró p ria s pes­ quisas.

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"aperceber-se do fanatismo, para aprender de outras práticas e para, se for o caso, até mudar de prática. Quem não volta à teoria deixa de ser crítico.

O papel da teoria ainda não está claro na pesquisa participante, porém o futu ro está por ser construído. Para que esta prática seja le g iti­ mada é preciso sistematizar experiências vivenciadas que possam fu n d a ­ m entar esta proposta de produção de pesquisa científica no contexto latino-am ericano.

IV — A P e s q u is a P a r tic ip a n te D e s a fia n d o a P rá tic a d a Ig re ja

Como povo brasileiro, eclético pela sua história de invasões e colonizações, aprendem os desde m uito cedo a copiar modelos. Na edu­ cação isto foi concretizado praticam ente em cada nova legislação. A ca­ da "r e fo rm a " estabelece-se um " n o v o " m odelo a ser seguido, os quais são ditados por ideólogos, políticos e educadores muitas vezes estrangei­ ros. G eralm ente estes modelos nos vêm às mãos por imposição e descon­ sideração do co nte xto.17

Com a igreja no Brasil tam bém não fo i m uito diferente. Cada igre­ ja trouxe consigo a história de sua denom inação. E im portante levar isto em consideração, porém não se pode mais copiar e im por modelos pron­ tos. E preciso construir uma base teórica contextuai, a partir do que se é e

do que se tem e ter consciência de que isto não acontece da noite para o dia, nem sem dedicação e disciplina de um fazer teológico que relacione constantem ente a teoria e a prática.

G erm ina na igreja hoje um desejo crescente de contribuir na ta­ refa de trasform ação social, no sentido de recuperar a d ig nidade da vida e da criação. Este desejo tam bém cresce em nós luteranas brasileiras. Talvez as CEB's têm servido de estím ulo neste sentido e temos em presta­ do delas m odelos e referenciais teóricos para a nossa própria prática. Emprestar não é o problem a. O problem a é não devolver e não contex- tualizar o em préstim o feito ! Enfatizamos aqui a cultura de cada grupo (igreja), a qual deve ser levada em consideração e respeitada como su­ jeito e não como objeto. Não será por "d o m in a r" uma análise de conjun­ tura que a pesquisadora aplicará princípios ideológicos dogm aticam

en-16 — Pedro DEMO, E le m e n to s M e to d o ló g ic o s da P esqu isa P a rtic ip a n te , p. 110. 17 - V e ja -se M o a c ir GADOTTI, C once pção D ia lé tic a d a Educação.

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te. O dogm atism o e a radicalidade podem abortar a proposta da pesqui­ sa participante no contexto cultural das com unidades da IECLB em todo o seu processo de aculturação.

Por isso precisamos um referencial teórico mais nosso. Um re fe ­ rencial que respeite a realidade cultural das pessoas m arginalizadas na própria IECLB, ou m elhor, nas suas com unidades. A realidade de opres­ são sócio-econôm ica é a mesma para todas no Brasil; porém , será a mes­ ma realidade cultural?

Acreditam os que neste aspecto a pesquisa participante pode fazer brotar em nós o desafio da pesquisa para a produção de novos conheci­ mentos, tam bém a partir da IECLB. Neste sentido, situaremos os desafios da pesquisa participante para dois momentos: o prim e iro é o m om ento acadêm ico ou de form ação teológica, e o segundo é mais voltado para a vivência cristã diá ria (ou da vivência da obreira na com unidade).

1 — A p e s q u is a p a r tic ip a n te n o m o m e n to a c a d ê m ic o

Enfatizaremos aqui algum as perguntas iniciais que objetivam , quem sabe, re a va lia r/re d im e n sio n a r, ao menos em alguns aspectos, os cursos de Educação Cristã e Teologia na EST.

A escola de ensino superior no Brasil é (ou pelo menos deveria ser) sustentada pelo tripé — Ensino, Pesquisa e Extensão. Destes três sus­ tentáculos, os dois últimos estão atrofiados e o prim e iro está q u a n tita tiva ­ mente m aior, porém nada sadio. Isso tudo graças às reform as que vêm acontecendo desde 1968. Dermeval Saviani d iferen cia ensino de pesqui­ sa e de extensão. Apresenta o ensino como "transm issão do saber", a pesquisa como "p ro d u çã o de novos conhecim entos" e a extensão é o diá log o com a c o m u n id a d e .18

No curso superior de Teologia e Educação Cristã, como está sendo visto este tripé? A pesquisa é apenas b ib lio g rá fic a ? 19 E a extensão, se dá apenas no estágio? O m áxim o que um trabalho semestral ou de conclu­ são alcança é ser indicado para a biblioteca? Qual o valor dado ao saber (à fé) das com unidades na re fle xão e pesquisa teológica? Aliás, a

per-18 — Cf. D e rm e va l S A V IA N I, E xte n sã o U n iv e r s itá ria : U m a a b o rd a g e m n ã o e x te n s io n is ta . 19 — V e rific a m o s 141 tra b a lh o s sem estrais e de con clu são a p a rtir de 1986 e con statam os q u e

des-tes, 8 ,5 % tin h a m a v is ita ç ã o e a e n tre v is ta co m o in s tru m e n to d e pesquisa e 0 ,7 % ob se rva va um a pesquisa de c a m p o com a c o le ta e o b se rva çã o dos da dos na te n ta tiv a de u m a a n á lis e m ais o b je tiv a .

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gunta fun d am en ta l, ante rio r a estas, deveria ser: Que tipo de conheci­ mento a teo lo g ia "p ro d u z ” para inserir-se na re a lid ad e e ser ouvida?

Já enfatizam os que a pesquisa participante opta por instrumentos não qua n tificáve is num ericam ente com tanta exatidão como os da pes­ quisa tra dicion a l. Isto porque a pesquisa participante considera o dia ló g i­ co e a pesquisa q u a lita tiva como form a de prom over a discussão e a par­ ticipação. Uma pesquisa desta natureza pode ser levada a cabo num cur­ so de Teologia e Educação Cristã? A partir de que áreas poderia haver pesquisa participante? E possível um d iá lo g o entre a Teologia e a pesqui­ sa participante?

No ensino superior de Teologia e Educação Cristã o d iá lo g o com a com unidade deveria fazer parte da pesquisa participante produzindo co­ nhecim ento em conjunto, de m aneira que ela pudesse germ inar contex- tualm ente: Uma teo lo g ia participante, onde o científico não é refutado e onde o tradicional (com unidade e a pesquisa) é levado em conta e questio­ nado tam bém . As discussões e a participação objetivam produzir conhe­ cim ento, teo lo g ia coletiva. Não pesquisar mais sobre alguém ou algum grupo, mas sim com e para o grupo o p rim id o e m arginalizado. Não po­ dem os esquecer que na pesquisa participante a intelectual se dispõe!

2 — P e s q u is a P a r tic ip a n te na V iv ê n c ia C ris tã D iá ria

Na vivência cristã muitas coisas se entrelaçam : a igreja, a te o lo ­ gia, a fé em Deus, a vida de cada um. Segundo a pesquisa participante, as obreiras chamadas pela com unidade para o serviço específico deve­ riam ter consciência de que não irão trabalhar sobre a com unidade mas

com ela. Isto exig irá da obreira que ela conheça a história da com unida­

de, sua realidade social, política e cultural, e a partir disto, perceba quais seriam as opressões (necessidades) que vivenciam as pessoas da com unidade e as pessoas m arginalizadas pela com unidade. Pode a OA- SE sofrer opressões das pastoras? As crianças, adolecentes, jovens e ido­ sos, as m ulheres que trabalham e os homens desem pregados podem es­ tar à m argem e sem o serviço da com unidade?

Esta postura, sujeito-sujeito, poderá fazer com que desm orone a torre de m arfim onde se colocava a obreira ou a pesquisadora. Com a pesquisa participante a obreira necessitará andar junto com a com unida­ de, consciente de que sabe m uito pouco da sabedoria, da cultura, da his­ tória e da resistência deste grupo ou com unidade. A obreira terá talvez, que re a valiar seus princípios ideológicos por causa do contexto em que estará inserida. Será, enfim , uma pesquisadora que encontrará na com u­

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nidade o outro sujeito para o d iá lo g o e a participação, re fle tin d o e talvez produzindo uma teologia mais concreta e coletiva. A obreira não resol­ verá tudo sozinha, mas<Jependerá do trabalho coletivo. Penso que a par­ tir disto precisará acontecer inclusive uma nova form a de a com unidade se organizar. Estamos abertas para isto? A igreja, como estrutura, supor­ tará as eventuais mudanças decorrentes de uma reestruturação a partir das necessidades das com unidades e das pessoas m arginalizadas?

A pesquisa participante é uma proposta que vêm redim ensionar os instrumentos e objetivos da pesquisa tradicional. Ela visa a produção de conhecim ento coletivo a partir de um trabalho que, segundo Bran­ dão, "re c ria de dentro para fora, form as concretas de pessoas, grupos e classes p o p u la re s ."20

A tualm ente vivem os muitos conflitos no Brasil e na Am érica Lati­ na. Estamos tentando criar soluções das maneiras mais variadas e cria ti­ vas. E uma corrida entre a sobrevivência e o sonho! Poderá a pesquisa participante ser um desfio para a teologia?

B ib lio g r a fia C ita d a

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Referências

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