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Processo

116/08.5TVPRT.P1

Data do documento 16 de dezembro de 2020

Relator

Paulo Duarte Teixeira

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Fundo de garantia automóvel > Prescrição > Invocação por co-réu

SUMÁRIO

I - Nos termos do art. 498º, do CC o prazo de prescrição aplicável ao FGA é de 3 anos.

II - Porque, numa interpretação teleológica, este não necessita de esperar o resultado de qualquer procedimento criminal, pelo que não é aplicável o nº3, do art. 498º, do CC.

III - A prescrição é uma excepção pessoal que tem de ser invocada por cada um dos RR da acção.

IV - Mas um co-réu pode, nos termos do art. 305º, do CC, invocar a mesma na medida em que é um terceiro com interesse direto nessa invocação.

V - Um condutor do veículo envolvido no acidente tem um interesse próprio e direto em que o responsável civil pela não existência do seguro não seja condenado, pois, este poderia, depois, exercer o direito de regresso contra si.

TEXTO INTEGRAL

Proc. n.º 116/08.5TVPRT.P1 Sumário: ……… ……… ……… 1. Relatório

O FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, intentou a presente acção declarativa de e condenação contra B…, Lda, e C… alegando em suma que, é titular do direito de sub-rogação estabelecido no art. 25º, nº 1, do DL nº 522/85 de 31.12, peticionando que os RR sejam condenados no pagamento das quantias (€ 27.396,28) que ele se viu obrigado a suportar em resultado de um acidente de viação ocorrido no dia 21 de

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Agosto de 2002.

Numa primeira fase, ambos os RR foram citados editalmente, foi realizada a audiência de julgamento, onde o autor procedeu à ampliação do pedido relativamente às despesas de instrução e liquidação do sinistro já determinadas, no montante de 526,41 euros, acrescido de juros de mota contados desde a citação até integral pagamento, o qual foi admitido. Foi proferida sentença a qual condenou os réus no pagamento da quantia de 27.827,49 euros, acrescida de juros de mora desde 25/1/2005, até integral pagamento.

O réu interpôs um recurso extraordinário de revisão de sentença afirmando apenas ter tomado conhecimento da sua condenação no âmbito da ação declarativa em causa quando foi interpelado pelo autor para liquidar o valor em dívida. Tendo procedido à consulta do processo, constatou ter sido citado editalmente, a qual foi indevidamente utilizada.

O recurso de revisão foi julgado procedente e, em consequência foi determinada a anulação dos “termos do processo declarativo apenso posteriores à citação edital dos réus, ordenando a citação do réu e a realização de buscas destinadas à identificação do legal representante da sociedade ré a fim desta ser citada na sua pessoa.”

Foi ordenada a citação dos réus. Notificado veio o réu C… contestar alegando, em 104 artigos que, em suma, não existe direito de acção, por não ser ele o obrigado a manter um seguro válido e eficaz e, em segundo lugar, já ter decorrido o prazo de prescrição, pois, o último pagamento ocorreu em 15.11.2004 e a acção foi intentada em 28.1.2008.

A ré foi citada editalmente e não contestou.

Foi proferida saneador sentença que julgou procedente a excepção invocada absolvendo as RR do pedido formulado.

*

Inconformada veio a autora interpor o presente recurso de apelação, que foi admitido subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

*

2. Formulou as seguintes conclusões:

1. O alargamento do prazo de prescrição previsto no n.º3, do artigo 498.º do CC aplica-se a qualquer das hipóteses previstas nos números anteriores, pelo que beneficia o Fundo de Garantia Automóvel;

2. O direito que o FGA exerce é o direito que assistia ao lesado; 3. Os interesses prosseguidos pelo FGA são os interesses do lesado;

4. Nas acções intentadas pelo FGA está em causa a discussão da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos que envolve o lesado e o lesante;

5. Nas acções intentadas pelas seguradoras para o exercício de um direito de regresso, está em causa uma outra relação controvertida, fundada noutros factos e circunstâncias;

6. A não aplicação do n.º3, do artigo 498.º do CC nas situações em que o FGA indemnize o lesado favoreceria o lesante, encurtando injustificadamente o prazo de prescrição e frustrando as finalidades que presidiram à criação do FGA;

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7. Ao não as interpretar da forma acima assinalada, o tribunal a quo violou o n.º3, do artigo 498.º e o artigo 593.º, ambos do CC.

1. A prescrição para ser eficaz necessita de ser invocada por aquele a quem aproveita, assim promana do artigo 303.º do CC.

2. No caso vertente, a ré B…, representada pelo Ministério Público, não deduziu contestação, pelo que não arguiu a excepção da prescrição, pelo que não pode beneficiar da mesma.

3. Recusa-se a aplicação do disposto no artigo 301.º do CC, na medida em que a alocução “aproveita a todos” não consagra a comunicabilidade da prescrição, mas, antes, pretende solucionar a dúvida quanto à possibilidade de aproveitamento da prescrição por parte de incapazes.

4. Neste sentido, sendo certo que a não invocação em sede de articulado próprio da prescrição configura um caso clássico de preclusão ou de resignação processual implícita, é incontestável que a obrigação da Ré B… não se mostra prescrita.

5. Donde, a referida ré sociedade comercial nunca poderia ter sido absolvida do pedido com fundamento na procedência da excepção de prescrição.

6. Ao não julgar da forma assinalada, o tribunal a quo violou os artigos 498.º, 521.º, 301.º e 303.º, todos do CC, tendo incorrido em erro de julgamento.

*

O réu C…, veio contra-alegar e apresentar ampliação, a título subsidiário, do âmbito do recurso nos termos do disposto no art. 636.º, n.º 1, do CPC, concluindo que:

Conclusões (quanto à ampliação do objecto do recurso):

1º. Do regime legal aplicável ao direito de sub-rogação (art. 25.º, em especial n.ºs 1 e 3 do DL n.º 522/85, de 31.12) resulta que o Recorrente não tem direito de acção contra o responsável pelo acidente e pelos danos que daí decorram quando sobre esse responsável não recaia a obrigação de celebrar contrato de seguro obrigatório;

2º. Era sobre a Ré B… que impendia a obrigação de segurar o veículo na medida em que era locatária deste; o Recorrido apenas conduzia o veículo com o conhecimento, autorização e no interesse da Ré – cfr., Ac. da Rel. do Porto de 27.04.2004, Proc. n.º 0421185;

3º. A falta de direito de acção do Recorrente traduz-se numa ilegitimidade material por respeitar à questão de fundo, a qual leva à absolvição do pedido – cfr. Ac. do STJ de 22.11.1968, BMJ 181, pg. 256 e Castro Mendes, Direito Processual Civil, vol. II, págs. 151 e ss ;

4º. Se assim não se entender, verifica-se, sempre e em qualquer caso, a ilegitimidade passiva do Recorrido, o que tem como consequência a sua absolvição da instância, nos termos da al. d), do n.º 1, do art. 278.º do Cód. Proc. Civil.

*

A apelante respondeu à ampliação formulada conforme consta do seu requerimento de 14.5.2020 cujo teor se dá por reproduzido.

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III. Questões

São as seguintes as questões a decidir:

1. Determinar qual o prazo de prescrição aplicável à autora e verificar se este já se completou

2. Em caso positivo, apreciar depois, se a procedência dessa excepção pode ou não aproveitar à ré citada editalmente

3. Em caso negativo, apreciar a ampliação formulada pela apelada. *

IV Motivação de facto

1. No dia 21/8/2002, pelas 20 horas e 15 minutos, D… foi vítima de atropelamento.

2. O veículo atropelante foi um veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ..-..-OR, conduzido pelo réu, sendo locatária do mesmo a ré.

3. O réu conduzia o OR com conhecimento, autorização e no interesse da ré.

4. O atropelamento ocorreu na Rua …, em cima da passadeira que se segue ao cruzamento com a Rua …, no Porto.

5. A lesada, no momento em que é colhida pelo OR, e porque o sinal luminoso para os peões se encontrava verde, procedia à travessia da dita passadeira vermelha, da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do OR e da via, já se encontrando a cerca de 1,9metros da berma.

6. O réu seguia distraído e desatento ao trânsito automóvel e pedonal que se processava naquela via. 7. Descendo a Rua …, ao aproximar-se do entroncamento referido, o réu depara-se com o sinal luminoso de cor vermelha, que lhe impunha a obrigação de parar.

8. Apesar do referido em 7., o réu não parou e avançou para o centro do referido entroncamento, vindo a embater, com violência, no peão que procedia à travessia da via, a lesada D…, a qual apenas se veio a imobilizar a cerca de 3,10metros à frente da passadeira onde ocorreu o embate.

9. Em consequência do embate o peão foi projetado para o solo, aí tendo ficado imobilizado.

10. O acidente ocorreu numa estrada com 7,60 metros de largura, constituída por duas faixas de rodagem, no mesmo sentido descendente, de boa visibilidade, sendo que, à data, estava bom tempo.

11. O atropelamento ocorreu na faixa de rodagem da direita.

12. O réu – condutor do OR – submetido ao teste do álcool, acusou uma taxa de alcoolémia de 1,26g/l. 13. A ré não realizou, nem beneficiava de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, circulando o OR sem seguro válido e eficaz.

14. Em consequência do referido embate, D…, sofreu fratura exposta dos ossos da perna esquerda, fratura do troquiter do ombro direito e ferida contusa do lábio superior.

15. Foi socorrida pelo INEM que a transportou ao Hospital …, onde recebeu tratamento de urgência, foi operada à fraturas e recebeu tratamento das lesões.

16. A D…, e consequência do embate e das lesões sofridas, ficou a padecer de sequelas: discreta rigidez do ombro direito, atrofia muscular da perna esquerda, cicatrizes do lábio superior e as resultantes das cirurgias realizadas no ombro, joelho e perna, o que se traduz numa incapacidade permanente geral de

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18,75%.

17. A D… e o G… participaram o acidente ao autor reclamando a reparação dos danos e prejuízos sofridos. 18. Instaurado o processo de averiguações concluiu o autor pagar: à D… a quantia de 14.759,95 euros, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais; ao G… a quantia de 12.491,13 euros pela assistência hospitalar prestada à lesada, o que ocorreu, respetivamente, em 15/11/2004 e 31/5/2004. 19. O autor despendeu, ainda, em 17/4/2003, a quantia de 50,00 euros com a realização do relatório médico elaborado pelo Dr. E…; em 6/7/2003, a quantia de 95,20 euros que liquidou à F… pela averiguação do sinistro.

20. Em despesas de instrução do processo e liquidação do sinistro o autor já despendeu a quantia de 671,61 euros.

21. A ação foi instaurada em 20/1/2008.

22. O réu citado pela primeira vez editalmente em 15/9/2008 e ulteriormente em 12/5/2016. *

5. Motivação Jurídica

O decurso do prazo de prescrição visa, por um lado sancionar o ente que não exerceu os seus direitos de forma tempestiva[1] e, por outro, assegurar a certeza e segurança do tráfego jurídico na medida em que o decurso do tempo estabiliza as expectativas dos cidadãos e atenua o perigo de falibilidade dos meios de prova.

Nessa medida Vaz Serra[2] foi, como sempre, elucidativo: “Sem querer entrar na discussão de qual seja exatamente o fundamento da prescrição, que uns vêem na probabilidade de ter sido feito o pagamento, outros na presunção de renúncia do credor, ou na sanção da sua negligência, ou na consolidação das situações de facto, ou na proteção do devedor contra a dificuldade de prova do pagamento ou sossegado quanto à não-exigência da dívida, ou na necessidade social de segurança jurídica e certeza dos direitos, ou na de sanear a vida jurídica de direitos praticamente caducos, ou na de promover o exercício oportuno dos direitos – pode dizer-se que a prescrição se baseia, mais ou menos, em todas estas considerações, sem que possa afirmar-se só uma delas ser decisiva e relevante.”

5.1. Do inicio do prazo

In casu a primeira questão é a de saber quando se inicia esse prazo.

No nosso entender esse prazo de prescrição inicia-se com o último pagamento efectuado e não com as várias prestações parcelares realizadas.

Neste sentido podemos usar argumentos sistemáticos e teleológicos.

Do ponto de vista sistemático, o que permite que o prazo de prescrição inicie o seu curso sem que o lesado tenha efectivo conhecimento da extensão dos danos é a possibilidade de, na acção de responsabilidade, deduzir um pedido genérico e obter também uma condenação do responsável também puramente genérica (artºs 569 do Código Civil, 471 nº 1 b) e 661 nº 2 do CPC).

Essa faculdade não é, porém, reconhecida ao segurador/FGA, dado que um tal direito é um direito novo que só se constitui com o cumprimento da obrigação de indemnização, o que exclui, por isso a possibilidade do

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seu exercício de forma antecipada relativamente a cada acto de pagamento parcelar da indemnização. Por isso, a natureza do direito que a autora pretende exercer nestes autos indica que o prazo de prescrição só se deve iniciar aquando do último pagamento.

Depois, convém não esquecer que a exigência de prazos de prescrição parcelares iria implicar a multiplicação de acções ou a ampliação do objecto das já existentes, o que implicaria a violação de normas processuais[3].

Por fim, a razão de ser da prescrição é estabilizar as relações jurídicas das partes, o que fica salvaguardado com contagem do respectivo prazo desde o pagamento final.

Em quinto lugar, o início do prazo de prescrição nos termos do art. 306º, do CC está ligado e depende da exigibilidade da prestação[4], ora, esta, neste caso, só está inteiramente completa com o último pagamento efectuado.

Por último, sempre se dirá que esta é a posição maioritária e aparentemente consensual na nossa jurisprudência[5].

De algum modo, aliás, o Ac de Fixação de Jurisprudência do STA nº 2/2018[6], não vinculativo para esta jurisdição decidiu que: “o prazo de prescrição do direito da sub-rogada companhia de seguros só começa a correr depois de ter pago os danos sofridos pelo seu segurado, em consequência de acidente de viação, visto que só depois deste pagamento o seu direito pode ser exercido, nos termos do artigo 498.º, n.os 1 e 2, do Código Civil”.

Assim sendo, como o último pagamento data de 15.11.2004 essa é a data do inicio do prazo de prescrição. *

5.2. Da duração do prazo de prescrição aplicável à autora.

A grande questão dos autos é a de saber se o prazo da prescrição será o de 3 anos previsto no art. 498º, nº1 e 2, ou o de cinco anos por via da aplicação do nº3, do mesmo artigo. Já que o prazo de prescrição criminal, neste caso, atenta a moldura do crime é de cinco anos nos termos do art. 118º, nº1, al. c), do CP conjugado com o art. 3º, nº2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro.

Cumpre relembrar, que o art. 498º, nº 1, do CC consagra uma prescrição especial de curto prazo, devido, primordialmente, em razões de perecimento da prova que o decurso do tempo inelutavelmente ocasiona. Dispõe, com efeito, o citado normativo que “o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete (...)”.

Por seu turno, o nº 2 do mesmo artigo estabelece que “prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre responsáveis”.

Sobre esta matéria existe uma acesa quer ela jurisprudencial[7], sendo que a jurisprudência mais recente do STJ tem vindo a defender que ao direito da autora é apenas aplicável a prescrição civil (nº2) e não o prazo criminal (nº3).

A tese contrária, que podemos qualificar como ampla, defende que o nº3, do art. 498º, do CC se deve aplicar às previsões do nº1 e 2 da mesma norma.

Nesta medida, Brandão Proença[8] esclarece que: “(…) a jurisprudência menos restritiva pretende construir o direito de regresso (e de subrogação legal) como prolongamentos do ilícito cometido pelo lesante, com o

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efeito de o dotar de uma idêntica estrutura e componente prescricional. Por outras palavras, “vê-se” o direito do lesado da mesma forma que o direito do pagador (seja este um credor de regresso ou um sub-rogado legal) e “imputa-se” ao responsável civil o ilícito criminal cometido. Daí a inexistência de uma barreira que separe o plano da responsabilidade, o direito do lesado contra o responsável civil (ou o responsável penal) e o plano subsequente da reintegração patrimonial dos pagadores”.

Mas a jurisprudência maioritária, à qual aderimos, faz apelo não apenas ao argumento literal mas fundamentalmente ao teleológico, defendendo que a aplicação do prazo mais alargado da responsabilidade criminal visa e depende da efectiva utilização desse meio de tutela jurisdicional o que não acontece com o autor/apelante FGA.

Para além disso, teremos de notar que por um lado a sub-rogação legal é distinta do direito de regresso[9]. O direito de regresso é um direito à restituição ou reintegração face a outros co-obrigados, por parte do devedor que cumpriu mais do que lhe competia, no plano das relações internas (artº 524 do Código Civil). Pelo contrário, o credor sub-rogado, tem um direito ex novo com base numa prestação efectuada por alguém que é um terceiro alheio ao vínculo obrigacional. Ora, apesar da lei qualificar o direito de reembolso da indemnização que a seguradora efectuou como direito de regresso é, pelo menos maioritário entre nós que o mesmo se enquadra na categoria técnica da sub-rogação. Se assim é, e como salientam os supra citados arestos do STJ[10], existe uma diferença teleológica fundamental na aplicação dos dois prazos de prescrição.

A razão de ser do alargamento do prazo de prescrição do direito do lesado, quanto o facto lesivo constitui simultaneamente um facto qualificado como crime, deriva de razões processuais penais (cfr. art. 71 do Código de Processo Penal)[11].

Depois, o acto de pagamento da indemnização ao lesado opera a extinção da obrigação primária de indemnização, extinção que, do mesmo passo, faz constituir, na esfera jurídica do segurador um direito novo que releva e se baseia no regime específico do contrato de seguro obrigatório – tendo, portanto, uma base extra-contratual nova e autónoma.

Por fim, como argumento autónomo não podemos esquecer que o segurador, quando paga, conhece já o facto danoso do lesante (sem o cujo conhecimento muito dificilmente pagaria), tendo aliás o segurado a obrigação de lho participar (art.100.º Lei contrato de Seguro), pelo que não carece de qualquer prazo adicional para exercer o seu direito.

Por isso, como demonstra a mais recente jurisprudência do STJ não pode a autora seguradora aproveitar-se do prazo superior relativo à responsabilidade criminal[12].

Assim, e por mais recentes: Ac do STJ de 18.1.2018 nº 1195/08.0TVLSB.E1.S1: “É de três anos o prazo de prescrição do exercício do direito de reembolso pelo Fundo de Garantia Automóvel relativamente ao pagamento da indemnização por ele satisfeita (como garante) ao lesado ou a terceiros”;

E, Ac STJ de 3.7.2018 nº 2445/16.5T8LRA-A.C1.S1: “O direito exercido pela seguradora nos termos do nº 4 do art. 31º da Lei 100/97, de 13/9, não constitui um verdadeiro direito de regresso, mas de sub-rogação legal nos direitos do sinistrado contra o causador do acidente, na medida em que tiver pago a indemnização. Nessa situação, o prazo de prescrição deve ser contado a partir do cumprimento, por aplicação analógica do art. 498º, nº 2, do CC. Esse prazo é o de três anos aí estabelecido, sem o

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alargamento previsto no nº 3 do art. 498º: o direito de sub-rogação mais não é que um direito de reembolso das quantias pagas, com uma natureza diferente da do direito do lesado e com um conteúdo delimitado essencialmente pelo crédito satisfeito. No caso de fraccionamento do pagamento da indemnização, deve atender-se, por regra, ao último pagamento efectuado, sendo, porém, de admitir que essa regra possa ser temperada nos casos em que seja possível a "autonomização da indemnização que corresponda a danos normativamente diferenciados".

Concluímos, assim, que o prazo de prescrição se completou em 15.11.2007, como tal, antes da instauração da acção.

5.3. Do aproveitamento ou não do decurso da prescrição pela co-ré

O art. 303º, do CC dispõe que: “O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público”.

Diga-se aliás que as causas impeditivas, ou suspensivas da prescrição podem ser subjetivas ou objetivas, sendo as primeiras baseadas em circunstâncias pessoais dos sujeitos envolvidos (arts. 321º; 322ºdo CC). A interrupção da prescrição pode ser promovida quer pelo credor, mediante a manifestação processual da intenção de exercer o direito (art. 323º), quer pelo devedor, mediante o reconhecimento, expresso ou tácito, do direito perante o credor (art. 325º).36, essa interrupção pode ainda derivar da prática de atos de liquidação (art. 306º, n.º 4), de compromisso arbitral (art. 324º, n.º 1), ou de notificação judicial avulsa (art. 323º, n.º 1).

As causas impeditivas subjetivas podem ainda ser bilaterais ou unilaterais, consoante respeitem, respetivamente, à relação entre credor e devedor (art. 318º), ou a circunstâncias relativas exclusivamente à pessoa do credor (arts. 319º; 320º).

Logo, é simples concluir quecada um dos devedores terá de invocar a prescrição para querendo se aproveitar da mesma. Com efeito, a contagem dos prazos de prescrição pode ser até diferente entre os devedores, porque conforme refere Vaz Serra , “a prescrição pode começar a correr em relação aos vários devedores em momentos diversos e até a duração do prazo pode acaso ser diferente.”

Nesta medida constituiu um meio de defesa pessoal que não aproveita ao outro devedor, na medida em que “não o libera da obrigação de regresso perante os condevedores a quem a prescrição não possa aproveitar”[13].

Nestes termos a prescrição consiste num meio de defesa pessoal que terá de ser invocado por cada um dos credores e, in casu o MP em representação do Réu citado editalmente, não o fez.

*

Mas importa frisar que nos termos do art. 305º, do CC:“A prescrição é invocável pelos credores e por terceiros com legítimo interesse na sua declaração, ainda que o devedor a ela tenha renunciado”. (nosso sublinhado).

Ou seja, a própria lei permite aos credores ou terceiros que se substituam ao devedor e invoquem a prescrição.

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Ora, in casu parece claro que o réu é um “terceiro com interesse legítimo” nessa invocação.

Este conceito de terceiro com interesse legítimo consiste na existência de um direito próprio, que o devedor não pode eliminar ou diminuir sendo caso disso: “o terceiro que constituiu hipoteca para garantia da obrigação (opõe a prescrição do crédito garantido pela hipoteca), o fiador (opõe a prescrição do crédito garantido por fiança), o vendedor obrigado a garantia pela evicção (opõe a prescrição – ou não-uso – do direito real sobre a coisa vendida), o sub adquirente do que adquiriu por negócio jurídico anulável (opõe ao terceiro a prescrição da ação de anulação) ”[14].

Desde logo, foi essa aposição da autora que intentou a acção contra os dois réus, alegando implicitamente que estamos perante uma obrigação solidária que, nos termos do art. 512º, do CC consiste numa mesma obrigação com pluralidade de sujeitos. Ou seja, a simples posição processual da AA/apelante concede ao réu um interesse efectivo e concreto em invocar todos os meios de defesa pessoais ou não a fim de evitar o pagamento do valor peticionado.

Porque, o art. 521º, n.º 1, do CC acentua que “se (…) a obrigação de um dos devedores se mantiver, apesar de prescritas as obrigações dos outros, e aquele for obrigado a cumprir, cabe-lhe direito de regresso contra os seus condevedores.”

Ou seja, de facto, o réu citado editalmente poderia, em abstrato pedir o ressarcimento do que tiver de pagar ao FGA ao réu, na medida em que este parece ter sido o efetivo causador do evento danoso, pois, conduzia: a) sem seguro; b) com taxa de alcoolémia superior à legal e c) atropelou um peão que atravessava a via na passadeira.

Logo este tem um interesse concreto, efectivo e material em que a acção não prossiga.

Porque, nos termos do art. 54º, nº5, do Decreto-Lei n.º 291/2007: “As entidades que reembolsem o Fundo nos termos dos n.os 3 e 4 beneficiam de direito de regresso contra outros responsáveis, se os houver, relativamente ao que tiverem pago”.

Ora, convém não esquecer que, conforme salienta Antunes Varela[15]: “dentro da rubrica geral do cumprimento efetuado no interesse próprio do terceiro cabem, não só os casos em que este visa evitar a perda ou limitação dum direito que lhe pertence, mas também aqueles em que o solvens apenas pretende acautelar a consistência económica do seu direito”.

Por fim, note-se que esta parece ser uma posição pelo menos maioritária entre nós, pois, num caso semelhante já foi decidido, (precisamente a favor da apelante FGA), pelo AC do STJ de 3.7.2003, nº 04B1328 (Ferreira Girão), que “ainda que o responsável civil a não tenha invocado na respectiva contestação, o Fundo de Garantia Automóvel pode invocar contra o lesado a prescrição do direito à indemnização, aproveitando àquele (responsável civil) esta invocação”.(nosso sublinhado)

Este aresto, considera ainda, que: “se o titular do direito à indemnização perdeu o direito de a exigir do responsável devedor, isto é, o direito de accionar a obrigação garantida, não se encontra fundamento para que ainda possa ser exercitado o direito consubstanciado pela obrigação de garantia. Com efeito, perante a subsidiariedade da obrigação de garantia, a responsabilidade do garante haverá de aferir-se pela existência e pela medida da obrigação garantida, de sorte que, extinta a obrigação do responsável civil, com ela se extingue a posição de seu garante encabeçada pelo FGA. Afloramentos do princípio estão patentes nas normas dos arts. 651º e 653º C. Civil, relativas à fiança, onde expressamente se prevê, como

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decorrência da natureza acessória da garantia, que a extinção da obrigação principal determina a sua extinção, bem como desoneração dos fiadores na medida em que não lhes for possível ficarem sub-rogados nos direitos do credor, por facto positivo ou negativo deste”.

Esta interpretação não é diretamente aplicável ao caso dos autos, pois, aqui os RR não são garantes. Mas, na medida em que o réu contestante pode vir a ser demandado pelo não contestante, nos termos de um direito de regresso, parece ser seguro concluir que o mesmo possui, por isso, um interesse directo em invocar a prescrição.[17]

Por último, importa frisar que neste caso, não existem diferenças subjectivas no inicio e contagem do prazo de prescrição sendo este idêntico para ambos os alegados devedores/titulares da mesma obrigação solidária. Sendo certo que, caso existissem, teriam de ser aplicadas, como referimos supra, de forma individual a cada umadas partes, pois, estamos perante uma excepção pessoal. Ou seja, não existem razões de justiça material que impeçam essa invocação, pois, a mesma sempre será determinada de acordo com as vicissitudes e comportamento concreto de cada parte.

Concluímos, assim, que no caso concreto pode o réu contestante invocar a seu favor nos termos do art. 305º, do CC o decurso do prazo de prescrição da co-ré.

*

5.4. Face ao exposto julga-se prejudicada a apreciação da ampliação do recurso. *

VI Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e manter a decisão proferida julgando procedente a exceção de prescrição, quanto ao RR dos autos.

*

Custas a cargo da apelante. *

Porto, 16 de Dezembro de 2020 Paulo Duarte Teixeira

Amaral Ferreira

Deolinda Varão [(com a seguinte declaração de voto) "Revendo posição anteriormente assumida".]

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[1] “dormientibus non succurrit jus”.

[2] “Prescrição Extintiva e Caducidade”, p. 32. Em termos semelhantes e mais recentemente Pedro Pais de Vasconcelos, Responsabilidade civil e prescrição, Revista de Direito da Responsabilidade, 2019, p. 761 e seg.; in

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http://revistadireitoresponsabilidade.pt/2019/responsabilidade-civil-e-prescricao-pedro-pais-de-vasconcelos

[3] No sentido de que o prazo começa a correr ex novo desde a data do pagamento nos termos do art.498.º, n.º2, vd. Ac.STJ 25-III-2010 (LOPES DO REGO), proc.2195/06, com os seguintes argumentos: “por aplicação analógica do art.498.º, n.º2, à sub-rogação, pois esta assenta no facto jurídico do cumprimento, pelo que o prazo prescricional de curta duração previsto no art.498.º, n.º1, apenas se inicia com o pagamento ao lesado, já que antes desse facto o segurador “está privado da possibilidade de exercer o direito que lhe assiste no confronto do principal responsável pelo dano causado, constituindo restrição excessivamente onerosa a que decorreria da aplicação, nessas circunstância, de um prazo prescricional curto, contado da originária verificação do facto danoso na esfera do lesado”.

[4] Cfr. Ana Filipa Morais Antunes, algumas questões sobre Prescrição e Caducidade, in separata de Estudos de Homenagem Prof. Dr. Sérvulo Correia, 2010, FDUL, pág.2 a 21

[5] Acs. da RL de 26.05.09 e do STJ de 28.11.04 e de 26.06.07, e Acs. do STJ de 27.03.03, 28.10.04 e 04.11.10, todos in www.dgsi.pt.

[6] In DR n.º 236/2018, Série I de 2018-12-07.

[7] Cfr. Defendendo a aplicabilidade do prazo de 5 anos: Acs. do STJ de 24.10.02, CJ, STJ, III, pág., 120 e de 13.04.00, BMJ nº 496, pág. 246, da RL de 18.02.08, CJ, I, pág. 103, da RC de 02.03.02, CJ, II, pág. 259, do STJ de 26.06.07, da RL de 15.05.07, 31.10.06, 31.10.02 e da RP de 27.11.08, www.dgsi.pt e, na doutrina, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, Direito das Obrigações, Tomo III, 2010, Almedina, Coimbra, pág. 757; contra, Acs. da RL de 26.05.09, 09.12.08 e 14.12.06, da RP de 04.10.01, 17.09.09 e de 18.10.99, e do STJ de 04.11.08, www.dgsi.pt. Acs. do STJ de 31.03.09 e 31.03.09, www.dgsi.pt. e Acs. do STJ de 29.11.11, 17.11.11, 16.11.10, 04.11.10, 27.10.09, 04.11.08, 09.10.03 e 06.05.09, www.dgsi.pt. [8] in “Análise ao Ac. do STJ, de 18.10.2012: natureza e prazo de prescrição do “direito de regresso” previsto no diploma do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel”, P. 4 [9] Para a distinção das duas figuras, na doutrina ANTUNES VARELA, Das Obrigações em geral, vol.II, pp.345-347; MENEZES CORDEIRO, Direito das Obrigações, 2.ºvol, p.101, ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, p.826, COSTA GOMES, Assunção fidejussória de dívida, pp.874 e ss., MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, vol.II, p.42(72); 57 VAZ SERRA, “Sub-rogação nos direitos do credor”, BMJ (1953), p.64. Estes autores salientam, também, a origem histórica da figura, nos termos do qual se visou limitar a sub-rogação aos casos de cumprimento efectuado por terceiro, e restringindo-a, dentro desse círculo de situações, aos terceiros que tenham garantido o cumprimento ou tenham interesse próprio na satisfação do crédito.

[10] E, entre outros o Ac da RC de 24.1.2012 nº 644/10.2TBCBR-A.C1 in www.dgsi.pt

[11] Note-se aliás que quanto à transmissão doutros acessórios do crédito, estes transferem-se para o cessionário ou para o sub-rogado apenas se forem separáveis da pessoa do cedente, o que não incluiu por exemplo os juros vencidos.

[12] Outros argumentos são ainda apontados pelo Ac.TRP de 25-3-2010 in

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regresso, como garante do credor sub-rogado, o prazo de prescrição “daquele que pagou” é de três anos, sem o alargamento previsto no art.498.º, n.º3, do CC”; Ac.TRL de 26-5-2009 (ABRANTES GERALDES), in proc.2491/06.7TBBRR-7, dizendo, a propósito do regresso no seguro automóvel, que, “se é verdade que o alargamento do prazo previsto no art.498.º, n.º3, se aplica ao art.498.º, n.º1, no que toca ao direito de regresso previsto no n.º2, em bom rigor, embora a letra da lei induza à aplicação do n.º3, esta norma de alargamento do prazo não se aplica, pois: 1) o elemento literal não basta; 2) o direito de regresso da seguradora é distinto do acidente enquanto facto constitutivo da responsabilidade civil e do facto gerador de ilícito criminal; 3) no direito à indemnização do lesado sobreleva a fonte extracontratual, ao invés do regresso onde tem mais relevo a fonte contratual; aponta ainda que, no caso de pagamento parcelar, também se dá o regresso com o prazo do art.498.º, n.º2 ”. Nos mesmos termos os Acs da RE de 5.12.2013 nº 847/11.2TBFAR-B.E1, e de 3.11.2015 nº 1195/08.0TVLSB.E1 “constando da certidão emitida pelo Instituto de Seguros de Portugal que o último pagamento foi efectuado pelo FGA em 20-06-2008, a presente acção foi instaurada antes de ter relativamente ao mesmo decorrido o indicado prazo de prescrição de três anos”.

[13] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, p. 772. No mesmo sentido, Almeida e Costa, Direito das Obrigações, pp. 674-675.

[14] CFR. Rodrigues Bastos, Das Relações Jurídicas Segundo o Código Civil de 1966, IV, 1969, p.109.

[15] In Das Obrigações em Geral, vol. II, reimpressão da 7ª ed., págs. 344 e 345.

[16] No mesmo sentido, Ac.RP de 06.11.2008, Proc. 0834107, E Ac. STJ 27.5.2004, Proc. 04B1328. De notar ainda que,apesar de no caso concreto chegar a uma diferente conclusão, a mesma interpretação foi expressa peloAc da RP de 12.9.2016 nº 2799/11.0TBVLG.P1 (Ana Paula Amorim). Este considerou que: “A invocação da prescrição do direito do lesado contra o responsável civil deduzida pelo Fundo de Garantia Automóvel não é oponível ao lesado, por não figurar como terceiro com legitimo interesse na declaração, para os efeitos do art. 305º/1 CC, nem aproveita ao responsável civil que renunciou tacitamente à exceção”. Ou seja, no caso concreto desse aresto, ao contrário do presente, existe um comportamento pessoal que invalida o aproveitamento da excepção (renuncia pessoal do responsável). Nos mesmos termos o AC da RP de 30.5.2013, Proc. 7697/10.1TBMAI-A.P1”o demandado FGA, enquanto devedor solidário perante o lesado, não pode invocar a prescrição quando esta se encontra interrompida relativamente a si, nem beneficiar dela quando o obrigado principal não a invocou”.

[17] Em sentido negativo, mas de forma não assertiva o comentário ao Código Civil, UCP, I, anotação ao art. 305º

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