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Brasil e o Papel de Liderança Regional Atuações e Desafios

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Brasil e o Papel de Liderança Regional – Atuações e Desafios

Ana Letícia de Andrade Lopes Carvalho1 Daniel Augusto dos Santos Lima2 Felipe Xavier Faria Alvarenga1 Ian Coutinho Bueno Marques Conti1 Marianna Batista Benzaquen1

Resumo

O presente artigo propõe discutir a temática da segurança regional, através da teoria dos complexos regionais de segurança (CRS), na tentativa de vislumbrar o papel do Brasil como líder regional. O artigo busca tratar como se evidencia o processo de securitização de uma região para um Estado, identificando-a como uma preocupação comum e compartilhada de segurança para um complexo regional. A hipótese é de caracterizar o complexo regional de segurança sul-americano não como um modelo padrão, mas sim um modelo centrado, no qual o centro não é uma potência global. Assim, o trabalho é dividido em quatro partes: primeiramente, analisar a aplicação de teoria apresentada por Buzan e Wæver; destacar a importância do relacionamento entre Brasil-Argentina para a região; o papel brasileiro no UNASUL, destacando o papel brasileiro para sua criação e para a criação do Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS); e uma análise da política externa brasileira frente à região sul-americana.

Palavras-chave: Brasil; Complexos Regionais de Segurança; UNASUL; América do Sul.

1 Graduando em Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNIBH).

2 Bacharel em Letras pela Universidade Federal de Belo Horizonte. Graduando em Relações Internacionais pelo

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2 Teoria dos Complexos Regionais de Segurança e a América do Sul

A consolidação dos estudos sobre segurança internacional é marcada pela ilustração histórica do período pós Segunda Guerra Mundial, no qual a segurança coletiva dos Estados em um mundo bipolar era a principal preocupação. Porém, com o passar dos anos, surgiram novos atores com poder de influência no cenário internacional, configurando uma estrutura que inclui: organizações internacionais, organizações não governamentais, sociedade civil, empresas privadas. Esses novos personagens da política internacional geraram novos debates nas relações internacionais, além de possibilitarem novas análises sobre os grandes temas e suas atuações no sistema. O Estado-nação permanece como o ator mais importante para a política internacional, porém ele passa a dividir a condução das relações internacionais com outros atores e, consequentemente, a atuar em diferentes níveis de análise (VILLA, 1994).

Após o término da Guerra Fria, o sistema internacional sofreu várias transformações quanto a suas definições. Iniciou-se um forte movimento de regionalização da segurança internacional como consequência direta ou indireta do término da bipolaridade característica do conflito. Houve assim uma mudança a um mundo mais complexo e multifacetado, que apresentava novos problemas a serem pensados a partir da consideração do protagonismo desses novos atores, que atuam para além do sistema internacional em geral (SENHORAS, 2010). A nova estruturação do sistema internacional altera o processo de tomada de decisão a respeito da política de defesa, no qual passou a levar em conta a negociação entre os Estados tanto no seu cenário regional, quanto no internacional como um todo.

Com o intuito de estabelecer um novo quadro compreensível para os estudos de Segurança Internacional, Buzan, Wæver e Wilde (1998) questionam a primazia do elemento militar e a conceitualização da segurança para o Estado, iniciando um movimento que visa ampliar a agenda de segurança. Foi identificada uma necessidade de um reconhecimento de problemas não militares como forma de ameaça da segurança, o que gerou uma urgência da ampliação da área de estudo. Definiu-se, então, que há uma necessidade de construir um conceito de segurança que signifique algo muito mais específico que “ameaça” ou “problema”, é preciso um critério definido para distinguir ameaças e vulnerabilidades que podem surgir das mais diversas áreas, militares e não militares (BUZAN; WÆVER; WILDE, 1998).

A divisão em um subsistema de relações de segurança, definido como região, é fruto da proximidade geográfica entre os Estados – ao apresentar distinções com relação aos demais complexos existentes. Essa proximidade permite a identificação de problemas e ameaças comuns, construindo preocupações compartilhadas de segurança entre esses Estados, ao passo que os distinguem do restante dos outros atores, conformando, portanto, um complexo regional de segurança (CRS). Isso pode ser entendido como uma ferramenta explicativa de entendimento do conjunto de Estados que se caracterizam por uma preocupação comum com a segurança, em que não podem considerar a defesa nacional de forma separada devido à interdependência das relações regionais que distingue a região das demais (BUZAN; WÆVER, 2003).

No pós-Guerra Fria, a perspectiva teórica sobre a ‘Estrutura’ da segurança internacional, em um nível Regional, é ainda uma caracterização amplamente Waltziana, como a organização das partes em um sistema, e como as partes se diferem umas das outras. Todavia, há um olhar mais amplo, já que (1) olha de forma além a como o neo-realismo observa a Estrutura, e (2) mantém uma visão que pretende privilegiar uma abordagem regionalista. Com o preceito de que o nível Regional se destaca mais em um mundo pós-Guerra Fria como nível propício a conflitos e cooperações entre Estados, pode-se fazer duas suposições: a primeira vem do declínio da rivalidade entre as superpotências e, por pressuposto, a redução da qualidade e capacidades de

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3 penetração3 e também do interesse de poder global no resto do mundo. A segunda diz respeito sobre como a maioria das grandes potências possuem caráter de lite power4 no pós-Guerra Fria, visto que suas dinâmicas domésticas possuem grande poder em afastá-las de um maior engajamento militar e competição estratégica em nível global, o que reduz a interferência das grandes potências no cenário internacional (BUZAN; WÆVER, 2003).

Ao definir os CRS, há uma conotação da possibilidade de uma divisão entre dois tipos de complexos, padrão ou centrado. Os complexos de tipo padrão possuem uma definição do poder com base na polaridade regional (caso haja apenas uma potência regional, há possibilidade do CRS ser unipolar). Os complexos do tipo centrado podem ser divididos de três maneiras, sendo essas, (1) unipolar, possuindo como centro uma grande potência, (2) unipolar, com uma superpotência como polo, e (3) centrado, mas sem uma potência, mas sim integrado por instituições. O CRS sul-americano é definido como padrão, apresentando dois subcomplexos5: o Cone Sul e o Norte-andino. A formação do complexo sul americano pode ser considerada como exemplar. Ele foi construído a partir de aspectos culturais comuns que confirmam a identificação de um complexo. Essa identificação herdada de um passado colonial comum foi responsável pela constituição de relações de inimizade inicialmente, onde disputas territoriais no cone sul conformaram um ambiente de tensão entre os Estados vizinhos. (BUZAN; WÆVER, 2003).

Ao falar sobre o início do CRS sul-americano deve-se dar ênfase a um problema: o papel dos Estados Unidos. Sua participação deve ser vista como uma penetração, e não uma sobreposição de interesses. A hegemonia norte-americana torna a relação com a América do Sul extremamente assimétrica, mas não há uma constante intervenção norte-americana no CRS sul-americano, não há um controle dos EUA na região e os Estados Unidos não conseguem moldar o Complexo Sul-americano (BUZAN; WÆVER, 2003).

Nota-se então um papel importante por parte do Brasil para manter o caráter de estabilidade na região sul-americana, destacando que o Brasil, após o período de anexação territorial do século XIX e início do XX, passa a possuir um importante papel estabilizador, dando preferência a vias diplomáticas e um grande interesse na estabilidade regional. Há, assim, uma clara percepção quanto ao papel centralizador dos dois subcomplexos da região sul-americana pelo Brasil; o Cone Sul possui uma grande dependência do sucesso do MERCOSUL para a sinergia dos países que englobam a região, ao passo que o fator de segurança principal encontrado no Norte-andino é o narcotráfico. A atuação brasileira conta com um forte foco na integração econômica (MERCOSUL), que tanto pelo Brasil quanto pela Argentina possui um caráter securitizador; além de manter um peso considerável na securitização da Amazônia, que se dá

3 O que interliga o padrão global de arranjo de poder entre as potências globais para as dinâmicas regionais dos

Complexos de Segurança é o artifício de penetração. Penetração ocorre quando as potências externas fazem alinhamento de segurança com os Estados que se encontram dentro de um CRS. Para as potências globais, o nível regional é importante para moldar tanto a opção para, e consequências de, projetar suas influências e rivalidades no resto do sistema, já que para a maioria dos Estados, o nível regional é crucial para a análise de segurança (BUZAN; WÆVER, 2003).

4 Entende-se por lite power Estados que possuem uma dinâmica doméstica que os impedem de um engajamento

militar e competição estratégica nos locais problemáticos no globo. Permitindo assim uma maior Liberdade aos Estados locais e a sociedade a decidir suas relações políticas-militares com menor interferência das grandes potências do período anterior ao fim da Guerra (BUZAN; WÆVER, 2003).

5 O que diferencia um subcomplexo regional de segurança de um complexo regional de segurança é unicamente o

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4 tanto por questões fronteiriças quanto por questão das drogas nos países vizinhos (BUZAN; WÆVER, 2003).

Conclui-se que devido à atuação convergente do Brasil e a intensa compatibilidade das ações dos Estados da América do Sul, uma transformação do complexo regional com dois subcomplexos em dois complexos diferentes é algo inapto a acontecer. As próximas seções visam esclarecer o papel brasileiro na região, dando foco ao seu relacionamento com a Argentina, já que é considerado como relacionamento central da região (BUZAN; WÆVER, 2003), além de tal relacionamento abordar um conjunto de questões sobre a liderança regional com atuação direta na balança de poder.

O eixo Brasil-Argentina

Ao analisar mais profundamente cada uma das relações entre esses grupos de Estados, conclui-se que o hemisfério sul-americano é caracterizado por vários acordos de cooperação bilaterais e multilaterais, gerando uma teia interconectada de tratados entre países que se interligam. Isto gera uma estabilidade no continente, tendo como um dos principais exemplos a relação Brasil-Argentina. Essa relação não pode ser explicada sem levar em conta a desastrosa década de 1980, a redefinição de segurança nacional e as dinâmicas da democratização, além da integração econômica dos dois países. Contudo, a origem dessa cooperação não pode ser encontrada nos movimentos em si, mas apenas após os antigos inimigos reconciliarem suas políticas estratégicas (SANTOS, 2002).

No que se refere aos países sul-americanos, foram feitas algumas tentativas durante o século XX que possuíam o intuito de promover uma maior aproximação entre os Estados da região. Contudo, os pactos e projetos não tiveram muito sucesso. Então, no final da década de 80, os países da América Latina passaram a promover maior cooperação entre si.

Em relação à Argentina e ao Brasil, a cooperação entre esses Estados se deu com maior intensidade a partir da década de 80. Anteriormente, desde a Guerra do Paraguai até o fim da Segunda Grande Guerra, o relacionamento entre esses países era marcado por cordialidades oficiais, apesar da rivalidade que na maior parte do tempo era predominante, como o caso da usina de Itaipu, durante a década de 70.

A partir de 1979, Brasil e Argentina passaram a se relacionar de maneira mais amistosa. Isso se deu em grande parte devido ao Acordo Tripartite Itaipu-Corpus entre o Estado paraguaio, argentino e brasileiro, e a partir desse momento, houve maior aproximação entre Argentina e o Brasil. Um fator importante que gerou essa aproximação foi a atitude que o Brasil teve na Guerra das Malvinas, por meio de discreto auxílio e reconhecimento ao direito da Argentina na ilha. Houve cooperação militar entre esses países durante os anos 80, gerando maior integração. Tendo como base, os acordos da cooperação entre os países tiveram dois estágios distintos, porém interconectados. O primeiro estágio foi a consolidação de vários acordos em 1970/80 e, como segundo estágio, a institucionalização da primeira fase, consolidado com a assinatura de dois acordos em 1985 e 1986, criando uma segurança nuclear e integração econômica. Esses acordos não foram o ponto de partida da cooperação, mas sim uma forma de união que teve seu início em 1979. Após vários anos com relações perturbadas, principalmente devido a era colonial, na qual havia competição territorial, principalmente na região da Bacia da Prata, uma atitude de conciliação parte da Argentina, que possuía problemas com o Chile e com a Inglaterra e necessitava da certeza de que poderia manter uma relação pacífica com o Brasil (SANTOS, 2002).

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5 O maior passo para institucionalizar a cooperação de segurança e economia foi com a Declaração Conjunta Sobre Política Nuclear, em 1985, sendo um dos motivadores à criação do MERCOSUL. Sendo criado em 1991, no mesmo ano que foi estabelecido a Agência Brasil Argentina para Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC), o MERCOSUL mostrou ser um forte conector dos países, não só bilateralmente, mas também multilateralmente, englobando outros países da América do Sul (SANTOS, 2002), mostrando assim o núcleo primordial para a característica geral de estabilidade do Cone Sul.

Contudo, anos após esse período mais harmonioso entre a Argentina e o Brasil, houve algumas divergências entre esses países. A busca pela liderança regional do Estado brasileiro, bem como sua relevância no campo internacional, foram fatores que fortaleceram esses desentendimentos. Com a entrada de Lula e Kirchner no poder a partir de 2003, houve uma alteração tanto no cenário político interno de ambos os Estados, quanto na visão que tinham sobre Política Externa. De um lado, Argentina abandona a ideia de realismo periférico; de outro, Brasil acentua a aproximação e parceria com países emergentes, no intuito de adquirir maior poder de negociação no sistema internacional. Esse processo foi iniciado no governo de Fernando Henrique Cardoso e acentuado no governo Lula, cuja Política Externa caracterizava-se pelo que se denominou de “autonomia pela diversificação” (VIGEVANI, T.; CEPALUNI, G. 2007). Com tais mudanças, assinaram os dois Estados o “Consenso de Buenos Aires”, que primava não somente por destacar a importância de uma cooperação bilateral e de uma integração regional, como também por definir uma convergência de valores em relação ao Mercosul, que deveria ter um papel menos comercial e mais social. Porém, ficou claro a partir desse momento que Brasil e Argentina possuíam entendimentos divergentes em relação à cooperação regional, bem como ao objetivo da cooperação.

Enquanto Argentina defenderia uma cooperação voltada para a integração, que envolveria a criação de uma política comum e formulação de estratégias conjuntas, o Brasil prezaria por uma cooperação voltada para a Defesa, não havendo interesse em formular uma política comum. O fato de o país buscar cada vez mais uma liderança regional, bem como uma influência maior no cenário internacional gerou desconfianças por parte de Argentina e abalou aquele primeiro entendimento bilateral entre os vizinhos.

Se por um lado Brasil e Argentina têm um vasto histórico de envolvimento em processos de cooperação bilateral, por outro, competiram durante muito tempo por uma liderança regional. O fato é que para a Argentina a integração serviria como uma maneira de se fortalecer, uma vez que, sozinha, não seria capaz de se destacar internacionalmente. Já para o Brasil, a cooperação regional serviria como um meio de aumentar sua possibilidade de destaque e influência no sistema internacional.

UNASUL e a Participação Brasileira

A União das Nações Sul Americanas (UNASUL) surgiu após a Declaração de Cuzco que anunciava a intenção da fundação de uma comunidade sul americana de nações. Em 2007, em um encontro de Chefes de Estado e de Governo da região, foi lançado a UNASUL, que ganhou sua personalidade jurídica internacional, após a assinatura do Tratado Constitutivo do bloco sul americano (MURAKI JUNIOR, 2008).

Formada por doze países, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela, a UNASUL tem como objetivo coordenar a área política, energética, comercial, ambiental, social e de infraestrutura da região, entretanto

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6 de forma aberta a outros domínios da integração. A UNASUL trouxe uma mudança de paradigma para o Cone Sul, na tentativa de fornecer desenvolvimento econômico e social aos países membros, além de um maior vislumbramento regional em um cenário multipolar (VIGEVANI; RAMANZINI JÚNIOR, 2014).

O perfil da interação entre os países da América do Sul sempre foi marcado por distanciamentos e busca pelo apoio de potências externas, como os EUA, a Europa e o Reino Unido. O padrão de isolamento entre os países foi deixado a partir de 1950, quando foram desenvolvidas iniciativas de integração, como a renovação e readaptação dos acordos tarifários entre Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile, após a criação do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT); e, a tentativa de criação de um mercado comum entre os países andinos, através da Comissão Econômica para a América latina Central (Cepal). Mais tarde, essas iniciativas se transformaram em ALALC (Associação Latino-Americana de Livre Comércio), em que foi incluído o México e posteriormente renomeada como ALADI (Associação Latino-Americana de Integração), em 1980. Nos anos 1960 a Comunidade Andina foi formada, e em 1991, com a aproximação entre Brasil-Argentina, nasceu o Mercosul. Contudo, ainda não havia se constituído uma realidade de integração efetiva como na União Europeia, precisava-se de uma maior interação e aproximação das ideias entre os membros (SIMÕES, 2010).

Não há uma identidade única no continente, persistem ainda desavenças do passado que separam os países, numa concepção de que cada um está ilhado. O que é compatível entre os países do continente sul americano são os problemas socioeconômicos e as carências institucionais que impedem o crescimento. Mas esse cenário pode ser alterado de forma que os interesses dos membros sejam atingidos pela UNASUL. Por exemplo, a Venezuela, a Bolívia e o Equador poderiam implementar seus interesses de caráter internacional na região. O Brasil pode usar a UNASUL a seu favor, no que consiste em destacar seu predomínio regional e proporcionar maior confiabilidade internacional, até mesmo no pedido por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Além desses, Chile, Colômbia e Peru poderiam buscar pela área de livre comércio que almejam. E para que essas vantagens aconteçam é preciso que união seja estabelecida (MURAKI JUNIOR, 2008).

Foi de grande importância a criação do Conselho de Defesa Sul Americano (CDS), sugerido pelo Brasil, assim como o Conselho da Luta pelo Narcotráfico, como uma forma de zelar pela segurança do continente. O Protagonismo brasileiro na criação do Conselho de Defesa, demonstra a figura de ator central exercida pelo Brasil no Complexo Regional de Segurança da América do Sul, uma vez que o Brasil busca exercer sua hegemonia regional aproximando as agendas de segurança dos dois subcomplexos regionais, o Cone Sul e o Norte-Andino. O Brasil consegue ter um papel centralizador, pela sua superioridade regional e pela autonomia com relação aos EUA, e tenta por meio do CDS a consolidação de um continente estável e fortalecido na cooperação regional em matéria de defesa. Entretanto, o Conselho ainda necessita de um aparato mais institucionalizado, capaz de proporcionar uma integração profunda e estável. O Brasil que é engajado em concretizar esse arranjo de forma eficaz, precisa também se preocupar em integrar o Ministério da Defesa, em especial os militares brasileiros, a atuarem de forma decisiva nesse Conselho, que muito pode acrescentar para as forças armadas do Brasil e aos demais países membros.( FUCILLE; REZENDE, 2013)

O CDS é destaque, por ser a primeira instituição de Defesa que compõe a região. Ele prevê a troca de tecnologia militar entre seus membros, obrigatoriedade de explicações das capacidades e intenções das forças armadas de cada país, como forma de controlar e gerar segurança para todos. A forma da tomada de decisão no Conselho é complexa, pois depende da aprovação de todos os membros da UNASUL, o que demonstra dificuldades na resolução dos problemas,

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7 tendo em vista as assimetrias ideológicas e físicas do continente. A mobilização conjunta nesse setor é fundamental, pois ela pode alterar o rumo de certas políticas e proporcionar a prosperidade da América do Sul. (SIMÕES, 2010).

O Brasil, a Argentina e a Venezuela são os países que possuem os maiores produtos internos bruto da região, com destaque também no Mercosul, na Organização de Cooperação Amazônica e na Aliança Bolivariana para as Américas. São esses países que precisam deixar as desavenças do passado e pensar nos interesses em comum para o sucesso da integração de todos os membros. A UNASUL propõe que a integração econômica seja realizada de forma gradual, para que se torne efetiva e ideal para todos, mas que a causa social de desenvolvimento e bem-estar seja veloz e possa atingir aqueles que mais carecem de ajuda. Ou seja, a integração sul-americana deve ser analisada como a possibilidade da constituição de um continente articulado em todos os sentidos, e não só com a intenção de criar zonas de livre comércio ou promover investimentos (SIMÕES, 2010).

Ir de desencontro ao preconceito e proteger a multiculturalidade do continente, conciliar potências heterogêneas em relação ao poder e à distribuição de renda, são os desafios da integração UNASUL. Para o Brasil, a UNASUL representa uma maior atuação de suas grandes empresas que são mais competitivas do que as concorrentes sul americanas, o que lhe renderia altos ganhos econômicos (SIMÕES, 2010). O Brasil é considerado o país de maior poderio em relação aos outros, o que favoreceria se impor, reivindicar maiores benefícios e buscar maiores ganhos e responsabilidades para si. Entretanto, integração não é feita por um só país, ela deve ser constituída por outros membros que possuem grau de importância no processo, que possa ao final resultar em ganhos que abranjam todos. É preciso colaboração das outras nações, como da Argentina, da Venezuela e dos demais, para que o sucesso da comunidade econômica e política criada alcance o sistema internacional com peso (BANDEIRA, 2008).

Somente através da união, os projetos principais e desenvolvimentistas da região ganharão concretude e agregarão a todos, de forma a irradiar benefícios para outras áreas e estimular esforços para aperfeiçoar a integração.

Brasil e sua Política Externa

O intuito desta seção é averiguar de que forma o exercício da Política Externa do governo Dilma Rousseff contribui ou depõe para a efetivação das intenções do Brasil em se promover como liderança da segurança regional. Vale ressaltar que a empreitada de se analisar a política externa de um governo vigente não é definitiva e carrega um pouco de incerteza, tendo em vista que reformulações ainda podem ser feitas.

O primeiro comentário que pode ser feito, e não fugindo da polêmica, mas apenas considerando-a, é uma comparação entre a política externa do governo Lula (sumariamente reconhecida) e a da atual presidente. Cornetet (2014) identifica que, comparativamente, a política externa de Dilma, apesar de manter o padrão de fomento à autonomia nacional e desenvolvimento, tornou-se, contudo, tímida. Ou seja, o autor defende a ideia de "que houve uma contenção na continuidade" (CORNETET, 2014, p 140) o que implica dizer que poucas inovações foram trazidas, e que apesar de existirem esforços, são mais fracos que outrora. Dentre os fatores dessa diferenciação, Cornetet identifica o tempo de mandato, no caso de Lula dois completos e o segundo de Dilma ainda por finalizar, os constrangimentos do sistema internacional impondo maior recrudescimento das relações internacionais, e a primazia da atual presidente pela política interna em detrimento à externa. Por fim, com relação à América do Sul, o autor pontua:

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8 Talvez a mudança mais relevante seja a da redução de viagens a países sul-americanos, tendo Rousseff visitado esses países menos do que a metade de vezes que Lula da Silva os visitou no início de cada um de seus mandatos […] permanece o enfoque do governo de Lula de priorização da América do Sul e de atenção à África, embora tenha ocorrido redução nas viagens a países sul-americanos, com exceção da Argentina (CORNETET, 2014, p 119-126).

Santos e Souza (2014) contribuem com uma análise dos discursos da presidente Dilma na abertura das reuniões anuais da Assembleia Geral das Nações Unidas. Do texto dos autores é possível auferir grande preocupação com questões concernentes à Segurança Internacional. A fala da presidente é sempre enfática quanto à responsabilidade ao proteger, e na afirmação de que o Brasil é capaz de assumir esse compromisso. Ainda, a presidente constantemente menciona a relevância da América do Sul para a estabilidade internacional. A presidente menciona os acordos de integração regional como salutares, e sendo assim, são temas presentes na agenda de política externa. Não obstante, cabe a crítica de que nenhum destes dois tópicos tem primazia sobre outros, o enxerto de conclusão dos autores ilustra este argumento:

A análise dos discursos da presidente Dilma nos mostrou uma continuidade significativa em relação à defesa das diretrizes adotadas pelo governo Lula no que diz respeito à agenda econômica e social, evidenciando uma dependência de trajetória nesses temas. Contudo percebemos também a preferência por caminhos autônomos em determinadas linhas de atuação em política externa, a saber: gênero, Segurança Internacional (em especial a Primavera Árabe) e as relações com os Estados Unidos, marcadas por uma breve reaproximação interrompida pela descoberta das operações de espionagem praticadas por esse país em relação aos interesses brasileiros (SANTOS e SOUZA, 2014, p 136-137).

Com relação à integração regional na América do Sul, Mercosul e UNASUL são os maiores tópicos do debate. Não menos interessante, o Mercosul tem uma temática maior voltada à interação entre os mercados nacionais, e tem importância na agenda da política externa. Ou, nas palavras de Junior e Vigevani:

O Mercosul tem sido considerado, há duas décadas, como a base da estratégia de cooperação sul-americana, como componente importante para as posições regionais do Brasil. Daí a necessidade de manutenção de um aparato institucional, intergovernamental, que permita, garanta e não limite a autonomia do Estado, sem, ao mesmo tempo, enfraquecer os laços do mercado comum (JUNIOR e VIGEVANI, 2014, p.543).

Neste trabalho, sobremaneira, maior atenção será dispensada à UNASUL. Um aspecto basilar da política externa brasileira é sua reivindicação por autonomia, ou seja, uma articulação independente no contexto internacional frente a potências de hegemonia predeterminada. Entretanto, uma estratégia identificada pelos formuladores da política externa tem na integração regional a estratégia suficiente para a autonomia no sistema internacional, ainda que alinhada a um sistema de cooperação. Assim, nas palavras de Junior e Vigevani "O forte interesse brasileiro na formação da UNASUL indica uma nova forma de compreender o que seja autonomia na política externa (2014, p.544)". De modo que a autonomia pretendida no contexto internacional pode ser alcançada pela concatenação de esforços de um esquema regional de cooperação.

A relação do Brasil com os demais países da América do Sul, espaço geográfico primordial da política externa brasileira, é fortemente influenciada pelas linhas gerais de sua inserção internacional. Atualmente, o país experimenta uma inédita confluência entre a circunstância territorial e a prioridade das relações exteriores (BARROS e CALIXTRE, 2011, p.177).

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9 O fragmento acima salienta a preponderância da relação do Brasil com seus vizinhos. Nesse mesmo sentindo a presidente Dilma em seu discurso de posse de 2015 mencionou:

Manteremos a prioridade à América do Sul, América Latina e Caribe, que se traduzirá no empenho em fortalecer o Mercosul, a Unasul e a Comunidade dos Países da América Latina e do Caribe (Celac), sem discriminação de ordem ideológica. Agradeço, inclusive, a presença de meus queridos colegas e governantes da América Latina aqui presentes ROUSSEFF, 2015).

O que demonstra sua real preocupação com a proximidade com os países da América do Sul para a projeção e inserção efetiva do Brasil. Ou seja, pode-se deduzir que apesar de críticas quanto ao reduzido espaço de discussão da política externa na agenda do governo Dilma, seus esforços e preferências são em prol da integração regional como modo de viabilizar as intenções do Brasil na economia, segurança e governança global.

Considerações Finais

Ainda que seja possível notar um avanço na integração regional sul-americana – mesmo que com bases fracas e com um discurso nacionalista e que defende a soberania e a não intervenção – essa integração é capaz de indicar a formação de um único complexo regional de segurança. Analisando a presença dos dois subcomplexos da região sul-americana, destaca de forma veemente o papel do Brasil em aglutiná-los, mesmo que seu papel como líder oscile, suas moderadas iniciativas são suficientes para encaminhar o complexo da região ao modelo centrado já que a exigência teórica para um complexo centrado seja “parcialmente uma questão de quão dominante o centro é (ex: o grau de assimetria do poder), mas, igualmente, a forma de hegemonia estabelecida” (BUZAN; WÆVER, 2003, p. 58)6.

Queira o Brasil assumir ou não o papel de responsável ao movimento de centralidade do complexo regional de segurança sul-americano, ele ainda assim o é, visto que as dinâmicas de segurança do complexo devam ser centralizadas em um único ator.

Conclui-se, então, que independentemente da posição brasileira frente à liderança regional, a assimetria de poderes o garante esse caráter (mesmo levando em conta a Argentina juntamente com o Brasil como principal núcleo sólido de segurança regional). Buzan e Wæver (2003) percebem que a relação do complexo sul-americano com os Estado Unidos durante a Guerra Fria gira em torno das prioridades apresentadas pelo segundo. A política norte-americana frente ao conflito originou a cooperação dos países da América do Sul, ao passo que a mudança de percepção da região indo de principal área de atuação dos Estados Unidos para uma arena importante da atuação, mas não a principal foi um dos principais legados do período da Guerra Fria para o CRS sul-americano. A resposta iniciada com a criação de uma espécie de sub-regionalismo por parte do Brasil e da Argentina acaba desencadeando e criando um núcleo forte da região com papel importante no período pós-Guerra Fria.

Logo, é possível notar como após o período da Guerra-Fria o aumento da autonomia da região proporciona, de forma fundamental, o papel relevante do Brasil como conector dos ideais e percepções de segurança da América do Sul.

6 Tradução nossa, do original: “This is partly a question of how dominant the centre is (i.e., the degree of power

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10 Referências

BANDEIRA, Luiz Alberto Muniz. O Brasil como potência regional e a importância estratégica da América do Sul na sua política exterior. IN: SEMINÁRIO ‘A POLÍTICA EXTERIOR DO BRASIL EM SUA PRÓPRIA VISÃO E NA DOS PARCEIROS’. 2008. Munique. Seminário no Consulado-Geral do Brasil em Munique. Munique, 2008. 20p.

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Referências

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