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Caracterizando os processos de revisão e reescrita no Ensino Fundamental I

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ

PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq - Fundação Araucária - UEM

DEPARTAMENTO DE LETRAS

ORIENTADOR: Prof. Dr. Renilson José Menegassi Bolsista: Débora Sodré Esper

Caracterizando os processos de revisão e reescrita

no Ensino Fundamental I

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ

PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq - Fundação Araucária - UEM

DEPARTAMENTO DE LETRAS

ORIENTADOR: Prof. Dr. Renilson José Menegassi Bolsista: Débora Sodré Esper

Caracterizando os processos de revisão e reescrita

no Ensino Fundamental I

Relatório contendo os resultados finais do Projeto de Iniciação Científica vinculado ao PIBIC/CNPq- Fundação Araucária – UEM, desenvolvido no projeto de pesquisa “Manifestações de constituição da escrita na formação docente”.

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RESUMO

Neste trabalho, cujo desenvolvimento ocorre junto ao Grupo de Pesquisa “Interação e Escrita” (UEM/CNPq), procuramos analisar como os processos de revisão e reescrita se constituem no 4º e 5º ano do Ensino Fundamental I, a fim de contribuir para a melhoria do ensino de produção textual. Para isso, tivemos como base teórica de autores engajados no desenvolvimento da aprendizagem de produção textual, dentro da visão interacionista, bem como as propostas oferecidas pelos PCNs e DCEs- PR. Tivemos como objeto de análise cinquenta e quatro textos produzidos por alunos de duas salas – 4º e 5º ano do Ensino Fundamental I –, dos quais se investigou as intervenções efetuadas pelos professores durante a revisão, bem como a reescrita realizada pelos alunos após os apontamentos, ou seja, a sua resposta ao trabalho do professor. Os resultados mostraram que os processos de revisão e reescrita mostram-se essenciais para o desenvolvimento da escrita e do aluno como sujeito/escritor, consciente de sua participação no processo de aquisição e aprimoramento da escrita. Dentre todos os tipos de revisão, percebeu-se que a textual-interativa destaca-se por contribuir de forma mais efetiva para esses resultados.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...05

2. REVISÃO TEÓRICA ... 07

2.1. As concepções de escrita...06

2.1.1. A escrita como dom ...08

2.1.2. A escrita como consequência...09

2.1.3. A escrita como trabalho... 10

2.2. Os processos de revisão e reescrita... 14

2.2.1. A revisão e a reescrita na escola... 19

3. REGISTROS DE ANÁLISE... 29

3.1. Passos metodológicos... 31

3.2. Dados quantitativos... 32

3.3. Quanto ao local dos apontamentos... 35

3.4. Quanto aos tipos revisão... 38

3.4.1. Revisão resolutiva... 38

3.4.2. Revisão textual-interativa... 43

3.4.3. Revisão indicativa... 49

3.4.4. Revisão classificatória... 51

3.5. Pontos não cobrados na 1ª versão e cobrados na reescrita... 54

3.6. Revisões além da 1ª versão do texto... 55

3.7. Casos especiais... 56 3.8. Operações linguísticas... 59 3.8.1. Acréscimo... 59 3.8.2. Substituição... 62 3.8.3. Supressão... 64 3.8.4. Deslocamento... 66

3.9. Resultado das análises dos registros... 67

4. CONCLUSÃO... 70

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 73

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1. Introdução

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCNs), documento que serve como orientação para os professores de Língua Portuguesa no país, trazem, referente ao ensino de produção textual, que esse trabalho deve ter como finalidade “formar escritores competentes e capazes de produzir textos coerentes, coesos e eficazes” (BRASIL, 1997, p. 47). Para tanto, ainda segundo os PCNs, é necessário que o escritor saiba enquadrar seu texto ao gênero adequado, conforme suas finalidades e que consiga entender o produto escrito como algo passível de análise, sendo sujeito a revisões e reescritas, sempre que for necessário, com o propósito de deixar seu texto mais inteligível para o seu leitor.

Dessa forma, a prática de produção de texto é compreendida como um trabalho progressivo, na qual, em ambiente escolar, o professor assume um papel extremamente importante, pois, por meio de diversos recursos, além de fornecer preparação prévia para a atividade escrita, pode auxiliar o aluno durante o processo de revisão e rescrita, através de intervenções realizadas no seu texto. Porém, esses comentários podem, ao invés de ajudar, prejudicar o desenvolvimento do produto escrito, dependendo da metodologia utilizada pelo docente. O que se percebe é que muitos professores não assumem a tarefa de revisão textual com a responsabilidade necessária, efetuando revisões confusas e superficiais, além de não incentivar a reescrita em todas as produções, o que acaba sendo extremamente preocupante, tendo vista que essas são as etapas mais importantes no processo de produção, pois não só conduz à melhoria do produto, mas, faz com que ele reflita mais profundamente a respeito da sua escrita. Frente a essa situação, o aluno, não se sente chamado a tomar o texto como processo. Cria-se, assim, um ciclo vicioso no qual o maior perdedor é o discente, que permanece, muitas vezes, anos sem verdadeiramente aprimorar a linguagem escrita, carregando a ideia de que não sabe escrever.

Em decorrência disso, essa pesquisa tem como objetivo geral compreender como os processos de revisão e reescrita se constituem no trabalho de produção textual no Ensino Fundamental I. Os objetivos específicos são: a) analisar e caracterizar as revisões efetuadas pelos professores em textos de alunos de uma turma do 4º e outra do 5º ano do Ensino Fundamental I; b) investigar qual é a influência que tais apontamentos tem e de que forma refletem na reescrita do texto; c) analisar e caracterizar de que forma se constituiu a resposta do aluno à revisão do professor; d) identificar quais comentários permitem um maior

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desenvolvimento da escrita do aluno; e) traçar um perfil sobre as etapas de revisão e reescrita nas séries analisadas.

O material de análise é composto por 54 textos de alunos dos 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I de uma escola privada da cidade de Maringá.

Embora tenhamos utilizado dados quantitativos como forma de auxiliar na interpretação dos registros, essa pesquisa adota a natureza qualitativa, uma vez que visa não só a simples coleta e descrição dos registros, mas, principalmente, uma análise interpretativa. Assim, após a escolha do material, o primeiro passo foi descrever e analisar os registros levantando as suas características. Em seguida, foram investigadas as interferências feitas pelos educadores nos textos durante a revisão e as influências que esses apontamentos tiveram na reescrita realizada pelo estudante.

Com o término da pesquisa, podemos concluir que a escolha, por parte do professor, do tipo de revisão e a forma como ela é aplicada interferem em muito nas reescritas dos textos realizadas pelos alunos

Para uma melhor organização do relatório, ele foi dividido em três partes:

a) Na primeira parte encontra-se a revisão teórica que se fundamenta, entre outros autores, em Bakhtin/Volochinov (2009) e Bakhtin (2003) no que refere ao interacionismo; em Menegassi (1998), Garcez (1998), Grillo (1995) e Jesus (2001) sobre os processos de revisão e reescrita, e em Ruiz (2010) e Serafini (1989) a respeito dos tipos de revisão;

b) A segunda parte do relatório expõe os passos metodológicos tomados, a forma como se deu a obtenção dos registros e as suas análises quantitativas e qualitativas;

c) Na terceira e última parte, temos os resultados encontrados e a conclusão a que se chegou após a análise.

Pesquisas sobre a constituição dos processos de revisão e reescrita mostram-se essencialmente importantes uma vez que servem como apoio para o trabalho dos professores no ensino de produção textual. Espera-se, portanto, que possamos contribuir para a formação de bons escritores, competentes e conscientes de seu processo de aprendizagem da linguagem escrita.

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1. Revisão teórica

Mesmo tendo o domínio da língua falada, o que já permitia a comunicação entre os indivíduos, foi o desenvolvimento da escrita que trouxe à humanidade a oportunidade de diminuir as distâncias, transmitir e perpetuar todos os acontecimentos de cada época. Por meio dela, o homem pode registrar sua história, seus sentimentos e tantas descobertas importantes.

Essa linguagem, que no início era expressa por representações pictóricas e ideogramas, aos poucos foi evoluindo e tornando-se cada vez mais essencial para o ser humano. Hoje em dia, crianças que mal sabem falar já tentam expressar-se de forma escrita por meio de rabiscos ou desenhos, na tentativa de também participarem desse universo, que parece ser enigmático para os que não o dominam.

Porém, ainda que o desejo de aprender a escrever seja intrínseco a todos, percebemos que, mesmo passado tantos séculos após seu surgimento, o ato de escrever, para muitas pessoas, é visto como um dom destinado a poucos. Podemos pensar que essa ideia exista devido ao acesso restrito que se tinha à educação até anos atrás. Mas, nos dias atuais, praticamente todos os cidadãos têm a oportunidade de serem alfabetizados. Então, por que muitos têm verdadeiro pavor quando precisam escrever um texto? Por que a palavra “redação” faz com que estudantes, mesmo os que concluíram o Ensino Médio, sintam-se despreparados? Sendo a escola grande responsável pelo ensino da escrita, só podemos acreditar que o problema está nas metodologias utilizadas para a escrita ou no despreparo dos educadores ou, até mesmo, que os dois aspectos devem ser revistos.

Preocupada também com essa realidade, Garcez (1998), após pesquisas referentes à produção textual, constatou que cerca de sessenta por cento dos alunos entrevistados em suas análises consideram a sua relação pessoal com a escrita péssima ou ruim, apontando como as possíveis causas dessa situação, além dos problemas com a gramática, a falta de informação e leitura, e a baixa experiência com esse trabalho devido a pouca solicitação de produção textual na escola.

Esse índice tão elevado é uma das razões que levam vários autores, dentro da área de Língua Portuguesa, a buscar alternativas para, se não resolver, pelo menos amenizar tal dilema por meio de estudos a respeito de como o processo de aprendizagem da escrita é concebido nas instituições de ensino, e qual a influência dessas metodologias sobre o procedimento utilizado pelo aluno durante a produção escrita. Dentre os que se destacam, está

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Sercundes (1997), que após análises sobre as práticas de escrita realizadas em sala de aula, explica que este processo pode ser concebido sob a perspectiva de três concepções de escrita diferentes que, consequentemente, se determinam conforme a concepção de linguagem adotada, são elas: a escrita como dom, como consequência e como trabalho.

2.1. As concepções de escrita 2.1.1. Escrita como dom

Para Sercundes, nesta concepção, “a produção textual é totalmente desvinculada do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor, sem nenhuma ligação com o trabalho anterior ou posterior” (1997, p. 75). Em pesquisa sobre a metodologia escolar que leva os estudantes à produção de texto, a autora traz um exemplo de atividade realizada, segundo essa concepção:

A professora de Português da sétima série da escola L, estadual não padrão, solicitou aos alunos que elaborassem um texto sobre a “Eco 92 - O Planeta do Futuro”, a fim de participarem espontaneamente de um concurso. Recolhidos os trabalhos, ela escolheu alguns e os enviou aos responsáveis pelo evento. […]. Não houve orientações para o desenvolvimento desse trabalho ou discussão do tema. A escola, na verdade, supõe um conhecimento prévio do aluno, por estar o tema circulando no mundo social brasileiro, já que o evento foi sediado no Rio de Janeiro (SERCUNDES, 1997, p. 76).

Como se pode observar, a atividade proposta é realizada totalmente de forma isolada. Não existe nenhuma atividade prévia, como leitura, discussões, ou até mesmo uma orientação, a fim de preparar o aluno para o exercício, pressupondo que o escritor tenha um conhecimento prévio a respeito do que será escrito. A atividade, proposta dessa forma, acaba contrariando o que defende Antunes ao afirmar que “a escrita é uma atividade processual, isto é, uma atividade durativa, um percurso que se vai fazendo pouco a pouco, ao longo de nossas leituras, de nossas reflexões, de nosso acesso a diferentes fontes de informação” (2006, p.168).

Nessa concepção, além de não receber qualquer preparação para a produção textual, o educando não vê finalidade para o trabalho, pois não há continuidade, tornando-se totalmente estagnado. Não existe um comprometimento por parte do professor ao utilizar esse tempo que

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mesmo avaliar o texto e nem por parte do aluno que se sente desestimulado perante a falta de incentivos e orientações.

Assim, podemos sintetizar a maneira como a produção textual é proposta na concepção de escrita como dom:

a) Desvinculada do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor;

b) Não existe atividade prévia à produção, supondo um conhecimento prévio do aluno; c) O trabalho não tem nenhuma finalidade;

d) Não há continuidade no trabalho.

2.1.2. A escrita como consequência

Esta concepção difere-se da anterior por trazer atividades prévias, o que é extremamente importante, já que habilita o educando para a atividade escrita, expandindo seus conhecimentos e preparando-o para o momento da produção textual, visto que “textos escritos não surgem do nada […] atividades de leitura, discussões e debates sobre temas variados e configurações textuais variadas são condição necessária para que os alunos tenham efetivamente estratégias para dizer o que tem a dizer em seus textos [...]” (RUIZ, 2009, p.16). Entretanto, toda preparaçãoanterior à escrita serve apenas como pretexto para este exercício, ou seja, o estudante assiste a filmes, palestras ou faz leituras, sabendo que a sequência disso será a redação. Ademais, “a organização desses recursos didáticos é prevista e controlável, definindo as ações dos professores e dos estudantes, pois todo o material é formulado para que o professor o siga” (SERCUNDES, 1997, p. 80).

Após as atividades prévias, os alunos redigem os textos, que são corrigidos pelo professor e entregues como o resultado final desse processo. Em alguns casos é feita uma análise dos textos pelos colegas, mas os comentários não são considerados, uma vez que não se realiza a reescrita. Dessa forma, o texto, na concepção que entende a escrita como consequência, não progride, pois há a falta de “revisão e reescrita, ações que caminham paralelamente, permitindo uma melhor produção do texto em construção, são desconsideradas” (MENEGASSI, 1998, p. 40).

Ohuschi & Menegassi trazem como exemplo dessa concepção um relato de uma aula ministrada por estagiárias do curso de Letras da Universidade Estadual de Maringá, em que o aluno faz uma atividade que termina sempre com uma produção escrita como consequência:

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A equipe 3 propôs a produção de parágrafos argumentativos, os quais também tiveram as atividades prévias como pretexto:

Solicitaram aos alunos que copiassem os registros do quadro (a respeito de ficar, namorar e casar), que escolhessem um tópico frasal sobre cada assunto e que o desenvolvessem.

Posteriormente, a equipe solicitou a produção de um texto dissertativo, a partir de esquemas com os argumentos levantados durante as aulas anteriores:

Produza uma dissertação argumentativa de 20 a 30 linhas sobre o tema relacionamento amoroso, respondendo à seguinte questão: “Qual o melhor tipo de relacionamento atual?” (2006, p. 06).

Percebemos, com esses exemplos, que a produção de texto nessa concepção é vista apenas como a finalização de um trabalho. A falta de continuidade da atividade desmotiva o aluno, pois não encontra uma razão significativa para escrever. Haja vista que, conforme Geraldi, esse trabalho “somente se sustenta quando os envolvidos [...] encontram motivação interna ao próprio trabalho a executar. Não fosse assim, não haveria um trabalho, mas tarefa a cumprir” (1993, p. 162-163).

Assim sendo, podemos afirmar, resumidamente, sobre essa concepção de escrita que: a) as atividades prévias são realizadas apenas como um pretexto para a escrita; b) a escrita é a consequência de um trabalho;

c) o texto é tido como o resultado final do trabalho, não progride, pois não existe revisão, tão pouco a sua reescrita;

2.1.3. A escrita como trabalho

Apoiada à visão interacionista de linguagem, na qual esta passa a ser vista como a ação entre sujeitos, e não como um ato individual, logo, uma atividade social (TRAVAGLIA, 1996; GERALDI; 1997b; PERFEITO, 2005), surge uma nova forma de se conceber a escrita: como um trabalho.

Para esta concepção, a escrita é vista como um processo contínuo e não mais como algo estanque. Portanto, a escrita do texto é “um momento no percurso desse processo, sempre possível de ser continuado” (FIAD & MAYRINK-SABINSON, 1991, p. 55). Desta forma, está aberta a comentários, revisões e a quantas reescritas forem necessárias, com o

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No entanto, não é preciso ter um dom especial ou receber uma inspiração divina para se fazer uma boa produção, mas sim, entender que esse trabalho envolve algumas etapas que precisam ser levadas em conta para que o autor atinja seus objetivos: planejamento, revisão e reescrita.

O momento do planejamento, conforme acentua Menegassi, apoiado em Bakhtin/Volochinov (2003), é quando o autor “considera a finalidade, o interlocutor eleito e o gênero textual escolhido para trabalhar sobre o tema, a organização composicional e o estilo de língua na produção textual” (2010, p. 79).

Após essa organização, é imprescindível que o autor tenha o que dizer, e esse ter o que dizer depende das atividades prévias, como leituras, debates, filmes, entre outros, que funcionarão como o ponto de partida para a escrita. Todavia, nessa concepção, diferente da anterior, não são utilizadas apenas como uma desculpa para a produção, mas, como um embasamento, a fim de auxiliar e preparar o estudante durante a escrita e consequentemente em trabalhos posteriores, visto que juntando as novas informações as que já possui, amplia cada vez mais seu repertório. Tendo em vista que é importante que os alunos não fiquem limitados ao seu mundo, ao contrário, é preciso interagir criando uma rede de troca de informações mais variada possível. Pois, “da heterogeneidade de vozes pode emergir o novo, o desconhecido a fim de enriquecer todo o processo de aprendizagem” (SERCUNDES, 1997, p. 86). No entanto,

Para que a escola possa incorporar essa proposta é necessário que se construa uma nova escola que dê condições aos alunos de expressarem as próprias experiências de vida, e partindo dessas se desenvolva um processo de aprendizagem que apresente novos conhecimentos, mas que estes não imponham certas categorias como as únicas válidas (SERCUNDES,1997, p. 93).

O envolvimento mais responsável com a escrita, cujo trabalho é seguido de forma processual, tem uma razão maior de ser, pois ao entender a linguagem como forma de interação, o foco passa a ser o interlocutor, já que, conforme Antunes, a escrita “é uma atividade de expressão, (ex-, 'para fora'), de manifestação verbal das ideias [...] que queremos partilhar com alguém, para, de algum modo, interagir com ele” (2003, p. 45). Koch & Elias (2009) contribuem afirmando que, assim como em outros tipos de linguagem, a escrita não é realizada por uma só pessoa; o escritor não escreve para si, mas em função daquele que irá receber a sua fala. Daí a importância de se planejar o texto dentro das características próprias

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do gênero textual escolhido para, assim, adequá-lo à situação sociocomunicativa em que será inserido e ao leitor previsto.

Levando-se em conta o interlocutor, e sendo, nessa concepção, a escrita vista como um trabalho passível de ser continuado, os processos de revisão e reescrita podem ser considerados etapas fundamentais. É a partir delas que o escritor revê seu texto, reflete sobre a sua escrita, vendo se seus objetivos como autor foram atingidos, se o texto está adequado ao gênero textual escolhido, enfim, todos aqueles pontos programados no momento do planejamento. “O texto, portanto, nunca é visto como um produto acabado, perfeito, mas que sempre se oferece para várias versões” (SERCUNDES, 1997, p. 95). Ademais, segundo Ohuschi & Menegassi (2006), a visão do leitor sobre o texto, em conjunto com as suas críticas, podem acabar motivando o autor para reformulações. E é esse fazer e refazer em função de alguém que provoca o crescimento do sujeito como autor.

Durante esse processo, tanto o professor quanto os outros alunos têm um papel extremamente importante. São as observações feitas pelos colegas que levam o escritor, muitas vezes, a refletir a respeito de seu texto e, se preciso, a modificá-lo. Já o docente, além de servir como um mediador entre aquele que escreve e os colegas, pode auxiliar o produtor, efetuando comentários e incentivando para que “a produção do estudante passe a ser um suporte para novas produções” (SERCUNDES, 1997, p. 96). Sob o mesmo ponto de vista, Geraldi completa:

As contradições internas deste mundo social, os diferentes acentos apreciativos que nele circulam estão a mostrar diferentes nuanças nas compreensões que produzimos dos mesmos fatos […]. É por isso que na “minha” palavra me (re)velo na contra-palavra do outro que me constitui como sujeito (GERALDI, 1996, p. 139).

Fora professor e colega, o próprio autor, ao ler o texto produzido, torna-se crítico do seu produto. Pois, ainda segundo Geraldi, “o próprio autor é leitor de si mesmo, e é enquanto leitor – um outro de si mesmo – que o autor se corrige” (idem, p. 141).

Como podemos notar, diferente das outras concepções, nessa, o texto escrito serve como lançamento para novas produções, podendo apresentar-se sob a estrutura de outros gêneros, como percebemos em exemplo de atividade produzida sob a concepção de escrita como trabalho trazida por Sercundes:

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Na escola A, os alunos da sétima série estavam estudando, na aula de português, os processos de comunicação veicular no interior da escola. A partir da análise e escritas de textos emergentes do cotidiano escolar, foi feito um projeto para a organização de um mural contendo esses textos. Dando continuidade ao trabalho, a elaboração de convites para peças teatrais deu origem à discussão e à escrita de textos teatrais cuja confecção e dramatização sintetizaram o estudo sobre os processos de comunicação (SERCUNDES, 1997, p. 84).

A continuação do trabalho configurada em diferentes gêneros textuais, como no exemplo, faz com que os alunos percebam que a atividade realizada tem continuidade, fazendo com que se sintam muito mais estimulados para futuros trabalhos, “observando as funções sociais da leitura e da escrita nos mais variados contextos” (HILA, 2009, p. 159). Entretanto, faz-se necessário também que os textos produzidos tenham um suporte textual e circulem em um ambiente social específico já conhecido pelos alunos antes do trabalho de produção, seja na escola como, por exemplo, no mural da escola ou em outro local da sociedade como em jornal da comunidade.

Portanto, feitas todas as explanações sobre a concepção de escrita como trabalho, podemos resumir suas características:

a) a escrita é processual;

b) as atividades prévias servem como suporte para o trabalho; c) a produção textual tem uma finalidade social definida; d) existe um planejamento antes da escrita;

e) durante o planejamento o gênero textual também é considerado; f) o leitor é levado em conta;

g) a revisão é feita durante todo o processo de produção e, se necessário, o texto é reescrito;

h) o texto circula em um ambiente sociocomunicativo em determinado suporte;

Todas as características dessa concepção estão de acordo com as condições de produção de texto, apontadas em Menegassi (2011), que tem como apoio Bakhtin. Para o autor, é preciso que o escritor seja conhecedor de tais condições para produzir “um texto mais completo dentro de um contexto sociocomunicativo determinado” (MENEGASSI, 2010, p. 81). Em sala de aula, o professor deve apresentar, no próprio comando de produção de texto, todas essas condições para direcionar o aluno durante todas as etapas de escrita.

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Apresentadas as três concepções de escrita, percebemos que, na concepção que entende a escrita como trabalho, o processo de produção textual é muito mais completo que as demais, pois, todas suas características se mostram essenciais para o desenvolvimento da produção escrita do aluno.

Por isso, se pretendemos alcançar os objetivos evidenciados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa, como “expandir o uso da linguagem em instâncias privadas e utilizá-las com eficácia em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos [...] coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos objetivos a que se propõem e aos assuntos tratados” (BRASIL, 1997, p. 33), é preciso que as instituições de ensino e os professores se conscientizem da importância do papel que assumem como mediadores no processo de aprendizagem da escrita.

Cabe às escolas e aos educadores adequar as propostas da concepção enfatizada a sua realidade, encaixando-as às necessidades de seus estudantes, para que, dessa forma, tornem-se não só mais um número nas listas de pessoas alfabetizadas, mas sim, cidadãos letrados e críticos, capazes de questionar por meio da fala e da escrita o meio social do qual participam, exercendo verdadeiramente sua cidadania.

2.2. Os processos de revisão e reescrita

Antes de aprofundarmos os estudos sobre os processos de revisão e reescrita, é fundamental pensarmos em uma das características da linguagem escrita que a difere da falada: a questão temporal. É esse tempo maior que existe entre o pensar e o escrever que dá ao locutor a oportunidade de refletir sobre o que vai escrever e como irá fazê-lo, ou seja, como distribuirá as palavras e ideias em seu texto, com o objetivo de torná-lo mais claro para o seu leitor, a fim de, com isso, atingir suas finalidades como autor.

Afinal, “embora o sujeito com que interagimos pela escrita não esteja presente à circunstância da produção textual, é inegável que tal sujeito existe e é imprescindível que ele seja levado em conta em cada momento” (ANTUNES, 2003, p. 46). Koch & Elias, em consonância com esse pensamento, acrescentam expondo que

A escrita é um trabalho no qual o sujeito tem algo a dizer e o faz sempre em relação a um outro (o seu interlocutor/leitor) com um certo propósito. Em razão do objetivo pretendido (pra quem escrever?), do quadro

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espacio-linguísticas, textuais, pragmáticas, cognitivas, discursivas e interacionais, vendo e revendo, no próprio percurso da atividade, a sua produção (2009, p. 36).

Tendo em vista que, como ressalta Geraldi (1996), embora a linguagem escrita seja realizada por um só indivíduo, o locutor realiza um trabalho conjunto, visto que “a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social a qual pertence o locutor” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 116). Com efeito, torna-se o locutor interlocutor do próprio texto, já que, conforme cita Garcez, para que o enunciador1 seja bem sucedido,

deve apropriar-se de habilidades de estruturação do discurso, principalmente quando se trata de discurso escrito formal, que levem em conta que o seu objetivo é estabelecer um elo na cadeia dialógica das relações sócio-históricas. Entre essas habilidades está a capacidade de distanciamento do próprio texto para observá-lo e analisá-lo quanto ao seu funcionamento junto a um leitor virtual, isto é, a capacidade de dirigir e controlar a atenção sobre o pontos críticos do processo enunciativo – a habilidade de deslocamento do papel de enunciador para o papel de leitor (1998, p. 156).

Ao incorporar esse papel, o de “leitor de si mesmo”, conforme já citado em Geraldi (1996, p. 141), que o autor consegue perceber possíveis problemas em seu texto, escolhas erradas que impedem, ou pelo menos dificultam a compreensão do que está sendo lido, algo muito mais complicado se o escritor assumir apenas a posição intransigente de locutor. Uma vez que, “Toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém como pelo fato de que se dirige para alguém” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p.117). Logo, a língua não teria razão de existir senão pela interação. Assim, utilizando a linguagem, os sujeitos expressam suas ideologias, e conjuntamente são afetados pelas ideologias do grupo social ao qual pertence. A língua, então, serviria como um instrumento de comunicação dinâmico, numa troca de informações constante. Portanto, quanto mais o sujeito estiver consciente da importância e da necessidade de considerar o interlocutor ao produzir o seu texto, melhor o fará. Essa consciência, associada ao desenvolvimento da escrita, traria um amadurecimento do sujeito como autor, favorecendo a sua atividade de transformação do signo ideológico em signo linguístico, dando

1 Enunciador é entendido como aquele que, por meio da língua e em conjunto dos signos, enuncia o seu discurso em função de um outro, conforme defende Bakhtin/VOLOCHINOV (2009).

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a linguagem escrita seu verdadeiro valor dialético, pois, recorrendo mais uma vez a Bakhtin/Volochinov,

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constituiu assim a realidade fundamental da língua (2009, p. 127).

Nesse sentido, por ser a língua escrita, assim como as demais, uma atividade interativa, onde o autor afeta e é afetado por um outro, a preocupação com o que se escreve e o modo como é transmitida a mensagem torna-se fundamental. Daí, aproveitarmos o tempo maior que ela nos oferece para trabalhar a produção textual, tomando-a como um processo e não mais como um produto, cientes que nesse processo devem ser incorporados vários passos, haja vista que produzir um texto de qualidade

é uma tarefa cujo processo não se completa, simplesmente, pela codificação das ideias ou das informações, através de sinais gráficos. Ou seja, produzir um texto escrito não é uma tarefa que implica apenas o ato de escrever. Não começa, portanto, quando tomamos nas mãos papel e lápis. Supõe ao contrário, várias etapas, interdependentes e inter-complementares, que vão desde o planejamento, passando pela escrita propriamente, até o momento posterior da revisão e reescrita (ANTUNES, 2003, p. 54).

Todas essas reflexões, anteriores, conjuntas e posteriores à escrita, fazem com que o escritor conceba-a como um projeto seu, um instrumento do seu dizer e não apenas como palavras ou frases soltas sem sentido algum, tomando então consciência da própria escrita e percebendo o quanto é primordial o seu comprometimento com esse trabalho.

Essa perspectiva de linguagem escrita, ainda pouco considerada pelos professores, é apresentada e orientada, em contexto escolar, por dois documentos: os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 1997) e as Diretrizes Curriculares da Educação: Língua Portuguesa (PARANÁ, 2008). Esses documentos, norteadores do ensino de Língua Portuguesa e que, segundo os PCNs, procuram “apontar metas de qualidade que ajudem o aluno a enfrentar o mundo atual como cidadão participativo, reflexivo e autônomo, conhecedor de seus direitos e deveres” (1997, p. 04), referem-se também à escrita como uma

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assim, melhor atingir os objetivos pretendidos e consequentemente chegar ao leitor ou, sob o olhar de Bakhtin, ao outro, permitindo a continuidade do diálogo e estabelecendo a interação. A respeito dos dois processos aqui discutidos, os documentos ainda afirmam:

[...] a revisão do texto assume um papel fundamental na prática de produção. É preciso ser sistematicamente ensinada, de modo que, cada vez mais, assuma sua real função: monitorar todo o processo de produção textual desde o planejamento, de tal maneira que o escritor possa coordenar eficientemente os papéis de produtor, leitor e avaliador do seu próprio texto. Isso significa deslocar a ênfase da intervenção, no produto final, para o processo de produção, ou seja, revisar, desde o planejamento, ao longo de todo o processo: antes, durante e depois. A melhor qualidade do produto, nesse caso, depende de o escritor, progressivamente, tomar nas mãos o seu próprio processo de planejamento, escrita e revisão dos textos (BRASIL, 1997, p. 51).

[…] nessa etapa o aluno irá rever o que escreveu, refletir sobre seus argumentos, suas ideias, verificar se os objetivos foram alcançados; observar a continuidade temática, analisar se o texto está claro, se atende a finalidade, ao gênero e ao contexto de circulação; avaliar se a linguagem está adequada as condições de produção, aos interlocutores, rever as normas de sintaxe, bem como a pontuação, ortografia, paragrafação (PARANÁ, 2008, p. 69-70).

Como os próprios Parâmetros Curriculares Nacionais confirmam, não é comum, na escola, o texto ganhar mais de uma versão, o normal é que ele permaneça como da primeira vez, o que impossibilita o seu aprimoramento, além de não contribuir “para o texto ser entendido como processo ou para desenvolver a habilidade de revisar” (BRASIL, 1997, p. 51). Como apoio para uma possível mudança, ainda de acordo com os PCNs, o uso de rascunhos seria um auxílio para que o escritor, ao revisar, entenda que o texto é algo provisório.

Dessa maneira, ao se conceber o produto da escrita como um objeto não concluído, possibilitaríamos um distanciamento entre criador e criatura. Assim, do mesmo modo que um artista observa sua obra em busca de imperfeições, de espaços que precisam ser preenchidos ou melhorados, o escritor lê, relê, procura as lacunas presentes e reformula o texto, mostrando ser ele o primeiro leitor e avaliador de sua obra.

De acordo com Menegassi, sendo a “revisão um processo recursivo, mostrando a ideia do texto em progressão, observa-se a reescrita como oriunda dessa configuração. Na verdade, é um produto que dá origem a um novo tipo de processo, permitindo uma nova fase na construção do texto” (1998, p. 40). Ruiz (2010) a cita como uma das principais fases que

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envolvem a produção textual, tendo em vista que é a etapa que mostra de forma mais evidente a escrita como um processo.

Portanto, podemos afirmar que a revisão e a reescrita são processos complementares, pois, juntas auxiliam numa melhor construção do texto. Por meio da revisão, o autor analisa seu produto, reflete a respeito dos elementos escolhidos, observando se suas escolhas colaboram para que seus objetivos sejam atingidos e, se julgar necessário, reescreve seu texto, a fim de torná-lo mais claro. Dessa maneira, fazendo e refazendo, quantas vezes for preciso, o autor, melhora a qualidade do seu texto e, por conseguinte, amplia o seu desempenho em escrever. Logo, “partindo do próprio texto, o aluno terá melhores condições de perceber que escrever é trabalho, é construção de conhecimento; estará, portanto, mais capacitado para compreender a linguagem” (SERCUNDES, 1997, p. 89).

No bojo dessas questões, Antunes declara que o momento de análise da escrita serve para o escritor

confirmar se os objetivos foram cumpridos, se conseguiu a concentração temática desejada, se há coerência e clareza no desenvolvimento das ideias, se há encadeamento entre os vários segmentos do texto, se há fidelidade as normas da sintaxe e da semântica- conforme preveem as regras de estrutura da língua- se respeitou, enfim, aspectos da superfície do texto, como a ortografia, a pontuação e a divisão do texto em parágrafos. [...], para decidir o que fica, o que sai, o que se reformula (2003, p. 55-56).

Como podemos notar, em praticamente todas as definições, fundem-se os processos de revisão e reescrita; e não poderia ser diferente. Pois, como reformular o texto sem antes refletir sobre o objeto de análise? E, da mesma forma, qual o objetivo de se revisar a escrita se não for para melhorá-la? Não há como separar esses dois processos, e são eles que, conjuntamente, irão aperfeiçoar, não só a escrita analisada, mas toda a forma como o autor escreve. Por isso, como assevera Cabral,

Sensibilizar o aluno para a necessidade de objetivar o texto e de tomar distância face ao que escreveu, fornecer-lhe instrumentos que ajudem a análise de sua própria escrita e facultar-lhe, na aula, momentos especificamente dedicados à revisão, é, pois, um percurso que se impõem, se queremos que as aquisições relativas à escrita sejam efetivas e contribuam para uma progressão do aluno nesse domínio (1994, p.118).

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Visto que é durante a revisão que o autor torna-se crítico do seu produto, pois, nesse momento, apropria-se do papel de leitor do texto que produziu, percebendo problemas não vistos antes, notando que o texto está sempre aberto às modificações, podendo ser melhorado a cada re-escritura. A revisão e a reescrita, portanto, têm, “uma função retrospectiva, que sinaliza os 'achados feitos', e uma função prospectiva, no sentido de que nos aponta 'como devemos prosseguir', o que fazer 'daqui em diante', por 'onde ir', 'a que ponto voltar' etc.” (ANTUNES, 2006, p.166).

2.2.1. A revisão e a reescrita na escola

Em sala de aula, além de leitor e avaliador do texto do aluno, o professor assume o papel de colaborador no processo de revisão e por meio de seus comentários ajuda o discente a buscar os possíveis equívocos, preparando-o para a reescrita. Para isso, professor e aluno, “precisam aprender a detectar os pontos onde o que está dito não é o que se pretendia, isto é, identificar os problemas do texto e aplicar os conhecimentos sobre a língua para resolvê-los […]” (BRASIL, 1997, p. 55). Contudo,

[…] o trabalho de retextualização realizado pelo aluno que revisa em função de uma correção pelo professor não é um trabalho solitário, como a princípio pode parecer (muito embora a solitude da tarefa de escrita lhe seja imanente). Esse seu trabalho é, necessariamente, e pela própria natureza, um trabalho a quatro mãos. De modo que toda e qualquer consideração que se faça a respeito do maior ou menor sucesso do aluno na tarefa de revisão (retextualização) deve inalienavelmente levar em conta a participação efetiva do mediador (o professor) no processo como um todo (RUIZ, 2010, p. 26).

Após os comentários do professor, o estudante pode ter duas atitudes: a de desconsiderar as propostas feitas, ou a de aproveitá-las para aprimorar seu produto, indo, muitas vezes, como cita Menegassi, “além das sugestões oferecidas” (1998, p. 60). Por isso, é muito importante que o revisor atente para os seus apontamentos, pois “os comentários com sugestões de revisão oferecidos pelo professor aos alunos têm papel relevante e influenciam na revisão e reescrita” (MENEGASSI, 2000, p. 83). O autor ainda esclarece que tais comentários precisam, para se tornarem claros e eficazes, apresentarem quatro componentes básicos: “1) Apresentação do problema a ser revisado; 2) Identificação da localização do problema [...]; 3) Apresentação do contexto em se encontra o problema; 4) Oferecimento de diretrizes para a reformulação do problema levantado” (Idem, p. 92).

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Ruiz (2010) reforça que é importante que o professor perceba que tipo de leitura faz do texto do aluno, já que é a partir dela que ele fará, ou não, a reestruturação de seu texto. Nesse sentido, o docente deve lembrar que, assim como o texto do aluno pode ter diferentes interpretações, os seus comentários, expressos na revisão, também podem causar um efeito contrário ao pretendido. A esse respeito, Garcez colabora confirmando que,

A língua é um produto de um trabalho coletivo e histórico, de uma experiência que se multiplica de forma contínua e duradoura, assegurando intrinsecamente uma margem de flexibilidade e indeterminação. Essa indeterminação provém do fato de que nenhum enunciado tem em si mesmo, isoladamente, condições necessárias e suficientes para permitir uma interpretação unívoca […] (1998, p. 48).

Em quase todos os casos, o professor até “tem boas intenções sobre o seu trabalho e sobre a escrita, mas não tem clareza teórica e metodológica sobre como explicitá-las ao aluno [...]” (EVANGELISTA, 1998, p. 120).

Na tentativa de ajudar o educador no momento da revisão, Serafini apontou seis princípios que devem ser levados em consideração durante a revisão:

1- A correção não deve ser ambígua - é preciso mostrar o erro de forma precisa.

2- Os erros devem ser reagrupados e catalogados

3- O aluno deve ser estimulado a rever as correções feitas, compreendê-las e trabalhar sobre elas.

4- Devem-se corrigir poucos erros em cada texto.

5- O professor deve estar pré-disposto a aceitar o texto do aluno - É muito importante que o professor tenha uma postura aberta e receptiva em relação ao texto, aceitando sem preconceitos o enfoque, as ideias, o estilo e a linguagem escolhidos pelo estudante.

6- A correção deve ser adequada à capacidade do aluno - O estudante muito criticado, cujos textos vem cheios de correções, sente-se mal a ponto de se tornar incapaz de escrever (SERAFINI, 1988, p. 108-112).

Cabe enfatizar, conforme ressalta Cabral,que “[…] o professor não deverá pretender, […] resolver todos os problemas levantados pelos textos” (1994, p.122), pois, se assim o fizer, correrá um grande risco de desmotivar o aluno, ou até confundi-lo com tantas advertências.

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Após a avaliação e intervenção do professor, o aluno pode adotar diferentes operações na reestruturação do texto. Fabre (1986), apontado por Menegassi (1998), sistematizou quatro operações linguísticas usadas na reescrita:

Adição ou acréscimo - pode tratar-se do acréscimo de um elemento gráfico, acento, sinal de pontuação, grafema [...], mas também de uma palavra, de um sintagma, de uma ou de várias frases;

Supressão - supressão sem substituição do elemento suprimido. Ela pode ser aplicada sobre unidades diversas, acentos, grafemas, sílabas, palavras sintagmáticas, uma ou diversas frases;

Substituição - supressão, seguida por substituição por um termo novo. Ela se aplica sobre um grafema, uma palavra, um sintagma, ou sobre conjuntos generalizados;

Deslocamento - permutação de elementos, que acaba por modificar sua ordem no processo do encadeamento (FABRE, 1986, apud MENEGASSI, 1998, p. 44, 45).

Para melhor entendermos as operações que envolvem a reescrita, Menegassi (1998) nos traz alguns exemplos coletados em textos de alunos do curso de Letras, investigados em sua pesquisa sobre reescrita:

Acréscimo:

“É um fator imprescindível na minha carreira como na minha vida pessoal.”

“É um fator imprescindível na minha carreira, pois lido com a comunicação oral, e também na minha vida pessoal, pois a comunicação é a base do relacionamento humano.”

Supressão:

“… um vazio no meu coração, que ao mesmo tempo dizia...”

“... um vazio no meu coração. Ao mesmo tempo dizia...”

Substituição:

“A opção pelo curso de Letras geralmente atrai pessoas vindas do magistério...”

“O curso de Letras geralmente trás pessoas vindas do magistério...”

Deslocamento:

“... retorna às aulas na Pré-Escola Monsenhor Kimura todas as crianças...”

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O uso, ou não, das quatro operações linguísticas depende muito do tipo de correção que o professor faz – de que forma se materializa, qual é o estímulo que transmite – uma vez que as revisões feitas pelos docentes nos textos dos alunos podem ocorrer de diversas formas. Serafini (1988), a esse respeito, esclarece que as intervenções podem se apresentar de três maneiras:

a) Indicativa: o professor se limita a apenas apontar os erros por um risco, círculo, ponto de interrogação, sublinhado, enfim, algum sinal que, na maioria das vezes, só mostra o equívoco, sem alterá-lo; normalmente relaciona-se a problemas ortográficos.

b) Resolutiva: o revisor, além de sinalizar o erro, o soluciona, reescrevendo-o da forma correta, nem que para isso mude, até mesmo, orações inteiras;

c) Classificatória: se caracteriza por apontar, usando como recurso sinais pré-estabelecidos, com o que e aonde o aluno deve rever seu texto. Dessa forma, um triângulo pode referir-se à falta de parágrafo, um círculo à falta de pontuação e assim por diante, fazendo com que o aluno, após identificar os símbolos, reescreva seu texto, considerando-os.

Além dos três tipos de revisão trazidos por Serafini, Ruiz acrescenta a revisão textual-interativa. “Tratam-se de comentários mais longos do que os que fazem na margem, razão pelo qual são geralmente escrito em sequência do texto do aluno [...]. Tais comentários realizam-se na forma de pequenos 'bilhetes' […]” (RUIZ, 2010, p. 47).

Se fizermos uma comparação breve entre os princípios que o professor deve considerar mostrados por Serafini e os tipos de correção apontados por ela e por Ruiz, notaremos que alguns desses princípios podem não se em determinadas revisões. A ambiguidade, por exemplo, pode aparecer na correção indicativa, já que a indicação, por si só, não deixa claro para o aluno o que deve ser revisto, podendo acarretar no descaso com o apontamento. Algumas vezes, tentando mostrar que a palavra está acentuada equivocadamente, o revisor apenas a sublinha, sem dar esclarecimentos. O escritor, sem entender o que está errado, acaba deixando-a do mesmo modo ou até mesmo substituindo-a por outra.

De forma similar, na correção classificatória, um símbolo, se não for do conhecimento do aluno, acabará confundindo o escritor. Isso acontece, por exemplo, quando o professor coloca um símbolo no início da frase para marcar a falta de parágrafo, sem explicar o que ele significa; o resultado dessa atitude é que, em muitos casos, sem compreender, o aluno acaba ignorando o pedido do revisor. Para Ruiz (2010), as revisões feitas no corpo do texto,

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apontando somente os erros, como nos casos apresentados, passam a impressão de comodidade do professor, visto que são mais rápidas e menos trabalhosas.

A correção resolutiva, por sua vez, não permite, em nenhum momento, que o aluno reflita ou trabalhe sobre seu erro (SERAFINI, 1998). A atitude mais provável é de apenas substituir o seu deslize pelo acerto oferecido, sem nenhum esforço. “Assim, ao corrigir resolutivamente, o professor assume ou uma atitude de alterar a forma de dizer do aluno, ou uma atitude de alterar o próprio dizer do aluno” (RUIZ, 2010, p.78), impondo a sua certeza e ignorando o dizer do aluno. Em virtude disso, a correção “pode produzir resultados inadequados, pois, nessa situação, não há como ter acesso total às intenções do autor, o que, em muitos casos é a única forma de se adequar um texto” (LUCENA, 1997, p. 06). Portanto, esse método de correção não incentivaria o aluno a refletir sobre a escrita e a revisão do professor.

Algumas vezes, o que pode ocorrer também é a mistura de duas ou mais correções, por exemplo, quando o professor usa sempre o mesmo símbolo para um determinado equívoco na revisão classificatória, o aluno acaba acostumando de tal forma com esse sinal e com a resposta esperada que se entrega à comodidade de apenas repetir a resposta que deu nas vezes anteriores, sem analisar as possibilidades de ultrapassar a marcação do professor, tornando-se, na verdade, uma correção resolutiva.

Quanto à distribuição espacial dos comentários, apontamentos e bilhetes feitos nas revisões interventivas, Ruiz (2010) percebeu que podem ocorrer junto ao texto original com várias configurações. Porém, na maior parte dos casos, encontram-se no corpo do texto, na margem ou lateral, ou na sequência dele, local em que, quase sempre, se posiciona a revisão textual-interativa.

Além de Ruiz, outros autores reconhecem a eficácia da correção apoiadas nos bilhetes. Para Nascimento, esse recurso inova por construir um espaço interativo entre professor e aluno. “Através deles, a professora-pesquisadora deixou de ocupar a posição de alguém que lê para apontar os erros gramaticais e ortográficos dos alunos, tornando-se uma 'interlocutora interessada' no que os alunos têm a dizer em seus textos” (NASCIMENTO, 2009, p. 77). Fora essa vantagem, os bilhetes também permitem a abordagem de “aspectos mais amplos relacionados à macroestrutura textual e aos modos de circulação do gênero, que dificilmente poderiam ser apontados através de marcações ou símbolos” (NASCIMENTO, 2009, p. 66), por tratarem de assuntos mais abrangentes e pessoais não estabelecidas por regras gramaticais.

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Outra vantagem desse tipo de revisão é a possibilidade de intimidade entre escritor e revisor, uma vez que, utilizando o recurso interativo, os bilhetes, o professor pode elogiar aquilo que o aluno fez de melhor e incentivá-lo ao crescimento textual; levando-o a refletir sobre seu texto por meio de um diálogo escrito, diminuindo a distância e proporcionando mais envolvimento entre discente e aprendiz. Assim, ao mesmo tempo em que o professor“explica, esclarece, instrui, define regras que asseguram a competência mínima esperada, modela, monitora, estimula e elogia o progresso, sempre com um papel crítico e positivo” (GARCEZ, 1998, p. 42).

Para Ruiz a principal diferença entre os tipos de intervenção “está no caráter altamente

dialógico da correção indicativa, classificatória e textual-interativa, de um lado e, de outro, no

caráter marcadamente monológico da correção resolutiva” (RUIZ, 2010, p. 79), pois ao tomar só para si a responsabilidade da reestruturação do texto, o professor transmite uma ideia de que não faz parte do papel do escritor ler e revisar o seu texto, dando a entender que isso é tarefa do professor. Além disso, a interação propiciada nas revisões de caráter dialógico, principalmente na textual-interativa faz com que se desloque

a noção do processo de ensino como transmissão, concebendo-se a sala de aula como lugar de interação verbal e por isso mesmo de diálogo entre sujeitos, ambos portadores de diferentes saberes. São os saberes do vivido trazidos por ambos – alunos e professores – que se confrontam com outros saberes, historicamente sistematizados e denominados “conhecimentos” que dialogam em sala de aula (GERALDI, 1997a, p. 21).

Gonçalves (2009), a respeito dos diferentes modos de se fazer a revisão textual, defende a revisão interativa que se assemelha muito com a textual-interativa de Ruiz (2010), porém, apoiada pelas listas de controles ou constatações e considerando o gênero textual escolhido, a partir de um trabalho feito com Sequências Didáticas. Para ele, esse método de revisão “pode oferecer importante caminho para o educando operar qualificações com e sobre a linguagem […]” (GONÇALVES, 2009, p. 21), pois, de posse da lista de constatações, refletiria de maneira crítica sobre vários pontos que envolvem seu texto, desde a sua adequação ao gênero textual, a construção do texto, a coerência, a coesão, os desvios gramaticais entre outros. Em resumo, as listas de constatações seriam construídas com perguntas guiadoras que ajudariam os alunos na sua revisão, como: “Você selecionou as

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texto? Não existem desvios gramaticais, tais como pontuação, frases truncadas/incompletas?” (GONÇALVES, 2009, p. 24).

O autor esclarece que esse recurso não é uma receita pronta, nem a solução para todas as dificuldades enfrentadas pelo professor no momento da revisão, haja vista que esta é apenas uma das etapas da produção textual, mas nos lembra que as mensagens interativas fazem com que o docente mantenha o exercício dialógico da linguagem, por meio da interação que mantêm com seu aluno.

Seja qual for o tipo de revisão, os critérios de avaliação levados em conta devem estar bem claros para o professor, para que possa transpô-los ao aluno, caso contrário, o escritor terá “apenas como referência de qualidade aquilo de que são portadores de forma mais ou menos implícita e que virá não tanto de uma aprendizagem escolar, mas de aquisições bebidas na sua experiência leitora, tantas vezes diminuta” (CABRAL, 1994, p.114).

O educador deve prestar atenção na necessidade real do aluno, tentando não cair no erro de favorecer, com maior dedicação, aqueles que correspondem mais ao seu trabalho, pois, de acordo com Grillo (1995), são os que menos respondem que, quase sempre, necessitam de mais atenção. Com base em suas pesquisas, a autora constatou que os alunos considerados mais fracos, com menos embasamento teórico e prático da escrita, correspondem em menor proporção às suas revisões do que aqueles com maior familiaridade. Isso, se explica pelo fato de os alunos não terem o conhecimento necessário para a reestruturação, necessitando de, além das instruções via bilhetes, de orientações pessoais.

Entretanto, o professor não precisa ser necessariamente o único avaliador do texto do aluno. Antes mesmo dele, o próprio escritor deveria fazer a autoavaliação. Conforme Cabral, essa tarefa será facilitada

[…] se for acompanhada de instrumentos de apoio e se for pedido ao aluno que se avalie mediante parâmetros por ele conhecidos. Daí a necessidade de se construir grelhas de avaliação, de preferência com a colaboração dos alunos que, ao participarem nessa construção, reforçam e investem o que aprenderam anteriormente. Assim se associará a avaliação à aprendizagem (CABRAL, 1994, p.119).

Outra maneira de promover a revisão interativa seria a avaliação em par ou em grupo. Trata-se de uma troca de material, onde cada um, após a leitura do texto do colega, levanta considerações que lhe parecerem pertinentes. Esses apontamentos não precisam aparecer somente por escrito. Seria importante que se fizessem também diretamente para o aprendiz.

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Garcez (1998), após análises de diálogos estabelecidos nas revisões em pares, percebeu que, durante a conversa, o escritor, ao notar que em certos pontos levantados pelo colega realmente não deixou clara as suas intenções no texto, procura, muitas vezes, explicar por que fez daquela forma. O que se conclui nessa interação é que, tanto o leitor quanto o autor, tentam defender o seu ponto de vista, mostrando uma postura crítica. Todavia, em outras vezes, o escritor se convence, após as considerações do par, que realmente precisa adequar seu texto.

De acordo com Antunes, a revisão em par ou em grupo traz duas vantagens:

Primeiro, se aguçaria esse olhar avaliador, no sentido, claro, construtivo de perceber o que está bem e o que poderia estar melhor na atividade do outro. Segundo, se estimularia a abertura da aprendizagem social que se pode fazer, em relação à crítica saudável, às observações do outro, à pluralidade de visão, dimensões tão relevantes para a madura e plural convivência social (ANTUNES, 2006, p. 164).

Garcez (1998), por meio de suas análises sobre os diferentes leitores/avaliadores do texto do aluno, incluindo o produtor, concluiu que, de modo geral, professor, colega e escritor se estruturam de forma parecida em suas revisões.

Entretanto, a assimetria natural e inevitável entre o par mais desenvolvido e o estudante em processo de formação apresenta-se, por meio de suas características principais: a) há um espectro maior de participação do professor-pesquisador que do leitor-crítico colega; b) o professor pesquisador evita a instrução direta, colocando questões ao estudante, que orientam, dirigem, provocam sua reflexão sobre um determinado aspecto que detectou, e percebe que o estudante, voltando ao ponto para releitura, pode solucioná-lo. […] O professor não só sustenta o percurso do estudante, mas o impulsiona, movimenta-o, encoraja-o para um avanço mais significativo (GARCEZ, 1998, p. 136).

Por outro lado, também existem aqueles que acabam focando somente em aspectos pontuais, desconsiderando outros elementos tão ou mais relevantes para a produção.

Jesus (2001), ao pesquisar a forma como os professores trabalhavam a escrita em sala de aula, especialmente a metodologia utilizada durante a revisão e a resposta dada pelos alunos na reescrita dos textos analisados, concluiu que preponderavam as observações baseadas em critérios gramaticais. Para a autora, o revisor acredita que fazendo a “higienização da escrita”, ou seja, limpando os erros gramaticais, o texto tornar-se-ia claro. E afirma ainda que, com esse tipo de avaliação,

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A reescrita transforma-se numa espécie de “operação limpeza”, em que o objetivo principal consiste em eliminar as impurezas pela profilaxia linguística, ou seja, os textos são analisados apenas no nível da transgressão ao estabelecido pelas regras de ortografia, concordância e pontuação, sem se dar a devida importância às relações de sentido emergentes na interlocução. […] Como resultado temos um texto, quando muito, “linguisticamente correto”, mas prejudicado na sua potencialidade de realização (JESUS, 2001, p. 102).

Conforme a pesquisadora, uma revisão apoiada somente em regras de pontuação, ortografia e concordância, faz com que o discente não compreenda a importância de se refletir sobre a escrita e muito menos sobre seu papel como autor, haja vista que esses dois pontos parecem não serem considerados quando a revisão é feita dessa forma.

Logo, um trabalho fragmentado, no qual pontuação e enunciação são tratadas de maneira desarticulada, como se fossem instâncias excludentes, desencadeia uma reescrita formal e mecânica, destituída de significado e reflexão, que não faculta ao aluno a apropriação dos recursos linguísticos necessários a uma melhor contextualização da pluralidade imanente ao seu enunciado (JESUS, 2001, p. 109).

Desse modo, o aluno passa a entender a revisão não como um momento de análise, mas como algo imposto pelo professor que deve ser seguido de forma rígida, deixando de lado a sua idiossincrasia e se apropriando do modo de dizer do professor. Além disso, permanece a noção de revisão apoiada somente em fragmentos do texto, em palavras isoladas, como se o sentido do texto não estivesse no seu todo. A esse respeito, Geraldi assevera que o texto “é precisamente o lugar das correlações. Construído materialmente com palavras (que portam significados), organiza essas palavras em unidades maiores para construir informações cujo sentido/orientação somente é compreensível na unidade global do texto” (GERALDI, 1997a, p.22).

Dividindo os mesmos pensamentos, Grillo explana que a revisão apoiada apenas em erros ortográficos, acentuação e de sintaxe, ocorre, entre outras coisas, porque “a formação da maioria dos professores de português ainda é fortemente baseada no estudo da gramática normativa, mas muito deficientes em termos de estudos linguísticos” (GRILLO, 1995, p. 60).

Antunes defende a busca por novos caminhos na revisão textual, esclarecendo que “se existe uma gramática (da qual deriva uma determinada norma gramatical eleita como padrão) também existe uma situação interativa (da qual derivam as normas sociais de uso da língua)” (ANTUNES, 2006, p.170). Portanto, ao avaliarmos um texto de forma resolutiva, levando em

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consideração apenas regras estruturais, estaríamos desconsiderando a função básica da língua levantada por Bakhtin/Volochinov (2009), a interação.

É claro que precisamos considerar as dificuldades enfrentadas pelos educadores para realizarem um trabalho mais eficaz em relação à revisão dos textos de seus discentes, pois, além de assumirem uma carga horária elevada de trabalho, são responsáveis por turmas de alunos numerosas e, muitas vezes, nem foram preparados para esse processo. O que se nota nas instituições de ensino é que o professor, quando corrige o texto, o faz de maneira superficial e o entrega ao educando, tomando o trabalho por encerrado. Porém, como cita Menegassi, no momento em que o professor compreende “a importância de seus comentários na construção textual dos alunos, conscientiza-se de que deve melhorar a qualidade de suas observações, o que invariavelmente é refletido na avaliação do texto, tanto por parte do aluno, como por parte do professor” (1998, p. 61). Para Antunes, a consciência da responsabilidade e a competência do avaliador no processo de revisão do texto são reflexos de sua própria formação. A autora enfatiza ainda que

É inadiável, ainda, que se ponha como ponto de estudo, nos cursos de graduação, o processo da avaliação e seus múltiplos procedimentos didáticos. Além disso, não se pode ter grandes expectativas de sucesso escolar, se os professores não demonstram ser leitores assíduos, não são capazes de escrever, com coerência e relevância um texto formal, se os professores, enfim, não têm uma visão mais relevante e interativa do funcionamento social da língua (ANTUNES, 2006, p.177).

Fiad & Mayrink-Sabinson, após realizarem experiências de reescritas com graduandos do primeiro ano do curso de Letras/Linguística do IEL/UNICAMP – futuros professores de Língua Portuguesa –, perceberam que, na grande maioria das vezes, o momento da escritura causa estranheza a muitos. Para alguns, a “reescrita tornaria o texto frio, sem emoção”, já para outros, “a reescrita só deve ser feita se o primeiro texto for ruim” (FIAD & MAYRINK-SABINSON, 1991, p. 57).

Este resultado nos mostra que o ato de revisar os textos e, principalmente de reescrever, ainda precisa ser muito explorado e trabalhado nas salas de aula, inclusive nos cursos de Letras, para que, dessa forma, a escrita deixe de ser vista como um dom, ou como uma inspiração e passe a ser entendida realmente como um trabalho, e, como tal, precisa ser aprimorada a cada dia, pois, “não acontece gratuitamente, por acaso, sem ensino, sem esforço,

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(ANTUNES, 2003, p. 60). Entendendo que, assim como os outros processos de escritura, segundo a concepção de escrita como trabalho, o uso da revisão e a reescrita melhoram profundamente o texto produzido, “os alunos passam a considerar o texto escrito como resultado de um trabalho consciente, deliberado, planejado, repensado” (FIAD & MAYRINK-SABINSON, 1991, p.63), passando a entender que todos são capazes de aprender a arte de escrever, basta apenas ter vontade, persistência e dedicação.

2. Registros de análise

Ao se iniciar uma pesquisa sobre escrita, em que o material de análise são textos produzidos num ambiente escolar, é preciso que tenhamos muita determinação, principalmente se dependermos da colaboração de uma escola para a obtenção desses registros.

Durante a leitura de Ruiz (2010), questionou-se muito até que ponto se consegue manter a imparcialidade ao analisarmos produções textuais que foram revisadas pelo próprio pesquisador. Mas logo que os primeiros contatos com a escola, que supostamente iria fornecer os registros desta pesquisa se iniciou, ficou claro o porquê de a autora fazer tal escolha. Mesmo tendo sido explicado à diretora dessa instituição, várias vezes, todos os objetivos e o modo como o trabalho iria ser encaminhado, esclarecendo que em nenhum momento a intenção seria avaliar os professores ou a escola e deixando sempre claro que não divulgaríamos os nomes dos envolvidos, fomos vencidos pelos obstáculos que, aparentemente, foram colocados de forma intencionais numa tentativa de provocar a nossa desistência em recolher materiais da escola, o que acabou ocorrendo.

Por mais que todos saibam que o ensino de Língua Materna esteja enfrentando uma grave crise, especialmente no que se refere à produção textual, as escolas, quando procuradas para fazerem parte de pesquisas que buscam a melhoria desse problema, sentem-se acuadas por medo de serem avaliadas. Sabemos que a grande maioria dos professores ainda não está preparada para realizar um trabalho construtor e edificador com a escrita, talvez, por isso, sintam-se tão inseguros. Mas, essa insegurança não justifica o boicote às pesquisas, mesmo porque, é o elo entre as universidades e as escolas de Ensino Fundamental e Médio que propicia um maior desenvolvimento do ensino. Além disso, todos ganham com essa união: professores, alunos, pesquisadores e as instituições de educação.

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Felizmente, ainda podemos contar com educadores e escolas que entendem as pesquisas científicas como tentativa de buscar soluções para, se não acabar, pelo menos amenizar os problemas que existem em relação à educação. Assim, após a frustração de não conseguir as produções necessárias para a análise em uma das maiores escolas privadas de ensino de Maringá, recebemos apoio em outra, também particular.

O primeiro contato com a segunda escola – feito no mês de outubro de 2010 – não foi muito diferente da primeira, explicações de como seria encaminhado o trabalho, a qual instituição estava vinculado, os objetivos, enfim, o momento em que tentamos mostrar a relevância da pesquisa. O diferencial é que todas essas explicações não foram à toa. Estava aberto um caminho, que seria longo, mas que traria resultados positivos.

Após algumas idas e vindas e passada toda a etapa burocrática, fomos apresentados às professoras das turmas que produziriam os textos para análise. Para essa pesquisa, foram selecionadas duas salas, sendo uma do 4º ano e a outra do 5º ano:

Da turma do 4º ano, composta por 20 alunos, 11 meninos e 9 meninas, tivemos acesso a 19 produções, sendo que dessas, 8 tiveram uma segunda reescrita, totalizando 27 textos para análise. Vale ressaltar que, antes mesmo do início da atividade de produção textual, a professora já tinha o conhecimento sobre a sua utilização como registro de pesquisa. O gênero textual para o trabalho foi a biografia, trabalhado anteriormente à produção, por diferentes meios. Em primeiro lugar, a professora apresentou às crianças um filme biográfico e, em seguida, teve início o trabalho com o livro didático “Coleção mais cores- 4º ano” 2, no capítulo 7, intitulado “Quem escreve história também tem história”.

O capítulo começa mostrando a importância de se conhecer um pouco mais sobre a vida de outras pessoas, especialmente a dos autores. Para melhor explicar, traz a biografia da autora Ruth Rocha e uma entrevista com Ziraldo, seguido, de forma separada, por exercícios de interpretação e identificação dos pontos que caracterizam os dois gêneros. Na sequência, apresenta um exercício propondo aos alunos que escolham um adulto e façam uma entrevista sugerida. As perguntas pré-estabelecidas no livro foram: “Qual é o seu nome completo? Onde e quando você nasceu? Em que cidade você mora atualmente? Você é casado? Com quem? Você tem filhos? Quem são eles? Qual a sua idade? Qual é a sua profissão? Onde trabalha? Há quanto tempo? Qual é a importância de seu trabalho para as outras pessoas? O que gosta de fazer quando não está trabalhando? Cite um ou mais fatos marcantes em sua vida”. Por

Referências

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