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Tudo começou em África

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Academic year: 2021

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Investigações sucessivas sobre o DA permitiram fazer uma nova árvore genealógica da espécie humana que confirma a proximidade entre os povos africanos e europeus. Apesar das diferenças da cor da pele, estes são os parentes mais próximos

Tudo começou em África

(Expresso: 25-04-1998)

Análises do DA confirmam a origem africana da espécie humana, uma ideia já defendida no século passado por Charles Darwin e Thomas Henry. A nossa árvore genealógica parece ter começado há 137 mil anos, quando 500 homens decidiram sair de África.

AO QUE tudo indica, 500 antepassados nossos terão bastado para povoar todo o

Globo. A grande migração terá começado há uns 137 mil anos, quando algumas centenas de seres humanos deixaram o continente africano para explorar a Eurásia, a Oceânia e as Américas.

A ideia de que o berço da humanidade se tenha localizado em África é já antiga, mas nunca tinha sido possível, como agora, estudar com tanto rigor os movimentos dos nossos antepassados. Já no século passado Charles Darwin (1809–82) e Thomas Henry Huxley (1825–95) tinham defendido que a África tinha sido o teatro da pré-história humana. O seu raciocínio era simples: as criaturas mais aparentadas aos humanos, os chimpanzés e os gorilas, vivem hoje em África, pelo que seria aí que o homem se deveria ter originado.

Os primeiros achados da nossa espécie datam de há uns 300 a 500 mil anos. Já antes disso, há uns dois milhões de anos, o «homo erectus», um antepassado do «homo sapiens», se tinha espalhado por quase todo o Globo, como as descobertas arqueológicas mais modernos têm mostrado. Entretanto, a evolução originou o «homo sapiens», com uma caixa craniana mais volumosa, uns 1400 centímetros cúbicos, em média. Até aí a evolução tinha vindo a aumentar a capacidade craniana; com o «homo

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sapiens» ela estabilizou. Apenas o formato do crânio se continuou a modificar. O chamado «homo sapiens» arcaico tinha uma face e mandíbulas salientes, um pouco como os macacos, enquanto o «homo sapiens» moderno tem o crânio mais alinhado.

O estudo da pré-história humana tem tido um desenvolvimento vertiginoso no nosso século. Os achados têm-se sucedido, a comunicação entre especialistas tem permitido confrontar restos de seres humanos em pontos diversos do Globo e, pouco a pouco, tem-se caminhado para uma ideia de conjunto sobre as migrações das últimas centenas de milhares de anos. Mas há um novo instrumento de pesquisa que só há pouco se tem desenvolvido. É o estudo do DNA, a macromolécula que constitui os genes dos seres vivos.

No conjunto, a variação genética que hoje se observa entre os seres humanos é extraordinariamente pequena, quando comparada com o que se observa noutras espécies. Os paleontólogos e biólogos sublinham sempre esse argumento científico, que se opõe ao racismo e mostra não se poder atribuir à raça as razões da grande diversidade no sucesso ou insucesso de determinadas comunidades. Mas mesmo assim, as pessoas estão longe de ser cópias perfeitas umas das outras, e as pequenas variações genéticas da espécie humana são o suficientes para permitir seguir os grandes movimentos migratórios.

Figura central nesse esforço de desenhar um mapa genético da humanidade tem sido Luca Cavalli-Sforza, um cientista de origem genovesa que trabalha hoje na Universidade de Stanford, na Califórnia, e que é um dos principais motores do chamado Programa do Genoma Humano, um projecto ambicioso que tem coleccionado e catalogado o DNA de seres de todo o mundo.

Cavalli-Sforza acentua os extraordinários movimentos migratórios deste século, em que sociedades como a norte-americana funcionam como cadinho de fusão de asiáticos, de europeus, de africanos e de migrantes de outras áreas. Catalogar os códigos genéticos dos seres humanos e relacioná-los com a sua origem geográfica está a ser cada vez mais difícil, pelo que o Projecto do Genoma Humano ambiciona recolher dados antes que a alteração das populações se acelere ainda mais.

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Os trabalhos de Cavalli-Sforza e de muitos outros especialistas foram grandemente facilitados pelas novas técnicas de estudo do DNA, particularmente do DNA mitocondrial. Margarida Barroso, professora de Biologia na Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, investiga os mecanismos de transporte no interior da célula e explica-nos a importância desse DNA.

«O DA existe nos núcleos das células e existe nas mitocôndrias, fora dos núcleos», esclarece a bióloga portuguesa. «As mitocôndrias encontram-se em todas as células dos organismos mais desenvolvidos. Utilizam o oxigénio para produzir energia e actuam um pouco como centrais geradoras. São o meio mais eficiente para a geração de energia nas células. As mitocôndrias encontram-se no citoplasma, localizado entre o núcleo e a membrana exterior da célula.»

Cada célula contém pelo menos uma mitocôndria mas pode conter dezenas ou mesmo milhares. Têm um aspecto semelhante ao de uma bactéria, e é provável que tenha sido essa a sua origem, há uns milhões de anos, quando certas bactérias talvez se tenham adaptado a viver em simbiose com as células e passaram a desempenhar o importante papel de centrais geradoras de energia.

As mitocôndrias são, em alguma medida, independentes do resto da célula, e têm o seu pequeno cromossoma que, tal como todos os cromossomas, é constituído de DNA, a estrutura que contém a informação genética que se transmite de organismo a organismo.

Os cromossomas das mitocôndrias contêm cerca de 16500 nucleótidos, que são os elementos básicos da codificação. São, pois, muito mais pequenos do que os cromossomas dos núcleos celulares, que contêm dezenas ou centenas de milhões desses componentes.

«Mas o mais importante» diz Margarida Barroso, «é que as mitocôndrias são passadas aos descendentes apenas pela mãe. Dois filhos da mesma mãe têm

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mitocôndrias idênticas, mesmo que os pais sejam diferentes. De volta e meia, o DA da mitocôndria muda, muito pouco, por mutação, quando um dos nucleótidos é substituído por um outro. A partir daí os descendentes dessa mulher passarão a ter uma sequência genética parcialmente diferente, revelada pelo DA das mitocôndrias.»

O DNA mitocondrial é, pois, muito mais estável que o DNA dos núcleos celulares, que resulta do cruzamento dos cromossomas masculinos e femininos e que, por isso, se altera de geração para geração.

O DNA mitocondrial apenas se altera por mutação, que é um fenómeno raro. Por isso, quando se observam descendentes de diferentes gerações, é pouco provável encontrar diferenças. Só à medida que as gerações se multiplicam alguma diferenciação começa a ser mais provável. E, mesmo assim, as diferenças são muito menos pronunciadas do que as encontradas no DNA dos núcleos celulares.

Esta descoberta tem sido fundamental para traçar um mapa genético dos seres vivos. Tal investigação começou já há umas dezenas de anos e tem permitido associar diferentes raças e povos, assim como medir as suas diferenças. A partir daí foi possível traçar uma árvore da espécie humana, que contém como ramos principais os africanos, europeus, asiáticos, nativos americanos e nativos australianos.

O estudo genético permitiu, por exemplo, confirmar uma proximidade entre africanos e europeus, apesar de diferenças na cor na pele e nos traços fisionómicos. A população australiana, por exemplo, está mais afastada geneticamente da africana do que da asiática e da europeia.

Sarah Tishkoff, que trabalhava na Universidade de Yale e agora é investigadora na Universidade do Estado da Pensilvânia, investigou recentemente as mudanças nos padrões genéticos de 1600 indivíduos de todo o Globo e encontrou uma grande diversidade no DNA nos povos africanos ao sul do Sara muito maior do que a diversidade entre os povos das outras regiões. «Estas diferenças de variação no código genético», diz Tishkoff, «sugerem que todas as populações não africanas derivam de uma única população ancestral que migrou do oroeste de África.»

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Na última Conferência da Evolução Humana, realizada em Long Island, perto da cidade de Nova Iorque, Tishkoff apresentou dados novos baseados no estudo do DNA mitocondrial. Esta investigadora estima agora em cerca de 500 indivíduos a dimensão do grupo migratório saído de África há uns 137 mil anos.

A possibilidade de traçar tais estimativas, por mais falíveis que sejam as primeiras aproximações, representa um sucesso notável. Mas é ainda possível descer a maior pormenor.

A diversidade no código genético dos núcleos celulares, por exemplo, aponta para movimentos de grupos asiáticos que terão retornado posteriormente a África. E, ao que parece, terão sido essencialmente grupos migratórios masculinos os responsáveis por esse retorno. É isso que o código presente nos núcleos celulares parece indicar. O DNA mitocondrial apresenta-se mais estável, o que sugere que as mulheres não terão participado dessa migração.

O estudo genético das populações humanas está ainda no seu começo, mas está já a atingir resultados até há pouco inimagináveis.

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