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Livro didático, representações sociais e francofonia: um olhar crítico sobre a formação de professores de FLE

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Academic year: 2021

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SUZANA DARLEN DOS SANTOS SANTARONI TEIXEIRA

LIVRO DIDÁTICO, REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FRANCOFONIA: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE FLE

Niterói, RJ 2016

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LIVRO DIDÁTICO, REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FRANCOFONIA: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE FLE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem, linha de pesquisa 3: História, política e contato linguístico, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem.

Orientador: Prof. Dr. Xoán Carlos Lagares Diez

Niterói, RJ 2016

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T266 Teixeira, Suzana Darlen dos Santos Santaroni.

Livro didático, representações sociais e francofonia: um olhar crítico sobre a formação de professores de FLE / Suzana Darlen dos Santos Santaroni Teixeira. – 2016.

125 f. ; il.

Orientador: Xoán Carlos Lagares Diez.

Dissertação (Mestrado em Estudos de Linguagem) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Letras, 2016.

Bibliografia: f. 77-80.

1. Política linguística. 2. Francofonia. 3. Formação de professor. 4. Livro didático. 5. Representação social. 6. Linguística; aspecto social. I. Lagares Diez, Xoán Carlos. II.

Universidade Federal Fluminense, Instituto de Letras. III. Título.

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LIVRO DIDÁTICO, REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FRANCOFONIA: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE FLE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem, linha de pesquisa 3: História, política e contato linguístico, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem.

Orientador: Prof. Dr. Xoán Carlos Lagares Diez

BANCA EXAMINADORA

Orientador: Professor Doutor Xoán Carlos Lagares Diez

Universidade Federal Fluminense

Professora Doutora Stela Maria Sardinha Chagas de Moraes

Universidade Estadual do Rio de Janeiro

Professora Doutora Telma Cristina de Almeida Silva Pereira (UFF)

Universidade Federal Fluminense

Niterói, RJ 2016

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Em primeiro lugar, sou grata a Deus pela oportunidade de ampliar meus conhecimentos na área em que escolhi atuar.

Aos meus pais agradeço o imenso amor, carinho e cuidado dedicados a mim durante toda a minha vida, o incentivo nas minhas escolhas. À minha irmã sou grata pela ajuda e apoio nos momentos em que precisei.

Ao meu esposo agradeço o companheirismo, ajuda emocional, contribuições e parceria.

À Carla Mirelle, grande amiga, sou imensamente grata pela ajuda, desde o início, e pelo encorajamento fundamental em meu percurso.

À Thábata, Quézia, Juliana e Thais sou grata pela amizade, os momentos de alegria e incentivo.

À professora Lucia Teixeira agradeço a oportunidade de tê-la como minha orientadora na pesquisa de Iniciação Científica, tornando-se inspiração para a minha vida acadêmica.

À professora Stela Sardinha, minha orientadora na Especialização, agradeço a possibilidade de aprofundar meus conhecimentos e ter base para ingressar no Mestrado.

Ao meu orientador, professor Xoán Lagares, sou grata pela aceitação e acolhimento deste trabalho. Agradeço o tempo dispensado em me orientar e contribuir para o desenvolvimento da pesquisa. Suas orientações foram base fundamental para a conclusão.

Aos mestres que fizeram parte da minha trajetória escolar e acadêmica, agradeço o exemplo que tive para que pudesse ter certeza da minha escolha. Agradeço também a grande contribuição para meu crescimento profissional.

Aos meus alunos sou grata pela inspiração e motivação que me causam. São os principais motivos da minha busca pelo conhecimento e, assim, do esforço incessante em tornar minha prática de ensino mais eficaz. Aos alunos que participaram das entrevistas e questionários agradeço a contribuição.

À agência de fomento CAPES agradeço o apoio financeiro que facilitou a realização desta pesquisa.

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O homem aprende a ver o mundo e atuar sobre ele através da língua. Desde muito cedo, comunica-se (oralmente) com espontaneidade, pertinência e eficácia, provendo de forma satisfatória suas necessidades de interação social e até mesmo de sobrevivência.

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Este trabalho reflete sobre a construção de representações da francofonia no processo de formação de professores de Francês Língua Estrangeira (FLE), através da análise de materiais didáticos utilizados por instituições federais de ensino superior do Rio de Janeiro, nos cursos de licenciatura. Acreditamos que tal pesquisa pode trazer contribuições aos sujeitos envolvidos nesse processo. Segundo Paraguai e Pereira (2012), a maioria dos livros didáticos de Francês Língua Estrangeira (FLE) prioriza as questões referentes à França e, se abordam aspectos referentes a outros países francófonos, o fazem de modo menos profundo. Ou seja, o livro didático pode funcionar como um instrumento que delimita a formação de representações sociais e linguísticas no que tange ao pluralismo francófono. Consideramos o processo de formação de professores fundamental para o desenvolvimento de profissionais qualificados, não apenas no ensino da língua francesa, mas no conhecimento da heterogeneidade cultural, social e linguística da francofonia. Essa ação vislumbra a aceitação e o reconhecimento da diversidade francófona pelos aprendizes, através de um ensino que proporcione a formação de representações sociais e linguísticas. Sendo assim, este texto concentra-se em assuntos que abrangem questões de representações ligadas à formação de ideias em torno da francofonia em aulas de FLE do ensino superior. A pesquisa deu-se através da leitura de textos que embasaram a fundamentação teórica e que deram condições de desenvolver as análises. As etapas posteriores consistiram na elaboração e aplicação de questionário, em entrevistas com professores de FLE dos cursos que fazem parte de projetos linguísticos da UFF (curso PROLEM) e UFRJ (curso CLAC), assim como na análise dos materiais didáticos utilizados pelas universidades citadas e análise das entrevistas. Todos os procedimentos elaborados e concluídos proporcionaram a compreensão de como os professores em processo de formação entendem a importância da francofonia no ensino de FLE. Pudemos, então, observar que a aceitação e conhecimento da diversidade francófona são fundamentais para uma formação mais completa, tendo em vista as diferenças que constituem a língua francesa.

PALAVRAS-CHAVE: políticas linguísticas, francofonia, formação de professores, livro didático, representações sociais e linguísticas.

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This work reflects on the construction of francophone representations during the training process of French as a Foreign Language (FFL) teachers by analyzing teaching materials applied by federal institutions of higher education in Rio de Janeiro to undergraduate courses. We believe that this research can bring contributions to the subjects involved in this process. According to Paraguai and Pereira (2012, p. 35), it appears that most textbooks of French as a Foreign Language (FFL) prioritize the French-related issues and if they approach aspects related to other French-speaking countries, this is less deeply done. That is, the textbook can serve as an instrument that delimitates the formation of social and linguistic representations with respect to the Francophone pluralism. We consider the process of training teachers as fundamental to the development of qualified professionals not only in the French language teaching, but also in the knowledge of Francophonie cultural, social and linguistic diversity. This action envisages the acceptance and recognition of Francophone diversity by apprentices through a school that provides the formation of social and linguistic representations. Therefore, this dissertation focuses on issues that touch on matters of representations linked to the formation of ideas around the Francophonie in FFL classes on higher education. This research took place through the reading of texts which supported the theoretical foundation and development of the analyses. Subsequent steps consisted on the ellaboration and application of a questionnaire, interviews with FFL teachers of courses from linguistic projects at UFF (PROLEM course) and UFRJ (CLAC course), as well as the analysis of teaching materials applied by these universities and analysis of interviews. All developed and completed procedures provided an understanding of how teachers in formation perceive the importance of the Francophonie in teaching FFL. At last, we observed that the acceptance and knowledge of francophone diversity are key to a more complete formation, taking into account differences which constitute the French language.

KEY WORDS: language policies, francophone, teacher training, textbook, social and linguistic representations.

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Figura 1: Mapa da francofonia ... 43

Figura 2: Ficha de inscrição “jeu-concours” ... 45

Figura 3: “La francophonie” ... 46

Figura 4: “Pontoise” ... 49

Figura 5: “Vivre en Bretagne” ... 50

Figura 6: “La France vue par...” ... 51

Figura 7: “Phonétique” ... 55

Figura 8: Fonética livro A2 ... 56

Figura 9: Léxico/ As partes do corpo ... 60

Figura 10: Vocabulário temático ... 61

Figura 11: Parte do questionário do GRADUANDO UFF 2 ... 62

Figura 12: Parte do questionário do GRADUANDO UFF 1 ... 63

Figura 13: Questões sociais e culturais – livro A2 ... 65

Figura 14: Exercício gramatical ... 66

Figura 15: Gramática ... 67

Figura 16: Exercício gramatical (2) ... 68

Figura 17: Gramática (2) ... 69

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2 METODOLOGIA ... 16

3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS... 19

3.1 Língua e variação sob a perspectiva da sociolinguística ... 19

3.2 Pluricentrismo linguístico ... 24

3.3 Políticas Linguísticas... 28

3.4 Representações, ideologias e ensino ... 31

3.4.1 Livro didático, ensino e formação de professores ... 31

3.4.2 Representações sociais e linguísticas ... 33

3.4.3 Ideologias...36

3.5 O conceito de francofonia...37

4 ANÁLISE DE LIVROS E MATERIAIS DIDÁTICOS ... 41

4.1 Sobre os livros didáticos ... 41

4.2 Observações e considerações sobre francofonia, ensino de FLE, representações e livros didáticos ... 42

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 74

REFERÊNCIAS ... 77

APÊNDICE A – Questionário entregue aos alunos/professores ... 81

APÊNDICE B – Temas abordados na entrevista dos alunos/professores ... 83

APÊNDICE C – Transcrição das entrevistas ... 84

ANEXO A – Páginas do livro Alter Ego plus A1 ... 97

ANEXO B – Páginas do livro Alter Ego plus A2 ... 116

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1 INTRODUÇÃO

A presente dissertação trata das representações sociais e linguísticas no âmbito da francofonia, na perspectiva da Teoria das Representações Sociais, em cursos de Licenciatura. O trabalho visa refletir sobre a presença da francofonia nas aulas de Francês como Língua Estrangeira, no âmbito acadêmico. Para isso, selecionamos para análise materiais utilizados por duas universidades Federais do Rio de Janeiro, que são os seguintes: Alter Ego plus A1 e A2 – adotados pela UFF e UFRJ – e os aparatos elaborados e utilizados pelos professores da UFRJ, após o término dos livros. A pesquisa enquadra-se na área de Sociolinguística e está centrada em questões de políticas linguísticas, especificamente em torno de materiais didáticos que compõem a prática de ensino de FLE1.

A sociolinguística aborda a língua como objeto histórico e cultural, o que corresponde ao comportamento e aos padrões linguísticos de um determinado grupo social. Tal teoria linguística entende o objeto língua como um sistema heterogêneo, integrado na estrutura social. De acordo com a Sociolinguística, “a língua é uma forma de comportamento social, ela é usada por seres humanos num contexto social, comunicando suas necessidades, ideias e emoções uns aos outros” (LABOV, 2008, p. 215). A Sociolinguística é um campo amplo, que contribuiu e contribui para os estudos em Políticas Linguísticas. Por isso, é importante salientar que “paralelamente às primeiras preocupações de Política Linguística, desenvolveu-se o que atualmente desenvolveu-se chama Sociolinguística, que dará à Política Linguística os meios científicos de que ela necessitava” (CALVET, 2007, p. 37). Assim, a Sociolinguística oferece suporte para a presente pesquisa, que se concentra no ensino de língua francesa como Língua Estrangeira (LE) 2.

Segundo Calvet (2007, p. 16), a Política Linguística pode ser definida como a “determinação das grandes decisões referentes às relações entre as línguas e a sociedade”. Ainda, como afirmam Savedra e Lagares (2012, p. 16), o interesse por questões que dizem respeito às Políticas Linguísticas está no centro de numerosas pesquisas situadas no âmbito não apenas da Sociolinguística e da Etnolinguística ou da Antropologia Linguística, mas também (e sobretudo) da Linguística Aplicada.

O campo de Política Linguística oferece subsídios para essa pesquisa, pois apresenta estudos relevantes na área de investigação das representações sociais e linguísticas, visto seu grau de importância dentro dessa área. Pereira e Costa (2012, p. 172) afirmam que “uma

1 A partir desse momento, a sigla FLE será utilizada no lugar de Francês Língua Estrangeira. 2 A partir desse momento, a sigla LE será utilizada no lugar de Língua Estrangeira.

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representação favorável a respeito de uma determinada língua pode [...] interferir em uma dada política linguística”.

A pesquisa se desenvolveu em torno da palavra “francofonia”, termo que surgiu em 1880, e que se aplica à realidade geográfica, linguística e cultural de todos os indivíduos que fazem uso da língua francesa enquanto língua materna, segunda língua, língua de comunicação ou de cultura. Segundo Calvet (2007, p. 136), podemos considerar a francofonia como “uma realidade sociolinguística, produto da história – particularmente da história colonial – e um conceito geopolítico recente”. Isto é, a expressão francofonia está relacionada ao conjunto de diferentes povos que utilizam a língua francesa, por influência colonial, social ou política.

Além do conceito de francofonia, o conhecimento das ideias de representação social e linguística também será fundamental para a compreensão das propostas da pesquisa. Assim, faz-se relevante ressaltar o que nos afirma Sêga (2000), a representação social é a representação de objetos ou de pessoas. Ela não representa a transcrição real e ideal, mas é o processo pelo qual é estabelecida a relação entre o mundo e aquilo que o compõe. Sendo assim, os conceitos que formamos sobre alguém ou alguma coisa (lugar, objeto, etc.) são o resultado das representações que construímos. De acordo com Moscovici (1978, p. 26), “a representação social é uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos”. Portanto, as representações são os meios pelos quais estabelecemos conceitos, e tais conceitos influenciam nos nossos comportamentos, e na forma como nos relacionamos com os outros.

Sobre as representações linguísticas, devemos ressaltar que elas são consideradas como um conjunto de conhecimentos sociais compartilhados e elaborados, relativos à língua. Segundo Petitjean, (2009) “a representação linguística aparece como uma representação social verbalizada (...) ela se organiza de maneira coerente em torno de um princípio comum que aparece na característica fundamentalmente interativa da representação linguística” (PETITJEAN, 2009, p. 44, tradução nossa). Ou seja, ela é a representação social da língua, partilhada através da fala e de atitudes.

Todos esses conceitos ancoram uma análise que tem como ponto de partida o livro didático. Segundo Bergmann (2009), esse material “pode apresentar um papel ideal de simples orientador e guia do processo de ensino/aprendizagem da língua, mas também ocupa frequentemente uma posição central na aula de língua estrangeira” (BERGMANN, 2009, p. 49, tradução nossa). O livro didático é considerado um dos principais instrumentos do

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processo de ensino/aprendizado de língua estrangeira, sendo uma de suas funções oferecer informações de forma graduada para a produção de conhecimentos. Utilizamos, na presente pesquisa, textos teóricos e documentos que abordam esse tema, como, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM), e os teóricos Cuq e Cruca (2002), Choppin (2004) e Tagliante (2006).

Assim, o livro didático é o corpus de análise dessa pesquisa; mais especificamente, selecionamos, para análise, os livros Alter Ego plus A1e Alter Ego plus A2, além de materiais auxiliares (Xerox, apostila, etc.). Os livros Alter Ego plus A1 e A2 foram editados pela Hachette: Français Langue Étrangère e elaborados por Annie Berthet, Emmanuelle Daill, Catherine Hugot, Véronique M. Kizirian e Monique Waendendries, no ano de 2012. Esses manuais são direcionados a jovens/ adolescentes e a adultos. Os livros são usados na Graduação em Letras – Português/Francês da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Vale ressaltar, todavia, que existem diferenças no uso, já que a UFF adota o material em todos os períodos, e a UFRJ o utiliza apenas nos quatro primeiros semestres.

Analisamos também os materiais utilizados pelos professores dos sétimo e oitavo períodos de FLE da UFRJ. Tais materiais são elaborados de acordo com os objetivos, necessidades e interesses dos profissionais em questão. O curso de licenciatura em Letras – Português/Francês, dessa universidade, utiliza livro didático somente nos quatro primeiros períodos.

Esta pesquisa buscou observar como pode ocorrer a formação de representações da francofonia através do que é exposto aos alunos no processo de aprendizagem. Sendo assim, o trabalho soma-se ao conjunto de estudos dedicados a suscitar questões sobre representações sociais e linguísticas. De acordo com Sá (1998, p. 15), “o campo de estudo das representações sociais se encontra em franca expansão no Brasil não apenas no âmbito da psicologia social, mas também no de disciplinas aplicadas, como educação, enfermagem e serviço social”. É importante dizer que a noção de representação social tem sido privilegiada no campo da educação, e podemos citar Michel Gilly (1989) e seu trabalho sobre as representações do aluno pelo professor como uma referência. Devemos ressaltar que têm havido importantes discussões entre educadores e psicólogos sobre a aplicabilidade teoricamente fundamentada das representações no processo educacional. Dentre os principais profissionais, podemos citar Alves-Mazzatti (1994), no Rio de Janeiro, e Almeida (1994), em Brasília.

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O fenômeno das representações também tem despertado a atenção de educadores no âmbito do livro didático; um exemplo desse interesse é o 2º Congresso Europeu da FIPF (Federação Internacional dos Professores de Francês) que teve como título de um dos eixos temáticos: A imagem da francofonia em manuais de FLE: um recurso de motivação para a aprendizagem do francês?. Entre os trabalhos apresentados no evento, podemos citar como relevantes à nossa pesquisa os seguintes: a pesquisa de Leite (2010), que se dedica a analisar imagens e representações de negros em livros didáticos de História; a de Teixeira (2011), que trabalha com a representação social da branquidade em livros didáticos de História e língua portuguesa. Ambos os trabalhos são desenvolvidos em Curitiba. No âmbito da francofonia, destacamos o trabalho de Hongfeng (2010) com o título “Ensinar a Francofonia com que Manual?” (HONGFENG, 2010, tradução nossa), na China.

Os estudos sobre representações sociais nos ajudaram a desenvolver as ideias em torno do objetivo de investigar se os professores são preparados e capacitados para uma abordagem da diversidade linguística e cultural da francofonia e de que maneira, levando em consideração a formação de representações. A língua francesa, como se sabe, constitui o vínculo entre os setenta e sete países que fazem parte da Organização Internacional da Francofonia, por isso, consideramos as representações dos professores sobre a língua francesa e suas sociedades elementos fundamentais para uma postura de educadores conscientes da realidade e das diversidades francófonas. Acreditamos que o projeto possui relevância social no que tange à contribuição para o processo de formação de professores e suas práticas de ensino, tendo como alvo sujeitos sociais integrados ao ensino de FLE do ensino superior.

O objetivo geral deste trabalho consiste na análise de como as representações da francofonia podem ser construídas no processo de formação de professores de FLE através de materiais didáticos, direcionados para o ensino de FLE e utilizados em cursos de licenciatura de Instituições Federais de ensino superior do Rio de Janeiro. Para isso, a pesquisa se pautou em algumas preocupações, tais como:

 observar as variedades linguísticas nos materiais utilizados pelos alunos em formação;

 analisar as ideologias que promovem o aparecimento dessas variedades;  observar de que forma a francofonia é abordada e se ela está presente nesses

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 verificar as políticas linguísticas que englobam e promovem a formação de representações através de livros didáticos produzidos na França e utilizados em duas universidades do Estado do Rio de Janeiro;

 analisar se essas políticas estão envolvidas com a preocupação de transmitir uma francofonia que vai além do território Francês;

 analisar os efeitos das representações sociais e linguísticas da francofonia construídas durante o processo de formação desses futuros professores.

Tais objetivos serviram como mote para a elaboração da presente pesquisa, que, conforme já afirmamos, produz uma análise de dois materiais didáticos de FLE utilizados nos cursos de Letras da UFF e UFRJ. O capítulo seguinte explicita a metodologia por nós utilizada. Logo em seguida (capítulo 3), apresentamos os pressupostos teóricos base de nossas reflexões. No capítulo subsequente (capítulo 4), dissertamos brevemente acerca do conceito de francofonia, caro ao nosso trabalho. Em seguida (capítulo 5), trazemos as nossas análises. Ao fim (capítulo 6), apresentamos as considerações finais.

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2 METODOLOGIA

A presente pesquisa se organiza em torno da análise de corpus, que são os livros didáticos: Alter Ego plus A1 e A2, adotados pela UFF e pela UFRJ, questionários e entrevistas, tratando-se de uma análise interpretativa que teve como fonte de informações os elementos citados. O processo de investigação se deu através de observações desses materiais, para a constatação de como eles colaboram para a formação de representações da francofonia, em contraste com os dados retirados das entrevistas e questionários. Relatamos o desenvolvimento das investigações de acordo com as teorias que embasam a proposta de análise e também com outras leituras.

A pesquisa pode ser descrita através das seguintes etapas: 1- pesquisa bibliográfica; 2-leituras, resumos e fichamentos; 3- elaboração do questionário; 4- aplicação do questionário; 5- entrevistas; 6- análise dos materiais; 7- conclusão das análises.

Os livros didáticos analisados estão sendo utilizados em instituições de ensino superior do Rio de Janeiro. Por isso, foi relevante elaborar um questionário para professores em formação, atuantes como monitores em projetos de ensino de LE de suas universidades. Sendo assim, foram entrevistados dois alunos monitores do PROLEM (Programa de Línguas Estrangeiras Modernas da UFF) e do CLAC (Curso de Línguas Aberto à Comunidade da UFRJ), que estão em fase final para a conclusão da graduação. O questionário foi elaborado com perguntas que nos permitiram avaliar práticas, contribuições e eficácias da utilização de tais materiais, observando pontos negativos e positivos, de acordo com os objetivos deste projeto.

Fizemos uso também de entrevistas semiestruturadas, que possibilitaram uma conversa fluida, já que essa técnica demanda apenas uma lista de perguntas pré-organizadas, permitindo a reformulação e reelaboração de questões no momento da entrevista. Sá (1998) faz alusão a Abric (1994), que “considera o papel da entrevista em profundidade – amplamente privilegiada por Jodelet – na pesquisa das representações sociais”. Nas palavras do autor:

Por muito tempo considerava-se o questionário como principal instrumento de levantamento das representações, a entrevista em profundidade (mais precisamente a entrevista dirigida) constitui-se ainda, atualmente, um método indispensável em qualquer estudo sobre representação. (ABRIC, 1994 apud SÁ, 1998, p, 81).

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Podemos considerar a entrevista como uma ferramenta importante para o levantamento de dados que puderam nos levar a conclusões essenciais para o desenvolvimento da pesquisa. As conversas com os alunos ocorreram em suas universidades, na sala de aula ou no corredor, sem haver necessidade de marcação de horário para que as entrevistas pudessem acontecer. Ademais, no momento em que as realizamos, não houve qualquer interferência externa que pudesse atrapalhar os questionamentos e respostas, permitindo um diálogo eficiente para os objetivos da pesquisa.

É importante ressaltar que o questionário é uma forma impessoal de obter informações, isto é, a pessoa abordada responde questões num formulário sem contato nenhum com outra pessoa. E a entrevista, por sua vez, é uma técnica que se caracteriza pela forma de relacionamento humano com um contato direto, face a face, o que permite a reiteração das perguntas.

Para o desencadeamento e maior clareza de informações, se fez relevante a transcrição das entrevistas. Através do modelo Jefferson simplificado, tivemos a possibilidade de ler e produzir constatações, de forma mais aprofundada do que foi questionado e respondido na fase das entrevistas. Vale salientar que:

[...] uma transcrição no modelo Jefferson procura registrar as elocuções dos participantes tal qual foram produzidas (não negligenciando fenômenos como auto-interrupções, ocorrências de itens não-lexicais, inspirações e expirações audíveis, risos, cliques) e procurando indicar, também, marcações gerais de entonação na produção das elocuções. (LODER, 2008, p. 133).

De acordo com esse modelo, são transcritas não somente ações verbais, mas também atitudes que vão além das palavras, como situações de riso, de pausas para pensamentos, etc. Por isso, nas transcrições foram marcados os momentos de risos (com a palavra risos entre parênteses) e de interrupções na fala (com reticências).

Assim, além de contar com análises de materiais pedagógicos que compõem o corpus com base em preceitos teóricos, a pesquisa abarca também experiências dos envolvidos na utilização desses materiais, através de questionários e entrevistas, a fim de constatar comportamentos e compará-los com as análises.

O trabalho buscou refletir sobre a forma como é mostrada a francofonia em sala de aula, por meio da depreensão de informações relevantes que podem contribuir para a construção de representações da francofonia (social e linguística). Além disso, visou refletir também sobre os fatores que norteiam essa construção. As análises empreendidas nos possibilitou observar, com base nos estudos da teoria da Representação Social e da

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Sociolinguística, o modo como se abordou (quando se tratou) a pluralidade francófona no âmbito do processo de formação acadêmica de profissionais envolvidos com o ensino de FLE, tendo em vista os principais recursos pedagógicos utilizados por eles nesse percurso.

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3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

Neste capítulo, serão abordados os principais conceitos que embasam a pesquisa: língua, pluricentrismo linguístico, políticas linguísticas, representações sociais, representações linguísticas, ideologia, livro didático e francofonia. Tais conceitos são abordados ao longo do trabalho com o objetivo de buscar uma reflexão em torno do ensino de língua com foco na formação de professores de FLE, tendo em vista que é nesse processo em que se formam as representações. Entendemos que os materiais didáticos utilizados pelos professores são ferramentas que podem ou não favorecer o ensino e a aprendizagem que levam ao conhecimento e aceitação do que é a francofonia hoje, em seu sentido sociolinguístico.

3.1 Língua e variação sob a perspectiva da sociolinguística

A Sociolinguística pode ser compreendida como “uma área da Linguística que estuda a relação entre a língua que falamos e a sociedade em que vivemos” (COELHO, 2015, p. 12). Ela teve um impulso importante como teoria linguística na década de 1960, através dos estudos de William Labov, relacionados às mudanças em progresso na língua inglesa falada na ilha de Martha’s Vineyard e na cidade de Nova York. As referências mais antigas que deram início aos estudos sociolinguísticos, como nos afirma Lucchesi (2004), são os estudiosos Gauchat (1905) e Meillet (1920); o autor ressalta ainda que “o trabalho de Gauchat se destaca por ser o primeiro estudo que tomou como objeto a mudança linguística em progresso” (LUCCHESI, 2004, p. 166).

Com os estudos Sociolinguísticos, entendemos que a língua não é uma estrutura pronta, acabada, mas sim que ela varia, “e essa variação decorre de fatores que estão presentes na sociedade – além de fatores que podem ser encontrados dentro da própria língua” (COELHO, 2015, p. 130), isto é, a língua reflete a sociedade e os seus falantes; assim, um mesmo idioma pode apresentar diferentes formas de uso em diferentes países e grupos de falantes. O idioma Francês, por exemplo, é falado em vários lugares, mas não da mesma forma, pois, em cada região, e, mais, em cada grupo de falantes, ele possui suas peculiaridades, no que concerne ao léxico, à sintaxe, à fonética e etc.

É importante salientar que a teoria Sociolinguística diverge da visão Estruturalista Saussuriana no que tange à forma como devemos analisar o objeto língua, já que, para Saussure (2012 [1916]), a língua:

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É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos. (SAUSSURE, 2012 [1916], p. 41).

Ou seja, para ele, a língua compõe a linguagem e é usada a partir de um acordo entre indivíduos que estão inseridos na sociedade, porém, a atuação dos sujeitos falantes é limitada, já que não lhes é permitido modificar o sistema linguístico. Em relação a isso, o mestre genebrino afirma:

A parte social da linguagem, exterior ao indivíduo, que por si só, não pode nem criá-la nem modificá-criá-la; ecriá-la não existe senão em virtude de uma espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade. (SAUSSURE, 2012 [1916], p. 46).

Com a Sociolinguística, o objeto de estudo da Linguística deixou de ser um sistema autônomo e passou a ser o resultado de um processo histórico que demanda uma ligação entre sujeito, sociedade e língua. Isto é, essa teoria considera de forma diferenciada o objeto de estudo da Linguística, proposto por Saussure (2012 [1916]), pois, além de entender a língua como um sistema heterogêneo, para a Sociolinguística, o sistema está integrado à estrutura social. Nas palavras de Labov (2008), “a língua é uma forma de comportamento social”; “ela é usada por seres humanos num contexto social, comunicando suas necessidades, ideias e emoções uns aos outros” (LABOV, 2008, p. 215). Como nos afirma Coan e Freitag (2010):

A Teoria da Variação e Mudança Linguística (também chamada Sociolinguística Quantitativa ou Laboviana) tem como objeto de estudo a variação e mudança da língua no contexto social da comunidade de fala. A língua é vista pelos sociolinguistas como dotada de “heterogeneidade sistemática”, fator importante na identificação de grupos e na demarcação de diferenças sociais na comunidade. O domínio de estruturas heterogêneas é parte da competência linguística dos indivíduos. (COAN; FREITAG, 2010, p. 175).

Nessa teoria, o indivíduo social é capaz de se posicionar e atuar na estrutura da língua heterogênea. Lucchesi (2004) afirma que:

Essa capacidade de o falante lidar com a heterogeneidade linguística levanta uma outra questão que diferencia a abordagem sociolinguística da abordagem Estruturalista. Para Saussure, e para todo o estruturalismo, o falante tem um papel passivo diante da língua, a organização estrutural do sistema linguístico é concebida independentemente da ação do falante, da prática linguística ou das disposições estruturadas nas quais essa prática se efetiva. (LUCCHESI, 2004, p. 172).

De acordo com Lucchesi (2004), entendemos que o indivíduo é ativo na relação língua/sujeito. A seleção dos elementos linguísticos (presentes em um conjunto de

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possibilidades) feita pelo falante está relacionada “com a carga ideológica que cada uma das possibilidades expressivas possui, com o tipo de relação social que une o falante ao seu interlocutor, e ainda com o papel que o falante deseja desempenhar especificamente nesta interação” (LUCCHESI, 2004, p. 50). Dessa forma a Sociolinguística rejeita a limitação estabelecida pelo estruturalismo saussureano entre língua, sujeito falante e fatores sociais. Ela defende que tanto a criação, a conservação como a mudança “são determinadas pelas relações sociais que se estabelecem entre os indivíduos na sociedade” (LUCCHESI, 2004, p. 50). Além disso, podemos dizer que, para essa corrente:

Os fatores sociais devem, portanto, ser tomados em sua especificidade – particularmente a língua – consoante a teia de relações que neles se estabelecem; e analisados em sua dinamicidade, numa relação dialética entre o social e o individual. (LUCCHESI, 2004, p. 50).

Vemos, assim, que a língua deve ser analisada como um objeto dinâmico, acoplada ao social e ao individual de um sujeito que está inserido em uma comunidade linguística.

Ao considerar a língua como um sistema heterogêneo, a Sociolinguística nos possibilita considerar os fatores sociais relativos às mudanças na estrutura linguística. Tais fatores já não são mais observados como absolutamente distintos dos fatores presentes na estrutura da língua. Através do que Lucchesi (2004) salienta, vemos que a Sociolinguística advoga um modelo de verificação do sistema linguístico que consiste na observação e análise, considerando-o como um conjunto de regras e unidades variáveis, pois essa teoria vê a língua como o resultado de um contínuo processo de variação e mudança.

Entendemos que, pela concepção Estruturalista, o linguista deve analisar a língua como um sistema autônomo, um sistema unitário imposto na sociedade. Já na visão Sociolinguística, a língua deve ser depreendida “como um sistema socialmente determinado, um sistema heterogêneo, cuja variação estrutural está relacionada às alterações dos padrões culturais e ideológicos” (LUCCHESI, 2004, p. 187). Com isso, podemos afirmar que:

Os procedimentos da linguística descritiva se fundamentam na concepção de língua como um sistema autônomo – ou um sistema unitário que se impõe a todos os membros da comunidade de fala. Entretanto, estudos mais acurados do contexto social em que a língua é usada mostram que muitos elementos da estrutura linguística estão envolvidos numa variação sistemática que reflete tanto mudanças temporais quanto processos sociais extralinguísticos. (LABOV, 1972 apud LUCCHESI, 2004, p. 187).

Desse modo, reiteramos que o Estruturalismo saussureano e a Sociolinguística laboviana conceitualizam o objeto língua de formas diferentes; como vimos, enquanto o

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Estruturalismo Clássico analisa a língua considerando-a como um sistema imutável, homogêneo e autônomo, a Sociolinguística Variacionista observa a língua como um sistema heterogêneo e variável, o que implica na escolha de cada linguista na forma como deverá analisar este objeto linguístico.

Para a compreensão dos estudos Sociolinguísticos, que nos interessam, particularmente, em nosso trabalho, alguns termos são fundamentais, dentre eles, estão: variação, variedade, variável, variante e norma.

A palavra “variação” é entendida como “o processo pelo qual duas formas podem ocorrer no mesmo contexto com o mesmo valor referencial/representacional, isto é, com o mesmo significado” (COELHO, 2015, p. 16). Isso quer dizer que, em um mesmo idioma podemos encontrar o mesmo significado em diferentes formas. Coelho (ibidem) afirma o seguinte:

A variação é inerente às línguas, e não compromete o bom funcionamento do sistema linguístico nem a possibilidade de comunicação entre os falantes – o que podemos perceber quando observamos que as pessoas à nossa volta falam de maneiras diferentes, mas sempre se entendo perfeitamente. (COELHO, 2015, p. 16).

Vemos que em toda língua existe variação, o que acarreta diferenças em traços linguísticos entre grupos de uma mesma sociedade e entre os diferentes países que falam a mesma língua.

Com relação ao termo “variedade”, segundo Coelho (2015, p. 14) ele pode ser definido como “fala característica de determinado grupo”. Assim, no âmbito do Francês, temos a variedade quebequense, francesa, haitiana, etc.; além disso, dentro de cada país, a língua apresenta suas variedades internas, que são caracterizadas pelas diferenças regionais. Essas diferenças se estendem ao falante. Dessa forma, consideramos também a variedade dos falantes que podem ser mais ou menos escolarizados, jovens ou anciões, homens ou mulheres.

Sobre os termos “variável” e “variante”, Monteagudo (2011) diz que:

O fenômeno da variação manifesta-se na existência de variáveis, isto é, de unidades de qualquer plano do sistema gramatical (fônico, morfológico, sintático...) que apresentem realizações diferentes. Cada uma dessas possíveis realizações representa uma variante. Por conseguinte, uma variante é um elemento linguístico que se encontra em concorrência com outro ou outros, representando cada um deles realizações alternativas de uma mesma unidade; o conjunto das variantes constitui tal unidade (a variável). Existem variantes analisáveis em termos gramaticais, como, por exemplo, as realizações de um fonema condicionado pelo contexto fonético. (MONTEAGUDO, 2011, p. 19).

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Assim, entendemos que a variação ocorre a partir da existência de variáveis, que são os traços característicos de diferenças, opondo-se a outros que possuem o mesmo significado, e que consequentemente dão existência a variantes ou variedades.

Cada variedade possui normas de uso. Sendo assim, é necessário saber que, para a Sociolinguística, a “norma designa o conjunto de fatos linguísticos que caracterizam o modo como normalmente falam as pessoas de uma certa comunidade” (FARACO, 2008, p. 40-41); além disso, “ela é também (e principalmente) um agregado de valores socioculturais articulados com aquelas formas” (idem, ibidem). Observamos que uma norma linguística é o resultado de valores sociais correspondentes a determinados grupos. Assim, a norma compreende formas estruturais linguísticas e traços socioculturais.

Podemos afirmar que uma língua é constituída por diversas normas, já que uma sociedade é formada por várias comunidades. Sobre isso Coelho (2015) diz que:

Numa sociedade há inúmeras normas linguísticas, que caracterizam as diferentes comunidades rurais, as normas vernaculares, as dos grupos de letrados, aquelas que caracterizam os grupos jovens, as que identificam as populações de periferias urbanas, as norma de adolescentes urbanos, etc. Como os falantes podem pertencer a várias dessas comunidades. (COELHO, 2015, p. 139).

Isto é, a norma está associada ao uso, à maneira como a língua é utilizada. Sabendo-se que a língua é heterogênea, em consonância com a diversidade social, é possível afirmar que existem, então, diferentes tipos de norma, que podemos denominar de variedades. Desse modo, é importante levarmos em conta dois tipos importantes de norma para os estudos Sociolinguísticos, que são: a norma culta (conjunto de variedades cultas) e a norma padrão (conjunto de variedades padrão).

Para Faraco (2008, p. 73), norma padrão é “uma codificação relativamente abstrata, uma baliza extraída do uso real para servir de referência, em sociedade marcada por acentuada dialetação, a projetos políticos de uniformização linguística”. Sobre norma culta o autor afirma que, ela “designa o conjunto de fenômenos linguísticos [variáveis] que ocorrem habitualmente no uso dos falantes letrados em situações mais monitoradas de fala e escrita” (FARACO, 2008, p. 71).

Ainda é importante apontar que, habitualmente, os indivíduos associam o prestígio social à norma culta, o que dá lugar a mescla entre os valores sociais da norma culta e a língua, através do imaginário dos falantes. Entretanto, Coelho (2015, p. 141) afirma que, “a língua não se constitui apenas por um conjunto de variedades de prestígio, mas é sempre heterogênea”. Isto é, as tentativas de transformar uma única forma padrão na norma culta ou

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de prestígio são vãs, pois a heterogeneidade característica da língua descarta qualquer possibilidade de homogeneização.

3.2 Pluricentrismo linguístico

A presente pesquisa observa a língua francesa do ponto de vista da sua heterogeneidade, ou seja, parte da premissa de que essa língua porta uma dinamicidade muito mais abrangente do que a que é exposta em livros didáticos ou compreendida pelos indivíduos. Por isso, consideramos os preceitos Sociolinguísticos vistos na seção anterior como base de nossas análises. Tal caráter heterogêneo pode ser exemplificado pelas características que norteiam o francês:

Dependendo das referências adotadas, a língua francesa é falada por 200 milhões de pessoas, segundo os cálculos do Alto Conselho da Francofonia, por 250 milhões “como língua primeira ou segunda”, segundo Jacques Attali, por 300 milhões segundo o diplomata francês Jean-François de Raymond. Ela pertence ainda à lista das dez línguas mais faladas no mundo. Como demonstra a geografia física da comunidade, essa última engloba o planeta e, consequentemente, a língua francesa é falada e ensinada em todos os continentes. (ROY, 2010, p. 143).

Roy (2010) afirma ainda que o idioma francês possui o status de língua oficial em quase 30 países, em quatro instituições (União Europeia, União Africana, Organização dos Estados Americanos e no interior da Organização das Nações Unidas). Dado isso, entendemos que a língua francesa pode ser caracterizada como pluricêntrica.

O pluricentrismo corresponde a uma língua com várias versões padrão. Isto é, uma língua com vários centros que oferece uma variedade nacional, com as suas próprias normas. Essas normas correspondem a estados nacionais delimitados por suas próprias fronteiras, de maneira que os seus falantes possuem identidades culturais diferentes, mesmo se reconhecendo todos eles num idioma “comum”, compartilhado com os cidadãos de outros estados nacionais. O mesmo não acontece com as línguas monocêntricas. Exemplo disso é o japonês, que possui apenas uma forma padrão.

Os estudiosos em Linguística com foco na diversidade entendem que “a ideia de ‘uma-nação-uma-língua’ é tão inverossímil quanto a bem conhecida concepção idealista de Chomsky de uma comunidade linguística homogênea” (SILVA, 2011, p. 13). Segundo Silva (2011), o pluricentrismo linguístico é um fenômeno generalizado, já que muitas línguas,

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como: o inglês, português, alemão, podem ser vistas como pluricêntricas por apresentarem variedades nacionais distintas e normatizadas. Silva (ibidem) afirma ainda que:

[...] todas as línguas são, até certo ponto, “pluricêntricas”, na medida em que contêm variação dialetal e diferentes normas locais. O pluricentrismo é, pois, um caso especial de variação linguística interna, marcado por questões de identidade e poder nacionais. (SILVA, 2011, p. 13).

Ou seja, um idioma caracterizado pela variação externa (entre países ou comunidades) e interna (dentro de determinados centros), pode ser considerado pluricêntrico, e é marcado por questões identitárias e nacionais.

Vale ressaltar que o precursor dos estudos de pluricentrismo linguístico é o estudioso Michael Clyne, com a obra intitulada Pluricentric Languages: Differing Norms in Different Nations (1992). O volume coletivo agrupou “dados comparativos sobre um conjunto representativo e diversificado de 17 línguas pluricêntricas espalhadas pelo mundo e pertencentes a diferentes famílias linguísticas” (SILVA, 2011, p. 13). Assim, o estudo de Clyne (1992) é considerado não só como obra institucionalizadora de investigações no âmbito das línguas pluricêntricas como também uma referência para estudos de variedades nacionais. Silva (2011) ressalta que, com os estudos de Clyne:

Passa-se de um modelo “desvio do centro”, que via as restantes variedades nacionais como desvios da norma linguística pertencente à nação historicamente mais antiga ou política e economicamente mais poderosa, ou as colocava ao mesmo nível das variedades dialetais locais, para um modelo “vários centros iteractuantes” ou pluricêntrico, interpretando a relação entre as variedades nacionais como um processo dinâmico e interativo. (SILVA, 2011, p. 13).

Compreendemos que, a partir desse momento, passou-se a dar mais visibilidade aos outros centros, levando em consideração não somente a variedade pertencente à nação histórica ou com maior status político, econômico e social.

O fenômeno do pluricentrismo linguístico é um campo pouco explorado pelos sociolinguistas ou estudiosos de linguística, no geral. Silva (2011) diz que:

Não obstante a extensão e generalização do fenômeno sociolinguístico do pluricentrismo e os relevantes contributos e perspectivas para o seu estudo, a investigação do pluricentrismo linguístico é ainda bastante reduzida, e, por vezes, ainda marcada por uma visão monocêntrica idealista e até ideológica. A própria expressão “línguas pluricêntricas” é pouco conhecida. (SILVA, 2011, p. 14).

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Isto é, as investigações linguísticas que se baseiam na concepção de pluricentrismo linguístico possuem uma visão debruçada na heterogeneidade, divergindo-se das ideias homogêneas e singulares em torno da linguagem. É importante ainda afirmar que são três os conjuntos de investigação no âmbito do pluricentrismo linguístico: questões descritivas e metodológicas, questões representacionais e questões aplicacionais. De acordo com Silva (2011):

Entre as questões descritivas e metodológicas, importa investigar quão pluricêntrica é determinada língua, quais são os indicadores de pluricentrismo linguístico, até que ponto os indicadores lexicais, construcionais e fonológicos de variação pluricêntrica se correlacionam e quais os métodos empíricos capazes de dar conta da multidimensionalidade da variação nacional e da interrelação entre as dimensões socioculturais e as dimensões cognitivas do pluricentrismo. (SILVA, 2011, p.14).

Ou seja, indagações no campo descritivo e metodológico buscam observar o nível de pluricentricidade de uma língua através de dados linguísticos, que levam à compreensão da diversidade sociolinguística. Sobre as questões específicas, Silva (ibidem) afirma que as questões descritivas e metodológicas:

Têm a ver com a formação das variedades nacionais, em particular as razões e condições de codificação de variedades nacionais, e as condições de promoção de um pluricentrismo mais ou menos simétrico; convergência e divergência entre variedades nacionais e estratificação interna de variedades nacionais; e ainda conflitos, competição e cooperação entre variedades nacionais, com incidência nas questões de identidades nacionais e nas relações de poder entre variedades dominantes e não dominantes. Uma oura questão é saber quais as consequências linguísticas do contato entre variedades nacionais e que impacto pode ter o pluricentrismo na mudança linguística. (SILVA, 2011, p. 14).

Dessa forma, essa outra possibilidade de investigação analisa as relações entre as variedades nacionais, suas condições de existência, tendo como uma de suas preocupações as consequências do contato entre variedades nacionais. Sobre as questões representacionais, o autor afirma que:

[...] incidem sobre como é que os falantes percebem as variedades nacionais e como as avaliam e que modelos cognitivos e culturais utilizam para categorizar e avaliar diferenças linguísticas nacionais e locais. Interessa também investigar que papel desempenha a ideologia nas representações cognitivas das variedades nacionais, até que ponto o pluricentrismo é aceito, como se manifestam as atitudes de purismo e de independentismo linguístico e que consequências têm no desenvolvimento das variedades nacionais e como diferem as atitudes linguísticas nos diversos centros dominantes e não-dominantes de uma língua pluricêntrica. (SILVA, 2011, p. 14).

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Compreendemos que, as questões representacionais fazem parte de estudos que abrangem o comportamento dos indivíduos com relação às variedades nacionais, tendo em vista as ideologias que orientam seus comportamentos em torno da aceitação do pluricentrismo. Por último, Silva (ibidem) fala sobre as questões aplicacionais, afirmando que:

Envolvem aspectos de política de língua, de planejamento e normatização linguísticos e de ensino/aprendizagem de línguas. É necessário discutir e estabelecer políticas de língua para as línguas pluricêntricas, fomentando a cooperação entre os centros nacionais e, desse modo, construindo políticas bilaterais ou multilaterais. (SILVA, 2011, p. 14, 15).

Entendemos, a partir de tais considerações, que os estudos aplicacionais questionam sobre as políticas linguísticas que envolvem a relação entre os centros e a manutenção de cada variedade.

Kloss (1976) é considerado o precursor do termo “línguas pluricêntricas”, o estudioso utilizou esse conceito para “denotar línguas com diferentes centros interativos, cada um com diferentes variedades nacionais codificadas em normas” (SAVEDRA, 2015, p. 149). Clyne (2004) afirma que:

Qualquer variedade nacional ou qualquer língua pluricêntrica é uma língua potencialmente separada, distinta, e que no que se refere ao status linguístico, muitas variedades de línguas pluricêntricas foram declaradas línguas independentes, de acordo com princípio de Ausbau. (CLYNE apud SAVEDRA, 2011, p. 150).

O autor salienta ainda que “o termo variedade nacional não pode ser confundido com variedade regional, pois suas funções de uso são diferentes” (CLYNE, 2004 apud SAVEDRA, 2011, p. 150), já que a nacional é usada para fazer referência ao modo padrão/standard (norma) e a regional para fazer alusão ao não padrão/standard.

Clyne (2004, apud SAVEDRA, 2015, p. 151) afirma que existem diferentes motivos que fazem com que uma língua possa chegar a ser pluricêntrica. Alguns deles são: colonização, imigração, redesenho histórico de fronteiras e divisões políticas. Ele considera também a existência de variedades pós-coloniais ou “variedades nativizadas” da língua, além das variedades de imigrantes. Sendo assim, podemos afirmar que muitas línguas podem ser consideradas pluricêntricas, tendo em vista que “suas variedades nacionais refletem identidades distintas” (SAVEDRA, 2015, p. 151).

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3.3 Políticas Linguísticas

É importante salientar que as práticas de políticas linguísticas fazem parte da história da humanidade, porém a intervenção na língua só se tornou objeto de reflexão no campo de estudo da linguagem recentemente. Segundo Calvet (2007):

A intervenção humana na língua ou nas situações linguísticas não é novidade: sempre houve indivíduos tentando legislar, ditar o uso correto ou intervir na forma da língua. De igual modo, o poder político sempre privilegiou essa ou aquela língua, escolhendo governar o Estado numa língua ou mesmo impor à maioria a língua de uma minoria. (CALVET, 2007, p. 11).

Conforme Calvet (ibidem), essas intervenções são práticas antigas e o estudo linguístico de tais ações envolve a conceitualização de dois termos, que são: política linguística e planejamento linguístico. Alguns teóricos se empenharam na busca pela definição dessas terminologias, dentre eles destacam-se Louis-Jean Calvet, Robert Chaudenson e Robert L. Cooper.

Segundo Calvet (2007, p. 11), podemos considerar a política linguística como a “determinação das grandes decisões referentes às relações entre as línguas e a sociedade”, e o “planejamento linguístico” pode ser visto como a implementação dessas decisões. Assim ambos os conceitos, na prática, são inseparáveis.

O processo histórico do surgimento desse campo de estudo está ancorado na primeira aparição do sintagma planejamento linguístico, no momento em que Einar Haugen utilizou a expressão “language planning”, em 1959, em um trabalho que tratava dos problemas linguísticos da Noruega; “o autor procurava mostrar nesse trabalho a intervenção normativa do Estado (por meio de regras ortográficas, por exemplo)” (CALVET, 2007, p. 12). Isso ocorreu na tentativa de elaborar uma identidade nacional pós-colonização dinamarquesa. Assim, podemos observar que esse campo surgiu em torno dos processos de descolonização.

Os estudos nesse campo continuaram através de investigações de teóricos como: J. Rubin, J. Das Gupta, B. Jernudd, J. Fishman e C. Fergunson; “temos aqui o 'bando dos cinco' anglófonos que permaneceriam, durante anos, no centro da reflexão sobre políticas linguísticas, e os temas difundidos pelos anglófonos foram abordados também por pesquisadores francófonos, germanófonos e hispanófonos” (CALVET, 2007, p. 14).

O progresso dos estudos no âmbito do planejamento linguístico é caracterizado pela elaboração e publicação da coleção Contributions to the Sociology of Language, organizada

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por Fishman. Em paralelo a esse acontecimento, a noção de política linguística foi difundida em pesquisas realizadas em (e sobre) várias línguas. De acordo com Calvet (2007):

Em todos os casos e em todas as definições, as relações entre política linguística e o planejamento linguístico são relações de subordinação: assim, para Fishman, o planejamento é a aplicação de uma política linguística, e as definições posteriores, em sua variedade, não ficarão muito longe dessa visão. (CALVET, 2007, p. 15). Durante o processo de evolução desses estudos, o termo aménagement linguistique apareceu como preferência de alguns estudiosos quebequenses em comparação ao termo planejamento linguístico, considerado por Calvet (2007, p. 16) “uma questão de embalagem: apresenta-se o mesmo produto com outro nome”. Chaudenson (1996, p. 116), ao suscitar questionamentos sobre o surgimento do termo aménagement linguistique, afirma que essa expressão foi uma tentativa de “procurar um termo francês que pudesse ser substituído por 'language planning', utilizada na literatura especializada em inglês”. Segundo o autor, a palavra “aménagement” tem “uma evidente conotação reformista” (CHAUDENSON, 1996, p. 116, tradução nossa).

Chaudenson (1996) tornou-se uma grande referência no âmbito dos estudos de política linguística, definindo os seguintes conceitos: política linguística, planificação linguística e reforma linguística. Para ele, a “política linguística” consiste em “tomar as decisões maiores, supranacionais (como o reconhecimento da pluralidade das línguas dentro do espaço francófono) ou nacionais”; a “planificação linguística”, por sua vez:

Implica a definição precisa das modalidades e prazos de realização dos objetivos definidos pela política em função das realidades e meios econômicos e humanos com os quais podemos efetivamente dispor. (CHAUDENSON, 1996, p. 116, tradução nossa).

Com isso, uma planificação linguística demanda solucionar adversidades através de um conjunto de objetivos que são delineados pela política em vigor. E o “aménagement linguistique” (reforma linguística, em tradução livre) é “a aplicação concreta, necessariamente diferenciada e adaptada, das ações definidas no quadro da política” (CHAUDENSON, 1996, p. 116). Nesse caso, o “aménagement linguistique” é a realização das estratégias traçadas pelos responsáveis políticos.

Calvet (2007) nos chama a atenção para o fato de que, para que haja uma intervenção na língua, é necessário uma “situação sociolinguística (S1)” – não satisfatória -, e uma “situação que se deseja alcançar” (S2). Segundo ele, “a definição das diferenças entre S1 e S2 constitui o campo de intervenção da política linguística, e o problema de como passar de S1

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para S2 é o domínio do planejamento linguístico” (CALVET, 2007, p. 61). Assim, entendemos que uma dada situação problema inicial (S1) é identificada através de dados sociolinguísticos, obtidos por descrições e verificações das situações sociolinguísticas. A partir dessas constatações, é necessário saber como será feita a intervenção na situação S1, para alcançar a situação S2. Dessa maneira, são utilizados o que Calvet (2007, p. 62) denomina de “equipamento das línguas”, que são os seguintes: a escrita, o léxico, a padronização (tornar uma variedade padrão em relação às outras possibilidades).

As ações sobre a língua propostas por uma política linguística podem ter vários objetivos, dentre eles estão os citados por Calvet (2007, p. 87): “fixação de uma escrita, enriquecimento do léxico, luta contra as influências estrangeiras (“purificação”), padronização” , ou ainda, promoção, difusão internacional, administração do “status e as funções sociais das línguas em presença” (CALVET, 2007, p. 117). Assim sendo, a Política Linguística entende que as intervenções na forma da língua são ações no corpus, e as atitudes relacionadas ao estado da língua são ações no status.

É sabido que as línguas são o resultado de transformações ocorridas desde o surgimento da humanidade, ou seja, fruto de um longo processo histórico, baseado em ações humanas ou sociais sobre esse objeto. Por isso, Calvet (2007, p. 68) afirma que, “as línguas sempre mudaram, porém, mudaram de outra maneira: sem intervenção do poder, sem planejamento”. Ou seja, as línguas sempre foram influenciadas por práticas sociais. Tais interferências na língua são denominadas de gestão in vivo, elas estão relacionadas às formas como os indivíduos resolvem os conflitos linguísticos do cotidiano. Todavia, os problemas enfrentados pelo plurilinguismo podem apresentar também soluções oriundas de um poder político, chamadas de gestão in vitro. De acordo com Calvet (2007):

Ao contrário da gestão in vivo, na qual a mudança se propaga na prática dos falantes por uma forma de consenso que é necessário estudar com precisão, a gestão in vitro deve, por sua vez, se impor aos falantes e, para isso, o Estado dispõe essencialmente da lei. (CALVET, 2007, p. 74,75).

Com essa afirmativa, verificamos que as ações da gestão in vitro são imposições de determinadas autoridades políticas, já que os mesmos possuem o poder de colocá-las em prática, e, para isso, é feito o uso de uma ferramenta fundamental, a lei. Calvet (2007) afirma:

O que é certo é que os Estados intervêm frequentemente no domínio linguístico, [...] mas eles intervêm de fato nos comportamentos linguísticos, no uso das línguas. Isso ocorre porque as políticas linguísticas são geralmente repressoras e precisam, por essa razão, da lei para se impor: não existe planejamento linguístico sem suporte

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O autor complementa:

Há, de fato: [...] As leis que se ocupam da defesa das línguas, seja para assegurar-lhes uma promoção maior (internacional, por exemplo), seja para protegê-las como se protege um bem ecológico. (CALVET, 2007, p. 76).

Com base na afirmação do autor, entendemos que o Estado pode dotar-se de uma política linguística buscando diferentes propósitos, dentre eles a promoção internacional, o que é o caso da França. Nesse caso, trata-se de um país que busca manter o seu status político, econômico, cultural e social, em âmbito mundial. Portanto, as leis auxiliam na administração da língua. Para finalizar este tópico, é importante salientar que:

Seja para equipar as línguas, intervir no ambiente linguístico ou para legislar, o planejamento linguístico constitui in vitro uma espécie de réplica dos fenômenos produzidos continuamente in vivo. A linguística nos tem ensinado que as línguas não podem ser decretadas, mas que são produtos da história e da prática dos falantes, que elas evoluem sob a pressão de fatores históricos e sociais. (CALVET, 2007, p. 85).

Ou seja, os fatores sociais e históricos são responsáveis pelo desenvolvimento e evolução da língua, no entanto as mudanças ocorridas ao longo do tempo são controladas por autoridades responsáveis que legislam em favor do que acham conveniente. Assim, o que acontece in vivo é reafirmado in vitro pelo poder político.

3.4 Representações, ideologias e ensino

Nesta parte do trabalho, introduzimos uma breve explicação de alguns conceitos implicados na pesquisa e que utilizamos na análise dos dados.

3.4.1 Livro didático, ensino e formação de professores

Neste trabalho, consideramos que o livro didático tem um poder e uma função fundamental para o processo de ensino e formação de professores. Choppin (2004) afirma que:

[...] o livro didático não é um simples espelho: ele modifica a realidade para educar as novas gerações, fornecendo uma imagem deformada, esquematizada, modelada, frequentemente de forma favorável; as ações contrárias à moral são quase sempre punidas exemplarmente; os conflitos sociais, os atos delituosos ou a violência cotidiana são sistematicamente silenciados. (CHOPPIN, 2004, p.557).

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Isto é, esse elemento pedagógico transmite uma determinada imagem da realidade, o que nos leva a indagar sobre como isso acontece, no âmbito das representações da francofonia, nos manuais de FLE.

Podemos entender o livro didático “como um roteiro para o ensino, um ponto de referência para o docente planejar as aulas” (BOHUNOVSKY, 2009, p. 31). Ele é considerado a base do trabalho em sala de aula. Com relação aos seus conteúdos, Paraguai e Pereira (2012) dizem o seguinte:

Constata-se que a maioria dos livros didáticos de Francês Língua Estrangeira (FLE) prioriza as questões referentes à França e, se abordam aspectos referentes a outros países francófonos, o fazem de modo menos profundo. Além de abordarem a cultura como um conjunto fixo de informações sobre peculiaridades do cotidiano e estereótipos dos falantes de francês. (PARAGUAI; PEREIRA, 2012, p. 35).

Todas essas afirmações nos levam a pensar nos motivos pelas quais os livros didáticos se limitam a apresentar somente a França, e que questões políticas podem atuar como responsáveis pela valorização de uma única variedade linguística, o que leva a um conhecimento restrito da diversidade da sociedade francófona pelos professores em formação.

Sabemos que a língua francesa é falada em diversos países, por isso ela é partilhada por diferentes povos e civilizações. Impõe-se em nosso trabalho, a partir disso, a questão a respeito da maneira como essa diversidade cultural deve ser abordada na aula de FLE, objetivando-se colocar em evidência o que as diferentes culturas francófonas têm em comum e também em que pontos elas divergem. Cabe-nos, então, investigar como os professores são preparados e capacitados para uma abordagem da diversidade linguística e cultural da francofonia e avaliar a influência da utilização do livro didático para tal preparação e capacitação. De acordo com Cuq e Gruca (2002):

Em situação de aprendizagem de uma segunda língua, os professores têm suas próprias representações mais ou menos positivas sobre a língua que eles ensinam, e devem levar em conta as de seus alunos. [...] Em conclusão, podemos dizer que, mais do que a qualidade de nativo ou não-nativo, é a natureza das representações, o nível sócio-econômico, o grau de segurança linguística e cultural e a qualidade da formação inicial e continuada que determinam a qualidade da postura no ensinamento. (CUQ; GRUCA, 2002, p. 144).

Cuq e Gruca (ibidem) afirmam que os professores, quando estão em momento de prática de ensino, possuem suas representações formadas sobre a língua que estão ensinando, ou seja, após a etapa de formação docente, o professor já tem ideias e pensamentos elaborados

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sobre o objeto de ensino (a língua) e a sociedade. Além disso, os autores asseguram que a qualidade da formação inicial e continuada dos professores é determinante para a qualidade da postura do professor no ensino.

Para complementar as ideias de Cuq e Gruca (2002), é importante dizer que, de acordo com as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM), o professor tem o dever de conscientizar os aprendizes da existência de outras variedades, além da que é utilizada por ele em sala de aula.

É claro que o fato de o professor empregar uma variedade qualquer não o exime do dever de mostrar aos alunos que existem outras, tão ricas e válidas quanto a usada por ele, e, dentro do possível, criar oportunidades de aproximação a elas, derrubando estereótipos e preconceitos. Nesse sentido, o papel de professores passa a ser quase o de articuladores de muitas vozes. (OCEM, 2006, p. 136).

Ou seja, deve ser exigido do professor um poder de “articulador de muitas vozes”, em que ele seja capaz de orientar seus alunos na existência e no uso dessas variedades linguísticas pertencentes à língua de ensino, nesse caso, o francês. As OCEM afirmam também que:

O fundamental, portanto, em que pese a impossibilidade de abarcar toda a riqueza linguística e cultural do idioma, é que, a partir do contato com algumas das suas variedades, sejam elas de natureza regional, social, cultural ou mesmo de gêneros, leve-se o estudante a entender a heterogeneidade que marca todas as culturas, povos, línguas e linguagens. (OCEM, 2006, p. 137).

Entendemos que é papel do professor levar o estudante a compreender a heterogeneidade que marca as sociedades, tanto no eixo regional, quanto nos eixos social e cultural.

Assim, podemos concluir que o processo de formação de professores tem um papel fundamental para o desenvolvimento de profissionais qualificados, cuja missão vai além de ensinar uma estrutura linguística, mas que envolve funções que exigem o conhecimento e a aceitação da heterogeneidade cultural, social e linguística da francofonia.

3.4.2 Representações sociais e linguísticas

Este trabalho não lida, exclusivamente, com representações sociais, mas faz uso do conceito para as análises dos livros didáticos e das entrevistas.

Referências

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