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Formação inicial de professoras mediada pela escrita e pela analise de narrativas sobre operações numericas

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Academic year: 2021

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DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORAS MEDIADA PELA

ESCRITA E PELA ANÁLISE DE NARRATIVAS SOBRE

OPERAÇÕES NUMÉRICAS

MARIA AUXILIADORA BUENO ANDRADE MEGID

Orientador: Prof. Dr. DARIO FIORENTINI

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Para meus três eternos amores, Jorge,

Cristiane e Daniele, pelo manancial inesgotável

de carinho, amor e companheirismo manifestado

em presença, atenção e apoio constantes.

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QUERO AGRADECER...

São muitas as pessoas que tornaram possível a realização desse trabalho. Já

inicio desculpando-me se injustamente esquecer de alguém.

Agradeço a Deus pelo Seu amor manifestado em minha vida através da presença

de tantas pessoas que comigo caminharam neste percurso.

Ao professor Dario Fiorentini, que aceitou a tarefa de acompanhar-me nesta fase

acadêmica e contribuiu, com suas orientações seguras, para a realização deste trabalho.

Às alunas da turma de Ensino-Aprendizagem de Matemática A de 2007,

provocadoras da minha prática docente. Todas e cada uma de vocês foram fundamentais

para a realização deste trabalho. Também a Camila, monitora da disciplina pela

parceria e companheirismo durante a coleta de dados..

Aos professores membros da banca de qualificação, Adair M. Nacarato, Maria

Teresa M. de Freitas e Sérgio Lorenzato, pelas valiosas contribuições por ocasião da

primeira leitura que fizeram. Também à professora Anna Regina L. de Moura, que

aceitou fazer parte desta importante etapa da minha formação acadêmica.

Às professoras Dione L. de Carvalho e Mônica Villarreal, as pós-graduandas

Marisol e Adriana e demais colegas do PRAPEM (Prática Pedagógica e Educação

Matemática), pela leitura minuciosa e pelas contribuições oferecidas quando da

pré-qualificação no grupo.

Aos amigos do GEPFPM — Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Formação de

Professores de Matemática — Carmen, Regina, Rosana, Renata, Adair, Dario, Liliam,

Ronaldo, Marisol, Dione, Maria Teresa, pelo incentivo e presença constantes.

Aos professores das diferentes disciplinas cursadas durante a pós-graduação, pela

coerente interlocução durante os estudos e trabalhos desenvolvidos. De maneira especial,

ao prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado.

Às queridas amigas, Irani, Cláudia, Cléo, Rut, Juliana, Graça, Geisa, Celi,

Marisol e Renata, que de perto ou não de tão perto me incentivaram, sobretudo nos

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Aos amigos: Hilário e Dorô, M. Helena e Ivan, Sérgio e Cacá, pela acolhida

constante e madura e pelas palavras coerentes e animadoras.

À minha família, minha mãe e minhas irmãs, Rê e Malu, de maneira especial, e ao

meu pai, que agora se faz presente em outro plano.

Aos meus melhores amigos, os três pilares da minha vida: Jorge, Cristiane e

Daniele, os três em primeiríssimo lugar, meus amores, alimento da VIDA. E aos que se

agregaram a nós, Rafael e Guilherme, nossa família ampliada.

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RESUMO

MEGID, Maria Auxiliadora Bueno Andrade. Formação inicial de professoras mediada pela escrita e pela análise de narrativas sobre operações numéricas. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, UNICAMP, Campinas, 2009. (Orientador: Prof. Dr. Dario Fiorentini).

O trabalho apresenta um estudo sobre a formação inicial de professoras que ensinam matemática para os anos iniciais do ensino fundamental mediada pela escrita e pela análise de narrativas sobre as operações numéricas. Teve por objetivo analisar e interpretar como se dá o processo de aprendizagem profissional e de (re)significação do sistema de numeração decimal e das quatro operações aritméticas básicas em alunas de um curso de Pedagogia, bem como os indícios de mudança da relação com a matemática e seu ensino ao longo da experiência formativa, quando utilizados recursos das dinâmicas de cooperação e das narrativas. No percurso da pesquisa foram utilizados, entre outros autores, aportes teóricos de Josso (2004; 2006), Freitas (2006) e Suárez (2008) relativamente às narrativas e escritas de si, e de Fiorentini (2006) e Nacarato (2008) no que se refere aos conteúdos matemáticos e didático-pedagógicos. A coleta de dados teve por base as dinâmicas de cooperação (Alrø e Skovsmose, 2006), as práticas reflexivas exploratório investigativas e as escritas de narrativas pelas alunas. Os dados originaram-se de três fontes distintas: da professora-pesquisadora, das alunas, individualmente, e do grupo de alunas a partir dos trabalhos colaborativos realizados em duplas, pequenos grupos ou grupo-classe. Foram coletados por intermédio de registros escritos, diário de campo e gravações em áudio ou vídeo. As práticas em sala de aula centraram-se nas quatro operações aritméticas fundamentais: adição, subtração, multiplicação e divisão. Para cada uma delas ocorreram três etapas de trabalho: uma primeira, onde as alunas individualmente refletiam sobre a operação em pauta e registravam em seus cadernos as formas que utilizavam para realizá-las, utilizando o cálculo mental e algoritmos aprendidos na escola básica; uma segunda, onde em duplas ou pequenos grupos narravam às colegas seus procedimentos, elaborando um registro único do grupo; e uma terceira, com toda a turma, que envolvia a socialização dos diferentes registros, em que se buscava a reconstrução de estratégias utilizadas na realização das operações e também alternativas para o ensino de algoritmos convencionais ou não. As análises feitas apontam que os procedimentos utilizados auxiliaram na (re)significação de conceitos matemáticos e na construção de perspectivas pedagógicas para o ensino de Matemática nos anos iniciais. As aulas e o desenvolvimento da pesquisa explicitaram as incompreensões das alunas, permitindo a exposição de suas angústias e ansiedades, o que proporcionou a interlocução entre as vidas das alunas, de seus ambientes socioculturais e incentivou o processo de desnaturalização da transmissão dos algoritmos. Foi possível a percepção de que as operações matemáticas podem ser aprendidas a partir da utilização dos recursos do cálculo mental e da utilização das propriedades a elas relacionadas, mesmo que de forma intuitiva. Além disso, as narrativas aliadas às dinâmicas de cooperação potencializadas pelo diálogo mostraram-se ingredientes fundamentais no ambiente de ensino e aprendizagem. PALAVRAS CHAVE:

Formação de Professores; Operações Numéricas; Narrativas; Educação Matemática; Ensino Fundamental; Pedagogia.

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ABSTRACT

MEGID, Maria Auxiliadora Bueno Andrade. Initial formation mediated by writing and by the analysis of narrative on numerical operations. 2009. Thesis (Doctorate in Education ). Faculdade de Educação, UNICAMP, Campinas, 2009. (Tutor: Prof. Dr. Dario Fiorentini).

The paper presents a study of the initial development of teachers who teach Maths to the first years of elementary school mediated by written work and analysis of narratives on numerical operations. The objective was to analyse and interpret how the process of professional learning and that of re-significance of decimal numerical system and of the four basic arithmetical operations for students from a Pedagogy course takes place, as well as the signs of change related to Maths and its teaching throughout the formative experience, when resources of dynamics of narratives and cooperation are used. When researching, among many authors pointed out on this paper, there is theory by Josso (2004; 2006), Freitas (2006) and Suárez (2008) narratives and written work, and by Fiorentini (2006) and Nacarato (2008) referring to Maths and didactics-pedagogical contents. The collection of data was based on dynamics of cooperation (Alrø e Skovsmose, 2006), the investigative exploring reflexive practices and the written work of narratives by students. Data arose from three distinctive sources: researcher teacher, students, individually, and from the group of students as from the collaborative papers which were done in pairs, small groups or class group. Written field diary and audio and video recording were collected. The practice in the classroom was concentrated in four fundamental arithmetic operations: addition, subtraction, multiplication and division. For each one there three phases of work: a first one, with students reflecting individually about the operation and registering in their notebooks the ways they realized them, using the mental calculation and algorithms learned in elementary school; a second one, where in pairs, or small groups they narrated their procedures to their colleagues, elaborating a unique register of the group and a third one with all the group, which included the socialization of different registers, where there was the reconstruction of strategies used when realizing the operations and also alternatives for teaching conventional or non-conventional algorithms. The analyses point out that the procedures helped on (re)significance of Mathematics concepts and in the construction of pedagogical perspectives for teaching Maths in the first years. The classes and the development of the research explicited the lack of comprehension of the students, allowing the exposition of anguish and anxiety, which helped the interlocution among the students lives, their socio-cultural environment. Besides, it motivated the process of denaturalisation of transmission of algorithms. The perception that Maths operations can be learned by using mental calculations resources and the use of properties to them related, even if intuitively, was evident. Besides, the narrative aligned to dynamics of co-operations emphasized by the dialogues showed fundamental ingredients in the teaching and learning environment.

KEY WORDS:

Teachers Development; Numerical Operations; Narratives; Mathematics Education; Fundamental Teaching; Pedagogy.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Modelo de Cooperação Investigativa ... 35

Quadro 1 – Síntese das etapas e particularidades da pesquisa ... 49

Figura 2 - Esquema de triangulação de sujeitos e de fontes de informações ... 52

Figura 3 – Mapa sobre Contrato Didático ... 71

Figura 4 – Mapa do Currículo Oculto ... 72

Figura 5- Registro do grupo de Beatriz/Cíntia/Juliana/Tayná sobre o Trabalho com o Ábaco ... 79

Figura 6 - Registro do grupo de Bruna/Maria Salete/Viviane sobre o Trabalho com o Ábaco ... 80

Figura 7 - Registro do grupo de Andressa/Simone/Valéria Reis/Valéria Soffiatti sobre o Trabalho com o Ábaco ... 81

Figura 8 – Roteiro de Tarefa sobre Cálculo Mental ... 87

Figura 9 - Roteiro de atividades sobre a adição ... 95

Figura 10 - Narrativa do Grupo das Alunas Andressa, Maria Aparecida, Thaísa e Camila sobre o Material Dourado ... 106

Figura 11 - Roteiro de atividades sobre a adição, subtração e o ábaco ... 107

Figura 12 - Registro da Aluna Andréia sobre Operações com o Ábaco... 114

Figura 13 - Ficha roteiro de atividade sobre a multiplicação ... 121

Figura 14 - Registros da Aluna Tayná sobre a Multiplicação ... 122

Figura 15 - Registro do Grupo Tayná/Andressa/Andréia sobre a Tarefa de Multiplicação ... 123

Figura 16 - Cartaz do grupo Tayná/Andressa/Andréia sobre a Tarefa de Multiplicação. ... 124

Figura 17 - Registro de Monique sobre a Atividade de Multiplicação... 126

Figura 18 - Registro do grupo Bruna/Monique/Carolina sobre a Atividade de Multiplicação ... 127

Figura 19 - Registro do grupo Juliana/Geovana/Karina sobre a Atividade de Multiplicação ... 129

Figura 20 - Registro do cartaz do grupo Luciane/Valéria/Viviane sobre a Atividade de Multiplicação ... 130 Figura 21 - Cartaz do grupo Juliana/Juliana/Mônica/Sandra sobre a Atividade de

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Figura 22 - Registro do grupo Juliana/Geovana/Karina sobre a Atividade de Multiplicação ... 135 Figura 23 - Registro individual da Beatriz sobre a atividade da Multiplicação ... 137 Figura 24 - Registro do grupo Paula/Beatriz/Camila sobre a atividade de Multiplicação ... 138 Figura 25 - Registro de Andréia sobre a atividade de Multiplicação em seu caderno de memórias ... 141 Figura 26 – Roteiro para a atividade sobre a divisão... 146 Figura 27 - Cartaz do grupo Mônica/Monique sobre a atividade de Divisão ... 147 Figura 28 - Cartaz do grupo Caroline/Juliana/Valéria R. sobre a atividade de Divisão ... 148 Figura 29 - Cartaz do grupo Juliana/Juliana/Melissa sobre a atividade de Divisão ... 148 Figura 30 - Cartaz do grupo Camila/Tayná sobre a atividade de Divisão ... 149 Figura 31- Cartaz do grupo de Beatriz/Eliane/Geovana sobre a atividade de Divisão ... 154

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SUMÁRIO

RESUMO ... ix

ABSTRACT ... xi

APRESENTAÇÃO ... 1

I — PRINCÍPIOS E BASES DA PESQUISA E DA PRODUÇÃO DE SABERES DOCENTES: UM MOSAICO TEÓRICO ... 7

Construção de saberes docentes ... 8

Práticas reflexivas e exploratório-investigativas ... 9

A escrita de narrativas e as escritas auto-biográficas ... 15

A escrita e o conhecimento de sei ... 18

O conhecimento matemático articulado à escrita ... 22

Os algoritmos das operações aritméticas ... 25

O ambiente da pesquisa, o diálogo e a cooperação investigativa ... 32

O saber que se constrói na experiência ... 36

As interações durante as aulas ... 38

As palavras ditas e escritas ... 40

Aprender a partir da escrita e da participação ... 43

II — A ESCOLHA DOS CAMINHOS, DOS LUGARES E DAS COMPANHEIRAS DE VIAGEM ... 47

Processo de construção, organização e análise do material de campo ... 51

Aonde ir, com quem ir? Locais, percursos e companheiras de viagem ... 56

A instituição-campo e o curso de Pedagogia ... 57

A turma da Pedagogia e a disciplina “Ensino-Aprendizagem de Matemática A”... 58

As companheiras de percurso ... 60

III — A VIAGEM: LUGARES (des)CONHECIDOS E OS SABERES (re)CONSTRUÍDOS ... 69

Os cadernos de narrativas: cadernos de memórias ... 74

Iniciando o trabalho com os conteúdos matemáticos: os números, o sistema indo-arábico ... 76

As práticas reflexivas e exploratório-investigativas ... 84

Atividades envolvendo cálculo mental ... 86

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A descoberta do material dourado ... 103

Reflexões envolvendo a subtração ... 112

Os jogos como auxílio na compreensão da adição e subtração ... 119

A Multiplicação ... 120

A tão esperada divisão ... 143

As marcas do trabalho realizado... 158

IV – NARRATIVA DE FORMAÇÃO DE ANDRESSA: INTERPRETANDO SUAS MEMÓRIAS E EXPERIÊNCIAS FORMATIVAS ... 165

Andressa: a aluna constituindo-se professora ... 167

MARCAS DO QUE SE FOI E DO QUE SERÁ ... 183

REFERÊNCIAS ... 191 ANEXO 1 ... 197 ANEXO 2 ... 199 APÊNDICE A ... 201 APÊNDICE B ... 203 APÊNDICE C ... 205

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APRESENTAÇÃO

Histórias da constituição da professora Dora: um porto de partida Sou professora de matemática, entre outras disciplinas, nas diferentes séries do ensino básico e superior. Tenho uma profissão: ensino matemática. Tenho um espaço onde realizo a minha atividade profissional: a escola básica e a universidade.

É partindo dessa “profissão de fé”, inspirada em Moura (2001, p. 143), que apresento os primeiros pontos de uma tessitura, indicando os caminhos deste trabalho, trazendo um pouco das experiências/ações/posicionamentos/aprendizagens da professora que se foi formando a partir da prática, antes de aprofundar-se na teoria. Mas que, com a teoria, pôde refletir e aprimorar o “saber fazer” da sala de aula. E, com a reflexão e o aprofundamento teórico, procura aperfeiçoar-se como pesquisadora.

Esta tese começou a ser delineada, claro que sem intenção a princípio, há mais de trinta anos, quando, na busca da minha formação, pretendia auxiliar no desenvolvimento dos alunos. Talvez essa intenção sintetize meu percurso como professora e como pesquisadora.

Minha trajetória profissional e meus ensaios na área da educação, inicialmente como professora da Educação Infantil, passando pelo magistério no Ensino Fundamental e culminando com a docência no Ensino Superior, sempre foram marcados pelo gosto pelo trabalho docente aliado à reflexão.

Iniciei trabalhando com a Educação Infantil, ainda aos 16 anos. Por seis anos lecionei na Educação Infantil e outros quatro nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Porém, a minha formação em nível médio – curso técnico em processamento de dados — não me habilitava ao magistério e, como não era minha intenção deixar de lecionar para a Educação Infantil e para as séries iniciais do Ensino Fundamental (na época, 1º Grau), foi necessário cursar Pedagogia. Dessa forma, por três anos lecionei no período da tarde, enquanto estudava pela manhã (Matemática) e à noite (Pedagogia), para ter a habilitação que me permitisse

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atuar na Educação Infantil, nas séries iniciais do Ensino Fundamental e também com o ensino de Matemática nas séries finais.

Quando estava no início do 2º ano da faculdade, sem haver ainda nem mesmo realizado os estágios da graduação, assumi cinco aulas de Matemática para uma 5ª série, aproveitando as “janelas” do curso de Matemática no período da manhã. À tarde, continuei com as aulas na Educação Infantil e, depois, assumi turmas das séries iniciais do Ensino Fundamental.

Formando-me pedagoga e professora de Matemática e Ciências para o Ensino Fundamental, continuei, nos 29 anos seguintes, atuando na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, a maior parte do tempo com turmas de 5ª a 8ª séries. Nesse período, por 12 anos fui também coordenadora da área de matemática na escola onde atuava como professora.

Assim, foi no espaço escolar que me constituí professora, construindo na prática pedagógica o “aprender fazer”. E nesse movimento de aprender, pretendia também que aqueles outros com quem interagia — meus alunos — pudessem ir (trans)formando-se, constituindo-se, melhorando seu modo de ser e de agir enquanto estudavam matemática.

Adquiria, nesse movimento, a consciência dos tantos saberes necessários para a ação docente: os disciplinares, os curriculares, os das ciências da educação, os da tradição pedagógica e da ação pedagógica, os saberes das experiências. Mas também me interessava em entender de que maneira aqueles com os quais interagia conseguiam aprender matemática. E, com isso, aprendia a ensinar matemática. Começava a entender que o conhecimento da profissão ia se construindo, que meu “eu” professora em construção se tecia e que para isso era preciso sempre mais me (in)formar.

Já se haviam passado mais de 20 anos de magistério quando voltei à universidade para aprofundar meus estudos na área da Educação Matemática. Iniciei-me nos caminhos da pesquisa acadêmica, direção essa que nunca havia sido objetivo na minha vida. Até então me encontrava realizada com o cotidiano das aulas, com a preparação de estratégias de ensino, com o ensinar e aprender da sala de aula — às vezes aprendendo mais que ensinando, sempre refletindo sobre o que vivenciava, ainda que de forma não muito sistematizada.

Comecei a perceber que poderia, além de somente aprimorar o meu desenvolvimento, também contribuir para a formação daqueles que contracenavam comigo: alunos e colegas professores. A partir dos novos estudos na universidade, as reflexões sobre a prática intensificavam-se, e era possível avançar nas soluções dos problemas que se apresentavam, bem

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como compreender melhor o cotidiano da sala de aula. Descobria a importância da ação docente refletida nos grupos de professores, quer no âmbito da escola onde lecionava, quer nos grupos de estudo e pesquisa que a academia proporcionava.

Em 1996, passados 15 anos da conclusão das graduações — Pedagogia e Licenciatura curta em ciências e matemática — e já lecionando há 20 anos, iniciei um curso de especialização intitulado “Ciência, Arte e Prática Pedagógica”. Era uma proposta pioneira da Faculdade de Educação da Unicamp, com 30 alunos/professores do Ensino Básico de 3 áreas: 10 de artes, 10 de ciências e 10 de matemática. O curso teve 2 anos de duração, período em que adquiri maior gosto pelos estudos compartilhados e compreendi a importância do trabalho de professores em grupo, trocando experiências, buscando saídas para os impasses da profissão docente. Essa experiência teve como produto uma monografia, minha primeira produção acadêmica e também minha experiência inicial com a escrita do/sobre o trabalho docente. Nela relatei atividades que se desenvolveram num processo de negociação de significados entre aluno e aluno e entre alunos e professora. O estudo buscou investigar os saberes discentes e docentes produzidos “em ação” nas aulas de matemática de uma 6a série do Ensino Fundamental sobre o tema Números Relativos. Um relato desse trabalho pode ser encontrado em Megid (2001).

O reencontro com a universidade instigou-me a continuar no caminho da pesquisa. Iniciei meu Mestrado em 2000 na FE-Unicamp, e minha dissertação recebeu o título “Professores e alunos construindo saberes e significados em um projeto de estatística para 6a série: estudo de duas experiências em escolas pública e particular”. Sua realização favoreceu-me desenvolver meu “eu” pesquisadora, que havia se iniciado na etapa anterior. A dissertação tratou de duas experiências desenvolvidas por mim em sala de aula, envolvendo atividades de ensino e aprendizagem com duas turmas de 6a série, uma da rede pública estadual e outra da rede particular, ambas do município de Campinas.

O estudo apresentava a descrição dos encontros ocorridos nas duas escolas; os diálogos estabelecidos entre aluno e aluno e entre alunos e professora; o projeto de pesquisa estatística realizado pelos alunos; o processo de tabulação dos dados e confecção de tabelas e gráficos por parte dos alunos; as produções dos alunos, com o objetivo de divulgar os resultados obtidos na pesquisa escolar. Os dados foram analisados com base em duas categorias: o processo de produção e elaboração dos conhecimentos pelos alunos e o processo de produção de conhecimentos pedagógicos e profissionais pela professora.

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A partir das análises realizadas na pesquisa, alguns aspectos emergiram, destacando-se os conhecimentos matemáticos trabalhados durante a investigação, entre eles: cálculo de porcentagem; leitura e confecção de gráficos e tabelas. Revelou-se também a importância da interação entre alunos nas tarefas realizadas em grupo e nas negociações coletivas, na interação com a professora, proporcionando uma melhor compreensão dos procedimentos matemáticos e estatísticos, auxiliando o aluno a verbalizar o que pensa e a representar matematicamente as suas idéias. Tudo isso se apresentou como uma contribuição para o desenvolvimento do raciocínio, para a flexibilidade do pensamento matemático e para a possibilidade de expansão da linguagem matemática.

Concluído o Mestrado em 2002, no ano seguinte retornei à Faculdade de Educação da Unicamp, agora participando do GEPFPM — Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Professores de Matemática, vinculado ao Grupo de Pesquisa Prapem (Prática Pedagógica em Matemática). O GEPFPM conta com pesquisadores de várias universidades e alunos da pós-graduação e tem como foco de estudos a formação de professores que ensinam matemática.

Nesse período, iniciava também a docência na educação superior, trabalhando em cursos de Pedagogia em duas instituições privadas de Campinas e região, com disciplinas relacionadas à didática e à metodologia da matemática para as séries iniciais do Ensino Fundamental.

Essas duas novidades — o GEPFPM e ser professora universitária — trouxeram-me novas e importantes vivências, mas também me faziam embrenhar por novos e desconhecidos caminhos. Até então, buscava aprimorar minha prática na busca de saber mais sobre a profissão docente e sobre o ensino da matemática, com a intenção de tornar-me uma professora cada vez melhor. Naquele momento, sem abandonar tais preocupações, outras se agregaram: era preciso estudar mais, ampliando conhecimentos por intermédio da pesquisa, para formar aquelas(es) que irão ensinar matemática.

Mais uma vez o grupo de pesquisa foi importante. Era nele que buscava subsídios para construir uma nova prática e desenvolver outros recursos importantes num campo ainda desconhecido para mim: a formação inicial de futuras(os) professoras(es).

Já nas primeiras aulas que ministrei no curso de Pedagogia, pude perceber o quanto incomodava boa parte das(os) alunas(os) participar das disciplinas que envolviam o ensino de matemática. Muitas(os) delas(es) traziam em seu percurso histórias de dificuldades com essa disciplina. Comentavam dissabores relacionados à falta de compreensão de conceitos e técnicas,

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bem como episódios de castigos ou vexames decorrentes de erros em situações enquanto alunas(os) da educação básica. Agregado a isso, emergia nelas(es) o medo de estar próximo o momento em que iriam ensinar matemática.

O foco do ensino de matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental concentra-se nas quatro operações aritméticas elementares. O algoritmo tradicional e suas aplicações básicas, geralmente em situações chamadas “problemas”, são os aspectos comumente abordados. Normalmente as(os) alunas(os) realizam corretamente as operações com esses algoritmos. As dificuldades situam-se na compreensão destes, nos procedimentos que se inserem nas etapas das operações, o que por vezes também é questionado pelas crianças. No que se refere à divisão, o desconforto mostra-se ainda maior: não são raras as vezes em que a resolução dessa operação apresenta complexidade aos que cursam a Pedagogia.

Se as dificuldades acontecem na resolução das operações e na compreensão dos seus procedimentos, elas se agravam quando as(os) alunas(os) da Pedagogia percebem a proximidade do momento em que deverão ensiná-las aos seus futuros alunos.

Em função de tais percepções adveio o objetivo de promover uma formação conceitual e didático-pedagógica sobre o sistema de numeração decimal e sobre as quatro operações aritméticas elementares, em um contexto de prática exploratória e reflexiva, tendo em vista o ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental. A prática reflexiva seria promovida mediante dinâmicas de cooperação e de produção de narrativas, nas quais as(os) alunas(os) confrontariam suas memórias escolares sobre a aprendizagem dessas noções com as que estavam trabalhando na disciplina Ensino-Aprendizagem de Matemática A, a qual eu lecionava numa turma do curso de Pedagogia no primeiro semestre de 2007, em uma universidade particular da cidade de Campinas.

Configurou-se, assim, o objetivo investigativo da presente pesquisa de Doutorado e, ao mesmo tempo, experiência de formação docente: analisar e interpretar como se deu o processo de aprendizagem profissional e de (re)significação do sistema de numeração decimal e das quatro operações aritméticas básicas pelas(os) alunas(os) participantes da disciplina Ensino-Aprendizagem de Matemática A, bem como perceber os indícios de mudança de relação com a matemática e seu ensino que as(os) alunas(os) apresentaram ao longo da experiência formativa.

A questão norteadora da pesquisa, portanto, pode ser assim enunciada: que contribuições as narrativas e as dinâmicas de cooperação em um contexto de prática reflexiva e exploratório-investigativa, envolvendo as operações aritméticas elementares, podem trazer ao processo de

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constituição de professoras que irão ensinar matemática para os primeiros anos do Ensino Fundamental?

O texto a ser apresentado está estruturado em quatro capítulos.

No primeiro capítulo descrevo um mosaico teórico que auxiliou no delineamento dos caminhos da pesquisa.

No segundo capítulo, apresento a viagem, os recursos utilizados, as companheiras de viagem e o percurso/caminho traçado para a constituição da investigação.

No terceiro capítulo serão descritas as ações vivenciadas com as futuras professoras. Para isso tomei como material de apoio as memórias de aprendizagem do percurso escolar das alunas envolvidas; os registros produzidos durante a elaboração das atividades exploratórias; as narrativas das aulas do curso de Pedagogia; os registros de áudio e vídeo produzidos durante as aulas; e o diário de campo da pesquisadora.

Para compreender o percurso da investigação e encontrar caminhos que possam ser delineados a partir das experiências vividas, no último capítulo são trazidas as análises de narrativas de formação de uma aluna, destacando: suas concepções sobre os conteúdos matemáticos e sobre o modo de ensiná-los; suas relações com a matemática desde a época escolar até o início da disciplina envolvendo o campo da matemática no curso de Pedagogia; as transformações que ocorreram ao longo dessa trajetória. Nas análises de narrativas de formação, busco compreender como ocorre a constituição da aluna a partir do que narra, com influência das estratégias de investigação matemática que aconteceram nos cenários de investigação ocorridos durante a pesquisa.

A partir de agora, passarei a utilizar a primeira pessoa do plural na escrita — o nós. Justifico este procedimento: nos diferentes estudos e momentos pesquisados, houve uma participação intensa da pesquisadora e de muitos outros: colegas do GEPFPM, professores(as) das instituições onde atuei e, sobretudo, as(os) alunas(os) envolvidas(os) na turma onde a pesquisa se desenvolveu.

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I — PRINCÍPIOS E BASES DA PESQUISA E DA PRODUÇÃO DE

SABERES DOCENTES: UM MOSAICO TEÓRICO

Neste capítulo buscamos constituir um mosaico formado a partir das diversas contribuições de leituras realizadas no decorrer da nossa formação como professora e pesquisadora. Assim, em diálogo com diferentes autores/pesquisadores constituímos o aporte teórico da pesquisa.

Tais estudos deram suporte às ações realizadas desde o início da pesquisa e foram se intensificando no decorrer da sua configuração e de seu desenvolvimento. Entendemos ser necessário apresentar, neste momento, os aspectos que foram determinantes na configuração do percurso teórico-metodológico da pesquisa e, sobretudo, na constituição de nossa ótica de análise e interpretação das informações obtidas pela pesquisa de campo. Além disso, foi a partir de tais estudos e de nossa interlocução com vários autores que foi se constituindo a professora-pesquisadora Dora, autora do presente texto.

Assim, ao longo do capítulo, procuramos revelar e desvelar o movimento de constituição da professora-pesquisadora e da própria pesquisa.

Nos capítulos que seguem, em que apresentaremos os dados e a análise, traremos outros autores — as alunas que participaram da pesquisa.1 Essas novas personagens irão cruzar-se, então, com as personagens que agora apresentamos, e todos os atores da pesquisa — devidamente apresentados — comporão a equipe dos que narram o processo investigativo da pesquisa de Doutorado.

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Construção de saberes docentes

Iniciando a reflexão sobre a construção dos saberes docentes, tomamos por base o pensamento de Fiorentini e Costa (2002), que desenvolvem três imagens de professor em relação aos saberes da atividade profissional. Denominam a primeira delas de professor prático ou isolado. “Prático”, pois tal professor considera a prática da sala de aula como “uma instância auto-suficiente para desenvolver seu saber fazer” (p. 314) e “isolado”, pois

[...] não se abre às inovações curriculares de seu tempo, não busca atualizar-se através de cursos de especialização, não lê sobre as reflexões e estudos que são produzidos em seu campo profissional, não participa de congressos, raramente troca experiências sobre o ensino da matemática com seus colegas de magistério (Idem, p. 314).

Numa segunda imagem, Fiorentini e Costa (2002) trazem o professor subordinado ou dependente. Qualificam-no como dependente, pois seu “desenvolvimento profissional depende das inovações produzidas pelos especialistas e de sua freqüência aos cursos de atualização ou treinamento nessas inovações.” (p. 316). E justificam a subordinação, pois ele “ocupa uma posição inferior e subalterna, ligada à prática, em relação aos especialistas e pesquisadores acadêmicos que dominam os conhecimentos teórico-científicos.” (Idem, p. 316).

O professor interativo ou autônomo, a partir da imagem elaborada pelos mesmos autores, é aquele que deixa de ser prático e subordinado, pois busca acompanhar o desenvolvimento do campo em que atua e os debates públicos sobre as inovações curriculares, participando ativamente de grupos e/ou projetos, tanto no âmbito escolar como fora dele; e busca “no outro e com o outro novas experiências e saberes da profissão.” (FIORENTINI; COSTA, 2002, p. 317).

Interessa-nos perceber quais as implicações dessas imagens de professores e de suas ações para a transformação da escola. Continuando com a nossa reflexão, em Cochran-Smith e Lytle (1999), encontramos uma discussão acerca de como a formação dos professores pode favorecer a mudança da escola — um espaço que necessita ser compreendido e colocado em debate. As autoras trazem três concepções utilizadas na perspectiva da consolidação do debate e na percepção de como avançar em tais estudos.

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professores os utilizem com a intenção de melhorar sua prática profissional. Com a segunda concepção, que denominam de “conhecimento-na-prática ou conhecimento prático”, referem-se àqueles conhecimentos que os professores produzem ao refletir sobre suas práticas e, assim, formar-se em processo. Dessas duas concepções, depreende-se que os professores aprendem ao investigar aqueles conhecimentos gerados pelo trabalho de especialistas ou quando refletem sobre suas ações e seus pensamentos, quando fazem julgamentos ou interagem em sala de aula.

Na terceira concepção, denominada de “conhecimento-da-prática”, as autoras entendem não ser possível dividir o universo do conhecimento em conhecimento formal e conhecimento prático. Indicam que se faz necessária a produção de conhecimentos a partir da própria sala de aula dos professores, a partir de investigações intencionais, considerando também teorias e materiais produzidos por outros, mas que são questionados e (re)interpretados pelos próprios docentes. Ou seja, os professores aprendem ao gerarem conhecimento no ambiente onde estão desenvolvendo sua prática, no local de prática. Ali constroem conhecimento e formam-se a partir das interações no grupo e conexão dessas ações ao contexto social, cultural e político em que se inserem.

Muito embora esta pesquisa tenha se desenvolvido com futuras professoras em formação, este terceiro viés de pesquisa apresentado por Cochran-Smith e Lytle (1999) auxiliou-nos a refletir e orientar o rumo das práticas que deveriam ser desenvolvidas a seguir. Os esforços voltaram-se para que as alunas tomassem como ponto de partida a problematização da prática vivida em sua infância e as observações feitas nos estágios regulares do curso de Pedagogia. Esperava-se, assim, que elas construíssem saberes a serem trabalhados na prática, na docência futura. A seguir, destacamos alguns aspectos teóricos norteadores da presente pesquisa.

Práticas reflexivas e exploratório-investigativas As atividades utilizadas na presente pesquisa configuraram-se no que optamos por nomear de práticas reflexivas e exploratório-investigativas. Tal escolha deveu-se a nossa compreensão de que havia a necessidade de apresentar, nas aulas, ações que não apenas proporcionassem às alunas envolvidas momentos de compreensão dos aspectos matemáticos já vivenciados por elas em outros ambientes e tempos, sobre os quais tinham a impressão de saberem pouco, mas

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também possibilitassem a reflexão sobre sua crença em poder trabalhar apenas repetindo procedimentos já vivenciados.

O que buscávamos era oferecer oportunidades para que procurassem as suas particularidades e peculiaridades e pudessem (re)construir os conhecimentos abordados em tais atividades e também construir alternativas para o futuro trabalho docente, após concluírem o curso de graduação.

Para compreender a dinâmica de trabalho, buscamos suporte em alguns autores, a respeito de aspectos pertinentes às práticas reflexivas e às investigações matemáticas.

Iniciemos por Castro (2003), que faz uma distinção entre “tarefa” e “atividade”, respaldada em autores como Ponte e Abrantes:

Por atividade entende-se não a proposta de trabalho colocada ao aluno, esta é a tarefa, mas aquilo que ele faz com o propósito de explorar a tarefa: suas idéias, conjecturas, testes, argumentações, exemplos, estratégias, raciocínios, conclusões, cálculos, esboços, gráficos, figuras, registros escritos utilizando linguagem corrente e/ou matemática, colocações orais, discussões etc. (p. 36). Ou seja, segundo a visão de Castro (2003), tarefa consistiria, por exemplo, nas instruções dadas pelo professor aos alunos para realizarem uma determinada ação ou estudo, um roteiro do trabalho a ser realizado. Já a atividade envolve não somente a tarefa, mas o conjunto de ações/pensamentos/estratégias mobilizados pelos alunos no desenvolvimento do trabalho.

A autora destaca também a importância de a tarefa instigar a atividade do aluno, proporcionando-lhe curiosidade, atenção e envolvimento ao realizá-la. Em outra obra, Castro (2004) aponta que realizar atividades exploratório-investigativas privilegia a compreensão de conhecimentos matemáticos (CASTRO, 2004). Torna-se imperativo, portanto, verificar se os objetivos e as motivações que levam os alunos ou os professores a inserirem-se nesse tipo de estudo/investigação são diferentes daqueles dos pesquisadores matemáticos. Embora os procedimentos se assemelhem no sentido de tanto uns quanto os outros buscarem inserir-se mais profundamente nos conteúdos que estão trabalhando, o investigador da sala de aula trabalha com algo que se constitui inédito para ele. Já a investigação do matemático se direciona ao campo da pesquisa científica, em que um dos quesitos se refere ao ineditismo do objeto pesquisado.

Dessa forma, convém atentar para a adequação da linguagem, para os conteúdos a serem investigados e para o tempo destinado à sua realização, proporcionando um ambiente que favoreça a aprendizagem matemática.

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Castro (2004) ainda indica serem as atividades investigativas tarefas pedagógicas e escolares, imbuídas de intencionalidade, de objetivos formativos não só referentes à matemática, mas que viabilizam o desenvolvimento de habilidades como: a produção de conhecimentos a partir de investigações e atividades realizadas tanto pelos alunos como pelos professores; o desenvolvimento da autonomia intelectual dos alunos; a negociação de significados; a tomada de decisões.

Nas aulas investigativas fica ampliada a possibilidade de aprofundar a reflexão da prática, passando da intuição para a ação consciente. Faz-se importante que as pesquisas desenvolvidas com professores ou, como no nosso caso, com professoras em formação, considerem como fundamentais as ações que provocam reflexões.

Ainda, no sentido de ampliar as concepções sobre tarefas e atividades, buscamos em Powell e Bairral (2006) outras contribuições. Para esses autores, tarefa “é vista como um fato estanque, prioritariamente elaborada e proposta pelo professor; a atividade é dinâmica, interativa. Ou seja, o desenrolar de uma tarefa realiza-se na atividade que lhe dará sentido.” (p. 60).

Os autores também escrevem que, para a proposição de tarefas, é importante levar em conta o potencial dos envolvidos, seus interesses, as experiências anteriores e também um desafio novo, para que lhes seja necessário refletir sobre o que já conhecem, na busca de encontrar caminhos desafiadores para a solução do que foi proposto. Assim, serão consideradas tarefas formativas aquelas que proporcionarem situações de aprendizagem e que estabelecerem propostas críticas e dinâmicas. Ao associarmos essas tarefas à escrita da sua resolução, amplia-se a oportunidade de encontrar caminhos para a solução dos impasses e, na busca por meio dos processos de reflexão e de socialização do construído, pode-se desenvolver a autonomia dos envolvidos.

Freitas (2006) traz outras considerações a respeito das dimensões reflexivas e colaborativas. Entende que o envolvido em processos investigativos não deve figurar como alguém com necessidade de informar-se, que precisará aprender aspectos considerados pelo professor ou pelas instituições como relevantes, “mas alguém que estabelece relações próprias com a matéria de estudo, realizando outras incursões sobre ela e atribuindo sentidos àquilo que estuda.” (p. 51).

Em relação ao ambiente construído para a realização das atividades, tomamos como referência o conceito de “cenários para investigação” enunciado por AlrØ e Skovsmose (2006, p.

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56). Há possibilidades de encontrar cenários para investigação elaborados a partir de diferentes ambientes, com referências à matemática pura; à semi-realidade; e ao mundo real. As diferentes formas de referência corresponderão a ambientes de aprendizagem diferentes e será a partir da escolha das referências que o ambiente será preparado. Segundo os autores, “Ao reconhecer o tipo de referência que se está utilizando, o aluno assume uma vista privilegiada para olhar todo o cenário que está sendo proposto e, dessa forma, consegue atribuir significado a suas atividades.” (ALRØ; SKOVSMOSE, 2006, p. 57). Nesse cenário, o aluno deverá sentir-se convidado a realizar

a investigação. Mas, para que se estabeleça o cenário, o aluno deverá aceitar tal convite, o que dependerá da qualidade das relações entre os participantes da aula e da natureza do convite.

No nosso caso, usamos como base as operações matemáticas elementares, isto é, tentamos incluir, na proposição das tarefas, a possibilidade de repensar os algoritmos tradicionais das quatro operações numéricas elementares. Esta proposição instaurava-se no cenário proposto a partir de duas perspectivas: de um lado, compreender as ações repetidas ao longo da vida, muitas vezes de maneira mecânica e sem compreensão; de outro, buscar construir saberes que favorecessem a docência, visto que em breve aquelas alunas iriam ensinar matemática para alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental.

Embora os temas estudados na disciplina Ensino-Aprendizagem de Matemática não fossem inéditos para aquela turma de alunas que participou da pesquisa, a proposta que apresentamos era diferente das experiências já vivenciadas por elas, o que proporcionava um ambiente de investigação bastante oportuno, ocorrendo diferentes problematizações, formulações de questões e busca de alternativas para as tarefas que apresentávamos a elas.

A partir das considerações anteriores, nomearemos as ações realizadas em nossas aulas de práticas reflexivas exploratório-investigativas, pois estas ocorreram num cenário onde o diálogo era privilegiado, o que, no nosso entendimento, favorecia a aprendizagem conceitual e didático-pedagógica das quatro operações. Ou seja, a aprendizagem à qual nos referimos não era aquela relacionada à recepção dos conteúdos, em que um aluno passivo incorpora o que é “ensinado” pelo professor e reproduz em exercícios ou provas o mesmo que ouviu ou copiou do quadro. O que esperávamos é que ocorresse uma aprendizagem dinâmica, ativa, colaborativa, crítico-reflexiva.

Tais práticas apresentaram-se como momentos de análise de situações propostas que favoreceram reflexões, em que foram considerados os saberes já vivenciados e a possibilidade de

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construção de novos saberes, no que diz respeito tanto ao conteúdo matemático quanto àqueles necessários para quem vai ensinar matemática para as séries iniciais.

As práticas exploratório-investigativas relacionadas ao conteúdo de matemática que foram realizadas durante as disciplinas do curso de Pedagogia eram introduzidas a partir da solicitação de uma reflexão individual sobre o assunto a ser tratado. Num segundo momento, dependendo do caso, solicitávamos que, em trios ou duplas, as alunas socializassem os caminhos percorridos. Dependendo da intenção da proposta, num terceiro momento algumas vezes os grupos confeccionavam cartazes com suas considerações, visando compartilhar com os demais aquilo que haviam refletido ou construído. Num quarto momento, havia a socialização coletiva dos cartazes ou das discussões dos pequenos grupos. E ainda ocorria um momento seguinte, onde, também em situação coletiva durante a socialização da atividade em grupo, procuramos encontrar uma relação do vivido por aquelas alunas quando cursavam o Ensino Fundamental e que tivesse sido “re-vivido” nas ações propostas pela tarefa, numa perspectiva de construção de um saber para a docência. Por fim, as alunas escreviam, nos cadernos de memórias, as reflexões relacionadas ao que foi trabalhado. Ali procuravam narrar seus conhecimentos anteriores, partindo da escrita de si, do que já traziam, do conhecimento até então adquirido. Nessa ação buscávamos a possibilidade de (re)significar suas experiências anteriores mediante narrativas escritas.

Algumas vezes direcionamos essa escrita das narrativas a partir de alguma questão ou de uma solicitação específica a respeito da atividade que acabavam de resolver. Outras vezes solicitamos que fizessem um paralelo sobre o que traziam a respeito do que fora tratado na aula e as percepções que se passaram naquele momento. Outras vezes, ainda, pedimos que registrassem o que havia sido fundamental, na opinião das alunas, para a sua formação como professoras de matemática. No entanto, na maioria das vezes, o registro era livre. Apenas insistimos que fizessem os registros logo após a conclusão da aula.

Na opção pelo trabalho com as práticas exploratório-investigativas, nossa intenção era que às alunas não coubesse somente responder a questionamentos ou dar respostas a problemas partindo de um caminho apontado pela professora, mas que, a partir de uma instigação ou proposta enunciada, apresentassem suas concepções anteriores, os caminhos que conheciam; formulassem novos caminhos; socializassem seus procedimentos para atuar frente à proposta.

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Enfim, que não só se inserissem numa atividade, mas que também se assumissem como protagonistas e, em vários momentos, como autoras das ações da aula.

Também as alunas não deveriam perder de vista que esse caminhar proporcionava trilhar dois percursos, ambos de grande importância: um deles, o de (re)construir conceitos básicos da aritmética, que julgavam de difícil compreensão; o outro, não menos importante, o de construir saberes que auxiliariam na futura atividade docente para a qual estavam em processo de formação.

Porém, procedimentos como os anteriormente descritos ainda não são usuais entre os professores que ensinam matemática. De maneira especial, quando tratam desta disciplina, os professores dos anos iniciais, até por conta dos fracassos e das falhas que muitas vezes fizeram parte da sua trajetória de estudante, não se permitem utilizar caminhos que não sejam os dos algoritmos e das atividades guiadas, que dificilmente proporcionarão questionamentos vindos dos alunos que não possam ser prontamente solucionados por eles, professores. Foi justamente por essa razão que o início do trabalho com as atividades reflexivas e exploratório-investigativas mereceu um cuidado especial de nossa parte.

A estratégia não era mais esperar respostas da professora, explicações iniciais que deveriam ser seguidas, regras a serem cumpridas. Seria necessário, primeiramente, observar a proposta — que não se aproximava dos tradicionais “resolva”; “efetue”; “calcule”; “dê a resposta certa”. Também não se aproximava muito das chamadas situações-problema normalmente utilizadas em aulas dos anos iniciais, que pouco diferem dos exercícios tradicionais, pois, embora estejam acompanhados de um texto introdutório, espera-se para a sua resolução que seja seguido o raciocínio ou a abordagem indicada pelo professor quando da exposição inicial.

Na concepção que adotamos, uma prática reflexiva e exploratório-investigativa em matemática deve iniciar por uma situação que precisa ser compreendida, acompanhada de dados que deverão ser organizados para que se possa explicá-los matematicamente. Mas, para isso, são necessárias instigações interessantes e que possam levar à produção de conjecturas, argumentos e justificativas — favoráveis ou não — para o que vai ser elaborado a partir do desenvolvimento da proposta inicial. Pode decorrer dessa prática o surgimento de novas indagações a averiguar.

Tais práticas oferecem oportunidades para que sejam relacionados diferentes tópicos da matemática, o que geralmente não ocorre em ambientes de aulas onde cada conteúdo é tratado

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isoladamente. Oliveira et al. (1999) destacam que atividades como essas auxiliam na perspectiva de que os envolvidos nelas criem uma imagem muito diferente da matemática.

Destacamos ser esse outro fator de relevante importância nas aulas do curso de Pedagogia, pois a impressão que as alunas costumam ter da disciplina matemática é a de tratar-se de um campo de estudo que não oferece discussões, que está pronto, acabado. Predomina entre elas uma representação negativa da matemática. Acreditam, muitas vezes, que, quando se estuda matemática, não se deve questionar. Basta ocupar-se em repetir procedimentos e técnicas previamente estabelecidas.

Na tentativa de desconstrução de tais sentimentos carregados por muitas alunas ao longo da vida estudantil, atuamos no sentido de indicar que outros caminhos pudessem ser seguidos. Porém, mesmo sendo oferecidas condições favoráveis para o ensino de matemática, como: um ambiente estimulante, tarefas cuidadosamente elaboradas, currículo adequado ao grupo, grande acervo de materiais educacionais, Ponte et al. (1999) alertam-nos que

[...] o professor será sempre um actor central neste processo e parte do seu trabalho não pode ser formalizado. Fica a encargo de seu senso matemático e educacional decidir o que é importante em cada momento, escutando muito, mostrando flexibilidade, e tentando descobrir qual poderá ser o movimento seguinte mais adequado. (PONTE et al., 1999, p.149)

Assim, estas reflexões foram decisivas na opção pela utilização do que chamamos, no desenvolvimento desta pesquisa, de práticas reflexivas e exploratório-investigativas.

A escrita de narrativas e as escritas autobiográficas

Optamos por incluir ainda uma solicitação para que as alunas escrevessem sobre os procedimentos que utilizavam durante a realização das atividades em sala de aula. Também havia uma preocupação em instigar as participantes a narrar, após a realização dos trabalhos, o que lhes tinha sido significativo.

Através das narrativas, buscamos os indícios de mudança nas relações estabelecidas pelas graduandas com o conteúdo aprendido na sua experiência escolar, quando eram alunas das séries iniciais do Ensino Fundamental, se comparadas com aquelas que vivenciavam no momento das

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formador de professores advindas dessas práticas, lições que a experiência pode trazer para a formação inicial de professores das séries iniciais.

Para destacarmos a potencialidade das narrativas em processos de formação de professores, entendemos sua importância sob dois aspectos:

[...] primeiramente, a narrativa como um modo de refletir, relatar e representar a experiência, produzindo sentido ao que somos, fazemos, pensamos, sentimos e dizemos. [...] e a narrativa como modo de estudar/investigar a experiência, isto é, como um modo especial de interpretar e compreender a experiência humana, levando em consideração a perspectiva e interpretação de seus participantes (FREITAS; FIORENTINI, 2007, p. 63).

Os autores realizaram pesquisa em curso de graduação de matemática em que as narrativas estiveram em evidência. Os resultados indicaram que o uso das narrativas favoreceu a inserção da escrita no contexto de formação. Por outro lado, Freitas e Fiorentini (2007) apresentaram a complexidade vivenciada pelos futuros professores quando estes registraram por escrito suas reflexões e pensamentos acerca do que vivenciavam nas aulas de uma disciplina do curso de matemática. Os mesmos autores consideram importante privilegiar o registro escrito sobre os processos pelos quais os alunos passam quando refletem sobre as ações vivenciadas durante a formação inicial.

No que se refere ao modo de investigar a experiência, Freitas e Fiorentini (2007) destacam que “o pesquisador, na pesquisa narrativa, dá inclusive atenção às ‘vozes não ouvidas’ as quais compreendemos serem aquelas percebidas por meio das alterações de movimentos, expressões, trocas de olhares e descompasso da respiração.” (p. 69).

Seguem ressaltando a importância das análises de narrativas de formação como estratégias que permitem dar visibilidade a elementos importantes da experiência formativa, como tempo, processo e mudança:

Os adeptos das análises e interpretações narrativas não apenas estudam como as pessoas percebem o mundo por meio de suas histórias contadas e narradas, como também valorizam os efeitos das histórias contadas e narradas nos caminhos vividos e experienciados pelo narrador. Dessa forma, a narrativa, por seu caráter formativo, reflexivo e potencializador de produção de sentido à experiência, passa a ter espaço relevante em diferentes contextos, trazendo contribuições à constituição da identidade do sujeito da experiência (Idem, p. 69).

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compreendemos que a prática da utilização da escrita pelas alunas envolvidas nos auxiliou na pesquisa. Segundo Souza (2006b):

O entendimento construído sobre história de vida como um relato oral ou escrito, recolhido através de entrevista ou de diários pessoais, objetiva compreender uma vida, ou parte dela, como possível para desvelar e/ou reconstruir processos históricos e socioculturais vividos pelos sujeitos em diferentes contextos. (p. 23).

Para Souza (2006b), as narrativas de formação podem ser compreendidas como “processos formativos e autoformativos através das experiências dos atores em formação” (p. 25) e como importantes ações que ajudam a repensar as questões da formação, pois, “ninguém forma ninguém”, há necessidade da predisposição e do empenho em formar-se; e a formação pressupõe reflexões sobre a trajetória vivida.

Nesse contexto, a abordagem biográfica é potencializadora de produção de conhecimentos a partir das experiências dos adultos, sujeitos em formação. Josso (2004) assim concebe a abordagem biográfica, considerando que o sujeito, ao tomar consciência de si e das suas aprendizagens adquiridas nas experiências vividas, percebe-se no papel de ator e de investigador de suas histórias.

A busca por uma metodologia que trouxesse as experiências de aprendizagens das alunas envolvidas se mostrou importante na medida em que acreditamos que as histórias ocorridas durante a vida influenciam na constituição das vidas em formação. Percebemos, assim, que a utilização das histórias de vida favoreceria a composição da pesquisa.

Chaves (2000, p. 87), em seus estudos, ressalta a importância da escrita das histórias por meio das narrativas, indicando que, quando contamos, escrevemos e ouvimos essas histórias — as nossas e as dos outros — penetramos “barreiras culturais”, descobrindo o nosso poder e a integridade do outro, bem como aprofundamos o entendimento de nossas perspectivas e possibilidades.

A mesma autora destaca três aspectos fundamentais das narrativas: dar significado às experiências e às ações temporais e pessoais; propiciar sínteses de ações diárias e de episódios vividos; estruturar eventos passados e proporcionar o planejamento de ações futuras.

As abordagens históricas de vida nos processos formativos e de pesquisa, para Josso (2004), possuem dois tipos de objetivos teóricos:

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1. Assinalam um processo de mudança do posicionamento do pesquisador, por meio do apuramento de metodologias de pesquisa-formação, articuladas à construção de uma história de vida. Esse apuramento visa diferenciar melhor as modalidades e os papéis assumidos durante o processo, as etapas e os projetos de conhecimento específicos da pesquisa-formação. 2. Demarcam também a contribuição do conhecimento dessas metodologias para o projeto delimitação de um novo território de reflexão abrangendo a formação, a autoformação e as suas características, bem como os processos de formação específicos voltados para públicos específicos (p. 23).

Josso (2004) destaca a originalidade da metodologia de pesquisa-formação em histórias de vida, pois esta se instaura na busca da produção de conhecimentos para aqueles que narram suas histórias, o que pode ocorrer a partir dos registros dos conhecimentos que os constituam como sujeitos. Em relação a esse aspecto, é possível entender a riqueza da construção de saberes favorecida pela produção das histórias de vida.

Entendemos, assim, que a escrita das narrativas e das histórias de vida seria importante para a nossa pesquisa, na medida em que permite que suas histórias e narrativas possam ser revistas por cada aluna e também pelo grupo de alunas, destacando: os valores pessoais que tinham; os saberes teóricos e práticos que possuíam; os caminhos que tencionavam percorrer durante a formação inicial no curso de Pedagogia; os saberes teóricos e para a prática que pretendiam construir.

Ao tentar compreender o conceito de narrativa, percebemos ser a expressão do que pensamos acerca do vivido/experienciado. Uma narrativa expressa os sentimentos, as percepções que capturamos sobre um fato ou a respeito de muitos deles, porém com a necessidade de levar para o outro — aquele que ouve ou lê a narrativa — tal compreensão (oralmente ou através do texto escrito) do que se pretende narrar. Mas também, no movimento de contar-se para o(s) outro(s) a partir da escrita de narrativas, torna-se possível que ocorra o conhecimento de si.

A escrita e o conhecimento de si Ao utilizarmos as atividades de escrita na sala de aula de matemática, percebemos que se amplia a possibilidade do aprendizado, proporcionando inclusive que os alunos reflitam de

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maneira crítica sobre o que estão aprendendo, sobre suas experiências dentro e fora da sala de aula, o que lhes proporciona encontrar saídas pessoais para as diferentes situações que se apresentam (POWELL; BAIRRAL, 2006, p. 74).

Mesmo a escrita não sendo padrão nas aulas de matemática, entendemos sua importância a partir de duas perspectivas: uma delas, porque permite aflorar, a partir das narrativas, as situações interiores dos envolvidos. Há vezes em que é possível rememorar episódios de frustração e angústia, e o fato de deixar que emerjam facilita a retomada de antigos fios quebrados na aprendizagem. As escritas de si, das experiências vivenciadas, podem ser fatores de auxílio nessa direção.

A outra perspectiva da escrita refere-se à importância de descrever as ações realizadas no decorrer das atividades. Para construir narrativas do que vivenciamos, torna-se necessário desembaralhar os procedimentos, comentar cada nuança do processo usado para chegar a uma resposta. Inicialmente buscamos compreender como a escrita e o conhecimento de si pode levar as alunas a produzir conhecimentos aritméticos e a construir saberes sobre o modo de ensiná-los. Também foi necessário estudar teoricamente o processo de escrita discursiva e reflexiva em contextos de ensino de matemática, tentando compreender como tal estratégia pode auxiliar a aprendizagem conceitual e didático-pedagógica da matemática escolar.

Um dos elementos que utilizamos para o desenvolvimento dos saberes e para a formação das futuras professoras foi a produção de narrativas das alunas sobre as aulas que desenvolvíamos.

Connelly e Clandinin (1995) destacam que o principal argumento para o uso das narrativas na investigação educativa se situa no fato de que as pessoas são originalmente contadoras de histórias. Para os autores, somos

[...] organismos que, individual e socialmente, vivemos vidas relatadas. O estudo da narrativa, portanto, é um estudo da forma em que os seres humanos experimentamos o mundo. Desta idéia geral se deriva a tese de que a educação é a construção e re-construção de histórias pessoais e sociais: tanto os professores como os alunos são contadores de histórias e também personagens nas histórias dos demais e em suas próprias (p. 11-12, tradução nossa)2.

2 “Organismos que, individual y socialmente, vivimos vidas relatadas. El estúdio de la narrativa, por lo tanto, es el

estúdio de la forma em que los seres humanos experimentamos el mundo. De esta idea general se deriva la tesis de que la educación es la construción y la re-construccion de historias personales y sociales; tanto los professores como los alumnos son contadores de histotias y también personajes em las historias de los demás y em las suyas propias”

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Sendo assim, ao contarmos/recontarmos histórias, nossas e dos outros, socializamos experiências e situamo-nos no espaço-tempo em que estamos inseridos, posicionando-nos em relação aos acontecimentos historiados. Essas narrativas também podem ser utilizadas para a tomada de consciência de algumas de nossas ações e/ou atitudes e para a mudança destas.

Nessa mesma direção, Josso (2006) aborda a importância da reconstrução da história de cada um na busca de procurar os elos que muitas vezes são invisíveis:

O trabalho de reconstrução de nossa história, tanto no relato oral quanto no relato escrito, provoca o aparecimento de um certo número de nós invisíveis, mas nem todos! O processo é pôr-se a caminho, nessa busca de compreensão de si, de componentes de nossa história, de tomadas de consciência do que nos move, nos interessa, nos guia, nos atrai. [...] Nessa história de elos, há como em toda história os bons e os maus elos [...] que não são bons nem maus em absoluto, evidentemente, mas que são tidos como tais para nós. (p.379)

Na perspectiva da busca dos “nós” e dos “elos” que provocam a tessitura das histórias é que se faz possível desvelar as dificuldades que impregnam as aprendizagens — no nosso caso, das operações numéricas e seu ensino — e buscar (re)construir essa mesma história de maneira diferente.

A mesma autora nos indica que a tomada de consciência dos “nós” da nossa história possibilita a criação de um saber de nossa existência no espaço físico que ocupamos, o que nos possibilita desemaranhar os “nós” que prejudicam a caminhada e criar novos laços que nos permitam avançar na nossa história (Idem, p. 379).

Souza (2006b) também enfatiza a potencialidade da escrita em situações de aprendizagem e, apoiado em Nóvoa (1992), utiliza-se da “Metáfora da Corda”, que pode ser encontrada por ocasião do relato de experiências lembradas e registradas em escritas de trajetórias de escolarização. Encontramos, nesses relatos, “muitos fios que se cruzam e misturam, que se associam e se confundem, que se ligam e se incorporam uns nos outros. Resultado: narrativas coletivas, bem mais complexas que o somatório das narrativas individuais.” (p. 10).

Ao socializar as histórias, é possível perceber que, no âmbito da história pessoal que é trazida na lembrança das alunas a respeito do modo como aprenderam matemática, não raramente aparecem sentimentos como a desilusão ou a repulsa em relação a episódios de ensino nas séries do ensino básico, comum a muitas alunas.

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constituição do ser professor. Essas aprendizagens passam pelas lembranças, indicando como fomos tecidos ao longo da vida, quantos fios foram usados para que fôssemos constituídos. Será necessário, então, um (re)tecer dessa vivência na perspectiva de construir saberes para a docência. E as escritas das memórias de como se aprendeu e as narrativas das ações agora vivenciadas podem levar a uma reflexão do porquê e do para que aprender, proporcionando uma nova tessitura.

Josso (2004) argumenta que as experiências vividas, os acontecimentos exteriores e interiores que marcaram a nossa existência permitem um tecer reflexivo da nossa individualidade. Para compreender o caminho que agora percorremos, é preciso buscar as experiências vividas que nos permitem construir novos significados para o momento presente, para os novos conhecimentos.

Nesse movimento deparamo-nos com as relações da vida pessoal que influenciam na formação profissional. O processo de formação é favorecido por meio do conhecimento de si, provocando implicações no trabalho docente (SOUZA, 2006a, p.15).

A escrita da história de cada uma das alunas da Pedagogia sobre como se deu sua aprendizagem das operações básicas, suas lembranças, as atividades que realizaram, seus sentimentos, as palavras ditas pelos seus professores das séries iniciais, proporciona, por um lado, o resgate do vivido; e, por outro, permite que cada uma se torne autora e atriz de seu projeto formativo.

A primeira experiência escolar que possuímos se refere à nossa trajetória enquanto alunos do Ensino Fundamental. Tal experiência não raro nos influencia na prática docente inicial, fazendo com que a primeira forma de ensinar que nos vem à memória seja aquela que vivenciamos enquanto alunos. Acreditamos ser necessário problematizar sobre essas práticas vividas e refletir sobre elas, para que, a partir dessa reflexão, possamos construir novas práticas docentes. Para Souza (2006a), “o educador em construção expressa uma reflexão sobre tempos e espaços de formação. Temos marcados na memória e nas histórias o sentido da vida e da profissão.” (p. 19).

Entendemos que o trabalho realizado com as alunas, a partir das escritas das memórias e dos relatos dos trabalhos realizados, pode favorecer o cruzamento da sua vida pessoal e a construção de sua prática docente. Ao proporcionar a (re)construção dos conceitos aritméticos envolvidos nas operações fundamentais, seu emprego, suas formas de operar, tínhamos a intenção

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