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OS METAPLASMOS NA MÚSICA CAIPIRA : UMA ANÁLISE DE CANÇÕES UNIVERSAIS

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Academic year: 2021

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OS METAPLASMOS NA “MÚSICA CAIPIRA”: UMA ANÁLISE DE CANÇÕES UNIVERSAIS

Valdinei Gonçalves de Oliveira1 (G – CLCA – UENP/CJ) Luiz Antônio Xavier Dias (Orientador – CLCA- UENP/CJ)

1 Introdução

De acordo com Carvalho & Nascimento (1971) os metaplasmos são alterações fonéticas que as palavras sofrem durante sua evolução do latim para o português, tais mudanças podem ser vistas em diversas “músicas caipiras” como: Maria Chiquinha, interpretada por cantores renomados como Sandy & Júnior, retrata com muito humor uma parcela da sociedade interiorana, suas aspirações, emoções, assim, o objetivo do trabalho é fazer uma análise sincrônica e diacrônica de “canções caipiras” e a ocorrência de seus metaplasmos. A linha de pesquisa que esse trabalho segue é a gramática histórica da língua portuguesa e diversos pressupostos da linguística textual.

Assim como todos os organismos vivos passam por transformações até que cheguem ao estágio de declínio e posterior desaparecimento, as línguas como entidades vivas, sendo instrumento de comunicação e interação entre falantes de uma mesma comunidade, possuem semelhante comportamento.

A Linguística Histórica adverte-nos de que as línguas humanas mudam com o passar do tempo, portanto, não constituem realidades estáticas, homogêneas. Todavia, estão num processo gradativo e ininterrupto de transformação.

Muitas palavras tiveram seu som e grafia modificados no período de passagem do latim para o português. Nesse enfoque, percebe-se que a língua possui diversas definições e pode ser considerada um complexo sistema, objeto de estudo de várias ciências. É com ela que os homens se comunicam e cultuam seus valores através das gerações. A língua está sempre em mudança. A pronúncia e a grafia das palavras sofrem alterações constantemente.

A língua portuguesa, assim como vários outros idiomas, originou-se do latim. O latim, por sua vez, foi primeiramente o idioma falado numa pequena zona da Itália Central, à

1 Valdinei é seminarista pela Diocese de Jacarezinho e graduando do segundo ano do curso de Letras/Espanhol pela UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná, Campus Jacarezinho-PR.

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margem esquerda do rio Tibre, não muito longe do Mar Tirreno. A cidade principal dessa minúscula região, chamada Lácio, foi e é Roma, fundada, segundo consta, por Rômulo no dia 21 de abril de 754 a.C. Essa língua do Lácio implantou-se primeiramente na Itália Central e depois em toda a Itália, na Espanha, em Portugal, no norte da África, nas Gálias (França, Suíça, Bélgica, regiões alemães ao longo do Reno), na Récia e no Nórico (Áustria), na Dácia (România) e, menos profundamente, na Grã-Bretanha, na Holanda, na Dalmácia, na Iugoslávia e na Hungria.

O mais vetusto documento da Língua Latina é uma inscrição do século VI a.C., mas os mais antigos textos literários que chegaram até nós pertencem ao século III d.C. Nesses escritos a língua já é bem desenvolvida, mas apresenta ainda alguma incerteza na ortografia e no emprego das formas.

Foi nos séculos I e II d.C. que a língua latina teve seu máximo esplendor. Pertencem a este período, chamado de “idade de ouro”, os maiores escritores latinos:

• Marco Tulio Cicero • Caio Júlio Cesar • Caio Crispo Salustio • Publio Virgílio Marão • Quinto Horácio Flaco • Publio Ovídio Nasão • Tito Lívio

Com a queda do Império Romano acaba a História Romana e um século depois, mais ou menos termina também a História da Literatura Latina, mas o Latim continua ainda por quase mil anos, sendo em toda a Idade Média a língua da civilização ocidental, inspirando assim todas as obras primas das literaturas modernas da Europa e da América.

Em nossos dias o latim não é mais falado em parte alguma, mas é a língua oficial da Igreja e é estudado em quase todas as nações do mundo, por ser, com razão, considerado elemento precípuo e fator eficiente de cultura, instrumento indispensável para o conhecimento profundo das línguas neolatinas, como por exemplo, o português, o espanhol, o italiano, o francês, o romeno etc., e meio incomparável para educação da inteligência, disciplina do raciocínio e formação do caráter.

Para compreender como e porque se modificam as línguas, convençamo-nos de que qualquer enunciado, qualquer fragmento de enunciado, obriga o interlocutor a despender energia mental e física. Este gasto de energia pode parecer insignificante a quem procura

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observá-lo em si nas circunstâncias correntes da vida, quando o equilibra com perfeição o desejo de comunicar ou de se exprimir. Mas um estado de grande fadiga revela, mesmo ao mais loquaz, que a busca de palavras exatas e de fonemas adequados e até o simples uso dos órgãos da fala fazem aumentar de maneira perceptível a impressão de cansaço. Há momentos em que “não se encontra a palavra”, outros em que a fadiga física e tão grande que a fala se torna confusa, por insuficiente diferenciação dos fonemas.

Do latim vulgar para a língua portuguesa falada hoje no século XXI, ocorreram inúmeras transformações, das quais foi possível fazer uma sistematização documental. Muitas palavras foram incorporadas ao léxico, do mesmo modo que outras caíram em desuso, além daquelas que permaneceram, mas com significados diferentes dos de sua origem.

Sobre o fenômeno das transformações de uma língua, Faraco (1991) assim pondera:

A primeira característica é que a mudança se dá em todas as línguas. É próprio de todas elas – como aliás, de qualquer outra realidade humana e até mesmo da natureza em geral, como nos mostram geólogos e biólogos – passar por transformações no correr do tempo, mutabilidade que se dá de forma contínua, ininterrupta. (FARACO, 1991, p. 26)

Ainda nas palavras do professor Faraco há que se dizer que

Cada estado de língua, definível no presente ou em qualquer ponto do passado, é sempre resultado de um longo e contínuo processo histórico; do mesmo modo que, em cada momento do tempo, as mudanças estão ocorrendo, ainda que imperceptíveis aos falantes. Dessa maneira, se o português do século XIII era diferente do português de hoje, o português do futuro será diferente do de hoje: entre eles há um ininterrupto processo de mudança. (FARACO, 1991, p. 27)

Observa-se que as mudanças linguísticas são contínuas e nem sempre perceptíveis à comunidade de falantes, já que essas mudanças se dão de modo lento, gradual, jamais de forma abrupta. O interessante é notar que os falantes de uma determinada língua possuem uma participação efetiva nesse processo de transformação, pois são eles que agregam ao léxico, outros vocábulos, muitas vezes já modificados, o que enriquece o idioma. Esse processo está ainda mais presente nesse momento de globalização em que vivemos.

Sabemos que as transformações ocorrem em todos os âmbitos, semânticos, pragmático, estilístico, sintático, morfológico e fonético. É nesse último que concentraremos nossa atenção, pois, sabe-se da ocorrência de alterações fonéticas do latim até o português e percebe-se na disparidade português-padrão / português não-padrão que essas alterações

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continuam presentes sendo muitas vezes imperceptível aos falantes, tendo consciência delas, apenas os profissionais da área de Letras e Linguística, que dedicam seus estudos para tais fenômenos.

Como já mencionado, alguns compositores empregam em suas músicas a modalidade português não padrão, o que talvez seja explicado pela tentativa de se reproduzir a fala no seu efetivo exercício de interação social, sendo o real coletivo ditado pela espontaneidade das pessoas e não o ideal de língua, descrito pela gramática.

Antes de analisarmos a letra de uma música que usa desse artifício, esclareçamos o que vem a ser transformações fonéticas e vejamos alguns exemplos que provam a dinâmica da língua na busca de sua remodelagem para atingir o perfil dos falantes de um determinado grupo social.

Primeiramente, pretende-se lembrar que, a fonética é a ciência dos fonemas que constituem a linguagem. Por fonética histórica, pode-se entender a ciência que estuda a evolução, a transformação dos fonemas no tempo e no espaço.

Como já salientado, a língua no seu caráter dinâmico, social, sofre alterações durante sua evolução. Chamaremos tais alterações de Metaplasmos. Essas alterações são apenas fonéticas, conservando, as palavras, a mesma significação.

Sobre as causas essenciais das transformações fonéticas, Silveira Bueno assim pondera:

Admitimos que tal causa reside na adaptação da base articulatória ao sistema fonético do idioma. Por base da articulação entendemos o conjunto dos órgãos da fala, no momento em que deve iniciar o trabalho da fonação. Neste momento inicial, encontra-se a base articulatória em estado neutro, sem ter ainda, pelos hábitos do aprendizado, tomado posição determinada para falar português, francês, italiano, ou qualquer idioma vivo. (SILVEIRA BUENO, 1967, p. 53)

2 Os metaplasmos segundo a gramática histórica da língua portuguesa Os metaplasmos se dão de quatro maneiras:

I – por aumento ou adição II – por supressão ou subtração III – por transformação e IV – por transformação.

No caso de alterações por adição, os mais comuns são: a prótese, a epêntese e o paragoge, acréscimo de fonemas no início, no interior e no final de um vocábulo,

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respectivamente. A epêntese possui uma modalidade que é o suarabácti, que consiste na intercalação de uma vogal para desfazer um grupo consonantal, como por exemplo, blatta >

barata.

No caso da supressão de fonemas, tem-se a aférese, a síncope e a apócope, sendo subtraído um fonema no início, no interior e no final de um vocábulo. Ainda sobre a subtração de fonemas, há que se considerar a crase, que consiste na fusão de duas vogais iguais em uma só. Quando a crase se dá pela junção final de uma palavra com a vogal inicial de outra, na formação de expressões compostas, recebe o nome de sinalefa, como por exemplo, outra +

hora > outrora, de + intro > dentro.

Por sua vez, os metaplasmos por transposição podem-se dar por deslocação de fonema ou de acento tônico da palavra. Nesse caso de metaplasmos, não há adição nem supressão de fonemas, apenas um deslocamento. O deslocamento de fonema pode ser por metátese, quando a transposição de fonema acontece na mesma sílaba, por exemplo, sem – per > sem – pre. O deslocamento pode ser por hipértese, quando a transposição de fonema ocorrer de uma sílaba para outra, como em fes – tra > fres – ta.

O deslocamento pode ser de tonicidade silábica, recebendo o nome de hiperbibasmo, consistindo em sístole, o recuo da sílaba tônica (idólu > ídolo) e diástole, quando avanço de tonicidade (pônere > ponere).

O último caso de alterações fonéticas, e o mais numeroso, são o por transformação. Dentre as transformações destaca-se: vocalização, consonantização, nasalização, desnasalização, assimilação, sonorização, apofonia, metafonia, palatização, assibilação, ditongação, monotongação.

É possível de se observar que os nomes acima elencados sugerem o tipo de transformação ocorrida, como por exemplo, a vocalização, que é a transformação de uma consoante em vogal, bem como a consonantização que é a transformação de uma vogal em consoante e assim por diante. É interessante observar que algumas dessas alterações formam uma disparidade, como nasalização e desnasalização e assim sucessivamente.

O que se pretende nessa apresentação do dinamismo da língua portuguesa, não é elencar de maneira pormenorizada os metaplasmos, tarefa que se deixa para a Linguística histórica, mas ao contrário, apresentá-los contextualizados no cotidiano dos falantes ou em algumas composições musicais.

Vale mencionar que, mesmo os falantes considerados cultos, no momento de espontaneidade e menor grau de monitoramento da fala, cometem supressões, caso mais

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comum entre os falantes, em especial na tendência de eliminar o “r” final dos verbos no infinitivo impessoal, como por exemplo, trabalhar > trabalhá; aprender > aprendê.

3. Os metaplasmos na música Maria Chiquinha

Para melhor ilustrarmos esses fenômenos, consideremos a música Maria Chiquinha, de autoria de Geysa Bôscoli e Guilherme Figueiredo, interpretada por Sandy & Junior.

Maria Chiquinha

(Geysa Bôscoli/ Guilherme Figueiredo)

Que cocê foi fazê no mato, Maria Chiquinha? Que cocê foi fazê no mato?

Eu percisava corta lenha, Genaro, meu bem Eu percisava corta lenha

Quem é que tava lá com ocê, Maria Chiquinha? Quem é que tava lá com ocê?

Era filha de Sádona, Genaro, meu bem Era filha de Sádona

Eu nunca vi muier de colote, Maria Chiquinha Eu nunca vi muier de colote.

Era a saia dela amarrada nas pernas, Genaro, meu bem Era a saia dela amarrada nas pernas

Eu nunca vi muier de bigode, Maria Chiquinha Eu nunca vi muier de bigode

Ela tava cumeno jamelão, Genaro, meu bem Ela tava cumeno jamelão

Nu meis de setembro num dá jamelão, Maria Chiquinha Nu meis de setembro num dá jamelão

Foi uns que deu fora do tempo, Genaro, meu bem Foi uns que deu fora do tempo

Então vai buscá uns que eu quero ver, Maria Chiquinha Então vai buscá uns que eu quero ver

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617 Os passarinhos cumero tudo

Então eu vou te cortá a cabeça, Maria Chiquinha Então eu vou te cortá a cabeça

Que cocê vai fazer com o resto, Genaro, meu bem? Que cocê vai fazer com o resto?

O resto? Podexá que eu aproveito.

Dada a letra da música, nos recordamos o quanto, neste caso, os metaplasmos garantem a sonoridade da música que destacamos para a análise. Assim, perscrutando a literatura específica, Carvalho e Nascimento (1981), nos ajudam a classificar o que julgamos necessário:

Cocê: Crase seguido de aférese.

Fazê: apócope – supressão de fonema no final da palavra; Percisava: epêntese – Metátese;

Ocê: Aférese; Sádona: Crase;

Muier: Palatização seguida de ditongação; Cumeno: Assimilação seguida de nasalização; Nu: Assimilação;

Meis: Ditongação;

Buscá: apócope – supressão de fonema no final da palavra; Cumero: Assimilação seguida de apócope e desnasalização; Cortá: apócope – supressão de fonema no final da palavra; Podexá: Crase seguida de aférese e apócope

4 Considerações Finais

Percebe-se que o estudo diacrônico da língua e sua reflexão nos dias atuais é de grande importância, além disso reconhecer a sua transformação através de músicas caipiras é necessário para que se valorize o aspecto histórico da linguagem.

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618 5 Referências

CARVALHO, Dolores G.; NASCIMENTO, Manoel. Gramática Histórica. 7. Ed. São Paulo: Ática. 1971

CÂMARA JR, Joaquim Matoso. Para o estudo da fonêmica portuguesa. 2. Ed. Editora Padrão.

COMBA, Padre Julio; Programa de Latim, 1º volume. 18. Ed. São Paulo: Editora Dom Bosco, 2002.

FARACO, Carlos Alberto. Linguística Histórica. São Paulo: Ática. 1991.

SILVEIRA BUENO, F.. A formação histórica da língua portuguesa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1967

Para citar este artigo:

OLIVEIRA, Valdinei Gonçalves de. Os metaplasmos na “música caipira”: uma análise de canções universais. In: VIII SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA SÓLETRAS - Estudos Linguísticos e Literários. 2011. Anais... UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de Letras, Comunicação e Artes. Jacarezinho, 2011. ISSN – 18089216. p. 611 – 617.

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