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Introdução ao Estudo do Direito - Paulo Dourado de Gusmão

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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 

Ewerton Rodrigo Cardoso da Silva – 3º ano Direito – Faculdade de Direito de

Ewerton Rodrigo Cardoso da Silva – 3º ano Direito – Faculdade de Direito de Franca / Franca- SPFranca / Franca- SP

PRIMEIRA AULA

PRIMEIRA AULA

I. OBJETIVOS GERAIS

I. OBJETIVOS GERAIS

Desenvolver no futuro bacharel noções básicas referentes à atuação do Desenvolver no futuro bacharel noções básicas referentes à atuação do profissional em Direito, nas diversas áreas, esclarecendo-o a respeito dos variados ramos profissional em Direito, nas diversas áreas, esclarecendo-o a respeito dos variados ramos de sua possível atividade, além das opções que terá após diplomado. Da mesma forma, de sua possível atividade, além das opções que terá após diplomado. Da mesma forma, procurar desenvolver nele senso crítico no que se refere à atividade profissional a que irá procurar desenvolver nele senso crítico no que se refere à atividade profissional a que irá se dedicar, bem como situar essa atuação na realidade atual. Desenvolver no futuro se dedicar, bem como situar essa atuação na realidade atual. Desenvolver no futuro profissional da área jurídica o interesse pela filosofia do Direito, pela interdependência profissional da área jurídica o interesse pela filosofia do Direito, pela interdependência dessa ciência com os demais ramos de conhecimento humano, assim como pela ética dessa ciência com os demais ramos de conhecimento humano, assim como pela ética profissional, postura e necessidade de f

profissional, postura e necessidade de fácil e adequada expressão verbal e escrita.ácil e adequada expressão verbal e escrita.

II. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

II. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

::

Preparação do aluno da área jurídica para o estudo das disciplinas Preparação do aluno da área jurídica para o estudo das disciplinas específicas do primeiro ao quinto ano, dotando-o de conhecimentos básicos e de específicas do primeiro ao quinto ano, dotando-o de conhecimentos básicos e de natureza instrumental, que lhe facilitem a manipulação dos conceitos técnicos dos natureza instrumental, que lhe facilitem a manipulação dos conceitos técnicos dos diversos ramos do Direito. preparação para o enfrentamento da realidade profissional, diversos ramos do Direito. preparação para o enfrentamento da realidade profissional, procurando-se demonstrar o funcionamento do espírito de pesquisa e aprofundmanto dos procurando-se demonstrar o funcionamento do espírito de pesquisa e aprofundmanto dos conceitos ensinados.

conceitos ensinados.

III.CONTEÚDO

III.CONTEÚDO PROGRA

PROGRAMÁTICO

MÁTICO

1.Acepções da expressão Direito 1.Acepções da expressão Direito

-Origem dos vocábulos Direito e jurídico -Origem dos vocábulos Direito e jurídico -Direito

-Direito

-Nas líng

-Nas línguas modernas uas modernas encontramos dois encontramos dois conjuntos de conjuntos de termos utilizados termos utilizados parapara exprimir a idéia de Direito.

exprimir a idéia de Direito.

-Primeiro conjunto ligado ao vocábulo “direito” que encontra similar em todas as -Primeiro conjunto ligado ao vocábulo “direito” que encontra similar em todas as línguas neolatinas e, de forma geral, nas línguas ocidentais modernas: Droit (francês); línguas neolatinas e, de forma geral, nas línguas ocidentais modernas: Droit (francês); Diritto (Italiano); Derecho (espanhol); Recht (alemão); Right (inglês); Dreptu (romeno). Diritto (Italiano); Derecho (espanhol); Recht (alemão); Right (inglês); Dreptu (romeno).

Essas palavras têm sua origem num vocábulo do baixo latim:

Essas palavras têm sua origem num vocábulo do baixo latim: directum directum ouou rectum rectum 

que significa “direito” ou “reto”.

que significa “direito” ou “reto”. Rectum Rectum ouou directum directum é o que é conforme a uma régua.é o que é conforme a uma régua.

-Jurídico -Jurídico

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Ao mesmo tempo encontramos palavras ligadas ao vocábulo jurídico, que também Ao mesmo tempo encontramos palavras ligadas ao vocábulo jurídico, que também encontram similar em quase todas as

encontram similar em quase todas as línguas modernas.línguas modernas.

A etimologia desta palavra encontra-se no termo latino

A etimologia desta palavra encontra-se no termo latino  jus  jus  (juris), que significa(juris), que significa

“direito”. Ao procuramos o significado originário deste vocábulo (

“direito”. Ao procuramos o significado originário deste vocábulo ( jus  jus ), encontramos, pelo), encontramos, pelo

menos duas origens diferentes, indicadas pelos filósofos. menos duas origens diferentes, indicadas pelos filósofos.

Alguns entendem que

Alguns entendem que  jus  jus  se tenha constituído do idioma latino, derivando dese tenha constituído do idioma latino, derivando de  jussum 

 jussum , particípio passado do verbo, particípio passado do verbo jubere  jubere , que significa: mandar, ordenar., que significa: mandar, ordenar.

Outros entendem que o vocábulo

Outros entendem que o vocábulo jus  jus seja uma derivação deseja uma derivação de justum  justum , isto é, aquilo, isto é, aquilo

que é justo ou conforme a justiça. que é justo ou conforme a justiça.

Na língua portuguesa falada no Brasil encontramos como exemplos de significados Na língua portuguesa falada no Brasil encontramos como exemplos de significados da palavra direito:

da palavra direito: -lado direito; -lado direito;

-que não é curvo -aprumado - ereto; -que não é curvo -aprumado - ereto;

-íntegro - probo - justo - honrado - leal - franco - sincero; -íntegro - probo - justo - honrado - leal - franco - sincero; O mestre Aurélio também indica:

O mestre Aurélio também indica: - o que é justo, reto conforme a lei; - o que é justo, reto conforme a lei;

- faculdade legal de praticar ou deixar de praticar um ato; - faculdade legal de praticar ou deixar de praticar um ato;

- prerrogativa que alguém tem de exigir de outrem a prática ou abstenção de certos - prerrogativa que alguém tem de exigir de outrem a prática ou abstenção de certos atos ou a respeito a

atos ou a respeito a situações que lhe aproveitam;situações que lhe aproveitam;

- ciência das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens em - ciência das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens em sociedade.

sociedade.

Caio Mário da Silva Pereira o conceitua como: “direito é o princípio de adequação Caio Mário da Silva Pereira o conceitua como: “direito é o princípio de adequação do

do homem homem à à vida vida social”.social”.

Miguel Reale o define: “direito é a ordenação heterônoma, coercível e Miguel Reale o define: “direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral-atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos e atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos e valores”.

valores”.

2.Pluralidade de significações do direito 2.Pluralidade de significações do direito

André Franco Montoro destaca cinco realidades fundamentais dos significados do André Franco Montoro destaca cinco realidades fundamentais dos significados do direito, analisando as expressões seguintes:

direito, analisando as expressões seguintes: 1. O direito não permite o

1. O direito não permite o duelo;duelo;

Neste caso, direito significa a norma, a lei, a regra social obrigatória. Neste caso, direito significa a norma, a lei, a regra social obrigatória. 2. O Estado tem o direito de legislar;

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Nesta expressão direito significa a faculdade, o poder, a prerrogativa, que o Estado Nesta expressão direito significa a faculdade, o poder, a prerrogativa, que o Estado tem de criar leis.

tem de criar leis.

3. A educação é direito da criança 3. A educação é direito da criança;; Aqui direito significa o que é

Aqui direito significa o que é devido por justiçadevido por justiça 4. Cabe ao direito estudar a criminali

4. Cabe ao direito estudar a criminalidade;dade;

Direito significa ciência, ou, mais especificamente, a ciência do direito. Direito significa ciência, ou, mais especificamente, a ciência do direito. 5. O direito constitui um

5. O direito constitui um setor da vida social.setor da vida social.

Direito é considerado como fenômeno da vida coletiva, é um fato social. Direito é considerado como fenômeno da vida coletiva, é um fato social.

1.DIREITO-NORMA

1.DIREITO-NORMA

É uma da acepções mais comuns do vocábulo. Neste aspecto, importante o exame É uma da acepções mais comuns do vocábulo. Neste aspecto, importante o exame do direito nas suas mais variadas realidades:

do direito nas suas mais variadas realidades:

- direito positivo : conjunto de normas elaboradas por uma sociedade determinada, - direito positivo : conjunto de normas elaboradas por uma sociedade determinada, para reger sua vida interna, com a proteção da força social

para reger sua vida interna, com a proteção da força social;;

- direito natural : constituído pelos princípios que servem de fundamento ao Direito - direito natural : constituído pelos princípios que servem de fundamento ao Direito positivo;

positivo;

direito estatal : normas jurídicas elaboradas pelo estado para reger a vida social direito estatal : normas jurídicas elaboradas pelo estado para reger a vida social -ex: Constituição - Código Civil - leis federais,

ex: Constituição - Código Civil - leis federais, estaduais municipais etc.;estaduais municipais etc.;

- direito não estatal ou social : normas elaboradas por diferentes grupos sociais e - direito não estatal ou social : normas elaboradas por diferentes grupos sociais e destinadas a reger a vida interna destes grupos - ex: direito universitário - direito esportivo destinadas a reger a vida interna destes grupos - ex: direito universitário - direito esportivo - direito religioso - usos e

- direito religioso - usos e costumes internacionais.costumes internacionais.

Clóvis Beviláqua conceitua o Direito como: “regra social obrigatória”. Clóvis Beviláqua conceitua o Direito como: “regra social obrigatória”.

O direito como norma de comportamento distingue-se das demais normas por ter O direito como norma de comportamento distingue-se das demais normas por ter estrutura bilateral, porque, enquanto atribui uma “prerrogativa” (faculdade, direito estrutura bilateral, porque, enquanto atribui uma “prerrogativa” (faculdade, direito subjetivo) ou “competência” a uma parte, impõe uma “obrigação” a outra. Nas palavras de subjetivo) ou “competência” a uma parte, impõe uma “obrigação” a outra. Nas palavras de Paulo Dourado de Gusmão, a característica do direito enquanto norma é a Paulo Dourado de Gusmão, a característica do direito enquanto norma é a coercibilidade.(possibilidade do emprego da força material para fazê-lo ser observado, ou coercibilidade.(possibilidade do emprego da força material para fazê-lo ser observado, ou melhor, na possibilidade de se recorrer ao Poder Judiciário para fazê-lo ser respeitado. melhor, na possibilidade de se recorrer ao Poder Judiciário para fazê-lo ser respeitado.

2. DIREITO-FACULDADE

2. DIREITO-FACULDADE

Direito faculdade ou direito poder que é o poder de uma pessoa individual ou Direito faculdade ou direito poder que é o poder de uma pessoa individual ou coletiva, em

coletiva, em relação a relação a determinado objeto (direito determinado objeto (direito de votar, de votar, de usar de usar um imóvel, um imóvel, cobrarcobrar uma dívida, propor uma ação). Cada um desses direitos é uma prerrogativa ou faculdade uma dívida, propor uma ação). Cada um desses direitos é uma prerrogativa ou faculdade de agir. Definido por Meyer como “o poder moral de fazer, exigir ou possuir alguma de agir. Definido por Meyer como “o poder moral de fazer, exigir ou possuir alguma coisa”.

coisa”. Ortolan, como “a faculdade de Ortolan, como “a faculdade de exigir dos exigir dos outros uma ação outros uma ação ou inação”. Ihering ou inação”. Ihering “é o“é o interesse protegido pela lei”. Também se identifica como direito subjetivo. Este último se interesse protegido pela lei”. Também se identifica como direito subjetivo. Este último se divide em direito-interesse e direito-função. Ao Direito concedido ou reconhecido no divide em direito-interesse e direito-função. Ao Direito concedido ou reconhecido no interesse do seu titular (satisfação de suas necessidades materiais ou espirituais - direito interesse do seu titular (satisfação de suas necessidades materiais ou espirituais - direito à vida, integridade física, liberdade, de usar um imóvel) denomina-se direito-interesse. à vida, integridade física, liberdade, de usar um imóvel) denomina-se direito-interesse.

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Por outro lado há direitos subjetivos instituídos em benefício de outras pessoas Por outro lado há direitos subjetivos instituídos em benefício de outras pessoas (pátrio-poder - conferido ao pai no interesse do filho), que se intitulam direito-função.

poder - conferido ao pai no interesse do filho), que se intitulam direito-função.

3.DIREITO-JUSTO

3.DIREITO-JUSTO

Relaciona o direito com o conceito de justiça. (ex. 1.salário é direito do trabalhador Relaciona o direito com o conceito de justiça. (ex. 1.salário é direito do trabalhador - palavra direito significa aquilo que é devido por justiça; 2.não é direito condenar um - palavra direito significa aquilo que é devido por justiça; 2.não é direito condenar um anormal - o que significa que não é conforme à justiça)

anormal - o que significa que não é conforme à justiça)

4.DIREITO CIÊNCIA

4.DIREITO CIÊNCIA

A expressão direito, neste caso é empregada para designar a ciência do direito. A expressão direito, neste caso é empregada para designar a ciência do direito. (ex: estudar direito, doutor ou bacharel em direito).

(ex: estudar direito, doutor ou bacharel em direito).

5.DIREITO FATO SOCIAL

5.DIREITO FATO SOCIAL

Direito considerado como setor da vida social. Sob este aspecto, Gurvitch define o Direito considerado como setor da vida social. Sob este aspecto, Gurvitch define o direito como “uma tentativa para realizar, num meio social, a idéia de justiça, através de direito como “uma tentativa para realizar, num meio social, a idéia de justiça, através de um sistema de normas imperativo-atributivas”. Também é, em fórmula mais atual, o um sistema de normas imperativo-atributivas”. Também é, em fórmula mais atual, o conjunto das condições de existência e desenvolvimento da sociedade, coativamente conjunto das condições de existência e desenvolvimento da sociedade, coativamente asseguradas.

asseguradas.

SEGUNDA AULA

SEGUNDA AULA

1. RELAÇÕES

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1.1. CIÊNCIAS SOCIAIS

Os séculos XIX e XX modificaram profundamente a noção do homem culto e da fonte do saber. Assim, até bem pouco tempo, bastava ao jurista, para ter cultura geral compatível com o seu papel social, ser iniciado em Filosofia e História. Hoje, a Filosofia, que perdeu muito de sua supremacia, é somente uma das fontes do saber utilizada pelo jurista para compreender, em sua totalidade, a realidade social de seu tempo.

Desta forma, em nossa época, não mais se pode pensar em estudar o direito sem o conhecimento de outras ciências que facilitam a exegese, a aplicação e, principalmente, a criação do Direito.

Entre tais ciências, destaca-se as ciências sociais, pela importância que tem para o direito, pois não se pode construir, interpretar ou aplicar o direito sem o seu conhecimento. O desconhecimento dessas ciências muito tem contribuído para a perda do papel social que desempenhou o jurista no nosso passado até os anos 60, para o qual concorreu também a crise do ensino jurídico, divorciado das demais ciências sociais, destinado exclusivamente a formar profissionais eficientes, “doutores em lei”, e não juristas.

As ciências sociais são as que tem por objeto material o comportamento humano, apesar de cada uma delas ter por objeto formal próprio, ou seja, a perspectiva mediante a qual contempla o homem e estuda os fatos de sua conduta.

HANS KELSEN classifica as ciências sociais em:

a) causais - as que se ocupam do comportamento do homem segundo o princípio da causalidade, procurando explicar aquela conduta como é de fato . Ex.: a psicologia, a história e a sociologia;

b) normativas - as que tratam da conduta recíproca dos homens, não como efetivamente se realiza, mas como ela, determinada por normas positivas, deve realizar-se. Ex.: a ciência da moral e a ciência jurídica.

A ciência jurídica é uma ciência social normativa distinguindo-se da história do direito, da psicologia forense, da sociologia jurídica, que, embora sejam ciências sociais, são causais.

A ciência do direito vem sendo empregada em sentido ampla e em sentido estrito. Em sentido amplo o termo ciência do direito indica qualquer estudo metódico, sistemático e fundamentado dirigido ao direito, abrangendo nesta acepção as disciplinas jurídicas, tidas como ciências do direito, como a sociologia jurídica, a história do direito etc.

Em sentido estrito o termo abrange a ciência do direito propriamente dita. É preciso ter em mente que não existe um conceito unitário de ciência do direito, por depender sua conceituação de diferentes pressupostos adotados pelo jurista.

Para que o jurista tenha uma visão atual do direito é necessário que seja iniciado nas ciências sociais dentre as quais destacamos a Sociologia, pela importância que tem para o direito, pois, hoje não se pode formular, interpretar, ou aplicar o direito sem o conhecimento dessas ciência

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e muito menos, construir a ciência jurídica, como autêntica ciência, sem uma visão sociológica. Sorokin define a Sociologia “não só a ciência da relações e correlações entre várias classes de fenômenos sociais (correlações entre os fatores econômicos e os religiosos; a família e a moral; o  jurídico e o econômico; a mobilidade e os fenômenos políticos etc.), como, também, o estudo das

relações entre os fenômenos sociais e os não sociais (geográficos, biológicos etc.), que a habilita a dar as características gerais comuns a toda classe de fenômenos sociais e a entendê-los como realmente são.

E assim é porque a Sociologia estuda os fatos sociais, ou seja, os fenômenos sociais. Ora, o direito é um fato social, resultante do impacto de diversos fatores sociais (religião, moral, econômico, demográfico, geográfico etc.). A sociologia versa sobre os costumes e as normas sociais; ora, é sabido que, em suas origens, o direito se apresenta sob a forma de costumes. A Sociologia é, também, a ciência das instituições sociais; ora, o direito dá forma jurídica a muitas instituições sociais, como, por exemplo, a família, a propriedade etc. A Sociologia Jurídica é inconcebível sem a Sociologia, da qual é uma especialização. O estudo do fenômeno social da delinqüência é inconcebível sem o auxílio da Sociologia, principalmente o fenômeno da delinqüência juvenil, que reflete a dissolução dos costumes, a crise de afetividade, a crise do mercado de trabalho e a crise da família de nossos dias.

A História, ou seja, o conhecimento do passado humano, ou ainda, o estudo do conjunto das manifestações da atividade e do pensamento humanos, considerados cronologicamente e em sua sucessão, seu desenvolvimento e suas relações de conexão ou dependência, é de grande utilidade para o jurista, por ser o direito um fenômeno histórico, que tem largo passado, ou seja, que tem História, relacionada com outros fatos e acontecimentos históricos. O Código Civil francês seria incompreensível sem a Revolução Francesa, bem como a Lei das XII Tábuas dos romanos sem a luta entre patrícios e plebeus ou as clássica Declarações de Direito sem as Revoluções Americana e Francesa. A Teoria da Divisão dos Poderes resultou do conflito entre a Coroa e o Parlamento Inglês, enquanto o direito do trabalho tem suas origens nas reivindicações trabalhistas da primeira fase da Revolução Industrial. A História fornece ao jurista as fontes históricas do direito. O direito atual tem suas raízes no passado. Governado pela força da tradição, o direito antigo encontra-se nas bases do direito vigente. Poder-se-ia pensar em direito alemão, francês ou italiano sem o direito romano ou em direito brasileiro sem as Ordenações Reais? Mas não é só, pois a História, dando a conhecer os direitos antigos, os erros cometidos pelos legisladores do passado e os bons e maus efeitos sociais das legislações antigas, aponta ao jurista e ao legislador de hoje o caminho que não deve seguir. Não se pode, pois, fazer ciência do direito sem o conhecimento da História. O jurista, disse Savigny, não pode deixar de ser um historiador.

É importante notar que a História possui um segmento que tem por objeto o direito considerado como fato histórico. Grande é a importância dos estudos históricos do direito, pois, revelando os efeitos históricos das legislações, da jurisprudência e da doutrina, facilitam a compreensão do direito atual, além de fornecer aos jurista, ao legislador e ao juiz lições que devem ser aproveitadas.

A Economia, ciência que versa sobre os problemas da produção, distribuição e consumo de bens e com os concernentes a preços, bem como em satisfazer as necessidades básicas do homem em promover o bem-estar social, oferecendo soluções para a reforma da ordem econômica, com a previsão de meios que o tornem viável, é outra com a qual o direito tem laços estreitos de parentesco. Não que o direito seja, como sustenta Stammler, a forma jurídica das relações econômicas ou o reflexo, como quer Marx, de ditas relações, mas porque há largo campo do jurídico em que os fatos econômicos têm importância fundamental. A intervenção do Estado no campo econômico, desde a Grande Depressão de 1929, ampliou o número de relações e atos

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 jurídicos de conteúdo econômico. As crises econômicas periódicas alteram os sistemas jurídicos. o controle de preços de gêneros alimentícios de primeira necessidade ou o congelamento de alugueres e salários, resultantes da crise de 1929, para a qual o direito então vigente não oferecia solução adequada, exigindo legislação especial, é exemplo que demonstra, de forma inequívoca, a dependência do direito do fator econômico e a importância da Economia, como ciência, para o legislador, o juiz e o jurista. A industrialização, entre nós, acelerando-se após os anos 30, fez evoluir o direito do trabalho. o direito econômico, que controla a produção e a circulação das riqueza, é ramo novo do direito, que apareceu devido à importância adquirida pelas relações econômicas depois da Primeira Guerra Mundial. O valor da Economia para o jurista tornou-se tal, que nas Faculdades de Direito foi criada a cadeira de Economia Política. Por isso, não se pode negar as relações estreitas entre Economia e Direito e o valor que tem para o jurista.

A Moral, que tem por objeto o comportamento humano regido por regras e valores morais, que se encontram gravados em nossas consciências, e em nenhum código, comportamento resultante de decisão da vontade, que torna o homem, por ser livre, responsável por sua culpa quando agir contra as regras morais, tem relações muito próximas com o Direito. Não se precisa ir muito longe para admiti-las porque norma, liberdade, culpa, responsabilidade e sanções são temas básicos da moral. Por isso, tem ela importância fundamental para o Direito, que é controle social eficaz da conduta humana. Muitas regras morais foram acolhidas pelo direito; não matar (implícita na punição do homicídio), não causar dano injusto a outrem (fonte da obrigação de reparar), respeitar a palavra dada (básica no direito dos contratos) etc. Na Moral e na Religião encontra-se a origem do direito antigo. A Justiça, valor jurídico fundamental é valor moral. O estudo da Moral, de suas regras e dos costumes é, pois, relevante para o jurista, principalmente para humanizar as relações econômicas e o mundo materializado de nossos dias.

A Ciência política, que estuda o pode, o governo do Estado, os costumes políticos, as ideologias etc., tem laços estreitos com o direito, por ser o direito estatal o direito por excelência no mundo atual. A Ciência Política é, pois, de importância fundamental para o direito constitucional.

1.2. MEDICINA LEGAL

É o emprego de conhecimento médico-cirúrgicos com o objetivo de constituir prova, quando o homem em si é objeto dela. A Medicina legal facilita a interpretação e a aplicação da lei penal quando esta emprega noções que só ela pode definir, como, por exemplo, aborto, virgindade, morte, lesão corporal etc. Perrando a define como parte da ciência médica que se dedica a “todos os problemas biológicos e médico-cirúrgicos, que têm relação com a evolução das ciências jurídicas e sociais, bem como, de forma sistemática, fornece noções técnicas indispensáveis à solução das questões de índole técnica nos procedimentos judiciários”.

Os conhecimentos médicos são valiosos tanto no direito penal como no direito civil . Assim, por exemplo, do exame de sanidade mental pode resultar na interdição de pessoa de maioridade; no direito de família muitos casos dependem de perícia médica, como, por exemplo: determinação da capacidade para o ato sexual motivadora de anulação de casamento, a investigação de paternidade etc.

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É a parte da psicologia a serviço do Judiciário, que, servindo-se da psicologia possibilita descobrir o falso testemunho e a autoria de delitos. Não reduz suas investigações ao delinqüente, mas se dedica mais ao testemunho como meio de prova. Ao tratar do delinqüente, não indaga os fatores psicológicos do delito - objeto da psicologia criminal, mas colabora na formação da convicção do juiz sobre a veracidade ou falsidade do depoimento do delinqüente. Trata também da psicologia do magistrado, do advogado e do promotor. Analisa documentos e fatos em função da personalidade de seus autores e da idade, do sexo e estado de saúde dos mesmos. Oferece meios para descobrir verdades, falsidades, simulações etc. Pode ser definida como a técnica psicológica a serviço do processo judicial, com o objetivo de descobrir a verdade, falsidade ou simulação de atos, confissões , depoimentos, condutas etc.

1.4. CRIMINOLOGIA

A Criminologia é o estudo do homem criminoso, isto é, do delinqüente do crime, não do ponto de vista legal, mas dos fatores que o determinam. Funda-se, exclusivamente, em métodos científicos, alheada das definições e das categorias jurídico-penais. Trata do crime como um fato, sem cogitar de seus “elementos normativos”.

Assim, a Criminologia não cogita do crime no sentido jurídico, da pena como sanção  jurídica, mas do crime como fato, como expressão da personalidade do delinqüente e do meio social. Estuda, pois, o delinqüente, não a lei penal, indagando as motivações (individuais e sociais) que o levam a delinqüir. Visa conhecer melhor o criminoso, para melhor recuperá-lo e prevenir melhor. Por isso, é o estudo das causas ou fatores da criminalidade como objetivo de evitar ou reduzir a criminalidade e de obter a recuperação do delinqüente. Indaga as causas e os fatores do crime de modo a predizer, com certa probabilidade, as condições favoráveis à criminalidade e os meios de evitá-la ou reduzi-la.

Considera, funcionalmente, a pena como meio de readaptação do criminoso à vida em sociedade e como meio preventivo, sem levar em conta seu aspecto retributivo. Assim, para a criminologia vale mais o aspecto "corretivo" da pena do que o “retributivo”.

Compreende a antropologia criminal, a psicologia criminal e a sociologia criminal, que, juntas, constituem o que se tem denominado criminologia teórica.

A história da criminologia começa na Itália, com Lombroso (1835-1909), fundador da “escola antropológica” também denominada “escola italiana”, aparecida em 1871, com a publicação do livro  L’uomo Delinquente, em que Lombroso defende a tese de o criminoso ser reconhecível por caracteres morfológicos.

1.5. ANTROPOLOGIA CRIMINAL

É a parte da criminologia que estuda as causas endógenas (que cresce para dentro ou no interior) do delito. Estuda o delito como resultado de fatores orgânicos e biológicos. Pesquisa as características orgânica e morfológica (estudo da formação e da transformação dos corpos orgânicos) dos criminosos, servindo-se nessa pesquisa do método estatístico. Interpreta o crime como reflexo de uma personalidade, resultante de vários fatores (somático - relativo ao corpo, psicológico, social). Querendo resumir, é lícito dizer que a Antropologia Criminal estuda o delito

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como resultante de fatores orgânicos e biológicos, ou melhor, como resultante de fatores orgânicos e constitucionais. É muito útil na avaliação da periculosidade do delinqüente.

1.6. PSICOLOGIA CRIMINAL

Pesquisa os “processos psíquicos do homem delinqüente” (Guarnieri). Interessa-se pelos motivos que o levaram a delinqüir. Não cogita do delinqüente anormal ,objeto da Psiquiatria Criminal. A Psicologia Criminal nos dá uma lista de tipos de delinqüentes, caracterizados por um dos processos psicológicos: instintivos (dominados pelo instinto de conservação ou de procriação), neuróticos (movidos por neuroses), afetivamente pervertidos (insensíveis, indiferentes, egoístas) emotivos, emocionais, vingativos etc. Os menores delinqüentes têm merecido dela estudo aprofundado, demonstrando a Psicologia que eles são levados à delinqüência pela imaturidade, por erros de educação, por problemas afetivos, pela crise da família, pela falta de amparo dos pais, pelos maus exemplos etc.

1.7. SOCIOLOGIA CRIMINAL

Investiga os fatores ambientais e sociais do delito. Trata o delito como fato social. Reconhece que o delito resulta de vários fatores sociais, para o qual concorre o indivíduo, com seus fatores somáticos e psicológicos. A Sociologia Criminal concentra-se nos fatores sociais da delinqüência (morais, econômicos, políticos, raciais, climáticos, educacionais etc.)

1.8. CRIMINALÍSTICA

Entende-se como a ciência que trata das provas criminais: prova pericial (médica, antropométrica, datiloscópica etc.), bem como das técnicas para descobrir o autor do crime e o falso testemunho. Ramo da ciência penal que tem por objeto a investigação dos delitos.

APLICAÇÃO DO DIREITO

O momento da aplicação da norma jurídica é característico do direito positivo. As normas positivas existem para ser aplicadas por um órgão competente, juiz, tribunal, autoridade administrativa ou particular. A aplicação do direito é decorrente da competência legal. O juiz aplica as normas gerais ao sentenciar; o legislador, ao editar leis, aplica a Constituição; o Poder Executivo, ao emitir decretos, aplica norma constitucional; o administrador ou funcionário público aplica sempre normas gerais ao ditar atos administrativos; simples particulares aplicam norma geral ao fazer seus contratos e testamentos. Este estudo irá ater-se, principalmente à aplicação feita pelo Poder Judiciário que consiste em submeter um caso particular ao império de uma norma jurídica.

A finalidade das normas jurídicas é a composição dos conflitos realizada pelos juizes, baseados, principalmente na lei. A composição é, na realidade, um silogismo, em virtude do qual se aplica a norma geral e prévia a um caso concreto. A premissa maior é a norma jurídica regulando uma situação abstrata, e a premissa menor é o caso concreto devidamente esclarecido pelas partes. A conclusão é a sentença judicial que aplica a norma abstrata ao caso concreto. Cabe às partes alegar e provar as questões de fato, devendo o juiz dar a norma jurídica competente para resolver o conflito.

A aplicação coercitiva do direito é da competência exclusiva do Estado, no que concerne ao direito interno, e das organizações internacionais, no que diz respeito ao direito internacional. No primeiro caso, é ato de direito público pelo qual a autoridade administrativa ou judiciária competente impõe as conseqüências jurídicas previstas na norma jurídica a um caso concreto. É,

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assim, o ato de direito público que transforma a norma geral em norma individual sob a forma de sentença ou de decisão administrativa. A autoridade administrativa pode aplicar de ofício ditas conseqüências, sem ser provocada pela parte, desde que ocorra a condição (fato) prevista na norma para a produção de seus efeitos. Já o juiz (autoridade judiciária) só as aplica quando provocado pela parte interessada. O meio de provocar a aplicação judicial do direito é a ação, regida pelas leis processuais, que completa e protege a pretensão que tem todo titular do direito subjetivo, ou seja, que completa e protege a faculdade de exigir de outrem uma prestação, componente do direito subjetivo. Torna efetiva a pretensão, possibilitando que o Estado, monopolizador do poder coercitivo, a faça ser direta ou indiretamente atendida. Na sociedade primitiva não era assim, por nela imperar a justiça privada.

A toda pretensão corresponde uma ação, como a todo direito subjetivo, uma pretensão. Sem a ação, o direito está desarmado, passando a pertencer ao reino da Moral, como ocorre quando há prescrição, em que a prestação não pode mais ser exigida judicialmente, ficando o cumprimento da mesma dependendo exclusivamente da vontade do devedor. Assim, o titular do direito, além de ter o direito subjetivo, ao qual corresponde uma pretensão, tem, por ser titular, direito de ação, ou seja, o direito autônomo de provocar a prestação jurisdicional do Estado por meio de uma ação (direito subjetivo público) .Ação pode ser definida como o meio processual, previsto na lei processual, pelo qual é pleiteável a tutela do Estado para o direito ameaçado, contestado ou lesado, ou, então, o meio de provocar a prestação jurisdicional do Estado para a proteção de um interesse legítimo.

Ajuizada a ação, contestada, isto é, com a “resposta” do réu, produzida a prova, chega o momento da aplicação do direito, na fase final do processo. Nesse momento o juiz tem que, primeiro, determinar a natureza da demanda e precisar a pretensão das partes. Feito isto, verifica a norma jurídica aplicável ao caso sub judice. Em regra, aplicável é o direito nacional, em virtude do princípio da territorialidade das leis, que prescreve estarem todas as pessoas, nacionais ou estrangeiras, que se encontrarem no território do Estado, submetidas às suas leis. Mas pode ao caso ser aplicável mais de um direito, o direito nacional e o estrangeiro, por serem, por exemplo, as partes estrangeiras, ou por ser só uma delas, por ter sido o ato celebrado no estrangeiro etc. Em tal ocorrendo, há conflito de leis no espaço, dirimido pelo direito internacional privado. Pode ocorrer que o ato tenha tido o começo de sua formação sob o império de uma lei já revogada, no qual tenha se formado quase totalmente, tendo sido concluído, entretanto, na vigência de outra lei. Quando tal ocorrer haverá conflito de leis no tempo, surgindo a questão da retroatividade ou da irretroatividade da lei nova ou de sua aplicação imediata. Pode ser argüida por uma das partes a inconstitucionalidadeda lei, ou seja, a incompatibilidade da lei, aplicável ao caso concreto, com a Constituição. Mas, havendo dúvida quanto à constitucionalidade, deve o juiz seguir a lição de Black: “Havendo razoável dúvida, resolve-se em favor da constitucionalidade”. Pode ser argüida a revogação tácita da lei quando incompatível com lei nova da mesma natureza, em vigor ao tempo do julgamento, que a torna inaplicável ao caso sub judice. Finalmente, pode ocorrer não ser o caso concreto previsto no direito vigente, ou seja, pode inexistir norma aplicável ao mesmo. Aí, diz-se haver lacuna do direito, sanável pela analogia, pelos costumes e pelos princípios gerais do direito. Se o caso concreto for trabalhista, a lacuna poderá ser preenchida pela eqüidade. Assim, mesmo havendo lacuna, o juiz terá meios para encontrar a norma jurídica aplicável a questão não prevista. Mas, se se tratar de questão criminal, havendo lacuna, inaplicável a analogia, bem como se se tratar de restrição de direitos.

Determinada afinal a norma jurídica aplicável ao caso concreto, o juiz deverá interpretá-la. Pela interpretação estabelece o exato sentido da norma, o seu alcance, as suas conseqüências  jurídicas e os elementos constitutivos do caso típico nela previsto. Interpretada, verificará o juiz se o

caso concreto corresponde ao caso típico legal. Se corresponder, aplicará ao mesmo as conseqüências jurídicas previstas na norma. Tal aplicação tem a forma do raciocínio silogístico. Daí  denominar-se silogismo jurídico ou judicial a atividade mental de aplicação do direito. Dito silogismo tem por premissa maior a norma jurídica; por premissa menor, o caso concreto a ser

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decidido pelo juiz, e por conclusão ou corolário, a sentença, que impõe a uma das partes ou a ambas as conseqüências previstas na norma jurídica. Assim, por exemplo, ocorrendo bigamia, teríamos o seguinte raciocínio - premissa maior: nulo é o casamento se ocorrer bigamia (preceito legal); premissa menor : Fulano, casado, escondendo tal situação, casa-se com Beltrana, solteira, que pode desconhecer o estado civil do seu noivo; conclusão: nulidade do casamento, além do procedimento penal. Podem existir silogismos jurídicos sucessivos, que ocorrem quando a aplicação de uma regra de direito supõe a aplicação preliminar de outras regras, tendo, então, de se “decompor o raciocínio em uma série de silogismos sucessivos”. Como, por exemplo, no caso em que houver conflito de leis no espaço. Para Kelsen a conclusão, ou seja, a sentença, é norma jurídica individual, por ser a concretização de uma norma geral, tendo em vista as particularidades do caso concreto.

Mas, o silogismo nem sempre é simples, podendo haver, na premissa maior, recurso ao direito intertemporal, se se tratar de norma revogada, ao direito internacional privado, se se tratar de dúvida quanto à legislação aplicável (nacional ou estrangeira) ou a mais de uma lei, enquanto o caso concreto pode apresentar particularidades que obriguem o juiz a recorrer a mais de uma regra  jurídica para resolver a questão principal ou os incidentes. Pode se afirmar que o julgamento é um

silogismo, porém, não se deve acreditar ser a atividade judicial simples operação lógica, não só porque na aplicação do direito entram fatores psíquicos e apreciações de interesses, especialmente na determinação do sentido da lei, como também porque o juiz nunca deixa de ser uma personalidade que pensa e tem uma consciência e vontade, para ser degradado a um autômato de decisões. Dramática, muitas vezes, é a aplicação do direito, bastando lembrar, por exemplo, a aplicação do direito de família no tocante à posse e guarda de filhos menores quando separados estão os pais. Muitas vezes, nesses casos, há drama na consciência do juiz entre a frieza da lei ( dura lex, sed lex), os interesses dos menores, que comandam a decisão, e o sofrimento do pai ou mãe ao perder a guarda do filho.

A norma contém, em si, uma generalidade, procede por abstração, fixando tipos, referindo-se a uma série de casos indefinidos e não a casos concretos.

De modo que essa abstração de normas, em virtude de seu processo generalizante, implica seu afastamento da realidade, surgindo um antagonismo entre normas jurídicas e fatos. Contudo, essa oposição não é uma hiato insanável, porque os fatos individuais apresentam o geral determinado no conceito abstrato, ou seja, uma “nota de tipicidade” que permite sejam enquadrados nos conceitos normativos. Deveras, a norma jurídica só se movimenta ante um fato concreto, pela ação do magistrado, que é o intermediário entre a norma e a vida ou o instrumento pelo qual a norma abstrata se transforma numa disposição concreta, regendo uma determinada situação individual. Assim, o dispositivo do Código Civil que estabelece a proteção possessória, garantindo o possuidor, permanece como norma abstrata até o momento em que o possuidor, alegando uma turbação da posse, pede ao órgão judicante a aplicação da norma protetora . A aplicação do direito, dessa forma concebida, denomina-se subsunção.

O conceito normativo contém uma potencialidade que possibilita a subsunção dos objetos individuais por ele abarcados, excluindo os que não o são. A subsunção revela a perseverança do  juiz em se aproximar mais da realidade fática, completando o pensamento abstrativo contido na

norma.

A norma de direito é um modelo funcional que contém, em si, o fato, pois sendo um tipo geral oposto à individualidade concreta, pode ser adaptada a esta última. Logo, o tipo contido no preceito normativo tem dupla função: é meio de designação dos elementos da hipótese de fato, e forma de apreensão e exposição de relações jurídicas.

A subsunção tem como problema central a qualificação jurídica dos casos sub judice, que apresenta dificuldades, devido a dois fatores:

1º) A falta de informação sobre os fatos do caso. Com freqüência, o juiz ignora se o caso concreto pertence ou não a uma classe, a um tipo legal, porque não possui as informações necessárias. P. Ex: mesmo sabendo que todo ato de alienação é gratuito ou oneroso, ele pode ignorar se a alienação que “A” fez de sua casa a “B” foi a título oneroso ou gratuito, simplesmente porque

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desconhece se “B” pagou ou não uma importância pelo imóvel. Essa dificuldade de se saber se “A” dispôs da casa a título oneroso ou gratuito pode originar-se de outra fonte, ou seja, a indeterminação semântica, vaguidade ou ambigüidade, dos conceitos gerais contidos na norma. Mesmo conhecendo todos os fatos do caso, pode o magistrado, ainda, não saber se a soma de dinheiro que “B” entregou a “A” como pagamento pelo imóvel constituía ou não um preço, em sentido técnico. Suponha-se, p. ex., que essa quantia fosse muito inferior ao valor econômico da casa. Hipótese em que podem surgir dúvidas sobre o fato: trata-se de uma compra e venda ou de uma doação encoberta? Essa primeira dificuldade - falta de conhecimentos empíricos - é de uma certa forma remediável pelas presunções legais, que permitem ao órgão jurisdicional suprir sua falta de conhecimento dos fatos e atuar como se conhecesse todas as circunstâncias relevantes do caso; levam-se em conta o princípio do onus probandi, segundo o qual todo aquele que afirma a existência de um fato deve prová-lo, e uma série de outras presunções: a da boa fé, a da onerosidade dos atos mercantis etc., que constituem um conjunto de regras auxiliares para a determinação da existência jurídica dos fatos. A produção da prova visa criar no juiz a convicção da existência de certos fatos, direta ou indiretamente relevantes, descobertos sempre com base nas normas que regem os meios de prova admitidos em direito (confissão, depoimento testemunhal, documentos, perícia etc.)

2º) A indeterminação semântica dos conceitos normativos, que não pode ser totalmente eliminada, podendo, porém, em certo ponto, ser mitigada mediante a introdução de terminologia técnica, o emprego de conceitos técnicos, introduzidos por meio de definições explícitas que estipulam suas regras de aplicação.

A subsunção do caso individual sob um genérico encontra-se ante a questão: o caso concreto tem solução, mas o magistrado não sabe qual é, ou porque falta informação sobre algum fato relevante (lacuna de conhecimento) ou porque o caso individual cai dentro da zona de vaguidade ou de penumbra de algum conceito relevante (lacuna de reconhecimento). Na determinação do direito que deve prevalecer no caso concreto, o juiz precisa verificar se o direito existe, qual o sentido exato da norma aplicável e se esta aplica-se ao fato sub judice.

Para a subsunção, resolvendo-se os problemas oriundos das lacunas de conhecimento e de reconhecimento, é necessária uma interpretação para saber qual a norma que incide sobre o caso sub  judice, ou melhor, para determinar a qualificação jurídica da matéria fática sobre a qual deve incidir

uma norma geral. Para subsumir o órgão precisa interpretar. A subsunção está condicionada por uma prévia escolha de natureza axiológica, entre as vária interpretações possíveis.

Quando o magistrado não encontra norma que seja aplicável a determinado caso, e não podendo subsumir o fato a nenhuma norma, porque há falta de conhecimento sobre um status  jurídico de um certo comportamento, devido a um defeito do sistema normativo que pode consistir na ausência de uma solução, ou na existência de várias soluções incompatíveis, estamos diante de um problema de lacuna normativa, no primeiro caso ou de lacunas de conflito ou antinomia, no segundo.

A lacuna constitui um estado incompleto do sistema que deve ser colmatado ante o princípio da plenitude do ordenamento jurídico. Daí a importante missão do art.4º da Lei de Introdução ao Código Civil, que dá ao magistrado, impedido de furtar-se de uma decisão, a possibilidade de integrar ou preencher a lacuna, de forma que possa chegar a uma solução adequada. Trata-se do fenômeno da integração normativa. É um desenvolvimento aberto do direito, dirigido metodicamente, em que o aplicador adquire consciência da modificação que as normas experimentam, continuamente, ao serem aplicadas às mais diversas relações da vida, chegando a apresentar, na ordem normativa, omissões concernentes a uma nova exigência da vida. O juiz tem permissão para desenvolver o direito sempre que se apresentar uma lacuna.

Ao lado do princípio da plenitude do ordenamento jurídico situa-se o da unidade da ordem jurídica, que pode levar-nos à questão da correção do direito incorreto. Se se apresentar uma antinomia, ter-se-á um estado incorreto do sistema que precisará ser solucionado, pois o

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postulado desse princípio é o da resolução das contradições. O sistema jurídico deverá, teoricamente, formar um todo coerente, devendo, por isso, excluir qualquer contradição, assegurando sua homogeneidade e garantindo a segurança na aplicação do direito. Para tanto, o  jurista lançará mão de uma interpretação corretiva guiado pela interpretação sistemática, que o

auxiliará na pesquisa dos critérios a serem utilizados pelo aplicador do direito para solucionar a antinomia. É preciso frisar que o princípio lógico da não contradição não se aplica às normas conflitantes, mas às proposições que as descrevem . Antinomia é o conflito entre duas normas, dois princípios, ou de uma norma e um princípio geral de direito em sua aplicação prática a um caso particular. É a presença de duas normas conflitantes, sem que se possa saber qual delas deverá ser aplicada ao caso singular.

Havendo lacuna ou antinomia, o jurista, ante o caráter dinâmico do direito, ao sistematizá-lo, deve apontar critérios para solucioná-las. O processo de sistematização jurídica compreende várias operações que tendem não só a exibir as propriedades normativas, fáticas e axiológicas do sistema e seus defeitos formais (antinomias e lacunas), mas também a reformulá-lo para alcançar um sistema harmônico, atendendo aos postulados de capacidade total de explicação, ausência de contradições e aplicabilidade fecunda do direito a casos concretos. Logo, havendo lacuna ou antinomia, a sua solução é encontrada no sistema jurídico elaborado pelo jurista.

O magistrado, como dissemos, ao aplicar as normas jurídicas, criando uma norma individual, deverá interpretá-las, integrá-las e corrigi-las, mantendo-se dentro dos limites marcados pelo direito. As decisões dos juizes devem estar em consonância com o conteúdo da consciência  jurídica geral, com o espírito do ordenamento jurídico, que é mais rico de conteúdo do que a

disposição normativa, pois contém critérios jurídicos e éticos, idéias jurídicas concretas ou fáticas que não encontram expressão na norma do direito. Por isso, a tarefa do magistrado não é meramente mecânica, requer um certo preparo intelectual, ao determinar qual a norma que vai aplicar.

A aplicação jurídica encerra as seguintes operações técnicas:

1º) construção de conceitos jurídicos e ordenação sistemática do direito pela ciência jurídica; 2º) determinação da existência da norma jurídica no espaço e no tempo, pelo órgão;

3º) interpretação da norma pelo jurista e pelo órgão; 4º) integração do direito pelo órgão;

5º) investigação corretiva do direito pelo órgão e pelo jurista;

6º) determinação, pelo órgão, da norma ou das normas aplicáveis, por servirem de fundamento de validade à norma individual (sentença);

7º) estabelecimento de uma relação entre a norma individual, criada pelo órgão para o caso sub judice, com outras do ordenamento que se sabe válidas.

Ao Poder Judiciário está reservada a grande responsabilidade de adequar o direito, quando a sua vigência social apresenta sintomas de inadaptabilidade em relação à realidade social, mantendo-o vivmantendo-o. Desta afirmaçãmantendo-o nãmantendo-o se infere que mantendo-o juiz tenha uma liberdade mantendo-onímmantendo-oda. (Que abrange tudmantendo-o, que não tem restrições, que é ilimitado)

O órgão judicante é livre não só para aplicar a norma que julgar adequada ao caso, ainda que não haja sido invocada no processo, e mesmo em grau de recurso, mas também para solucionar antinomias e preencher as lacunas, de conformidade com os meios previstos no art. 4º da nossa Lei de Introdução ao Código Civil, que permite uma integração analógica, introduzindo uma norma não expressa, que autoriza a utilização de normas costumeiras e o recurso aos princípios gerais de direito, que leva à introdução no sistema de normas generalíssimas não explícitas. Seria este artigo uma espécie de norma de “reconhecimento” ou de identificação, cujo conteúdo, além de oferecer critérios caracterizadores para a inclusão da norma de conduta latente no sistema, confere ao magistrado o poder de criação da norma individual completante, permitindo assim o desenvolvimento judicial aberto, em caso de lacuna.

Contudo o juiz, ao aplicar o direito, não deve exceder aos ditames jurídico-legais, nem prejudicar terceiros.

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Dentro da ordem jurídica, o poder de jurisdição do magistrado tem uma zona de liberdade, dentro da qual pode exercer sua atividade. A liberdade de julgar só é garantida nos limites da órbita  jurídica que lhe corresponde; se o órgão judicante ultrapassar esses marcos, invade órbitas jurídicas

alheias e sua atividade torna-se uma perturbação da ordem, um abuso de direito.

Percebe-se que o problema do abuso do direito, ou desvio de poder, está em íntima conexão com o direito subjetivo, pois este apresenta-se na vida jurídica como uma posição diante da norma, uma autorização dada pela norma a um sujeito, de fazer ou de ter algo, em face de alguém que se obriga. Logo, se o magistrado exceder tal permissão que lhe foi dada normativamente estará agindo de modo abusivo.

Assim sendo, o poder jurisdicional está limitado pelas normas, visto que, além de se ater às normas processuais, deve, por exemplo:

1) circunscrever-se aos fatos em que se funda a relação jurídica litigiosa;

2) deter-se nos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes;

3) obedecer a normas legais sobre formas probatórias dos atos jurídicos; 4) considerar as presunções legais;

5) levar em conta, ao solucionar antinomias e ao preencher lacunas, o espírito informador do ordenamento jurídico, fixando-se no complexo daquelas convicções sociais vigentes, que integram o sistema valorativo da ordem jurídica em vigor, bem como no disposto nos arts. 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.

As decisões dos juizes estão condicionadas pelo sistema jurídico em seus três subconjuntos: normativo, valorativo e fático.

Se, nos casos de lacuna, o magistrado julga sem lei, até mesmo contra ela, para preencher omissão legal, atendendo às necessidades emergentes da vida social e aos reclames da justiça, é o sistema, em seu todo, que o autoriza a criar norma individual sem relação lógica de subalternação a uma lei. A norma individual possui, portanto, um limite, que seria a sua plena e pacífica compatibilidade com o ordenamento jurídico a fim de nele poder penetrar sem causar-lhe incongruências. Se assim não fosse, a ciência do direito não teria como considerar válida a norma individual do juiz, que julga caso inédito. A tarefa do órgão judicante é criadora, por dar como explícito algo já implícito no sistema jurídico, estabelecendo a norma individual relativa ao caso sub  judice.

O juiz, diante de cada caso, deve distinguir as questões preliminares das questões de mérito e, no campo destas, deve, ainda, subdividir os problemas que podem surgir em questões de direito e em questões de fato.

A questão preliminar é a de que depende a admissão do debate; abrange os problemas referentes à capacidade das partes e à competência do juiz.

Assim, nas questões preliminares é que se aprecia se a parte é legítima, se está devidamente representada e se o juiz é competente para dirimir o conflito.

A competência pode depender da natureza do interesse em litígio ou do domicílio das partes, ou, ainda, de outros critérios fixados pelo Direito Processual.

VALIDADE DA LEI

Tomando o termo validade como gênero, nele distinguimos a vigência como validade formal ou técnico-jurídica, a eficácia como validade fática, e o fundamento axiológico como validade ética. Logo, a validade seria um complexo, com aspectos de vigência, eficácia e fundamento.

Estes três aspectos essenciais da validade são os requisitos para que a norma jurídica seja legitimamente obrigatória. Há na norma uma relação necessária entre validade formal, fática e ética.

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Para Hans Kelsen, vigência seria a existência específica da norma, indicando uma propriedade das relações entre normas. Assim , uma norma inferior só será válida se se fundar em uma superior, reveladora do órgão competente e do processo para sua elaboração. A norma válida, então, será a promulgada por um ato legítimo de autoridade, não tendo sido revogada. A existência de uma norma positiva, isto é, sua vigência, é diferente da existência do ato de vontade que a põe. A norma pode ser vigente até mesmo quando o ato de vontade de seu elaborador deixou de existir. O indivíduo que criou uma norma jurídica não precisa continuar a querer a conduta normada para que a norma seja vigente. Logo, a validade da norma independe do ato volitivo de seu elaborador, que é tão-somente condição de existência.

A norma será vigente, portanto, mesmo que não tenha sido aplicada ou ainda que seu criador não mais exista. Será imprescindível para que tenha vigência (sentido amplo) a presença de alguns requisitos, como:

1º) elaboração por um órgão competente, que é legítimo por ter sido constituído para tal fim;

2º) competência ratione materiae do órgão, isto é, a matéria objeto da norma deve estar contida na competência do órgão;

3º) observância dos processos ou procedimentos estabelecidos em lei para sua produção, que nos EUA se denomina due process of law.

A validade formal ou vigência, em sentido amplo, é uma relação entre normas (em regra, inferior e superior), no que diz respeito à competência dos órgãos e ao processo de sua elaboração. Vigente será a norma se emanada do poder competente com obediência aos trâmites legais.

Segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr., a norma válida é aquela cuja autoridade, ainda que o conteúdo não seja cumprido, é respeitada, sendo tecnicamente imune a qualquer descrédito. Logo, o valer de uma norma não depende da existência real e concreta das condutas que prescreve: mesmo descumprida, ela vale. Será válida a norma se a autoridade legiferante for tecnicamente competente e se agiu de conformidade com as normas de sua competência legislativa, hipótese em que se terá uma validade condicional. Também será válida a norma cuja autoridade legisladora agiu dentro dos fins estabelecidos pelo ordenamento, caso em que haverá uma validade finalística. Fácil é denotar que para ser válida a norma precisará estar integrada no ordenamento, retirando sua validade de outras normas que condicionam a competência e/ou determinam os fins. Validade formal é, pois, sob esse ponto de vista, uma qualidade da norma cuja relação autoridade/sujeito (cometimento) é imune, por estar ela conforme o ordenamento, tanto quanto às condições como quanto aos fins por ele estabelecidos.

O âmbito temporal de validade constitui o período durante o qual ela tem vigência (sentido estrito) e o espacial diz respeito ao espaço em que se aplica. Pode-se afirmar que as normas jurídicas têm vida própria, pois nascem, existem e morrem. Esses momentos dizem respeito à determinação do início, da continuidade e da cessação de sua vigência. Vigência temporal é uma qualidade da norma atinente ao tempo de sua atuação, podendo ser invocada para produzir efeitos. Seria, então, um termo com o qual se demarcaria o tempo de validade de uma norma. A vigência pode coincidir com a validade, mas nem sempre, pois nada obsta que uma norma válida, cujo processo de produção já se aperfeiçoou, tenha sua vigência postergada (LICC, art. 1º).

As normas nascem com a promulgação, mas só começam a vigorar com sua publicação no Diário Oficial. De forma que a promulgação atesta sua existência e a publicação, sua obrigatoriedade, visto que ninguém pode furtar-se a sua observância, alegando que não a conhece (LICC, art. 3º). É obrigatória para todos, mesmo para os que a ignoram, porque assim exige o interesse público. Vigor é uma qualidade da norma relativa à sua força vinculante, pela qual não há como subtrair-se ao seu comando.

A obrigatoriedade da norma não se inicia no dia de sua publicação, salvo se ela assim o determinar. A escolha de uma ou outra determinação é arbitrária, pois o órgão elaborador pode fazer com que a data da publicação e a entrada em vigor coincidam, se julgar inconveniente ao interesse público a existência de um tempo de espera; pode, ainda, estipular data precisa e mais remota

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quando verificar que há necessidade de maior estudo e divulgação devido à importância da norma, como ocorreu com o Código Civil, promulgado a 1º de janeiro de 1916 e com início de vigência estabelecida para 1º de janeiro de 1917 (CC, art. 1.806).

A norma jurídica pode ter vigência temporária ou determinada, pelo simples fato de que o seu elaborador já fixou-lhe o tempo de duração, p. ex., as leis orçamentarias, que fixam a despesa e a receita nacional pelo período de um ano. Tais normas desaparecem do cenário jurídico com o decurso do prazo preestabelecido.

A norma jurídica pode ter vigência para o futuro sem prazo determinado, durando até que seja modificada ou revogada por outra. Não sendo temporária a vigência, a norma não só atua, podendo ser invocada para produzir efeitos, mas também tem força vinculante (vigor) até sua revogação. Trata-se do princípio da continuidade, que assim se enuncia: não se destinando a vigência temporária, a norma estará em vigor enquanto não surgir outra que a altere ou revogue (LICC< art. 2º). Contudo, as normas só podem ser revogadas por outras de hierarquia igual ou superior.

Revogar é tornar sem efeito uma norma, retirando sua obrigatoriedade. A revogação é gênero, que contém duas espécies: a ab-rogação, suspensão total da norma anterior; e a derrogação, que torna sem efeito parte da norma. Logo, se derrogada, a norma não sai de circulação  jurídica, pois somente os dispositivos atingidos é que perdem a obrigatoriedade.

A revogação pode ser, ainda: expressa, quando o elaborador da norma declarar a lei velha extinta em todos os seus dispositivos ou apontar artigos que pretende retirar; ou tácita, se houver incompatibilidade entre a lei nova e a antiga, pelo fato de que a nova passa a regular inteiramente a matéria tratada pela anterior (LICC, art. 2º, par. 1º)

O PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE

A lei, a partir do momento em que entra em vigor, é obrigatória para todos os seus destinatários, não podendo o juiz negar-se a aplicá-la ao caso sub judice. Entrando em vigor, a ninguém é lícito ignorar a lei. Qual o fundamento desse princípio? A doutrina, seguida pela maioria dos juristas do século passado, encontrou-o na presunção absoluta do conhecimento da lei. A  justificação desse princípio decorre, segundo a opinião moderna, da necessidade social de que, publicada a lei, transcorrida a vacatio legis, deve ser a lei aplicada mesmo aos casos em que for argüida sua ignorância. Na verdade, a multiplicidade de leis, fenômeno característico de nossa época, dificulta o conhecimento de todas as leis pelos próprios juristas, quanto mais pelos leigos. Assim, esse princípio só pode ser justificado tendo em vista razões de ordem social.

Portanto, depois da publicação ou decorrida a vacatio legis, a lei torna-se obrigatória, não podendo ser alegada sua ignorância: nemo jus ignorare censetur, sendo aplicada, mesmo àqueles que a desconhecem, porque o “interesse da segurança jurídica exige esse sacrifício”. Por isso, a obrigatoriedade da lei não está condicionada ao seu efetivo conhecimento, pois a lei é aplicável a todos, desde que publicada, independentemente de seu conhecimento. Se a aplicação da lei dependesse de seu efetivo conhecimento, não haveria segurança nas relações jurídicas, pois, como o conhecimento é subjetivo, não se poderia provar a falsidade da alegação de sua ignorância.

Conseqüência da obrigatoriedade da lei, independente de seu efetivo conhecimento: o erro de direito não anula os atos jurídicos. Em regra, o erro de direito não justifica: error juris non excusat , salvo quando for a causa única ou principal do negócio jurídico. No direito penal, no que diz respeito às normas que fixam crimes e penas, não tem nenhum valor o erro de direito, porém, nas contravenções penais, desde que excusável, tem valor relativo, pois o juiz pode, no caso de error juris, deixar de aplicar a pena.

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TERCEIRA AULA

1. DIREITO POSITIVO

Definindo o DIREITO como “conjunto de normas executáveis coercitivamente, reconhecidas ou estabelecidas e aplicadas por órgãos institucionalizados (estatais ou internacionais)”, passaremos a seguir a definir Direito Positivo e Direito Objetivo, para, em seguida, distinguirmos o Direito da Moral.

Caio Mário da Silva Pereira, em seu Livro Instituições de Direito Civil, Vol. I, define Direito Positivo como o conjunto de princípios que pautam a vida social de determinado povo em determinada época. É nessa acepção que nos referimos ao direito romano, ao direito inglês, ao direito alemão, ao direito brasileiro etc...Não importa seja escrito ou não escrito, de elaboração sistemática ou de formação jurisprudencial. O direito positivo é o que está em vigor num povo determinado, e compreende toda a disciplina da conduta, abrangendo as leis votadas pelo poder competente, os regulamentos, as disposições normativas de qualquer espécie.

Paulo Dourado de Gusmão o define como o direito histórica e objetivamente estabelecido, efetivamente observado ou então, passível de ser imposto coercitivamente, encontrado

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em leis, códigos, tratados internacionais, costumes, resoluções, regulamentos, decretos, decisões de tribunais etc. é, assim, o direito determinável na história de um país com pouca margem de erro, por se encontrar em documentos históricos (códigos, leis, repertórios de jurisprudência, compilação de costumes, tratados internacionais etc.). É o direito vigente ou que teve vigência. É direito positivo tanto o vigente hoje como o que vigorou ontem ou no passado longínquo, como, por exemplo, o Código de Hamurabi ou o direito romano. Direito positivo é a garantia da certeza do direito. É o direito cuja existência não é contestada por ninguém.

Direito positivo tem dimensão temporal, pois é direito promulgado (legislação) ou declarado (precedente judicial, direito anglo-americano), tendo vigência a partir de determinado momento histórico, perdendo-a quando revogada em determinada época. Tem dimensão espacial ou territorial, pois vige e tem eficácia em determinado território ou espaço geográfico em que impera a autoridade que o prescreve ou o reconhece, apesar de haver a possibilidade de ter eficácia extraterritorial. Espaço que geralmente coincide com o território do Estado que o impõe, porém pode ser mais amplo. O direito positivo tem ainda caráter formal, pois é instituído por meio de fonte formal (tratado, lei, decreto-lei, costume, precedente judicial, regulamento etc.). Caracteriza-se, também, por auto controlar a sua própria criação, modificação ou revogação, pois estabelece regras para a elaboração legislativa. Finalmente, impõe uma ordem em que há hierarquia de suas normas, sendo as superiores, como, por exemplo, a constitucional, mais ricas em conteúdo e quantitativamente reduzidas em número, enquanto as inferiores ou subordinadas, à medida que particularizam a matéria jurídica, tornam-se mais gerais, por isso mais numerosas.

1.2. DIREITO OBJETIVO

Direito objetivo é a consideração normativa do direito, ou seja, a compreensão do direito como norma obrigatória. Segundo Washington de Barros Monteiro, Direito Objetivo é a regra de direito, a regra imposta ao proceder humano, a norma de comportamento a que o indivíduo deve se submeter, o preceito que deve inspirar sua atuação. À respectiva observância pode ser compelido mediante coação. O Direito objetivo designa o direito enquanto regra.

2. DIREITO E MORAL

A análise comparativa entre a ordem moral e a jurídica é importante não apenas quando indica os pontos de distinção, mas também quando destaca os focos de convergência. Direito e Moral são instrumentos de controle social que não se excluem, antes, se completam e mutuamente se influenciam.

2.1. NOÇÃO DE MORAL

A pesquisa quanto ao nível de relação entre o Direito e a Moral exige o conhecimento prévio das notas essenciais destes dois setores da Ética. A Ética se identifica, fundamentalmente, com a noção de bem, que constitui o seu valor. Esta é a palavra-chave no campo da Moral. Para o estoicismo o bem consistia no desprendimento, na resignação, em saber suportar serenamente o sofrimento, pois a virtude se revelava como a única fonte da felicidade. Para o epicurismo a idéia de bem se identificava com o prazer, não um prazer desordenado, mas concebido dentro de uma escala de importância. Paulo Nader considera bem tudo aquilo que promove o homem de uma forma integral e integrada.Integral significa a plena realização do homem, e integrada, o condicionamento a idêntico interesse do próximo. Dentro desta concepção tanto a resignação quanto o prazer podem constituir-se em um bem, desde que não comprometam o

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desenvolvimento integral do homem e nem afetem igual interesse dos membros da sociedade. A fonte de conhecimento do bem há de ser a ordem natural das coisas, aquilo que a natureza revela e ensina aos homens e a via cognoscitiva deve ser a experiência combinada com a razão.

1.2. DISTINÇÕES ENTRE DIREITO E MORAL

1.2.1. Distinções de ordem formal

a) Determinação do Direito e a Forma não concreta da Moral - Enquanto o Direito se manifesta mediante um conjunto de regras que definem a dimensão da conduta exigida, que especificam a fórmula do agir, a Moral estabelece uma diretiva mais geral, sem particularizações.

b)A Bilateralidade do direito e a Unilateralidade da Moral - As normas jurídicas possuem uma estrutura imperativo-atributiva, isto é, ao mesmo tempo em que impõem um dever jurídico a alguém, atribuem um poder ou direito subjetivo a outrem. Daí se dizer que a cada direito corresponde um dever. Se o trabalhador possui direitos, o empregador possui deveres. A moral possui uma estrutura mais simples, pois impõe deveres apenas. Perante ela, ninguém tem o poder de exigir uma conduta de outrem. Fica-se apenas na expectativa de o próximo aderir às normas. Assim, enquanto o Direito é bilateral, a Moral é unilateral. Chamamos a atenção para o fato de que este critério diferenciador não se baseia na existência ou não de vínculo social. Se assim o fosse, seria um critério ineficaz, pois tanto a Moral quanto o Direito dispõem sobre a convivência. A esta qualidade vinculativa, que ambos possuem, utilizamos a denominação alteridade, de alter, outro. Miguel Reale denomina esta característica do Direito de bilateralidade atributiva, sendo que o autor apresenta a bilateralidade (simples, no caso), como atributo da Moral.

c) Exterioridade do Direito e Interioridade da Moral - O direito se caracteriza pela exterioridade, enquanto que a Moral, pela interioridade. Com isto se quer dizer, modernamente, que os dois campos seguem linhas diferentes. enquanto a Moral se preocupa pela vida interior das pessoas, como a consciência, julgando os atos exteriores apenas como meio de aferir a intencionalidade, o Direito cuida das ações humanas em primeiro plano e, em função destas, quando necessário, investiga o animusdo agente.

d)Coercibilidade do Direito e incoercibilidade da Moral - Uma das notas fundamentais do Direito é a coercibilidade. Entre os processos que regem a conduta social, apenas o Direito é coercível, ou seja, capaz de acionar a força organizada do Estado, para garantir o respeito aos seus preceitos. A via normal de cumprimento da norma jurídica é a voluntariedade do destinatário, a adesão espontânea. Quando o sujeito passivo de uma relação jurídica, portador do dever jurídico, opõe resistência ao mandamento legal, a coação se faz necessária, essencial à efetividade. A coação, portanto, somente se manifesta na hipótese de não-observância dos preceitos legais. A Moral, por seu lado, carece do elemento coativo. É incoercível. Nem por isso as normas da Moral social deixam de exercer uma certa intimidação. Consistindo em uma ordem valiosa para a sociedade, é natural que a inobservância de seus princípios provoque uma reação por parte dos membros que integram o corpo social. Esta reação, que se manifesta de forma variada e com intensidade relativa, assume caráter não apenas punitivo, mas exerce também uma função intimidativa, desestimulante da violação das normas morais.

1.1.2. Distinções quanto ao conteúdo

a) O significado de Ordem do Direito e o sentido de Aperfeiçoamento da Moral - Ao dispor sobre o convívio social, o Direito elege valores de convivência. O seu objetivo limita-se a

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