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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação do Porto Processo nº

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0612883

Relator: FERREIRA DA COSTA Sessão: 18 Setembro 2006 Número: RP200609180612883 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.

CONTRATO DE TRABALHO TRABALHO TEMPORÁRIO

DESPEDIMENTO

Sumário

I. Na falta de redução a escrito do contrato de utilização de trabalho

temporário ou do contrato de trabalho temporário, ou de falta de indicação do motivo do recurso a tal tipo de contratação, a consequência é sempre a

mesma: o contrato converte-se em contrato de trabalho sem termo.

II. No caso de ter havido omissão da indicação ou falsidade do motivo de

recurso ao trabalho temporário, o trabalhador pode escolher em qual das duas empresas (de trabalho temporário ou utilizadora do trabalho temporário)

pretende ficar vinculado por contrato sem termo.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B... instaurou acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C..., S.A., pedindo que se julgue nula a estipulação do termo - aposto nos contratos de trabalho temporário e de utilização - e que se declare ilícito o despedimento e que se condene a R. a pagar à A. as

prestações pecuniárias vencidas e vincendas até decisão final e a reintegrar ou indemnizar a A. de acordo com a sua opção, a exercer até à sentença.

Alega, para tanto, que foi admitida ao serviço da R. através de dois contratos de trabalho temporário celebrado com “D...”, tendo o primeiro terminado em 2000-10-20 e o segundo vigorado desde 2001-01-22 até 2002-01-22, sendo certo que os motivos invocados não são verdadeiros e que a R. tentou iludir a

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lei quando recorreu ao trabalho temporário.

A R. contestou por impugnação, alegando serem verdadeiras as razões do recurso ao trabalho temporário e, por excepção, invocou a ilegitimidade e a prescrição, sendo esta relativa ao primeiro contrato.

A A. apresentou a sua resposta às excepções.

No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade e relegada para a sentença a da prescrição.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou procedente a excepção de prescrição dos créditos decorrentes do primeiro contrato de trabalho e, quanto aos subsequentes, julgou-os nulos, tendo absolvido a R.

quanto ao mais.

Inconformada com o assim decidido, a A. interpôs o presente recurso de apelação, em cujo requerimento invocou a nulidade da sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

1. A apelante mantinha com a apelada um contrato de trabalho sem termo, por nulidade quer do contrato de trabalho temporário quer do contrato de

utilização;

2. Em 14 de Janeiro de 2002 foi comunicado à apelante a cessação do contrato de trabalho temporário a partir de 21 de Janeiro de 2002;

3. A apelada conhecia suficientemente os motivos não verdadeiros da contratação e a comunicação da cessação à apelante;

4. A nulidade dos contratos acarreta a solidariedade da apelada perante o ilícito;

5. Existe simulação nos contratos celebrados, pelo que deve a apelada,

destinatária e beneficiária da prestação da apelante, responder pela ilicitude do despedimento, reintegrando-a ao seu serviço;

6. A douta sentença, ora posta em crise, sofre do vício de nulidade por contradição entre os seus fundamentos e sua decisão;

7. Fez incorrecta interpretação do artº 13° do regime aprovado pelo DL 64- A/89, de 27/02, art° 42° n° 1 do mesmo diploma legal, art° 16° do DL 358/89, de 17/10, art° 342° do CC e art° 53° da CRP.

A R. apresentou a sua alegação de resposta, concluindo pela confirmação da sentença.

O Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer,

manifestando o seu entendimento no sentido de que a apelação não merece provimento.

Recebido o recurso, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

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São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:

2.1. A autora celebrou com a empresa de trabalho temporário "D……", um contrato denominado "de trabalho temporário", que teve início em 12 de Maio de 1999, conforme documento de fls. 27 que aqui se dá por reproduzido, para trabalhar ao serviço da ré como empresa utilizadora.

2.2. Desde a celebração desse contrato e até 20 de Outubro de 2000, a autora celebrou ainda com a mesma empresa de trabalho temporário, os contratos denominados "de trabalho temporário", conforme consta dos documentos que se mostram juntos a fls. 28, 29, fls. 134 a 226 e fls. 322, que aqui se dão por reproduzidos, para trabalhar ao serviço da ré como empresa utilizadora, sendo o último o de fls. 29 e 136, com início em 16/10/2000 e termo em 20/10/2000.

2.3. Em 22 de Janeiro de 2001 a autora celebrou com a mesma empresa de trabalho temporário "D…….", um contrato denominado "de trabalho

temporário", que teve início nessa data e com termo em 25 de Janeiro de 2001, conforme documento de fls. 31 que aqui se dá por reproduzido, para trabalhar ao serviço da ré como empresa utilizadora.

2.4. Desde a celebração desse contrato e até 21 de Janeiro de 2002, a autora celebrou ainda com a mesma empresa de trabalho temporário, os contratos denominados "de trabalho temporário", conforme consta dos documentos que se mostram juntos a fls. 227 a 232 e fls. 234 a 321, que aqui se dão por

reproduzidos, para trabalhar ao serviço da ré como empresa utilizadora, sendo o último o de fls. 235, com início em 21/01/2002 e termo nessa mesma data.

2.5. Em 14 de Janeiro de 2002 foi comunicado à autora a cessação do contrato de trabalho temporário a partir do dia 21 de Janeiro de 2002, conforme

documento de fls. 32 que aqui se dá por reproduzido.

2.6. A autora exercia as funções de atendimento ao público (TPG), e teve ao longo do tempo como local de trabalho as várias estações dos correios

mencionadas nos aludidos contratos, situadas nomeadamente no Porto e em Vila Nova de Gaia.

2.7. A autora auferia em contrapartida uma remuneração, sendo que no último contrato o vencimento base de referência era de € 535,46.

2.8. A actividade de técnica postal e de gestão que a autora exercia é

permanente e contínua na empresa ré, fazendo parte da normal exploração da actividade da empresa.

2.9. A ré tem ao seu serviço a exercer funções no Porto vários trabalhadores contratados temporariamente para fazer face a necessidades permanentes de serviço.

2.10. Entre a ré e referida empresa "D…….." foram celebrados vários

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contratos denominados "de utilização de trabalho temporário", para vários locais de trabalho e com invocação de motivos diferentes entre si.

2.11. Assim, a ré celebrou com a mencionada "D…….." o contrato cuja cópia consta a fls. 71, com início em 22/01/2001 e termo em 25/01/2001, que aqui se dá por reproduzido.

2.12. A ré celebrou ainda com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 72, que aqui se dá também por reproduzido, com início em 10/04/2001 e termo em 20/04/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "substituição de E……. por férias".

2.13. A ré celebrou ainda com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 73, que aqui se dá por reproduzido, com início em 30/04/2001 e termo em 30/04/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "substituição de F……. por férias".

2.14. A ré celebrou também com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 74, que aqui se dá por reproduzido, com início em 7/05/2001 e termo em 11/05/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ….., indicando-se como motivo "substituição de G……. por férias".

2.15. A ré celebrou ainda com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 75, que aqui se dá de igual modo por reproduzido, com início em

6/08/2001 e termo em 10/08/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "substituição do Sr.

H…… por motivo de férias".

2.16. A ré celebrou com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls.

76, que aqui se dá por reproduzido, com início em 20/08/2001 e termo em 24/08/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ….., indicando-se como motivo "substituição de I……. pelo motivo da sua presença no Sindicato".

2.17. A ré celebrou ainda com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 77, que aqui se dá também por reproduzido, com início em 17/09/2001 e termo em 21/09/2001, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "substituição de J……. pelo motivo de esta ir efectuar exames".

2.18. A ré celebrou também com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta a fls. 78, que aqui se dá também por reproduzido, com início em 17/12/2001 e termo em 28/12/2001, para as funções de atendimento ao

público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "aumento de trabalho na época Natalícia".

2.19. A ré celebrou ainda com a mesma empresa o contrato cuja cópia consta

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a fls. 79, que aqui se dá também por reproduzido, com início em 14/01/2002 e termo em 18/01/2002, para as funções de atendimento ao público na estação de correios de ……, indicando-se como motivo "acréscimo de trabalho

motivado pela entrada do Euro".

2.20. Em todos estes denominados "contratos de utilização" foi indicada a autora como trabalhadora temporária.

2.21. A autora é sócia do Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações (SNTCT).

Estão ainda provados, por documentos, os seguintes factos:

2.22. Nos contratos de trabalho temporário referidos em 2.3 e 2.4, constam como motivos, entre outros, substituição de L…… por formação, aumento de passes/encomendas, substituição de M……. por motivo de férias, substituição do colaborador N……… por motivo de doença, acréscimo de trabalho por motivo da entrada do euro, aumento de venda de passes/euro, aumento de trabalho na época natalícia.

2.23. A comunicação referida em 2.5 foi efectuada pela empresa de trabalho temporário "D………".

O Direito.

Sendo pelas conclusões do recorrente que se delimita o âmbito do recurso [Cfr. Abílio Neto, in Código de Processo Civil Anotado, 2003, pág. 972 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25, in Boletim do

Ministério da Justiça, n.º 359, págs. 522 a 531], atento o disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, são duas as questões a decidir nesta apelação, a saber se:

I – A sentença é nula e

II – A R. despediu a A., ilicitamente.

Vejamos a 1.ª questão.

Trata-se de saber se a sentença é nula, atento o disposto no Art.º 668.º, n.º 1, alínea c) do Cód. Proc. Civil, pois entende a A. que o Tribunal a quo incorreu em contradição entre as premissas e a conclusão quando, face à nulidade do termo aposto nos contratos, não concluiu pelo despedimento ilícito.

Decidindo.

As nulidades podem ser processuais, se derivam de actos ou omissões que foram praticados antes da prolação da sentença; podem também ser da sentença, se derivam de actos ou omissões praticados pelo Juiz na sentença.

Aquelas, constituindo anomalia do processado, devem ser conhecidas no

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Tribunal onde ocorreram e, discordando-se do despacho que as conhecer, ele pode ser impugnado através de recurso de agravo. As nulidades da sentença, tendo sido praticadas pelo Juiz, podem ser invocadas e fundamentadas no requerimento de interposição do recurso, expressa e separadamente [dirigido ao Juiz do Tribunal a quo] e não na alegação [dirigida aos Juízes do Tribunal ad quem], como dispõe o Art.º 77.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, sob pena de delas não se poder conhecer, por extemporaneidade [Cfr. Manuel de

Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1976, pág. 175 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1990-12-13, 1991-01-31, 1991-04-09, 1994-03-09 e 1995-05-30, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 402, págs. 518-522, n.º 403, págs. 382-392, n.º 416, págs. 558-565, n.º 435, págs. 697-709 e n.º 447, págs. 324-329].

No entanto, recentemente, o Tribunal Constitucional, pelo seu Acórdão n.º 304/2005, de 2005-06-08, proferido no proc. n.º 413/04 decidiu,

nomeadamente, o seguinte:

Julgar inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.ºs. 2 e 3), com referência aos n.ºs. 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição, a norma do n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das

nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço ao tribunal superior [negrito nosso], in

www.tribunalconstitucional.pt.

In casu, a A. invocou a nulidade da sentença no requerimento de interposição do recurso, pelo que dela devemos conhecer.

Ora, reconhecendo a sentença a nulidade do termo aposto nos contratos, certo é que a R. não declarou a caducidade de qualquer deles, nem adoptou

qualquer outro comportamento que possa ser interpretado como uma vontade rescisória do contrato, tendente a uma desvinculação por sua iniciativa.

É que a consequência da nulidade do termo não é necessariamente a

ocorrência de um despedimento ilícito, imputável à empresa utilizadora de trabalho temporário, ora R. E, não tendo esta tomado qualquer iniciativa no sentido de pôr termo ao contrato de trabalho, nunca lhe seria imputável um despedimento ilícito.

Daí que, o silogismo da sentença – independentemente de se saber se existiu erro de julgamento, o qual nada interessa às nulidades da mesma – tenha sido acertado, inexistindo qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão.

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Improcede, destarte, a invocada nulidade da sentença.

A 2.ª questão.

Trata-se de saber se a R. despediu a A., ilicitamente.

O Tribunal a quo absolveu a R. dos pedidos derivados do despedimento ilícito com fundamento em que ela não adoptou qualquer conduta que se pudesse traduzir em tal acto. Em realidade, em 14 de Janeiro de 2002 foi comunicado à A. a cessação do contrato de trabalho temporário a partir do dia 21 de Janeiro de 2002, comunicação esta que foi efectuada pela empresa de trabalho

temporário "D…….", conforme resulta dos factos dados como provados sob os pontos 2.5 e 2.23. Assim, apesar de entender que os motivos constantes dos contratos de utilização de trabalho temporário são nulos porque não foi

demonstrado que eles correspondessem à realidade, tendo-se provado, antes, que a actividade desenvolvida pela A. sempre correspondeu à satisfação de necessidades permanentes de mão-de-obra da R., e que por isso o contrato de trabalho se tem de entender como celebrado por tempo indeterminado, com o utilizador, ora R., absolveu esta dos pedidos correspondentes ao despedimento ilícito, pois a iniciativa da resolução do contrato não lhe é imputável [A

sentença seguiu muito de perto o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2005-05-04 – e não de 2003-11-03 como nela, certamente por lapso, se afirma – podendo ser consultado in www.dgsi.pt, Processo 04S1505, também referido no douto parecer do Ministério Público, donde – com a devida vénia – se

transcreve o seguinte passo:

Tal não significa que o contrato individual de trabalho "sub-judice" não tenha cessado, neste ou noutro momento. O que não pode é afirmar-se que a missiva remetida pela R. "E" ao A., desacompanhada de qualquer outra atitude da Ré B, consubstancie uma declaração negocial extintiva emitida por esta última com a virtualidade de fazer cessar o contrato que a vinculava ao A. e que este desempenhava já desde 1992. Era ao A. que competia provar os factos

integradores da hipótese legal do art. 13º do D.L. nº 64-A/89 de 27 de

Fevereiro, para beneficiar dos direitos indemnizatório e retributivo aí previsto, factos nos quais se incluía a ocorrência do despedimento, como resulta da regra geral estabelecida no art. 342º, nº1 do C. Civil. Assim, porque inexistiu o alegado despedimento no dia 31 de Dezembro de 2000 – despedimento cuja ocorrência incumbia ao A. provar nos termos do art. 342º do C. Civil, enquanto facto constitutivo do seu direito –, não pode este considerar-se ilícito,

conforme invoca o A. nestes autos, nem tão pouco pode atribuir-se-lhe as peticionadas indemnização por antiguidade e retribuições até à data do presente acórdão.]

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Com o devido respeito, discordamos de tal entendimento.

Vejamos.

Contrato de trabalho temporário é o contrato de trabalho celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar temporariamente a sua actividade a utilizadores e

Contrato de utilização de trabalho temporário é o contrato de prestação de serviço celebrado entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a colocar à disposição daquele um ou mais trabalhadores temporários, como dispõe o Art.º 2.º, alíneas d) e e) do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro [de ora em diante, LTT].

Diz-se que a figura do trabalho temporário conduz ao estabelecimento de uma relação triangular – outros dizem angular – entre empresa de trabalho

temporário [de ora em diante, abreviadamente, ETT], empresa utilizadora [de ora em diante, abreviadamente, EU] e trabalhador, ligando-se a ETT ao

trabalhador por um contrato de trabalho temporário e a ETT à EU por um contrato de utilização de trabalho temporário. Só que, sendo a actividade do trabalhador prestada à EU, fica ele sujeito aos poderes de direcção desta, mas inexistindo qualquer vínculo jurídico entre eles. Daí que, do ponto de vista estritamente jurídico, não existe uma relação triangular entre os três sujeitos, pois não há contrato entre a EU e o trabalhador, mas no plano prático ele existe e com efeitos muito importantes.

Sendo o trabalho prestado à EU, a vida do contrato de trabalho desenvolve-se na relação que intercede entre utilizador e trabalhador e de acordo com o modo, o tempo, o lugar, a suspensão da prestação, as condições de higiene, segurança e medicina do trabalho e o acesso aos equipamentos sociais que vigorarem na EU, como dispõe o Art.º 20.º, n.º 1 da LTT.

Tal significa que, apesar de a EU e o trabalhador estarem ligados apenas por uma relação fáctica, a verdade é que, em realidade, as três entidades

funcionam em cadeia, não se podendo dissociar, para além do plano da mera análise, as relações que intercedem entre eles, apesar de só existirem dois contratos, mas sendo três os sujeitos: ETT, EU e trabalhador.

A obra de engenharia jurídica que o regime do trabalho temporário representa não nos pode fazer obnubilar que o trabalho é prestado na EU, onde o

trabalhador vive – se realiza ou frustra a sua realização – apesar de não estar vinculado juridicamente a ela [por contrato].

Esta realidade insofismável verifica-se com clareza nos casos patológicos.

Na verdade, como dispõe o n.º 4 do Art.º 11.º da LTT,

Na falta de documento escrito ou no caso de omissão da menção exigida pela alínea b) do n.º 1 [Indicação dos motivos de recurso ao trabalho temporário

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por parte do utilizador], considera-se que o trabalho é prestado ao utilizador com base em contrato de trabalho sem termo, celebrado entre este e o

trabalhador.

Isto é, apesar de não estarem ligados por contrato [por qualquer vínculo jurídico], nesta hipótese patológica do trabalho temporário, a EU e o

trabalhador passam a estar ligados por um contrato de trabalho sem termo, como se tivessem estado vinculados anteriormente por contrato, como sucede em caso idêntico com a ETT, como resulta do consignado no Art.º 19.º, n.º 2 da LTT, segundo o qual,

A falta da menção exigida na alínea b) do número anterior [Indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos], ou a inobservância de forma escrita têm a consequência prevista no n.º 3 do artigo 42.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e

caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64- A/89, de 27 de Fevereiro.

Portanto, nas hipóteses patológicas de falta de redução a escrito do contrato de utilização de trabalho temporário ou do contrato de trabalho temporário ou de falta de indicação do motivo do recurso a tal tipo de contratação, a

consequência é sempre a mesma - contrato de trabalho sem termo - apenas faltando saber se o trabalhador vai ter como entidade empregadora, a ETT ou a EU.

[Cfr. Maria Regina Gomes Redinha, in Empresas de trabalho temporário, Revista de Direito e Economia, Anos X/XI, 1984/1985, págs. 137 a 171, in A RELAÇÃO LABORAL FRAGMENTADA, ESTUDO SOBRE O TRABALHALHO TEMPORÁRIO, 1995 e in TRABALHO TEMPORÁRIO: APONTAMENTO SOBRE A REFORMA DO SEU REGIME JURÍDICO, ESTUDOS DO INSTITUTO DO DIREITO DO TRABALHO, VOLUME I, 2001, págs. 443 a 470, Paula Camanho, Miguel Cunha, Sofia Pais e Paulo Vilarinho, in Trabalho temporário, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Ano XXXIV (VII da 2.ª Série), Janeiro- Setembro – 1992, N.ºs 1-2-3, págs. 171 a 257, António Monteiro Fernandes, in DIREITO DO TRABALHO, 12.ª EDIÇÃO, págs. 160 a 168, Pedro Romano

Martinez, in DIREITO DO TRABALHO, 2.ª EDIÇÃO, págs. 653 a 661 e Guilherme Machado Dray, TRABALHO TEMPORÁRIO e Célia Afonso Reis, NOTAS SOBRE O tRABALHO TEMPORÁRIO, in ESTUDOS DO INSTITUTO DO DIREITO DO TRABALHO, VOLUME IV, 2003, págs., respectivamente, 101 a 143 e 145 a 182].

In casu, fazendo a análise crítica da prova, verificamos que a actividade da A.

se destinou a satisfazer necessidades permanentes da R., a qual tem inclusive vários trabalhadores no Porto na mesma situação [2.8. A actividade de técnica

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postal e de gestão que a autora exercia é permanente e contínua na empresa ré, fazendo parte da normal exploração da actividade da empresa. 2.9. A ré tem ao seu serviço a exercer funções no Porto vários trabalhadores

contratados temporariamente para fazer face a necessidades permanentes de serviço], pelo que os motivos constantes dos contratos de trabalho temporário e dos contratos de utilização de trabalho temporário são falsos, a determinar a nulidade do termo neles aposto, como a sentença – e bem – declarou.

A consequência da omissão da indicação ou da falsidade do motivo é:

a) No contrato de utilização de trabalho temporário, atento o disposto no Art.º 11.º, n.º 4 [Era o n.º 2 na versão anterior à que lhe foi dada pela Lei n.º

146/99, de 1 de Setembro, a qual empreendeu a republicação do diploma] [cfr.

a alínea c) do n.º 1] do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro, considerar- se que o trabalho é prestado ao utilizador com base em contrato de trabalho sem termo, celebrado entre este e o trabalhador e

b) No contrato de trabalho temporário, atento o disposto no Art.º 19.º, n.º 2 [cfr. a alínea b) do n.º 1] do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro,

considerar-se sem termo o contrato de trabalho celebrado entre o trabalhador e a empresa de trabalho temporário, atento o disposto no Art.º 42.º, n.º 3 [considera-se contrato sem termo aquele em que falte...] do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro [LCCT].

Perante esta contradição que, à identidade de falta ou de nulidade do motivo invocado, faz corresponder a transformação do contrato de trabalho

temporário em contrato de trabalho por tempo indeterminado, mas radicando- o no que ao empregador concerne, num caso, na empresa de trabalho

temporário e, noutro, na empresa utilizadora, tem-se respondido afirmando que tais consequências legais traduzem apenas os termos da opção que a lei, qual direito potestativo, oferece ao trabalhador em causa.

Face à falta ou nulidade de motivo em ambos os contratos, o trabalhador escolhe a empresa que pretende que seja a sua entidade empregadora.

[Cfr. António Menezes Cordeiro, in MANUAL DE DIREITO DO TRABALHO, 1991, págs. 607 a 610 e Maria Regina Gomes Redinha, in A RELAÇÃO LABORAL FRAGMENTADA, ESTUDO SOBRE O TRABALHALHO

TEMPORÁRIO, 1995, págs. 233; Guilherme Machado Dray, in TRABALHO TEMPORÁRIO, ESTUDOS DO INSTITUTO DO DIREITO DO TRABALHO, VOLUME IV, 2003, a págs. 136 coloca a questão em termos dubitativos: A quem compete esta escolha: ao próprio trabalhador ou às instâncias judiciais?

].

Ora, a declaração da ETT acerca da cessação do contrato ou a omissão de declaração em idêntico sentido por banda da EU, são despidas de qualquer valor juridicamente relevante, face ao direito potestativo que, em tais

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situações patológicas da vida da relação de trabalho temporário, o trabalhador pode exercer.

Assim, tendo a A. escolhido a R. como sua entidade empregadora [pois

deduziu a acção e formulou os pedidos contra ela] e tendo o contrato cessado por forma equivalente ao despedimento ilícito, a acção deverá proceder, também nesta parte.

Destarte, atento o pedido formulado e dado o disposto nas duas alíneas do n.º 1 do Art.º 13.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de

trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, a A. tem direito a ser reintegrada na R. e a receber dela as retribuições vencidas desde

2002-01-21 até ao trânsito em julgado da decisão, a liquidar oportunamente.

Em síntese, procedem as conclusões do recurso.

Decisão.

Termos em que se acorda em conceder provimento à apelação, assim

revogando parcialmente a douta sentença recorrida, indo a R. condenada a reintegrar a A. e a pagar-lhe as retribuições vencidas desde 2002-01-21 até ao trânsito em julgado da decisão, a liquidar oportunamente.

Custas pela R.

Porto, 18 de Setembro de 2006 Manuel Joaquim Ferreira da Costa Domingos José de Morais

António José Fernandes Isidoro

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