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A formação do habitus tradutório em sala de aula: um estudo baseado em corpus. Talita Serpa (UNESP/UNILAGO) Diva Cardoso de Camargo (UNIOESTE)

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Academic year: 2021

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A formação do habitus tradutório em sala de aula: um estudo baseado em corpus

Talita Serpa (UNESP/UNILAGO) Diva Cardoso de Camargo (UNIOESTE)

RESUMO:

Com o objetivo de observar o comportamento linguístico e social (habitus) no âmbito da prática tradutória na direção português ↔ inglês, principalmente no que concerne ao uso de termos culturalmente marcados (brasileirismos); e a fim de fornecer subsídios para uma exploração pedagógica da formação do habitus de tradutores aprendizes, procedemos a compilação de um corpus paralelo composto pela obra O povo brasileiro (1995), de autoria de Darcy Ribeiro; e pela respectiva tradução, The Brazilian People (2000), realizada por Rabassa. Esse corpus serviu-nos de base para a composição de um conjunto de estratégias tradutórias passível de ser ordenado em um modelo de ensino. Para tanto, nos apoiamos na abordagem interdisciplinar proposta por Camargo (2005, 2007), adotando o arcabouço dos Estudos da Tradução Baseados em Corpus (BAKER, 1993, 1995, 1996, 2000), da Linguística de Corpus (BERBER SARDINHA, 2004, 2010) e da Terminologia (BARROS, 2004;

FAULSTICH, 2004). Procuramos ainda associar as propostas da Sociologia da Tradução (SIMEONI, 1998; GOUANVIC, 2005), bem como o conceito de habitus na Educação (BOURDIEU, 1980, 1982; PERRENOUD, 2000, 2001; TARDIF, 2002), às discussões sobre o ensino de competências tradutórias ( HURTADO ALBIR, 2000, 2001, 2005) e sobre o uso de corpora para a formação de tradutores (BERBER SARDINHA, 2010; CAMARGO, 2011).

Desse modo, verificamos que a observação reflexiva por parte dos tradutores em formação sobre o exercício da tradução de brasileirismos por tradutores profissionais, por meio da Linguística de Corpus, permitiu-nos elaborar uma proposta de ensino do habitus tradutório com base nos preceitos de uma Pedagogia da Tradução.

PALAVRAS-CHAVE: Estudos da Tradução Baseados em Corpus. Linguística de Corpus.

Habitus Tradutório. Pedagogia da Tradução.

ABSTRACT: Intending to observe the social and linguistic behavior (habitus) within the scope of the translation practice under the Portuguese ↔ English direction, mainly regarding the use of culturally marked terms (Brazilianisms); and to provide subsidies for an exploration of pedagogical training of the apprentice/translator’s habitus, we observed a parallel corpus composed by the work O povo brasileiro (1995), written by the anthropologist Darcy Ribeiro, as well as by its translation into English, The Brazilian People (2000), performed by Rabassa (2000). This corpus represented the bases for a set of skills that can be organized in order to create a teaching model. With these purpose in mind, we will base our study on Camargo’s interdisciplinary proposal (2005, 2007) adopting the theoretical and methodological framework of Corpus-Based Translation Studies (BAKER, 1993, 1995, 1996, 2000), Corpus Linguistics (BERBER SARDINHA, 2004) and, in part, of Terminology (BARROS, 2004;

FAULSTICH, 2004). We will also seek to associate the Sociology of Translation (SIMEONI,

1998; GOUANVIC, 2005), specially in the context of the concept of habitus (BOURDIEU,

1980, 1982; PERRENOUD, 2000, 2001; TARDIF, 2002), with some discussions about

teaching translational skills (HURTADO ALBIR, 2000, 2001, 2005) and the use of corpora

for training translators (BERBER SARDINHA, 2010; CAMARGO, 2011). In this way, we

consider that a reflexive observation, developed by translation students, on the professional

translation practice related to Brazilianisms, through Corpus Linguistics Methods, allowed us

to develop a proposal for teaching translational Habitus, in order to work the Pedagogy of

Translation.

(2)

KEYWORDS: Corpus-Based Translation Studies. Corpus Linguistics. Translational Habitus. Brazilianisms. Pedagogy of Translation.

INTRODUÇÃO

No que concerne às q

uestões socioculturais envolvendo o processo tradutório, notamos a difusão de possíveis análises sob as perspectivas sociológicas do tema, entre as quais podemos citar os trabalhos de Gouanvic (2005) e Sapiro (2010) acerca da Sociologia da Tradução. Também é possível destacar a emergente discussão no domínio do habitus tradutório profissional, a qual abordamos, em nossa investigação, aliando-a a uma proposta de exploração do ensino de competências tradutórias, por meio, principalmente, das teorias de Camargo (2011a, 2011b), Bourdieu (1980), Perrenoud (2000; 2001) e Tardif (2002).

O conceito de habitus, trabalhado entre as décadas de 70 e 80, pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1972, 1980), corresponde a todas as medidas de percepção e ação que os indivíduos adquirem por meio de suas experiências e práticas sociais.

Dessa forma, o habitus pode ser entendido

(...) como um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona em cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas, que permitem resolver os problemas da mesma forma, e às correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidas por esses resultados (BOURDIEU, 1983, p. 65).

O pesquisador (1983, p. 60 - 61), assim como Tardif (2002), considera o habitus como um produto da verificação empírica das ações e um princípio estruturador de práticas individuais e coletivas que podem ser apreendidas empiricamente, pela observação e pelo ensino.

A partir da aplicação desse conceito no conjunto teórico dos Estudos da Tradução, autores como Simeoni (1998) e Gouanvic (1999, 2005) passam a propor que a existência de um habitus tradutório, o qual contribuiria para a formação de um comportamento no conjunto dos usos das estratégias de tradução.

Nesse sentido, podemos pensar uma assimilação deste habitus presente nas opções de tradução, de acordo com a teoria bourdieusiana (1970), a qual atravessaria a esfera do ensino-aprendizagem por meio de uma proposta em que os sujeitos sociais promoveriam o reuso de dados padrões de ação à medida que incorporariam suas habilidades e competências, via sistema educacional (BOURDIE, 2000, 2001, 2002; TARDIF, 2002).

Sendo assim, com o intuito de verificar a possível existência deste comportamento compartilhado no âmbito da prática tradutória na direção português ↔ inglês, no que concerne ao uso de termos considerados como brasileirismos

1

, e a fim de fornecer dados para a exploração pedagógica a que nos propomos, compilamos um corpus paralelo composto pela obra O povo brasileiro (1995), de autoria de Darcy Ribeiro; e pela tradução The Brazilian People, realizada por Rabassa. Também nos valemos dos glossários bilíngues produzidos com base na obra ensaística de Ribeiro (SERPA, 2012), de modo a cruzarmos os dados e observarmos coocorrências de opções tradutórias, as quais podem representar uma amostra do habitus do tradutor na área e, com isso, corresponder a disposições passíveis de serem organizadas em um modelo de ensino-aprendizagem. Tal modelo, por sua vez, foi testado por

1 A definição de brasileirismo será apresentada na Fundamentação Teórica.

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Serpa, em 2011, por meio da experienciação e observação, em sala de aula, no contexto universitário de um curso de Bacharelado em Letras com Habilitação em Tradução, com duração de quatro anos e regime integral de aulas, de uma faculdade pública paulista.

2

Com isso, tomamos por proposição que o habitus tradutório, no tocante aos brasileirismos, pode ser expresso por meio das escolhas lexicais do tradutor da obra de Darcy Ribeiro, o que nos permite testar uma proposta de ensino com os alunos de tradução, baseada na análise reflexiva do exercício empírico da tradução, por meio da Linguística de Corpus e da Pedagogia da Tradução Baseada em Corpus (CAMARGO, 2011a, 2011b), a qual poderia contribuir para a aprendizagem de atribuições concernentes à atuação dos tradutores profissionais, principalmente no contexto de uso de termos voltados ao universo social brasileiro.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para a realização deste estudo, nos valemos do arcabouço teórico dos Estudos da Tradução Baseados em Corpus, da metodologia fornecida pela Linguística de Corpus e, em parte, de alguns princípios da Terminologia, da Sociologia da Tradução e da Pedagogia, a fim de apresentamos uma proposta de ensino do habitus para o campo dos brasileirismos (termos culturalmente marcados) presentes na obra ensaística de Darcy Ribeiro, a qual possa contribuir para o desenvolvimento de uma Pedagogia da Tradução Baseada em Corpus.

Associamos o trabalho com corpus (BAKER, 1993, 1995, 1996) à definição de termo (BARROS, 2004) e de brasileirismo (COELHO, 2003; FAULSTICH, 2004), procurando estabelecer uma possível relação de interdisciplinaridade entre pressupostos teóricos das Ciências Sociais (BOURDIEU, 1972, 1980, 1982), da Pedagogia (PERRENOUD, 2000, 2001; TARDIF, 2002) e dos Estudos da Tradução (GOUANVIC, 2005; SIMEONI, 1998), buscando constituir relações com o ensino da prática tradutória (ALVES, MAGALHÃES, PAGANO, 2000, 2005; BERBER SARDINHA, 2004, 2010; CAMARGO, 2011a, 2011b).

1.1 ESTUDOS DA TRADUÇÃO BASEADOS EM CORPUS, LINGUÍSTICA DE CORPUS E TERMINOLOGIA

No que concerne ao arcabouço teórico-metodológico para pesquisas baseadas em corpora, Berber Sardinha (2004) aponta a definição mais completa de corpus como sendo a de Sánchez, por incorporar as características principais para a compilação de corpus em formato eletrônico:

Um conjunto de dados linguísticos (pertencentes ao uso oral ou escrito da língua, ou a ambos), sistematizados segundo determinados critérios, suficientemente extensos em amplitude e profundidade, de maneira que sejam representativos da totalidade do uso linguístico ou de algum de seus âmbitos, dispostos de tal modo que possam ser processados por computador, com a finalidade de propiciar resultados vários e úteis para a descrição e análise. (SÁNCHEZ, 1995, p.8-9; traduzido por Berber Sardinha, 2004, p.18).

No âmbito dos Estudos da Tradução, Baker (1995) considera a análise de corpus uma rica fonte de material descritivo-comparativo que pode auxiliar na percepção de diferenças entre a linguagem da tradução e a dos textos originalmente escritos em uma dada língua.

No presente estudo, utilizamos um corpus paralelo (que corresponde aos subcorpora de estudo) o qual é definido por Baker (1993, p.238) como sendo corpus “(...) de textos fonte

2 A forma de coleta dos dados será especificada na Metodologia de Pesquisa.

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e suas respectivas traduções”

3

. O corpus paralelo para investigação deste trabalho é composto por um subcorpus principal com o TO em português extraído de uma obra ensaística de Darcy Ribeiro, assim como por um subcorpus principal com o respectivo TT em inglês.

No que diz respeito aos constructos terminológicos, utilizamos o conceito de termo.

Neste sentido, Barros (2004) esclarece que:

[...] termo é um vocábulo, uma vez que é um modelo de realização lexical no texto. Seu caráter de termo se dá pelo fato de que designa um conceito específico de um domínio de especialidade. O conjunto terminológico presente nesse texto constitui, na verdade, um subconjunto do conjunto vocabular do mesmo. Assim, um termo é também um vocábulo, além de ser uma palavra.

(BARROS, 2004, p.42).

No que concerne à linguagem cultural, projetada por Darcy Ribeiro em suas obras teóricas é importante identificar os padrões próprios da natureza da produção teórica do autor, assim como os padrões correspondentes na tradução de suas proposições, levando ao conhecimento do mundo o papel que este autor atribui às nações latino-americanas.

Nesse sentido, como o autor dedica-se a fenômenos específicos do ambiente brasileiro, podemos considerar as escolhas lexicais de sua constituição terminológica como brasileirismos, os quais, de acordo com Coelho (2003), podem ser compreendidos como índices linguísticos da identidade do povo brasileiro. Faulstich (2004), por sua vez, os define

“palavras, locuções e outra estrutura sintagmática criada e formada no Brasil, que tenha significado autônomo (...)”(FAULSTICH, 2004).

1.2 SOBRE OS ESTUDOS DA TRADUÇÃO BASEADOS EM CORPUS E AS CONCEPÇÕES DIDÁTICAS PARA A PRÁTICA TRADUTÓRIA

Pesquisas voltadas para a formulação de uma sistematização da proposta de ensino para a tradução vêm crescendo, de modo a permitir uma orientação pedagógica a ser oferecida ao futuro tradutor. Neste sentido, destacam-se os estudos de Hurtado Albir ( 2000, 2001), pesquisadora do grupo PACTE (Processo de Aquisição da Competência Tradutória e Avaliação) da Universidade Autônoma de Barcelona, os quais enfocam questões fundamentais para a formulação de bases para o ensino da prática tradutória.

A autora (1993) postula uma nova metodologia, partindo da perspectiva ora tradutológica ora didática, e adverte que, na elaboração de um método de ensino- aprendizagem, é preciso centralizar o processo no estudante, fornecendo-lhe ferramentas que lhe permitam descobrir os princípios para desenvolver a atividade tradutória a fim de adquirir sua própria competência. Nesse sentido, considera que “[...] a competência tradutória é um conhecimento especializado, integrado por um conjunto de conhecimentos e habilidades, que singulariza o tradutor e o diferencia de outros falantes bilíngues não tradutores” (HURTADO ALBIR, 2005, p.19).

Nas pesquisas de Alves, Magalhães e Pagano (2000, 2003, 2005), por sua vez, aponta-se que, para constituir a ideia de competência, é necessário realizar um trabalho pedagógico que permita ao estudante conhecer as bases tanto linguísticas quanto conceituais de modo que venha a reconhecer e resolver problemas que lhe surgirão na prática. Nesse âmbito, as considerações sobre o ensino da prática tradutória condizem com as premissas apontadas pelas teorias pedagógicas de Perrenoud (2000, 2001). O autor salienta que o reconhecimento e o ensino de um habitus profissional estão diretamente vinculados à

3 Parallel corpora, that is corpora of source texts and their translations.

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formação prática do aluno. Também nesse sentido, Tardif (2002) aponta que a apropriação e a utilização dos saberes profissionais estão vinculadas à experiência, ou seja, ao exercício da prática, o qual permite a incorporação de comportamentos recorrentes sob a forma de um habitus.

Notamos que, no âmbito dos trabalhos voltados à aprendizagem do tradutor, é possível considerar grande avanço no que concerne às tecnologias envolvidas no processo tradutório, entre as quais podemos mencionar o papel inovador da Linguística de Corpus.

Dessa forma, os Estudos da Tradução Baseados em Corpus equacionam diferentes competências, permitindo-nos associá-las às questões levantadas pela Sociologia da Tradução e pela diversidade sociocultural das escolhas individuais dos alunos-tradutores, no intuito de inseri-las nos processos de Pedagogia da Tradução.

Ao utilizarmos os corpora de textos originais (TOs) e de textos traduzidos (TTs) como material didático, permitimos aos aprendizes centrarem-se nas possibilidades de padronização e/ou variação da linguagem, em especial, no que concerne às terminologias de áreas de especialidade. Berber Sardinha acrescenta que “[o]s instrumentos disponíveis para análise de textos e gêneros já estão disponíveis no arsenal da Linguística de Corpus, como listas de palavras, palavras-chave, segmentadores textuais, etiquetadores, etc” (BERBER SARDINHA, 2010, p.306).

O ensino de tradução com base em corpora pode beneficiar-se desse aparato, além de proporcionar a criação de novas ferramentas didáticas e sua futura disponibilização para uso em sala de aula. A utilização destes recursos para o ensino-aprendizagem vem sendo cada vez mais enfatizada.

No âmbito da intersecção com a Terminologia, notamos, ainda, que a proposta de Bowker (1999) sustenta o trabalho com corpora como uma forma de apreciação das especificidades das linguagens de especialidade por parte dos futuros tradutores. De acordo com a pesquisadora, é importante que os estudantes tenham ciência de que textos especializados criam maiores obstáculos aos tradutores, exigindo distintas maneiras de interagir como o léxico e com as características referentes a cada área. Com isso, enfatiza a maneira como se estabelece um comportamento padrão adotado pelos alunos de tradução diante da relação de diferença que se estabelece entre língua geral e línguas de especialidade.

Dessa forma, ao colocar os estudantes em contato com um método de trabalho que lhes possibilite reconhecer os comportamentos seguidos em TTs já realizados, permitimos que tomem conhecimento da possibilidade de produzirem conjuntos de novas práticas e adaptá-los ao mundo social, gerando atualizações dos habitus dos tradutores.

2. MATERIAL E MÉTODO

Para esta investigação, foram compilados:

1) um corpus principal paralelo, composto pela obra: O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil (1995), de autoria de Darcy Ribeiro; e pela respectiva tradução para o inglês: The Brazilian People: formation and meaning of Brazil (2000), realizada por Gregory Rabassa.

2) um corpus principal paralelo, composto pelas traduções dos capítulos finais da obra O povo brasileiro, produzidas por quinze alunos da disciplina “Prática de Tradução III”, no quarto ano do curso de Graduação –Bacharelado em Letras com Habilitação em Tradução, como produto da aplicação do Estágio de Docência na Instituição (2011);

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O levantamento dos dados foi realizado com a utilização da ferramenta WordList do software WordSmith Tools (versão 4.0) as quais facilitam a compilação dos termos, assim como de seus contextos de uso.

Após termos procedido à compilação e organização dos termos, notamos, com base nas teorias dos Estudos da Tradução Baseados em Corpus, da Linguística de Corpus, da Sociologia da Tradução e da Terminologia, que as variações lexicais ocorridas entre o corpus de TO e de TT poderiam representar dissociações conceituais decorrentes das diferenças culturais entre a sociedade de partida e a sociedade de chegada.

Realizamos, então, o levantamento e análise dos resultados apresentados em sala de aula por quinze alunos do 4º ano de Bacharelado em Letras com Habilitação de Tradutor do curso de graduação

4

, após discussões sobre a tradução de fatores culturais tipicamente brasileiros, relacionados à formulação de termos em LM para a teoria darcyniana.

Os dados apresentados foram verificados a partir das traduções de parte do capítulo final de O povo brasileiro (“O destino nacional - As dores do parto”) realizadas, pelos tradutores aprendizes, durante o Estágio de Docência aplicado por Serpa entre os meses de março e abril de 2011, sob a supervisão da Profa. Dra. Diva Cardoso de Camargo.

3. ANÁLISE DOS DADOS

3.1 O TRABALHO COM CORPORA PARA A APRENDIZAGEM DA TRADUÇÃO Como exposto anteriormente, a pesquisa interdisciplinar entre os Estudos da Tradução Baseados em Corpus, a Linguística de Corpus, a Terminologia e a Sociologia da Tradução, que nos propusemos a realizar, permitiu um aprofundamento teórico-analítico acerca dos elementos de conduta social envolvidos tanto na produção textual quanto na tradução do conjunto terminológico da obra de Darcy Ribeiro para a língua inglesa. Esses fatores levaram- nos, por sua vez, a levantar a hipótese de elaboração de uma possível estrutura didática para o ensino-aprendizagem de um habitus tradutório relacionado ao discurso antropológico.

A seguir, apresentamos alguns dos resultados obtidos por meio dos TTs dos alunos e da comparação de suas escolhas lexicais com o trabalho desenvolvido por Rabassa na tradução de parte do capítulo final de O povo brasileiro (“O destino nacional - As dores do parto”).

3.2 ANÁLISE DAS TRADUÇÕES PRODUZIDAS POR TRADUTORES APRENDIZES Inicialmente, geramos uma lista com as dez palavras mais frequentes extraídas do trecho do TO escolhido para trabalhar em sala de aula, com o auxílio da ferramenta WordList.

Após este primeiro levantamento, geramos a lista de palavras mais frequentes a partir do trecho do TT de Rabassa e dos TTs dos tradutores aprendizes.

Abaixo, apresentamos as Tabelas 1, 2 e 3, com as dez palavras mais frequentes do TO de Darcy Ribeiro, do TT de Rabassa e dos TTs dos aprendizes, respectivamente:

4 Manteremos os nomes dos estudantes em sigilo.

(7)

N Palavra Freq.

1 ÍNDIOS 5

2 POVO 3

3 PRODUÇÃO 3

4 CONDIÇÕES 3

5 FEITORIA 2

6 NATIVOS 2

7 NEGROS 2

8 TRABALHO 2

9 ALICIAMENTO 1

10 DESAFRICANIZAÇÃO 1

Tabela 1: Dez palavras mais frequentes a partir do trecho do TO trabalhado em sala

N Word Freq.

1 INDIANS 4

2 BLACKS 3

3 PEOPLE 3

4 AFRICAN 2

5 BLOOD 2

6 ESTABLISHMENT 2

7 PRODUCTION 2

8 WORKFORCE 2

9 DE-AFRICANIZATION 1

10 BACKWARDNESS 1

Tabela 2: Dez palavras mais frequentes a partir do trecho do TT trabalhado em sala

ESTUDANTE 1 ESTUDANTE 2

N Word Freq. N Word Freq.

1 PEOPLE 6 1 PEOPLE 8

2 INDIANS 5 2 INDIANS 5

3 NEGROES 3 3 BLACK 4

4 PRODUCTION 3 4 PRODUCTION 3

5 WORK 3 5 CONDITIONS 2

6 FACTORY 2 6 LABOR 2

7 MESTIZOS 2 7 WOMEN 2

8 NATIVE 2 8 AFRICAN 1

9 DIS-AFRICANISATION 1 9 BLOODS 1

10 BLACK 1 10 BRAZIL 1

ESTUDANTE 3 ESTUDANTE 4

N Word Freq. N Word Freq.

1 INDIANS 4 1 PEOPLE 4

2 PEOPLE 4 2 INDIANS 4

3 AFRICANS 3 3 PRODUCTION 3

4 PRODUCTION 3 4 CONDITIONS 2

5 GOVERNED 2 5 BLACK 2

6 MANAGEMENT 2 6 BRAZIL 2

7 PROSPERITY 2 7 FOREIGN 2

8 WORK 2 8 PROSPERITY 2

9 BLACK 1 9 DIS-AFRICANISATION 1

10 BLOOD 1 10 AFRICANS 1

ESTUDANTE 5 ESTUDANTE 6

N Word Freq. N Word Freq.

1 PEOPLE 5 1 PEOPLE 11

2 INDIANS 4 2 INDIGENOUS 7

3 BLACK 3 3 BLACK 4

4 BRAZIL 3 4 PRODUCTION 3

5 CONDITIONS 2 5 CONDITIONS 2

6 FOREIGN 2 6 FOREIGN 2

7 DIS-INDIANIZATION 2 7 LABOR 2

8 POPULATION 2 8 PROSPERITY 2

9 PRODUCTION 2 9 AFRICAN 1

10 PROFIT 2 10 BRAZIL 1

ESTUDANTE 7 ESTUDANTE 8

N Word Freq. N Word Freq.

1 PEOPLE 7 1 INDIANS 4

2 INDIGENES 6 2 NEGROES 3

(8)

3 BLACK 4 3 PEOPLE 3

4 PRODUCTION 3 4 PRODUCTION 3

5 WORK 3 5 AFRICAN 2

6 BRAZIL 2 6 BRAZIL 2

7 CONDITIONS 2 7 CONDITIONS 2

8 FACTORSHIP 2 8 FEITORIA 2

9 WOMEN 2 9 FOREIGN 2

10 AFRICANS 2 10 DE-INDIANIZATION 2

ESTUDANTE 9 ESTUDANTE 10

N Word Freq. N Word Freq.

1 BLACK 4 1 INDIAN 5

2 INDIANS 4 2 PEOPLE 5

3 FOLK 3 3 AFRICAN 3

4 PEOPLE 3 4 BLACKS 2

5 CONDITIONS 2 5 BRAZIL 2

6 PRODUCTION 2 6 BRAZILIAN 2

7 PROFIT 2 7 ETHNIC 2

8 PROSPERITY 2 8 DIS-INDIGENIZATION 2

9 WORKFORCE 2 9 PRODUCTION 2

10 AFRICAN 1 10 PROFIT 2

ESTUDANTE 11 ESTUDANTE 12

N Word Freq. N Word Freq.

1 PEOPLE 6 1 PEOPLE 6

2 BRAZIL 4 2 INDIANS 5

3 NATIVE 4 3 BLACK 3

4 AFRICAN 2 4 PRODUCTION 3

5 CONDITIONS 2 5 ATTAINMENT 2

6 FACTORY 2 6 CONDITIONS 2

7 MISCHARACTERIZATION 2 7 EMBODYING 2

8 ORDER 2 8 IDENTITY 2

9 PRODUCTION 2 9 PROSPERITY 2

10 SLAVES 2 10 WORKFORCE 2

ESTUDANTE 13 ESTUDANTE 14

N Word Freq. N Word Freq.

1 PEOPLE 7 1 PEOPLE 7

2 INDIANS 5 2 BLACK 4

3 BLACK 3 3 INDIANS 4

4 PRODUCTION 3 4 BRAZIL 3

5 CONDITIONS 2 5 AFRICAN 2

6 ETHNIC 2 6 CONDITIONS 2

7 IDENTITY 2 7 DIS-INDIANIZATION 2

8 PROSPERITY 2 8 POPULATION 2

9 WORK 2 9 PRODUCTION 2

10 ADMINISTRATION 1 10 PROFIT 2

ESTUDANTE 15

N Word Freq.

1 PEOPLE 6

2 INDIANS 4

3 PRODUCTION 3

4 AFRICAN 2

5 BRAZIL 2

6 CONDITIONS 2

7 NEGROES 2

8 PROSPERITY 2

9 WORKFORCE 2

10 BLACK 1

Tabela 3: Dez palavras mais frequentes a partir do trecho do TTS produzido pelos tradutores aprendizes

Com a análise das palavras mais frequentes, verificamos uma tendência dos alunos para

alternar os sentidos dos termos simples, como ocorre com Rabassa, o que permite uma

elaboração de interpretações diferentes entre os leitores da Cultura Meta. Com isso, notamos

que os aprendizes começam a compor seus comportamentos de maneira semelhante aos dos

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tradutores profissionais, assim como observamos que, ao reconhecerem os habitus do autor e dos tradutores, passam a trabalhar de maneira similar, desenhando certos comportamentos.

É importante salientar que os termos avaliados em nossa investigação relacionaram-se com as palavras mais frequentes levantadas pela WordList. Como exemplo, apresentamos a análise do constructo da ideia de “índio”, para o qual os alunos optaram por utilizar três diferentes conceitos: Indigenous, Indigene e Native, além daquele apresentado por Rabassa em seu TT, ou seja, Indian. Em sala, foram discutidos os significados dos termos levantados e, a partir dessa investigação, os alunos parecem ter optado por elaborar seus próprios conceitos durante as traduções, lembrando que, uma vez utilizado um termo, procuraram manter certa regularidade.

Nesse sentido, o conceito de Indigene/s aparece como sendo o menos utilizado e apresenta como significado as ideias de Native e Indigenous, as quais também são utilizadas pelos aprendizes. Podemos, assim, considerar que os alunos apresentam a noção de “índio”

vinculada a questões de pertencimento a um dado ambiente e associada também à concepção de

“nativo” (Native). Nos TTs em que esse termo é utilizado, são enfatizadas, por conseguinte, as relações de nascimento, origem e parentesco, ao passo que, quando os tradutores-aprendizes tomam por correspondente a imagem de Indigenous, retomam distinções socioculturais e raciais presentes também no termo Indian.

Com isso, notamos que, em LM, o constructo de Indigenous apresenta várias definições, geralmente representativas de um “grupo étnico” original de um dado território. É interessante verificar que, no final do século XX, o termo tornou-se marcado por fatores políticos e por laços históricos de existência pré-colonial, mantendo uma diferenciação entre os níveis de evolução cultural até o estágio dos Estados-Nação.

O senso político do termo Indigenous definiu-o como sendo um núcleo humano vulnerável à exploração e opressão por parte das metrópoles, e, como resultado, um conjunto de direitos foi desenvolvido, a Declaration on the Rights of Indigenous Peoples (Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, 2007), cujo principal propósito era proteger a cultura, a identidade, a linguagem e os recursos naturais utilizados por esses grupos.

Dessa forma, a chave para a compreensão da Indigenousness (indigenidade) está relacionada não aos critérios geralmente denotados aos indigenous groups, como a

“territorialidade”, a “racialidade”, a “história” e o modo de vista, mas sim ao papel político- cultural que estes grupos sociais desempenham nas sociedades a que pertencem.

Ao constituírem a ideologia dos indigenous peoples in Brazil, os tradutores-aprendizes, por conseguinte, podem revelar mais questões de “seminomadismo”, “subsistência” e

“agricultura” que podem, por sua vez, estar envolvidas no constructo de “índios” brasileiros em LF, a princípio. O trabalho com os corpora comparáveis e com as teorias de Darcy Ribeiro permitem aos docentes trabalhar com as nuances de significado do termo, as quais revelam também elementos como “assimilação”, “integração populacional” e “nacionalização”.

Os TTs dos alunos podem constituir novos sentidos, distintos do TO, o que lhes confere o caráter de um habitus tradutório que pode ser aprendido em sala de aula e que constitui uma liberdade de ação social para os agentes tradutores que virão a ser. Essa formação cultural e esse senso crítico-analítico podem, ainda, ser verificados pela frequência de escolha de termos diferentes entre os aprendizes e o tradutor profissional.

Compreendemos que, embora reconheçam os termos correspondentes de maneira

imediata, em decorrência das discussões sobre as listas de palavras e glossários em sala de aula,

é importante aos alunos observarem as relações de sentido que se estabelecem dentro de uma

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área de especialidade, assim como conhecer os valores sociais que regimentam as escolhas lexicais. É importante que a busca por conceitos faça parte do processo tradutório de modo geral, sendo intensificada quando os temas e teorias abordados envolvem questões de cunho social e interacional.

Acreditamos, ainda, que a leitura das obras de Darcy Ribeiro e de outros cientistas sociais proporciona aos aprendizes uma possível consciência sociocultural mais ampla, principalmente no que concerne aos elementos de formação e de identidade do tradutor com a obra a ser traduzida.

Apresentamos, no decorrer de nossa investigação, como a identificação com os grupos sociais e com os assuntos das investigações darcyniana conduziu Rabassa a comportamentos que, embora sejam únicos, fazem uso de recursos semelhantes como as variações, simplificações, omissões conceituais e explicitações de brasileirismos. Tal habitus constitui-se, por conseguinte, de similitudes e diferenças, considerando que ambas partem das relações que cada tradutor estabelece com o TO. Compreendemos, por conseguinte, que uma amostra dos fenômenos e comportamentos sociais dos tradutores profissionais pode ser levada aos aprendizes para que iniciem a formação de suas competências tradutórias com maior autonomia tanto no plano linguístico quanto no plano social.

Podemos dizer que, ao longo do curso, seria possível uma internalização de um habitus tradutório e de dados linguístico-comportamentais recorrentes entre os tradutores- aprendizes, os quais se estabelecem no contato com a terminologia e conceituação do TO, com as opções de tradução para os termos por parte dos tradutores profissionais e, por fim, com a prática tradutória dos tradutores aprendizes.

Por conseguinte, a didática e a pedagogia estabelecidas pelo trabalho com a conscientização das condutas sociais dos tradutores podem permitir que os aprendizes reconheçam a função cultural dos TTs, principalmente no contexto que envolve a formação do que é “ser brasileiro” na Cultura Fonte e a necessidade de uma contextualização histórica, social, política e ideológica para o público de especialistas em Antropologia na Cultura Alvo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta investigação, fundamentada nos Estudos da Tradução Baseados em Corpus (BAKER, 1993, 1995, 1996), na Linguística de Corpus (BERBER SARDINHA, 2004, 2010), na Sociologia da Tradução (SIMEONI, 1998; GOUANVIC, 2005) e, em parte, na Terminologia (BARROS, 2004; FAULSTICH, 2004; COELHO, 2003 ) e na Didática de Ensino de Tradução ( HURTADO ALBIR, 2000, 2001), segue a proposta de um estudo interdisciplinar desenvolvida por Camargo (2005, 2007) para a observação do processo tradutório do conjunto léxico de especialidade da Antropologia de Darcy Ribeiro para a língua inglesa. Com o auxílio desta abordagem, foi possível comparar, de modo empírico, os dados de formulação e variação terminológica e social dos conceitos presentes no TO e no TT.

O software WordSmith Tools, por meio de suas ferramentas e utilitários, facilitou

consideravelmente a pesquisa de uma grande quantidade de dados, obtidos de maneira muito

mais rápida e precisa do que manualmente. As linhas de concordância serviram de apoio e

possibilitaram o esclarecimento de dúvidas em relação à terminologia levantada, ao

apresentarem os cotextos nos quais os termos estão inseridos. As concordâncias também

permitiram observar a organização das palavras dentro dos sintagmas, favorecendo a análise

de que os termos não têm significado independentes, visto que seus elementos

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interrelacionam-se criando especificidades próprias de acordo com a situação a que se aplicam na Cultura Fonte ou na Cultura Meta.

No tocante ao comportamento dos tradutores-aprendizes, averiguamos que quanto maior for a compreensão da existência de um habitus comum, mais simples fica para os alunos formularem suas competências, ampliando a noção de que o tradutor é responsável pela interpretação que a comunidade de chegada fará do autor e pelas repercussões nos ambientes cientifico e sociocultural de circulação do TT.

Ao mostrarmos aos estudantes de tradução que as escolhas lexicais dos tradutores para a terminologia darcyniana podem refletir diretamente na teorização e na imagem da Cultura Brasileira para os leitores do público alvo, estamos colocando em pauta a importância de constituição de um habitus para estes aprendizes.

Com isso, os alunos podem vir a se tornar capazes de produzir novas concepções sociais e de configurá-las em termos, os quais, por sua vez, ampliam a gama de significados, temas e teorias abordados dentro da subárea antropológica.

Salientamos, ainda, que, por meio da metodologia e da teoria da Linguística de Corpus, dos Estudos da Tradução Baseados em Corpus, da Terminologia e da Sociologia da Tradução, foi possível apontar diferenças dos valores sociais relacionados ao uso de determinadas escolhas lexicais em detrimento de outras. Rabassa mostra ter construído seus comportamentos com base em um conjunto de habilidades e competências decorrentes de uma conscientização e compreensão prévia do TO com o qual trabalhou.

Dessa forma, expusemos ser possível elaborar uma estrutura de ensino que pudesse aliar as competências léxico-tradutórias ao desenvolvimento de uma postura crítica e de um engajamento social por parte dos tradutores em formação.

Por meio de um estudo integrado entre teoria e prática, aliado a um corpus de estudo paralelo rico em informações sociais tanto acerca do Brasil quanto de uma possível visão que o estrangeiro faz dos elementos nacionais, acreditamos poder conscientizar o aprendiz da importância de seu posicionamento cultural no momento da tradução.

Bourdieu (1980) considerava que o habitus era formado por comportamentos regulados socialmente e que eram internalizados pelos agentes sociais, podendo ser alterado conforme estes atores fossem entrando em contato com novas práticas e com novos habitus de outros grupos sociais. Neste contexto, quando o tradutor se depara com um novo TO a ser trabalhado, encontra-se também com um novo conjunto de práticas sociais, as quais precisam ser primeiramente compreendidas para então serem levadas à outra cultura. O tradutor está no meio de dois constructos sociais diferentes e, até certo ponto, não pode fazer parte de nenhum deles. O habitus tradutório estaria, por conseguinte, em uma zona neutra; funcionaria como uma espécie de antropólogo (mediador) entre o habitus da sociedade de partida do TO e o habitus da sociedade de chegado do TT:

Quadro 1: Posicionamento do Habitus Tradutório no momento da constituição dos TTs Habitus Tradutório

Habitus contido no TT (tradutor + visão do autor pela comunidade em LM e o habitus da

sociedade de chegada) Habitus contido no TO

(autor + sociedade de partida)

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Quanto maior for o conhecimento adquirido pelo tradutor acerca das sociedades envolvidas no processo tradutório, assim como de suas formas de avaliação do outro, maior poderá ser a chance de que o TT seja aceito entre os membros da sociedade de chegada.

Compreendemos que, para a formulação de um habitus tradutório a ser apresentado aos aprendizes, é importante lidar com as bases conceituais dos Estudos da Tradução, acrescentar os elementos de compreensão terminológica e, por fim, discutir que as aproximações e distanciamentos entre TOs e TTs estão relacionados às escolhas lexicais dos tradutores, as quais estão vinculadas diretamente à forma como estes agentes sociais deixam- se influenciar pelos habitus da Cultura Fonte ou da Cultura Meta, ocorrendo nisso um sentido de identificação cultural promovida pela formação social de cada indivíduo.

Temos, dessa maneira, um núcleo de comportamentos e competências baseado nos conhecimentos teórico-terminológicos, o qual se encontra circunscrito em um primeiro núcleo, mais amplo e submetido aos comportamentos e competências acolhidos nas sociedades do TO e do TT:

Quadro 2: Elementos influentes na concepção do Habitus Tradutório

Por tal razão, evidenciamos a relevância da constituição de uma pedagogia que tenha como alicerce os elementos de cunho prático, teórico e metodológico, os quais possam fornecer os subsídios para que os alunos construam suas competências, associadas aos fatores socioculturais e aos conhecimentos das sociedades envolvidas no processo tradutório, as quais lhes permitem formular as bases críticas das culturalidades a serem trabalhadas no ato social da tradução.

Com nossa primeira experiência do plano de atividades proposto em sala de aula, verificamos que os estudantes começaram a formular um possível reconhecimento dos valores que permeiam o habitus tradutório, sendo capazes de passar a agir de modo consciente nas escolhas lexicais que iriam compor seus TTs.

A interação e discussão das opções de Rabassa permitiu aos estudantes principiar a compreensão da tradução como um ato social cujos elementos e atitudes podem ou não ser aceitos em sociedade ou no âmbito de uma comunidade de especialista. Assim, o papel do tradutor constitui-se em uma interpretação de uma teoria, e seu trabalho pode levar a um enaltecimento do autor ou à depreciação de suas proposições analíticas.

Essa investigação e o uso de dicionários especializados conferiu aos aprendizes o

início de um discernimento e de um senso crítico para distinguir quais seriam os habitus que

são compartilhados entre cientistas sociais e antropólogos, os quais poderiam ser encontrados

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na utilização de termos coocorrentes. Também foi possível que os alunos dessem início a um entendimento de valores sociais novos e de alterações conceituais expressas por Darcy Ribeiro, além de um conjunto de novas terminologias voltadas ao núcleo social brasileiro, como os brasileirismos.

Ao lidarem com a formação de significados e conceitos de termos simples e compostos, em seus contextos de partida e de chegada, os alunos podem compreender que a tradução é mais que um processo linguístico ou mesmo cultural; passam a concebê-la também como um plano de trocas e negociações de valores simbólicos do capital social. Os valores desse capital, por conseguinte, são estabelecidos por transações entre o habitus da Cultura Fonte e o da Cultura Meta.

Quando o docente apresenta essas noções aos aprendizes, mostra que é importante esclarece que não existe uma fixação de conceitos, eles podem ser trocados, negociados e variados dentro de um procedimento de “câmbio” considerado regulado pela sociedade.

Consideramos que o conhecimento destes elementos de cunho social na tradução favorecem a composição do papel do tradutor e da independência do TT, proposta por Baker (1992, 1993, 1995). Notamos que, ao proporcionar aos aprendizes a possibilidade de reconhecerem-se como agentes, permitimos que atuem com maior engajamento nas mudanças culturais e teóricas e na formação de um senso identitário para a profissão de tradutor.

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