Breve ensaio sobre a Lei 13.441/17 – Infiltração policial na internet
Márcio Alberto Gomes Silva é Delegado de Polícia Federal, Professor da Faculdade Pio X, do CICLO/CERS Aracaju, do Supremo, da Escola Nacional dos Delegados de Polícia Federal, autor dos livros Prática Penal para Delegado de Polícia, Inquérito Policial – Uma análise jurídica e prática da fase pré-processual e Organizações Criminosas – Uma Análise Jurídica e Pragmática da Lei 12.850/13.
O combate aos crimes contra a dignidade sexual praticados contra crianças e adolescentes e os que envolvem produção, divulgação, compartilhamento e armazenamento de imagens/vídeos pornográficos de crianças/adolescentes foi incrementado com a entrada em vigor da Lei 13.441/17.
O novel mandamento legal permite a infiltração policial na internet, com o fito de investigar os crimes previstos nos artigos 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C, 241-D, todos do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), e artigos 154-A, 217-A, 218, 218-A e 218-B, todos do Código Penal.
Em síntese apertada, a infiltração policial na internet depende de autorização judicial (atendendo a requerimento do Ministério Público ou representação do delegado de polícia) e será decretada pelo prazo de 90 dias, admitidas prorrogações, desde que não ultrapassado o prazo total de 720 dias (dicção do artigo 190-A, I, II e III, do ECA, incluído pela nova lei).
O estudo inicial do artigo acima mencionado revela:
a) que a infiltração não pode ser determinada de ofício pelo juiz;
b) que a infiltração inicial e as prorrogações subsequentes não precisam ser, necessariamente, determinadas em blocos de 90 dias (é possível estipulação de prazo menor a cada período, nunca maior);
c) não é preciso que as prorrogações sejam sequenciais (desde que, em relação ao caso apurado, a medida não ultrapasse o lapso temporal total de 720 dias).
O inciso II e o § 3º, do já mencionado artigo 190-A do ECA, revelam que o MP ou o delegado de polícia deverá demonstrar:
a) a necessidade da medida (indícios mínimos de autoria, demonstração da materialidade delitiva e que a prova não pode ser coligida por outro meio);
b) o alcance das tarefas do agente infiltrado (planejamento das ações a serem materializadas no curso da técnica investigativa);
c) os nomes ou apelidos das pessoas investigadas (o que for possível, no momento que a medida for pleiteada); e
d) quando possível, os dados de conexão ou dados cadastrais que
permitam a identificação dessas pessoas (eventualmente
colecionados por meio de requisição a provedores de
internet).
É possível, para garantir a efetividade da infiltração, que o agente faça uso de documentos com dados fictícios (que serão fornecidos por órgãos públicos mediante requisição judicial, nos termos do artigo 190-D do ECA). Tal medida é extremamente importante para garantir o sucesso da infiltração (observe que providência semelhante não foi adotada quando da regulamentação da infiltração policial em organização criminosa, no bojo da Lei 12.850/13
1– aliás, penso ser perfeitamente adequada a utilização de analogia para estender o permissivo do Estatuto da Criança e do Adolescente em relação à infiltração na internet para infiltração no seio de organização criminosa).
Destarte, nos termos dos artigos 190-C e 190-D do ECA, não há que se falar na prática do crime (de falsidade ideológica, por exemplo), em face da confecção de documentação com dados inverídicos (ou da criação de perfis falsos em redes sociais ou aplicativos/programas), vez que criado permissivo legal (que desemboca na atipicidade do fato em face de ausência de antinormatividade ou em causa de exclusão da ilicitude da conduta, a depender do entendimento adotado – o novel mandamento legal parece ter preferido a exclusão da ilicitude, em face do contido no parágrafo único do artigo 190-C, que fala da possibilidade de punição do excesso).
A primeira análise da lei leva a crer que é possível, no curso de investigação relativa aos crimes descritos no artigo 190-A do ECA:
a) criar perfil falso de adulto, com o objetivo de se aproximar do investigado e constatar a prática delitiva (parece estar autorizado ao policial, inclusive, fazer-se passar por pedófilo para ser
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