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A LUTA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO PELO ACESSO A TERRA NA AMAZÔNIA MATOGROSSENSE

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A LUTA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO PELO ACESSO A TERRA NA AMAZÔNIA MATOGROSSENSE

Serlene Ana De Carli

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Eixo temático: CONFLITOS E MOVIMENTOS SOCIAIS

RESUMO: O presente estudo tem por objetivo analisar e compreender como se deu o processo de ocupação do espaço geográfico da região que compreende a Amazônia Matogrossense e os conflitos socioespaciais existentes no meio agrário. A ocupação desta região se intensificou a partir da década de 1970, através dos projetos de colonização particulares e oficiais. Com a abertura desta nova fronteira agrícola, grandes grupos econômicos nacionais e internacionais subsidiados pelo governo se instalaram na região. O processo de ocupação não respeitou os povos tradicionais que viviam na região, nem os trabalhadores sem terra, ocasionando conflitos e disputa pela posse da terra. Diante disso, os movimentos sociais do campo têm levantado as suas bandeiras de luta contra o latifúndio e a exclusão social no campo. Este estudo foi feito com base na bibliografia que trata do tema e na visita ao campo, que nos permitiu a observação direta e através de entrevistas não-estruturadas junto a Sindicatos de Trabalhadores Rurais, trabalhadores rurais acampados, assentados da reforma agrária, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e junto a algumas empresas relacionadas à cadeia produtiva do agronegócio. Refletir sobre esta temática é importante para entendermos as contradições e os conflitos que foram produzidos no espaço agrário que compreende a Amazônia Matogrossense.

PALAVRAS-CHAVE: Conflitos; Movimentos Sociais; Concentração Fundiária; Amazônia Matogrossense.

1 INTRODUÇÃO

A disputa pela posse da terra, desencadeada na colonização, foi marcada por violentas batalhas e revoltas, levando à morte milhões de indígenas, quilombolas, posseiros, camponeses e, mais recentemente, de trabalhadores rurais sem terra, líderes de movimentos

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Professora Formadora da Educação do Campo do Centro de Formação de Professores de Mato Grosso-

CEFAPRO - Polo de Primavera do Leste/MT, ser.ana52@gmail.com e ser44@terra.com.br.

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sociais do campo e sindicalistas, que têm resistido ao modelo de ocupação por parte dos grupos oligárquicos, das empresas agrárias e dos latifundiários, detentores de grandes extensões de terras. A luta é contra a exclusão e a marginalização imposta pelo modelo agrário marcado pela concentração de terra, grilagem de terra e pela improdutividade, essa realidade agrária é responsável pela pobreza, desigualdade, miséria e violência no campo, no Brasil e na Amazônia Matogrossense.

Dados do Censo Agropecuário do IBGE (2006) apontam o Brasil na lista dos países com o maior índice de concentração fundiária, medido através do Índice Gini

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, os dados mostram que ocorreu um aumento na concentração de 0,857, em 1985, para 0,872, em 2006.

Este índice sinaliza uma estrutura agrária brasileira perversa, isso prova que o modelo de reforma agrária praticado desde o século passado vem preservando a estrutura fundiária do Brasil, mostrando-se incapaz de realizar a justa distribuição de terras. Dentre os dados divulgados, o Estado de Alagoas encontra-se com o índice de 0,871 e o Mato Grosso com 0,865, sendo estes os dois Estados com a maior concentração de terras do país.

Segundo Stédile (2003), a realidade agrária brasileira reflete a perversidade de um modelo que sempre concentrou as terras do Brasil; ainda mais grave é que, analisando as séries históricas das estatísticas da propriedade de terra feitas pelos Censos Agropecuários (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE), verifica-se que há uma tendência permanente à crescente concentração da propriedade da terra, assim como, cada vez mais, se criam mecanismos de intensificar sua concentração entre uns poucos privilegiados.

Em relação ao modelo de ocupação do território que compreende a Amazônia Matogrossense, seguiu-se essa mesma lógica, o processo concentrador, depredador e violento para com os povos tradicionais que viviam na região, caboclos, posseiros e índios - estes não foram respeitados, foram expropriados de suas terras, de suas origens e de suas culturas, muitas tribos foram dizimadas e outras foram extintas.

O modelo de ocupação gerou a concentração fundiária, a expropriação e a exclusão social no campo, e essa situação tem sido responsável pelos conflitos e a violência na região entre os donos do latifúndio, índios e trabalhadores sem-terra. Neste contexto estão presentes os movimentos sociais do campo que lutam por uma redistribuição justa das terras, usando como táticas de pressão sobre o governo e o latifúndio a ocupação das terras ociosas, improdutivas e griladas.

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Índice usado para medir a concentração de riquezas e terras; quanto mais próximo de 1, maior a concentração.

O índice referente à concentração de terra no Brasil é alto, pois está se aproximando de 1.

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Diante desta problemática, procurou-se compreender o processo de ocupação do território que compreende a Amazônia Matogrossense, a estrutura fundiária, a demanda por terras por parte dos trabalhadores rurais sem terra, as contradições e os conflitos sócio-espaciais existentes no meio agrário, marcado por realidades antagônicas e conflitosas.

Este estudo foi feito com base na leitura de alguns autores que tratam do tema e na visita ao campo, que nos permitiu, através da observação direta e de entrevistas não- estruturadas junto a Sindicatos de Trabalhadores Rurais, a trabalhadores rurais acampados e assentados da reforma agrária, ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e visita a algumas empresas, que comandam a cadeia produtiva do agronegócio, refletir sobre como esta temática é importante para entendermos as contradições que foram produzidas no espaço agrário que compreende a Amazônia Matogrossense.

2 A ORGANIZAÇÃO E A LUTA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO

Para fazer frente ao latifúndio e ao modelo econômico excludente, surge no século XX a organização dos movimentos sociais campesinos, com suas bandeiras de luta em favor da reforma agrária e da inclusão social dos povos pobres e sem-terras dos países latino- americanos. Esses movimentos pressionam o Estado, os governos, exigindo justiça social no campo e uma intervenção na estrutura fundiária.

Conforme explica Fabrini (2008, p. 240), “os movimentos sociais são caracterizados como organizações e manifestações da sociedade civil, com o objetivo de contestar a ordem estabelecida e a forma de organização da sociedade, buscando a transformação da mesma”.

Para o autor, "um movimento só é caracterizado como social quando agrega forças coletivas de diferentes grupos, visando mudanças nas relações sociais, políticas, ambientais, educacionais, econômicas, etc.”

Nesta perspectiva, surgem com caráter agrário os movimentos sociais do campo, que passam a existir a partir da organização de grupos sociais que lutam por uma causa comum.

Os movimentos sociais do campo, ou campesinos, são definidos por Fernandes (2004), como

“sócio-territoriais que, para atingirem seus objetivos, constroem espaços políticos,

especializam seus militantes e conquistam novos territórios, de maneira que a maior parte dos

movimentos sócio-territoriais é formada durante o processo de territorialização da luta pela

terra e desterritorialização do latifúndio”.

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No Brasil, a resistência campesina e a luta pelo acesso democrático a terra vem ocorrendo ao longo da história, através de revoltas e manifestações, a exemplo de Canudos, Contestado, Trombas, Formoso, Ligas Camponesas, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Sindicatos de Trabalhadores Rurais, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e outras dezenas de movimentos sociais.

A decisão de entrar na luta pela terra não é tomada da noite para o dia, como uma decisão mágica. É fruto de todo um processo de expropriação, exploração perpassada pela alienação, que oculta a eles a sua real condição de expropriados e explorados. No bojo desse processo, porém, está presente a resistência. Acomodante a princípio, essa resistência vai se tornando pouco a pouco em resistência propulsora de um movimento de rebeldia contra a própria condição. E a resignação acomodada torna-se força de luta para a transformação (BORGES, 1997, p. 147).

Atualmente o MST é considerado o maior movimento camponês do mundo, cuja bandeira de luta pauta por três eixos: ocupar, resistir e produzir. Além de reivindicar o acesso a terra através da reforma agrária, o movimento cobra mudanças gerais na sociedade e no sistema econômico neoliberal do país, apontando e legitimando a ocupação como principal meio de pressionar governos e sensibilizar a sociedade sobre a necessidade da realização de uma reforma concreta e democrática.

O movimento dos trabalhadores sem-terra passou a representar uma nova fase na organização dos camponeses, fazendo com que a sociedade olhasse a sua condição de excluídos do processo produtivo e da apropriação da terra, por meio de ocupações de latifúndios e acampamentos em todo o Brasil.

Passaram a criar situações para o envolvimento do Estado na questão da terra através da ocupação da terra e órgãos públicos, marchas, caminhadas, atos públicos, etc. Assim, simultaneamente à expulsão e expropriação com a evolução do capitalismo, os camponeses construíram a possibilidade de retorno a terra, através de ocupações e lutas de resistências (FABRINI, 2008, p. 250).

A partir da década de 1990, o MST intensificou suas ações através da ocupação de

terras ociosas, improdutivas e hipotecadas, adicionando ao alvo do movimento os órgãos

públicos responsáveis pela reforma agrária, a fim de pressionar e cobrar do governo agilidade

no processo de assentamento. Para os militantes do MST, a realização da reforma agrária é a

única alternativa econômica para a massa de trabalhadores camponeses sem acesso a terra,

que vivem marginalizados na periferia das cidades e em centenas de acampamentos

espalhados pelo Brasil. Neste sentido, a reforma agrária é vista como o mecanismo legal para

modificar a estrutura fundiária do país.

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Foto 1. Passeata

Fonte: MST (2006).

Para Grzybowsky (apud BRANDÃO, 2006, p. 41), o principal mérito dos movimentos sociais é a resistência, possibilitando a “mudança de padrão dos trabalhadores rurais e suas comunidades, contribuindo para o processo de constituição de uma nova concepção de sociedade civil”. A explicação para tal mudança se associa à nova feição atribuída aos trabalhadores, que, da posição de excluídos, passaram a agentes políticos, lutando por melhores condições de vida e possibilidade de acesso a terra.

Contudo, apesar de os movimentos sociais do campo agregarem forças políticas para pressionar o Estado na realização da reforma agrária, os mesmos estão sendo criminalizados perante a sociedade, através da mídia, por grupos econômicos do setor agropecuário, pelos representantes do latifúndio no Congresso Nacional e até pelo judiciário.

Martins (1995) ainda afirma que: “Nos conflitos pela terra, são considerados vítimas unicamente os mortos e feridos. Entretanto, seria necessário incluir ente elas os posseiros que tiveram suas casas queimadas por jagunços a serviço de grileiros, fazendeiros e grandes empresas nacionais e multinacionais; os que têm sido despejados, quase sempre violentamente, por equipes combinadas de jagunços e policiais, com base em decisões judiciais”.

Nos últimos anos os conflitos se intensificaram em todas as regiões do país, provando que o modelo de reforma agrária adotado pelo atual governo, apesar de dialogar com os movimentos camponeses, não está sendo capaz de realizar a justa distribuição da terra.

Diante disso, a violência no campo se tornou fato comum, onde trabalhadores são

constantemente ameaçados e enfrentam, apesar da disparidade de forças, pistoleiros,

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capangas, policiais e a própria justiça, que, no auge de sua magistratura, corriqueiramente se posiciona em favor do latifúndio e do capital.

Tabela 1. Comparação dos conflitos no campo por regiões. Brasil – 2008.

Regiões Nº de conflitos

Pessoas

Envolvidas Assassinatos Presos Famílias

despejadas Agredidos Área em disputa (ha)

Nordeste 380 34508 6 13 3033 56 340316

Norte 402 120583 18 66 586 78 332325

Centro-

Oeste 129 34508

1 29 1845 117 59102

Sudeste 153 115078 0 8 2988 220 124706

Sul 106 52049 3 52 2217 329 61132

Total

Brasil 1169 356726 28 168 8679 800 917581

Fonte: CPT (2009).

Observa-se, pela tabela, que os conflitos agrários estão presentes em diferentes escalas em todas as regiões do Brasil. A região Norte aparece como uma das regiões do país mais conflituosas apresentando maior número de conflitos, de pessoas envolvidas, de mortes e de presos. As relações conflituosas nos espaços sociais agrários desta região ocorrem devido ao enfrentamento dos trabalhadores sem terra e os latifundiários que concentram as maiores áreas de terra do país.

Os resultados totais demonstram que no Brasil as relações sociais no campo são extremamente violentas, que o problema agrário no país é sério e que a luta no campo existe e não pode ser mascarada e criminalizada, como vem sendo feito pelas elites agrárias, pelo Estado e pela própria justiça, que têm usado a lei para criminalizar os movimentos sociais do campo.

3 PROCESSO DE OCUPAÇÃO, CONCENTRAÇÃO FUNDIÁRIA E ORGANIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO NA AMAZÔNIA MATOGROSSENSE

Na década de 1970 os governos militares, na intenção de ocupar a região amazônica

para facilitar a expansão do capitalismo, e para resolver os conflitos de terras, principalmente

na região Sul e do Nordeste do País, abriram várias frentes de colonização e ocupação da

Amazônia através de projetos governamentais e privados. A ideia do governo era ocupar as

terras devolutas e ociosas da vasta região, e essas terras realmente foram ocupadas por

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grandes proprietários, por grandes grupos econômicos que reproduziram na região o latifúndio como estrutura da propriedade de terras.

De acordo com Stédile (2003, p. 22), o governo poderia ter aproveitado a imensidão de terras da região Centro-Oeste e da região Amazônica, para distribuí-las de forma democrática em pequenas propriedades, mas preferiram distribuir em grandes propriedades, que em alguns casos ultrapassam 100 mil hectares nas mãos de um único proprietário.

No caso de Mato Grosso, cerca de 90% dos projetos de colonização foram feitos por empresas privadas e a maioria dos assentamentos agrários foi realizada no eixo que compreende a BR 163, que liga Cuiabá a Santarém. Os projetos de colonização e de assentamentos deram origem a várias cidades, como: Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Sorriso, Vera, Santa Carmem e Sinop, entre outras do Estado. Cidades estas, que nasceram como pontos estratégicos para atender, com a infraestrutura e serviços, a cadeia produtiva do agronegócio, conforme explica a autora:

A colonização privada teve caráter seletivo, e o acesso a terra implicava a existência de recursos próprios; à medida que a área se desenvolvia economicamente, os colonos descapitalizados iam se afastando, acelerando- se o processo de concentração fundiária. Com a intensificação da modernização agrícola, núcleos urbanos iam se desenvolvendo para atender as necessidades dessa atividade. Entretanto, assim como em áreas de colonização oficial, muitos colonos tiveram dificuldades de adaptação às novas condições ambientais, sofrendo com a ausência de assistência técnica e financeira, alem de outras promessas não cumpridas por algumas colonizadoras (BERNARDES, 2006, p. 133).

O projeto de ocupação e de expansão da nova fronteira agrícola do país, na Amazônia Matogrossense, está praticamente consolidado, graças aos incentivos governamentais, aos grandes grupos econômicos que se instalaram na região, atuando nos setores da agropecuária, agroindústria, comércio, e nos setores financeiros fundamentados no capitalismo rentista. Em Mato Grosso a cadeia produtiva do agronegócio responsável pela economia do Estado se encontra nas mãos de grandes grupos econômicos nacionais e internacionais, representados por grandes traders, como a ADM, Cargil, Fiagril, Amaggi, Sadia, Perdigão, Itamaraty, barraálcool e outras centenas de médias e pequenas empresas.

Esses grandes grupos econômicos têm o monopólio das terras, da produção de grãos,

biodiesel, insumos, sementes, comercialização, industrialização das matérias primas

produzidas na região e, além disso, são detentores do capital.

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A nova fase de expansão territorial do capital, no que diz respeito à agricultura moderna em Mato Grosso, estende-se através das novas relações de mercado para além dos limites de territórios já incorporados e consolidados, com apropriação das terras para obtenção de maior lucro possível através da utilização das técnicas mais inovadoras, com vistas no mercado externo (BERNARDES, op.cit., p 135).

Nesse sentido, prevalece na região uma economia capitalista fundamentada no modelo agro-exportador baseado em grandes áreas de monocultura; na progressiva destruição do meio ambiente, da biodiversidade, da concentração da terra, concentração de renda e na exclusão social. Essa realidade sócio-econômica e fundiária é responsável pelos conflitos agrários na região.

Pode-se afirmar que o avanço da fronteira agrícola sobre o Cerrado, sobre a Amazônia Matogrossense e o Sul do Pará tem contribuído, ao longo dos anos, para a violência permanente no campo. Segundo os dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), os maiores índices de assassinatos estão nestes dois estados, que configuram a nova geografia dos conflitos agrários. A violência tem se agravado devido à expansão das monoculturas de grãos, dos agrocombustíveis e da invasão e exploração das terras dos povos tradicionais, pequenos posseiros, indígenas e quilombolas. Os municípios com maior índice de violência pela posse da terra em Mato Grosso são: Colniza, Tapurah, Poxoréu, São Félix do Araguaia, Novo Mundo e Nova Canaã do Norte, todos localizados na Amazônia Matogrossense (CPT, 2009).

De acordo com Amaral (2010), a violência no campo, no Estado, ocorre devido a várias situações ilegais. Sobreposição de títulos de terra, presença de milícias contratadas para a retirada de famílias acampadas ou posseiras, donos de terra que, por conta própria, expandem suas áreas, alargando suas cercas e adentrando em terras de assentamentos, brigas internas em assentamentos, a presença de jagunços e pistoleiros. Neste cenário de violência os ameaçados são: posseiros, trabalhadores sem terra, agentes da pastoral, religiosos, índios e líderes dos movimentos sociais.

A questão agrária na Amazônia Matogrossense é extremamente conflitosa, a demanda

por terra por parte dos trabalhadores rurais sem terra ainda é grande, existem em torno das

principais BRs vários acampamentos de trabalhadores com cerca de 19 mil acampados. Na

região Médio-Norte do Estado, onde predomina o latifúndio, a agricultura e a pecuária

capitalista, ocorre uma maior incidência de acampados. Os municípios de Nova Guarita,

Peixoto de Azevedo, Sinop, Itaúba e Cláudia têm apresentado vários conflitos pela posse da

terra, com assassinatos, e as lideranças responsáveis pela organização dos acampamentos

constantemente ameaçadas de morte. Nesta região, o MST, a Comissão Pastoral da Terra

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(CPT) e Sindicatos de Trabalhadores Rurais têm ocupado várias áreas, como forma de pressionar o INCRA na desapropriação e na compra da terra para a reforma agrária.

Em Mato Grosso, os dois movimentos mais atuantes são o MST, que atua desde 1995, e a CPT. Nestes 15 anos de luta o MST conseguiu a realização de 35 assentamentos e atualmente coordena muitos acampamentos, principalmente no Médio-Norte do Estado.

Segundo Ferreira, Fernandez e Silva (1999), “a primeira organização de camponeses em Mato Grosso aconteceu em 1986, no município de Jaciara, quando trabalhadores rurais sem terra, sob a coordenação da Igreja Católica, caminharam até Cuiabá com o objetivo de negociar com o governo estadual a desapropriação de áreas para fins de reforma agrária”. Esta ação gerou visibilidade aos problemas sociais no campo e estimulou novas práticas de luta, que posteriormente foram intensificadas através de outros movimentos.

Entre os estados que fazem parte da Amazônia Legal

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o Mato Grosso é um dos estados com a maior concentração fundiária. De acordo com dados do MST/MT, o mesmo possui em torno de três milhões e quinhentos mil hectares de terras da União griladas, ocupadas pelo latifúndio, e dois milhões de hectares de terras públicas estaduais, que podem ser usadas para a reforma agrária, além disso, existem as terras de fronteiras, o que daria para assentar 23 mil famílias.

Segundo informação dos dirigentes do MST, “existem em Mato Grosso 100 mil famílias sem terra, isso é fruto do modelo econômico capitalista que tem contribuído para a exclusão social tanto na cidade como no campo. Muitas destas famílias sem terra se encontram na linha de pobreza, e para estes, lutar por um pedaço de terra ainda é o melhor caminho, melhor do que ficar na cidade e cair no mundo da marginalização da fome e da miséria urbana”.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio deste estudo foi possível perceber que a tônica dos movimentos sociais do campo são as mudanças nos rumos das políticas econômicas e agrárias, reivindicando políticas públicas que venham dar solução para as desigualdades sociais, cobrando políticas de inclusão social e um novo modelo de desenvolvimento econômico, social e ambiental para o Brasil e para a região amazônica.

Ficando claro que, para os movimentos sócio-territoriais, a luta pelo acesso a terra no Brasil, e especificamente em Mato Grosso, é justa, devido à omissão do Estado em realizar

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Amazônia Legal é o termo referente a uma área que engloba nove estados brasileiros pertencentes à Bacia

Amazônica: Mato Grosso, Tocantins, Acre, Pará, Amazonas, Rondônia, Roraima, Amapá e parte do Maranhão.

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uma reforma agrária de fato, pondo fim ao latifúndio improdutivo, às terras ociosas e griladas.

A luta também é contra o latifúndio, enquanto fonte que sustenta uma estrutura de poder político e econômico extremamente desigual.

O Mato Grosso e o Pará aparecem como os dois estados brasileiros, com maiores índices de violência no campo, isso vem ocorrendo divido o avanço da fronteira agrícola em direção a floresta amazônica, onde novas áreas, ocupadas pelos povos tradicionais são incorporadas ao setor madeireiro, agropecuário e ao grande capital.

A despeito da violência, burocracia estatal e da parcialidade jurídica nos conflitos agrários, centenas de trabalhadores sem terra, não desistem do sonho do acesso a terra e continuam acampados em torno das principais BRs do Estado, esperando a desapropriação das áreas por parte do INCRA, para a reforma agrária.

Diante do fortalecimento e consolidação do agronegócio, das contradições e conflitos, se questiona o futuro de milhares de trabalhadores sem terras, do destino dos povos tradicionais, cada vez mais encurralados em pequenas reservas, e da agricultura familiar praticada nos assentamentos ilhados em meio à monocultura e ao latifúndio.

Conclui-se que, apesar de quase um século de luta pela terra no Brasil e 15 anos de luta em Mato Grosso, por parte dos movimentos sociais organizados, chegamos à atualidade sem assistir à redistribuição democrática e igualitária da mesma. Sabe-se que a reforma agrária é uma política necessária para o desenvolvimento econômico, social e democrático do país.

REFERÊNCIAS

AMARAL, Lívia. 21 „jurados‟ de morte em MT. Folha do Estado. Cuiabá, 21 de fev. de 2010, p. 9.

BERNARDES. Julia Adão; FILHO, Osni de Luna Freire (Orgs.). Geografias da soja BR 163, Fronteiras em Mutação. Rio de Janeiro: Arquimedes Edições, 2006.

BORGES, Maria Stela Lemos. Terra: Ponto de Partida, Ponto de Chegada: Identidade e Luta pela Terra. São Paulo: Anita, 1997.

BRANDÃO, Cândice Lisboa. Assentamentos rurais e licenciamento ambiental em Minas Gerais. 170 p. Dissertação de Mestrado em Extensão Rural. Universidade Federal de Viçosa.

Viçosa: UFV, 2006.

CPT - Comissão Pastoral da Terra. Dados sobre violência no campo, 2008. Disponível em:

<http://www.cptnac.com.br>. Acesso em 22 out. 2009.

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FABRINI, João Edmilson (Org.). Campesinato e territórios em disputa. São Paulo:

Expressão Popular, 2008. cap. 6, p.161-190.

FERNANDES, Bernardo Monçano. Vinte anos do MST e a perspectiva da reforma agrária no governo Lula. In: OLIVEIRA, Ariovaldo Ubelino de; MARQUES, Maria Inês Medeiros. O Campo no Século XXI, território de vida, de luta e de construção da justiça social. São Paulo: Ed. Casa Amarela e Ed. Paz e Terra, 2004. cap. 14, p. 273-291.

FERREIRA, Eudson de Castro; FERNÁNDEZ, Antonio João Castrilan; SILVA, Evande Praxedes. A reconstrução dos assentamentos rurais em Mato Grosso. In: MEDEIROS, Leonilde Servolo de; LEITE, Sérgio (org). A formação dos assentamentos rurais no Brasil:

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Disponível em:

http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/agropecuaria/censoagro/2006/>. Acesso em 3 nov. 2009.

MARTINS, José de Souza. Os Camponeses e a política no Brasil: Lutas: As lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. 4

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MST - Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra. Disponível em:

<http://www.mst.org.br/mst/pagina. php?cd=87> Acesso em 23 de abril de 2009.

STÉDILE, João Pedro. Latifúndio: O Pecado Agrário Brasileiro. Caderno de Formação nº

33. Publicação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. São Paulo: MST, 2003.

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