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A reforma do código penal pela lei 12.0152009 e sua condição mais benéfica para o agente que comete o crime de estupro

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CURSO DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO

HANNA MORAIS DE ARIMATÉA CAPIBARIBE

A REFORMA DO CÓDIGO PENAL PELA

LEI 12.015/2009 E SUA CONDIÇÃO MAIS

BENÉFICA PARA O AGENTE QUE

COMETE O CRIME DE ESTUPRO

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HANNA MORAIS DE ARIMATÉA CAPIBARIBE

A REFORMA DO CÓDIGO PENAL PELA LEI

12.015/2009 E SUA CONDIÇÃO MAIS

BENÉFICA PARA O AGENTE QUE COMETE

O CRIME DE ESTUPRO

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a aquisição do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal.

Orientador: Profº. Mestre Michel Mascarenhas Silva.

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HANNA MORAIS DE ARIMATÉA CAPIBARIBE

A REFORMA DO CÓDIGO PENAL PELA LEI

12.015/2009 E SUA CONDIÇÃO MAIS

BENÉFICA PARA O AGENTE QUE COMETE

O CRIME DE ESTUPRO

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a aquisição do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal.

Aprovada em: 13/06/2012

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________ Prof. Ms. Michel Mascarenhas Silva(Orientador)

Universidade Federal do Ceará – UFC

______________________________________________ Prof. Dr. Márcio Ferreira Rodrigues Pereira

Universidade Federal do Ceará - UFC

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

C243r Capibaribe, Hanna Morais de Arimatéia.

A reforma do código penal pela lei 12.015/2009 e sua condição mais benéfica para o agente que comete o crime de estupro / Weber Busgaib Gonçalves. – 2012.

101 f. : enc. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2012.

Área de Concentração: Direito Penal.

Orientação: Prof. Me. Michel Mascarenhas Silva.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, primeiramente, pela vida, pela saúde e por todos os ensinamentos, bem como por ter me proporcionado a felicidade de conseguir cursar a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará.

Ao professor orientador, Michel Mascarenhas Silva, por ter prontamente me atendido e aceitado orientar este trabalho científico.

Aos membros da banca, professor Márcio Ferreira Rodrigues Pereira por ter sido tão solícito, e a aluna do mestrado Ana Karoline dos Santos Pinto por sua disponibilidade e atenção.

À minha mãe, Rosemary, pelo amor, pela dedicação, pelo apoio nas horas difíceis e por acreditar no meu potencial.

À minha avó, Maria Ilmeire, e ao meu tio, Yan, por terem sido tão presentes e amorosos.

Aos meus amigos Gilberto, Érica, Gabriela e Rossana, por me darem alegria durante nossos encontros, por me ouvirem e me aconselharem, por demonstrarem de diversas formas, mesmo com suas particularidades, que nossa amizade é forte e que sentimos amor uns pelos outros.

Ao meu pai, Sirlênio, que, mesmo estando mais presente apenas no final desta etapa da minha vida, se fez muito importante nesses últimos meses.

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RESUMO

No presente trabalho monográfico foi realizado um estudo acerca das recentes modificações do Código Penal Brasileiro advinda da Lei 12.015 de 7 de agosto de 2009, particularmente no tocante ao crime de estupro. Teve por objetivo principal analisar a mudança legislativa mais benéfica ao acusado quando houve a junção, num mesmo tipo penal, dos delitos de estupro e atentado violento ao pudor. Procurou-se demonstrar que o novo tipo penal passou a ser entendido como tipo misto alternativo, ao passo que passou a ser um crime de ação múltipla, ou de conteúdo variado, embora haja uma minoria que entende por ser um tipo misto cumulativo, devendo incorrer ainda o concurso de crimes para o agente que comete, com desígnios autônomos, conjunção carnal e outro atentado violento ao pudor. Por fim, ao se comparar a antiga redação dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor com o novo texto, percebe-se tratar de uma novatio legis in mellius, portanto devendo retroagir para atingir aos casos julgados e os que estão em andamento, desde que seja imputado ao agente as penas dos artigos 213 e 214 (revogado), do Código Penal, em concurso material de crimes.

Palavras-chave: Direito Penal; crime de estupro; Lei 12.015/2009; novatio legis in mellius.

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ABSTRACT

In the present study a monograph on the recent modifications of the Criminal Code arising from the Brazilian Law 12,015 of August 7, 2009, particularly with regard to the crime of rape. Our aim was to analyze the main legislative changes most beneficial to the accused when there was a junction in the same criminal offense, the offenses of rape and indecent assault. We demonstrate that the new criminal offense has to be understood as an alternative mixed type, while crime has become a multi-action, or content varied, although there is a minority that believes to be a mixed type cumulative and shall incur the contest yet crimes to the agent who commits, with independent designs, carnal knowledge and one indecent assault. Finally, when comparing the old wording of the crimes of rape and indecent assault with the new text, we realize it is a legislative novatio in mellius therefore should retroactive to cases tried to achieve and that are in progress, provided that imputed to the agent the feathers of Articles 213 and 214 (repealed) of the Criminal Code on crimes tender material.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 09

1 O DIREITO PENAL NO MUNDO E NO BRASIL. OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO PENAL. ... 12

1.1 A Evolução do Direito Penal no Mundo ... 13

1.2 O Direito Penal no Brasil... 18

1.3 Princípios Consagrados no Direito Penal ... 23

2 O CRIME DE ESTUPRO E DE ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR ANTES DA LEI 12.015/2009 ... 32

2.1 O art. 213 antes da reforma sofrida em 7 de agosto de 2009. ... 34

2.1.1 Sujeitos do Crime ... 36

2.1.1.1 Marido como sujeito ativo? ... 40

2.1.1.2 Transexuais: existência de estupro? ... 42

2.1.2 Consumação e tentativa ... 44

2.1.3. Conceituação do tipo penal ... 46

2.2 Atentado violento ao pudor – o revogado art. 214 do Código Penal Brasileiro ... 48

2.2.1 Sujeitos do crime ... 50

2.2.2 Consumação e tentativa ... 51

2.2.3 Conceituação do tipo penal ... 54

2.2.4 Beijo Lascivo e a (des)necessidade de contato entre o agente delituoso e a vítima... 55

2.3 Posse sexual mediante fraude – art. 215 ... 57

2.4 Atentado violento ao pudor mediante fraude – art. 216 ... 59

2.5 Disposições comuns entre o crime de estupro e de atentado violento ao pudor ... 61

2.5.1 Formas qualificadas e causa de aumento de pena ... 62

2.5.2 Ação Penal ... 63

3 A NOVA ESTRUTURA DO ART. 213 DO CÓDIGO PENAL COM A VIGÊNCIA DA LEI 12.015/2009. .. 66

3.1 Da Proteção à Dignidade Sexual: o novo bem juridicamente protegido ... 66

3.2 Sujeitos do crime: ativo e passivo ... 66

3.3 Consumação e tentativa ... 67

3.4. Conceituação do tipo penal ... 70

3.5 Ação Penal nos moldes do art. 225 do Código Penal e o advento do Segredo de Justiça ... 72

3.6 Qualificadoras: lesão corporal e morte ... 78

3.7 Violação sexual mediante fraude – nova redação do art. 215 ... 81

4. ANÁLISE CRÍTICA DA REFORMA DO ARTIGO 213 DO CÓDIGO REPRESSIVO ... 84

4.1 Abolitio criminis? ... 85

4.2 A Retroatividade da lei penal mais benéfica: novatio legis in mellius ... 87

CONCLUSÃO... 96

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INTRODUÇÃO

Em 7 de agosto de 2009, houve a introdução da Lei Federal 12.015 no ordenamento pátrio, cujo objetivo foi reformar o Código Penal Brasileiro vigente. Esta lei trouxe significativas mudanças, a começar pelo Título VI do Código Repressivo, transformando a nomenclatura do então vigente “Dos crimes contra os costumes” para “Dos crimes contra a dignidade sexual”, tendo em vista que aquela já não mais condizia com as mudanças ocorridas tanto na questão da sexualidade do indivíduo, como no pensamento da sociedade, sem falar na adequação aos princípios já elencados pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Tem-se em vista que a antiga taxonomia procurava tutelar os valores morais da sociedade da época, ideia inerente à criação da legislação penal, haja vista ter sido esta elaborada em 1940, portanto, a sociedade puritana pretendia adequar o indivíduo de acordo com os padrões considerados normais para os mais diversos comportamentos sexuais. Diante de tais valores, o indivíduo não tinha sua liberdade e dignidade como bens imediatamente assegurados, pois o importante era a padronização e adequação dos hábitos sexuais.

Com a alteração do comportamento da sociedade ao longo dos anos, o legislador sentiu necessidade de remeter atenção especial ao novo bem que deveria ser juridicamente protegido, a dignidade sexual dos indivíduos. Significa dizer que a proteção se voltou mais para os valores do ser humano do que para os valores arraigados na sociedade machista e, por muitas vezes, preconceituosa, apresentando-se, assim, em plena consonância com a Constituição Federal vigente. Ou seja, passou a consagrar princípios basilares já adotados no Estado Democrático de Direito, qual seja o da dignidade da pessoa humana.

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de 40, quando se deu a elaboração do Código Repressor.

Muito embora a lei em comento tenha trazido alterações importantes no âmbito penal, a mais impactante se referia justamente a nova redação que o crime de estupro iria contemplar. Mesmo tendo a concepção do homem como vítima de estupro já difundida nos ordenamentos penais de diversos países, o legislador brasileiro, por sua mentalidade muitas vezes enraizada do tempo do colonizador, não haveria como imaginar que tal figura, tão máscula, símbolo de força e virilidade também pudesse configurar como sujeito passivo do estupro.

Mas tanto tempo sem reconhecer esta igualdade de gêneros, figurava no âmbito penal uma injustiça de proteção aos bens tutelados, pois não somente a mulher poderia ser a vítima de uma violência sexual. Os homens também poderiam sofrer tal agressão e, por muitas vezes, se viam em desvantagem, pois na visão da sociedade o fato de ocorrer abuso sexual contra homem seria visto como de natureza homossexual, criando em cima do fato um estigma.

Nota-se, com isso, que a ampliação do rol de sujeitos ativos e passivos, no delito de estupro, trouxe consigo o princípio da isonomia dos gêneros, fato possível somente após a revogação do crime de atentando violento ao pudor, art. 214 do Código Penal, passando a vigorar sob o mesmo nomen júris do já existente crime de estupro. Dessa forma, o estupro não mais se caracterizaria apenas com a ocorrência da conjunção carnal, fato intimamente ligado à relação heterossexual, mas também com a prática de outros atos libidinosos, desde que diversos da cópula vaginal.

A alteração da redação do tipo elencado no art. 213 permitiu a existência do crime entre pessoas do mesmo sexo, porém ao mesmo tempo foi levantada pela doutrina e pela jurisprudência diversas questões, ainda não pacificadas, objeto de estudo ao longo deste trabalho.

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carnal e ato libidinoso diverso deste. Assunto é polêmico, pois há que se considerar que a unificação dos tipos sob uma só nomenclatura fez surgir diversos posicionamentos quanto ao que se tornaria a nova classificação do crime: se misto alternativo ou misto cumulativo.

O fato é que, dentre um dos maiores temores da sociedade ao saber da reforma, seria a possível descaracterização do crime de atentado violento ao pudor, com a abolitio

criminis, hipótese que não vingou, mas também o de reconhecer a lei como mais benéfica

para o indivíduo já condenado ou que responde processo por ter cometido, antes de 7 de agosto de 2009, as condutas tipificadas nos arts. 213 e 214 do Código Penal, neste caso, devendo retroagir para melhorar a situação do réu.

No presente trabalho se procurou abordar a atual conjuntura do artigo 213 do Código Penal, sendo necessário, para tanto, uma análise comparativa dos artigos 213 e 214 antes da vigência da Lei 12.015/2009 em face do texto de ambos constituírem o presente dispositivo, relatando quais pessoas poderiam configurar no polo ativo e passivo dos delitos, se o marido poderia ser sujeito ativo do estupro, se uma pessoa considerada transexual se enquadraria como vítima do crime de estupro, como se daria consumação destes dois delitos, as hipóteses de qualificadoras destes crimes, e por fim sua ação penal.

Procurou-se analisar, de forma mais sucinta, a alteração sofrida nos crimes correlacionados com o de estupro e de atentado violento ao pudor, quais sejam o art. 215, atualmente chamado de violação sexual mediante fraude e o de atentado violento ao pudor mediante fraude, art. 216 atualmente revogado. Tal exame se fez necessário haja vista o modo de execução, bem como os sujeitos ativos e passivos, ser bastante assemelhado aos delitos tipificados nos art. 213 e 214 do Código Penal, diferindo-se destes apenas no meio utilizado pelo agente para conseguir obter o fim desejado.

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1 O DIREITO PENAL NO MUNDO E NO BRASIL E SEUS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS.

1.1A Evolução do Direito Penal no Mundo

A terminologia “direito penal” não se faz tão antiga quanto sua aplicação. Ao que parece esta denominação foi utilizada, primeiramente, por um Conselheiro de Estado, chamado Regnerus Engelhard na data de 1756. Há que se lembrar de outros nomes pelos quais este direito é catalogado, tais como direito repressivo, direito protetor dos criminosos, direito restaurador ou sancionador, direito criminal, dentre outras. No Brasil, esta tipificação passou a ser utilizada no Código de 1890, que se chamava Código Penal da República.

São das mais diversas as formas como o direito penal é definido, dentre os quais se pode cita a de Von Liszt e Mezger, limitando-se a dizer que são normas elaboradas pelo Estado, tendo como fato principal o crime e como consequência a pena.1 Não há como ter uma definição exata e perfeita deste ramo jurídico, devendo sua análise ser realizada sob a visão objetiva e subjetiva do direito penal. Porém, diz-se que este direito é um conjunto de normas, visando caminhos outros que não sejam apenas o crime e a sanção, cuja repercussão vai além da pena imposta ao delinquente, haja vista seu caráter social, tutelando bens fundamentais de interesse a toda uma coletividade, bem como atinge outras disciplinas como o Direito Cível, Direito Administrativo, Direito Militar, Direito Eleitoral, Direito Internacional, etc.

Faz-se necessário observar que estas normas regulam o poder punitivo do Estado (jus puniendi), definindo condutas criminosas e impondo penas aos agentes criminosos. Apesar de caber ao Estado o poder de punir, este não é ilimitado, muito menos feito de forma arbitrária pelos governantes. A dita limitação se encontra na própria lei, pois ao mesmo tempo em que ela delimita quais tipos de ações serão consideradas incriminadoras perante a sociedade, sob pena de restringir os direitos individuais de quem comete tal infração, também acaba por vincular o comportamento do Estado quando se depara com a ocorrência tipificada pela norma penal. Por fim, considera-se que o Direito Penal deve ser o último fim ao qual o Estado recorrerá para combater algum mal, usando como medidas preventivas outras áreas

1

Von Liszt define direito penal como: “Conjunto das prescrições emanadas do Estado, que ligam ao crime, como fato, a pena como consequência”. Enquanto para Mezger é: “o conjunto de normas jurídicas que regulam o poder punitivo do Estado, ligando ao delito, como pressuposto, a pena como consequência.” (apud

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cuja sanção seja menos gravosa ao indivíduo, logo, conclui-se que pela ótica lógico-sistemática a medida penal repressiva deve vir posteriormente às demais.

O homem, devido a sua natureza, vive em comunidade, sendo o Direito o instrumento regulador deste convívio, assegurando a paz, o desenvolvimento e as condições mínimas de existência nesse ambiente coletivo. De acordo com estudiosos, o primeiro direito a ser criado foi o penal. Com o surgimento da vida em grupos, a vingança do homem contra o homem se tornou um meio de coibir as ações tidas como delitos, visando à preservação dos interesses individuais e até mesmo coletivos. Não há como se compreender a legislação penal atual sem antes ter conhecimento de seu passado. Em se tratando da evolução do Direito Penal há várias fases da pena, tais como: a vingança privada, a vingança divina, a vingança pública. Ressalva-se que tais fases não foram sucessivas, nem tão pouco deixaram de existir com o surgimento de uma nova, tornando-se muitas vezes concomitantes.

A vingança privada era praticada pelo próprio ofendido ou por quem se sentisse atingido pelo mal que foi causado àquele. A justiça seria feita pelas próprias mãos e a pena sofrida pelo ofensor não era resguardada de nenhuma proporcionalidade com o delito cometido. Essa fase é caracterizada pela ausência do Estado, portanto as comunidades existentes faziam imperar a lei do mais forte.

Neste contexto surge a Lei de Talião presente no Código de Hamurabi – olho por olho, dente por dente- tornando a vingança menos arbitrária e desproporcional. Há indícios que tenha aparecido com as Leis Mosaicas, na mesma época, a chamada composição - instituto que dava ao ofensor o direito de não haver represália pelo ato cometido, pois este comprava tal direito do próprio ofendido ou da família do mesmo-, e a legítima defesa, elencada no direito hebreu.

As penas/sanções também possuíam caráter religioso, pois o norte da repressão seria a satisfação da divindade ofendida pela conduta criminosa, cuja punição estava interligada proporcionalmente a grandeza do deus ofendido, a chamada vingança divina.

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(1976, p.13), “A essa época os sacerdotes são magistrados. As leis são ditadas em nome de Deus, e o legislador invoca seu nome e pede sua inspiração para redigi-las, quando não as recebe diretamente do Ser Supremo”2. As sanções continuam sendo extremamente severas.

Quando o poder político evoluiu e passou-se a falar na existência do Estado primitivo, o Direito Penal também se transformou passando a ser aplicado em função do interesse coletivo. Surge a ideia de proteção ao soberano, no qual se reprimia o crime através de penas cruéis e severas. Embora a vingança fosse de cunho público, predominando o arbítrio do soberano, as vinganças privada e divina não deixaram de existir.

Para o direito romano, o crime e a pena possuíam um caráter público, pois aquele era visto como um atentado à ordem estabelecida, consequentemente a pena era uma resposta do Estado. Concomitantemente, o pater familias podia executar as penas primitivas, quais sejam a da Lei de Talião ou a de composição, adotadas na Lei das XII Tábuas – primeiro código romano. No período monárquico desta civilização o que prevalecia era o direito consuetudinário, de forma rígida, formal e solene. Cabe observar que a existência do pater

famílias trazia este como chefe da casa, com poderes totais, sem apelação, sobre as decisões

que deveriam ser tomadas.

Em Roma, havia diferenciação das palavras conforme o tipo de ação: crimen era a referência para os crimes de natureza pública e delictum aos de natureza privada. A principal pena para um crime de natureza pública era a de morte, chamada supplicium, aplicada aos crimes de traição à nação, de morte do cidadão livre. Havia também o chamado parricidium, aos crimes de incêndio, de falso testemunho, de suborno do juiz e de sátira injuriosa3. Ressalta-se que os crimes tidos como públicos a repressão da conduta criminosa ficava a cargo do Estado, este representado pelo magistrado que possuía poder de imperium. Já para os delitos de cunho privado, a sanção era realizada pelo ofendido e o Estado só intervia para regularizar o exercício desta repressão.

No período republicano de Roma, o Estado passou a assumir suas funções de jurisdição, passando a pena de morte a ser aplicada aos crimes mais graves, porém se fazia presente como sanção o trabalho forçado. Na época do Império, nasce uma nova espécie de

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delito, o chamado crimina extraordinária, cuja orientação se baseava nas ordenações imperiais, nas decisões do Senado, bem como na interpretação jurídica. Ressalta-se que os romanos já possuíam a noção de dolo – intenção-, de culpa – negligência-, de legítima defesa e do estado de necessidade, as duas primeiras como noções fundamentais e as demais como institutos importantes no Direito Penal Moderno.

Seguindo o curso da história, o Direito Canônico, ordenamento jurídico da Igreja Católica Apostólica Romana, surge como um direito que foi estabelecido pela Igreja. Sua finalidade precípua seria a regulamentação da vida interna da própria instituição religiosa, impondo regras e disciplinas a seus membros, bem como aos seus fiéis. Durante boa parte da Idade Média foi o direito canônico o único direito escrito, gerando enorme influência no direito da época. A princípio, estas normas, que eram escritas em canons, serviriam apenas para o uso interno destes templos, como descrito acima. Porém, com seu crescimento e influência sobre os governantes, suas normas passaram a ser aplicadas, aos poucos, à população em geral, servindo de base ideológica para os ordenamentos jurídico-penais de toda a Europa.

Primeiramente, os delitos podiam ser divididos em: delicta eclesiastica, quando ofendia o direito divino, deixando o julgamento por conta dos tribunais eclesiásticos; delicta

mere secularia, lesionando apenas a ordem laica e era punida pelo tribunal do Estado; delicta

mixta, quando violava as leis de ordem religiosa e laica, porém seu julgamento se daria pelo

tribunal que primeiro conhecesse do delito.4

O sistema penal canônico passou a estabelecer penas mais suaves e moderadas, causando a extinção da pena de morte. Suas penas eram as chamadas espirituales e

temporales, aquelas sendo destinadas às penitências e excomunhão e esta de ordem a alcançar

a integridade física, a liberdade, patrimônio, etc. Mas ambas possuíam a finalidade de reparar o mal realizado e arrependimento do agente causador do delito. Este direito manteve os princípios já consagrados pelos romanos acerca da responsabilidade subjetiva, “proclamou a igualdade de todos os homens, acentuando o aspecto subjetivo do crime”5. Também possibilitou que as tradições romanas se expandissem pelo Ocidente, além de civilizar

4 PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro, parte geral – arts. 1º ao 120. Vol1. 8ª ed, p. 72. São

Paulo: Revista dos Tribunais,2007.

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algumas práticas adotadas pelos germanos. Advém do direito canônico a substituição das penas mais graves pelas penas privativas de liberdade, devendo estas ser cumpridas em penitenciárias. Por fim, é mister ressaltar a criação dos Tribunais do Santo Ofício, cuja finalidade era aplicar procedimentos inquisitórios, tendo atuação em especial na península Ibérica.

Quando se fala em período medieval, o Direito Penal da Idade Média ficou sendo o resultado da junção do direito romano, germânico e canônico adequado os direitos locais. Durante os anos que compreendem tal período da história, a Europa vai impor um Direito Penal mais rigoroso, com penas extremamente cruéis e extensivas aos familiares do condenado, como por exemplo, as mutilações, penas corporais, torturas e morte pela forca, pela fogueira, pela empalação, por esquartejamento, desrespeitando quaisquer direitos humanos. Conforme relata Beccaria:

Fragmentos da legislação de antigo povo conquistador, reunidos por ordem de um príncipe que reinou em Constantinopla, há doze séculos, juntados depois aos costumes dos lombardos e amortalhados em volumoso calhamaço de comentários pouco inteligíveis, são o antigo acervo de opiniões que uma grande parte da Europa prestigiou com o nome de leis; e, ainda hoje, prejuízo da rotina, tão nefasto quanto difundido, faz com que uma opinião de CARPOSOW, uma velha prática preconizada por CLARO, um suplício que FRANCISCO imaginou com bárbara complacência, continuem sendo orientações friamente seguidas por esses homens, que deveriam tremer ao decidirem da vida e da sorte de seus concidadãos. 6

O pensamento Iluminista do século XVIII irá influenciar de sobremaneira o Direito Penal, a partir da publicação da obra Dei delitti e dele pene, escrita por Cesare Bonessana, o marquês de Beccaria, na qual combate vorazmente o uso da tortura, da pena de morte, devendo a pena ser aplicada apenas para que o indivíduo não volte a delinquir, bem como servir de exemplo para toda a comunidade. O dito escritor ainda defendia a aplicação do princípio da legalidade, com elaboração de leis penais mais claras, cuja interpretação não seria realizada livremente pelo magistrado, como também o direito de o acusado se defender perante o processo penal.

Devido às ideias de Beccaria, o Direito Penal passa a ter uma nova fase, qual seja a do período humanitário, época compreendida entre os anos de 1750 e 1850, na qual seus pensadores lutavam contra as ideias absolutistas, pregando a reforma da lei e da administração

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da justiça penal. Observa-se que este ideal será influenciado, em 1789, pela Revolução Francesa, onde serão consagrados os direitos fundamentais humanos na famosa Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Após o pensamento difundido pelo Iluminismo, houve a necessidade de o Direito Penal ser tratado como ciência. A primeira escola, assim chamada de Escola Clássica, tem origem encontrada na filosofia grega antiga, que sustentava ser o Direito afirmação da justiça, no contratualismo e, sobretudo, no jusnaturalismo. A terminologia “clássica”, denominação da Escola Clássica do Direito Penal, foi criada pelo movimento positivista utilizando o termo de forma depreciativa para retratar autores que não seguiam seus posicionamentos, tornando-se um conceito de referencial negativo.

O precursor deste pensamento foi o marquês de Beccaria (Cesare Bonessana). Caracteriza-se por sua linha filosófica, de cunho liberal e humanitário. Os fundamentos seguidos por esta Escola eram: a) o Direito possui uma natureza transcendente, seguindo uma ordem imutável da lei natural; b) o delito era caracterizado como ente jurídico, representando uma relação de contradições entre o fato humano e a lei; c) a responsabilidade penal é pautada na imputabilidade moral e no livre arbítrio do ser humano; d) o delinquente é um ser livre, optando este a praticar o mal por vontade própria.

Após esta época surge o chamado Período Criminológico. Tal fase é iniciada pela Escola Positivista com ideias opostas ao racionalismo, atacando o pensamento clássico do combate ao crime, baseando-se em estudos antropológicos do indivíduo e sociológicos do crime. A Escola em tela surgiu na época em que houve um grande desenvolvimento das ciências sociais (Antropologia, Psiquiatria, Psicologia, Sociologia, etc.), tornando este fato determinante para uma nova orientação nos estudos criminológicos. Confrontando o individualismo da Escola Clássica, a Escola Positivista opôs a necessidade de defender com mais ênfase a sociedade contra a ação do indivíduo delinquente, priorizando os interesses coletivos.

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classificado em tipos. Teve como precursores Cesare Lombroso e Raffaele Garófalo, porém os adeptos a esta Escola procuravam rebater a responsabilidade penal pautada no livre-arbítrio, pensamento propagado pela Escola Clássica.

No final do século XIX surge, na Alemanha, um movimento reformista liderado por Von Liszt objetivando combater o pensamento de Lombroso acerca da existência do criminoso nato e mostrando que as raízes do crime estavam inseridas nas relações sociais, sendo de fator relevante o meio individual e externo (físico e social), em especial o econômico para a determinação do delinquente. Dá-se a este movimento o nome de Escola Alemã.

O pensador adepto desta escola, Von Liszt, defendia a necessidade de se conhecer as causas do crime, especialmente as de natureza antropológica e sociológica, pois seria desta forma que haveria a construção de uma pena que conseguisse combater a criminalidade e fosse de caráter eminentemente preventivo. Cumpre ressaltar que os adeptos desta escola fundaram, em 1888, a União Internacional de Direito Penal, tendo como sucessora a Associação Internacional do Direito Penal, objetivando a disseminação dos estudos científicos acerca das ciências penais.

1.2 O Direito Penal no Brasil

Em 1446, quando Cabral chegou à Bahia, vigorava em Portugal as Ordenações Afonsinas, promulgadas por D. Afonso V. Tais Ordenações possuíam conteúdo canônico, romano e costumeiro. Estavam dividas em cinco livros, encontrando-se no Livro V os aspectos que tratavam do delito, da pena e do processo penal. A aplicabilidade das penas não levava em conta a gravidade do delito, pois o importante era conter os homens por meio do terror e do sangue. Reconhecia-se nas aplicações das sanções a característica da desigualdade feudal, impondo aos nobres penas menores que para os plebeus.

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havia cidades, haja vista que a data do descobrimento remonta de 1500.

Em 1505, D. Manuel I mandou que fossem revisadas as Ordenações Afonsinas porque a imprensa havia sido descoberta, feito que tornaria a lei de conhecimento geral. A legislação anterior possuía muitas leis extravagantes e houve a retirada das normas que haviam sido revogadas pelo desuso. As Ordenações Manuelinas seguiram a mesma ideologia adotada pelas Ordenações Afonsinas. Ainda predominava a vingança pública e a prisão era medida cautelar, destinada a guardar o prisioneiro enquanto este esperava a execução de sua pena, que podia ser de morte, corporal, de aflição ou de suplício. No Brasil as Ordenações Manuelinas foram amplamente aplicadas pelos donatários das capitanias hereditárias.

Em 1603, as Ordenações Manuelinas foram revogadas para dar lugar as Ordenações Filipinas, que vigeram no Brasil até a criação do Código Criminal do Império em 1830. Estas Ordenações lutavam contra a vingança privada, permitida em apenas dois casos: morte dada à adúltera e seu parceiro e na hipótese da vingança particular consistente na perda da paz.

Relata Eugênio Zaffaroni os tipos de penas existentes nas Ordenações Filipinas:

d) Das penas. A pena de morte era cominada para a maior parte dos delitos. Ocorre,

porém, que ela poderia ser executada mediante quatro formas, numa variação entre a mais grave e a menos grave:

d1) Morte Cruel: a vida era tirada lentamente, entremeada de suplícios. Muitas vezes, a escolha do meio de tornar mais sofrido o passamento do réu escapava ao controle do juiz ou executor.

d2) Morte atroz: nessa, acrescentavam-se algumas circunstâncias agravantes à pena capital, como o confisco de bens, a queima do cadáver, o seu esquartejamento e até a proscrição de sua memória.

d3) Morte simples: esta representava apenas a perda da vida e era executada mediante degolação, enforcamento, este reservado para as classes mais humildes, porque era tido como infamante.

d4) Morte Civil: com esta pena, eliminavam-se a vida civil e os direitos de cidadania.7

Além das sanções citadas acima, existiam outras formas de punições chamadas de penas vis como, por exemplo, a de açoite, corte de membro, trabalhos públicos, ferro em brasa, sem contar na punição sob o aspecto da transmissão da infâmia aos descendentes do criminoso. Também existia a pena de multa e de degredo, esta última possuía como forma

7ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro,p. 198. 5ª ed.

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mais grave o envio do acusado para as novas terras, o Brasil. Sob estas ordenações, inexistia o princípio da reserva legal e do direito de defesa, bem como as penas eram arbitradas desproporcionalmente pelos juízes, conforme a classe econômica do acusado.

Já no Período Imperial, com a influência do ideal iluminista, após a emancipação política do Brasil, em 1822, a Constituição de 1824 trouxe significativas mudanças para as garantias do direito humano. Sob tal ótica, o Código Criminal do Império foi sancionado em 1830 abolindo as penas de tortura, açoite, marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis, todos passaram a ser iguais perante a lei e a pena não mais passaria para os descendentes do condenado. Foram implementados o estado de necessidade, a legítima defesa, o concurso de agente e o instituto da tentativa, continha de modo expresso a imprescritibilidade dos delitos, porém a pena de morte ainda não tinha sido abolida em sua totalidade.

Com o surgimento do período republicano, em 1889, o Código Penal precisou ser refeito, pois o código da era imperial ainda continha referência à escravidão, abolida em 1888. Antes da vigência do Código Penal de 1890, o Governo Provisório editou o decreto nº 774, em 20 de setembro de 18908, abolindo as penas de galé – o condenado trabalharia prestando serviços públicos no local onde cometeu o crime com calcetas e corrente de ferro nos pés-, fixou em 30 anos o tempo da antiga prisão perpétua e as penas passaram a ter prescritibilidade.

O Códex Repressor da época foi extremamente criticado, sendo considerado o pior de todos. Conforme relata Zaffaroni:

É obvio que a República nasceu sob o signo ideológico do positivismo, e o Código Baptista Pereira não correspondia a essa ideologia. Isto explica as críticas de que foi alvo, particularmente quando chegaram ao Brasil as influências de Ferri e de toda a escola criminológica italiana. Obviamente, as tendências elitistas racistas não poderiam ver no código de 1890, algo diferente do que a materialização do liberalismo que elas satanizavam.9

Após as diversas críticas ao código acima, surge o Código Penal de 1940, por meio do Decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, porém entrando em vigor apenas no

8

BRASIL. Decreto nº 774, de 20 de setembro de 1890. Declara abolida as penas de galés, reduz a 30 anos as penas perpétuas, manda computar a prisão preventiva na execução, e estabelece a prescrição das penas. Disponível em: www.lexml.gov.br/vrn:lex:br:federal:decreto:1890-09-20; 774. Acesso em: 14/05/2012.

(22)

dia 1º de janeiro de 1942. No dia 3 de outubro de 1941 foi expedido o Decreto-lei nº3.688, regulamentando as contravenções penais. O novo sistema repressor elegeu como pena principal a privação da liberdade, para os demais crimes as formas de reclusão e de detenção, e a prisão simples para as contravenções penais, além da imposição de medida de segurança para os condenados que fossem incapazes e perigosos. Segundo lições de Heleno Cláudio Fragoso “era um Código Penal eclético, como se falou e declara a Exposição de Motivos. Acende uma vela a Carrara e outra a Ferri. É, aliás, o caminho que tomam e devem tomar as legislações contemporâneas” 10.

Em 1984 houve uma reforma geral, abrangendo o Código Penal, o de Processo Penal e a Lei de Execução Penal, norteada pelo princípio da reserva legal. O novo texto do sistema penal apresentava uma nova linha de política criminal, mais adequada com os Direitos Humanos. Foi introduzido pela reforma um novo sistema de cumprimento de penas – regime fechado (mais severo) e regime aberto (mais brando)-, a regressão e novas modalidades de penas (penas alternativas), como a prestação de serviços à comunidade e a de restrição de direitos.

A legislação penal, após a dita reforma de 1984, tornou-se liberal e não atendeu aos anseios da sociedade, no que diz respeito aos crimes mais graves, publicando-se em 1990 a lei nº 8.072 que dispôs sobre os crimes hediondos e equiparados, impedindo a concessão de anistia, graça, indulto e liberdade provisória, dificultando a liberdade condicional e proibindo a progressão de regime 11.

Além das reformas citadas acima, muitas outras modificaram o atual Código Penal, que ainda é de 1940, principalmente na definição dos crimes e na cominação das penas, tornando-o um direito de intervenção mínima e democrático, mais adaptado ao Estado

10

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: parte geral, p . 63. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

11 Já foi reconhecida a inconstitucionalidade da pena que deve ser cumprida em regime integralmente fechado.

BRASIL, Superior Tribunal Federal,Pesquisa de Jurisprudência: “PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 - INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da

Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a

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Democrático de Direito vivido hodiernamente e consagrado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

1.3 Princípios Consagrados no Direito Penal

Os princípios abordados no Direito Penal devem ser vistos como pontos iniciais e base para os estudos, principalmente no que tange ao estudo da pena e da teoria do crime. Importante ressaltar que no estudo da hermenêutica os princípios não possuem hierarquia de uns para com os outros, porém para uma melhor adequação devem ser analisados mediante a proporcionalidade e a importância para o caso concreto.

Salienta-se que alguns princípios, tais como o da Razoabilidade, da Proporcionalidade e da Igualdade não serão abordados como princípios fundamentais do Direito Penal, haja vista tais princípios serem de natureza constitucional, essenciais na fundamentação do Estado Democrático de Direito e do nosso ordenamento jurídico, portanto, servem como base para todos os demais princípios. Com relação à importância dos princípios no âmbito penal, leciona Luiz Regis Prado:

O Direito Penal, como também os demais ramos do ordenamento jurídico, fundamenta-se em determinados princípios jurídicos, como elementos essenciais e diretores, em sua maioria jurisdicizados, seja em nível constitucional, seja não-constitucional. Derivados, em sua origem, dos valores ético-culturais e jurídicos vigentes em uma determinada comunidade social, numa certa época, foram se impondo num processo histórico-político contínuo como basilares à sociedade democrática. [...] Os princípios penais constituem o núcleo essencial da matéria penal, alicerçando o edifício conceitual do delito – suas categorias teoréticas-, limitando o poder punitivo do Estado, salvaguardando as liberdades e os direitos fundamentais do indivíduo, orientando a política legislativa criminal, oferecendo pautas de interpretação e de aplicação da lei penal conforme a Constituição e as exigências próprias de um Estado democrático e social de Direito. Em síntese: servem de fundamento e de limite à responsabilidade penal.(grifo original)12

Como explanado acima, o Direito Penal moderno possui assento em princípios fundamentais, que são próprios do Estado Democrático de Direito, dentre os quais o primeiro a ser citado será o Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal encontrado logo no 1º (primeiro) artigo do Código Penal Brasileiro com a seguinte redação: “Art. 1º Não há crime

sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. Com a Revolução

Francesa, este princípio se tornou uma exigência de segurança jurídica, além de ser uma

12 PRADO, Luis Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro, parte geral- arts. 1º ao 120. Vol 1. 8ª ed, p. 128-129.

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garantia da liberdade do cidadão perante a intervenção arbitrária estatal.

Mediante a análise do artigo primeiro da legislação penal pátria, tem-se que para uma conduta ser considerada crime deve existir uma lei anterior proibindo sua prática, prevendo tal conduta humana como delito e determinando uma sanção para o indivíduo que realizar o ato descrito na norma, ou seja, não haverá crime nem pena sem lei em sentido estrito, elaborada conforme prevê a constituição.

A Lei penal deverá determinar da maneira mais precisa e exata aquilo que o legislador decidiu considerar como crime, ou seja, o criador da norma deverá deixar claro o ato que se quer proibir, especificando a conduta incriminadora. Este princípio visa evitar abusos e arbítrios na aplicação das penas, além de legitimar o jus puniendi do Estado em matéria penal mediante a existência de norma devidamente expressa, escrita e prévia – nullun

crimem, nulla poena sine lege praevia, scripta et stricta.

A Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXIX, traz em seu bojo o referido princípio, praticamente igual ao exposto no Código Penal: “Art. 5º [...] .XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;” Pode-se extrair da análise de tal dispositivo que deve haver primeiramente uma lei anterior prevendo e descrevendo o fato como crime, para depois desta criação a conduta ser tida como reprovada. Vale dizer, a criação dos tipos penais incriminadores e suas possíveis consequências no mundo jurídico estão submetidas à existência de uma lei formal anterior. O princípio em tela, salvaguardando uma leva de garantias, também gera como consequência a restrição ao legislador e ao intérprete da norma penal.

Em suma, somente a lei formal é considerada fonte criadora dos crimes, das penas e de tudo mais que esteja sob a ótica penal, em se tratando das garantias da liberdade dos indivíduos, sendo inconstitucional a utilização de outro meio normativo, como medida provisória, os costumes ou a analogia in malam partem para a sua regulamentação. Ainda se tratando das garantias, tem-se alguns preceitos elencados na Carta Magna que complementam o princípio da legalidade, tais como “ninguém será processado nem sentenciado senão pela

autoridade competente” – art. 5º, LIII, CF; “a pena será cumprida em estabelecimentos

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CF; “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” – art. 5º, XLIX. Tais direitos constitucionais complementam o direito jurisdicional e de execução do condenado, ambos protegidos pela legalidade.

Explica Cristiano Rodrigues, diante de tal conclusão, que se pode retirar a primeira função do princípio da reserva legal: “Proibir a retroatividade da lei penal

incriminadora: em outras palavras, uma lei que venha depois do fato não poderá tratar este

fato anterior como crime. A lei penal não pode retroagir para alcançar fatos anteriores a ela13”. (grifo original). Prevendo o princípio da legalidade a proibição da retroatividade da lei incriminadora, temos o surgimento de um princípio decorrente daquele, qual seja o Princípio da Irretroatividade, com previsão expressa na Carta Magna: “Art. 5º [...]XL – a lei penal

não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;”. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 explicita: “Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.”14.

Outro princípio que deriva do princípio da reserva legal é o Princípio da Retroatividade da Lei Penal mais Benéfica, explicitado tanto na Constituição Federal

vigente, art.5º, XL, segunda parte ([...] salvo para beneficiar o réu), como no Código Penal, art. 2º, parágrafo único com o seguinte texto: “Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”.

Após ser mostrada a primeira função do Princípio da Legalidade e os dois princípios derivativos dela, analisa-se a segunda função deste princípio: a não admissão da analogia e dos costumes in mala partem, ou seja, para o prejuízo da parte. Segundo Cristiano Rodrigues esta segunda função seria:

Proibir incriminações com base em costumes e na analogia: em outras palavras, não é

possível incriminar um fato com base simplesmente em um costume social, ou por razões de conveniência social, bem como não se pode aplicar uma Lei incriminadora a

13

RODRIGUES, Cristiano. Temas controvertidos de direito penal, p. 6. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

14 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, da Assembleia Geral das Nações Unidas, 10

de dezembro de 1948, art. XI, item 2. Disponível em:

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uma situação que não esteja expressamente prevista em seu texto. Por mais que a situação fática realmente se pareça com o que consta no texto legal sempre será preciso que haja manifestação prévia do poder legislativo, através de Lei, para que algo seja considerado crime15. (grifo original).

Diante de tal função se pode entender que no Direito Penal não se adotar um costume ou utiliza a analogia para o prejuízo do acusado, mal da parte, a fim de ter uma conduta incriminada. Porém, ressalta-se que o uso de tais recursos não se estende quando o assunto for para beneficiar o réu, para garantir direitos, ou seja, deve ser aplicado sempre quando for in bonam partem.

Em função disto, surge um terceiro princípio advindo do Princípio da Reserva Legal: o Princípio da Taxatividade ou da Determinação. Este princípio induz que as condutas definidas como crime será de um rol taxativo, não permitindo sua extensão nem a utilização da analogia para ampliar o alcance da norma penal, ou seja, a determinação e a taxatividade não se refere apenas à descrição das condutas incriminadoras, mas também da fixação de marcos legais, pois quando estes se tornam demasiadamente amplos, acabam por colidirem com o princípio da legalidade. Vale dizer que o julgador, para seguir este princípio, deverá interpretar e aplicar a norma penal dentro dos limites em que esta foi elaborada, evitando, com isso, abusos judiciais. Conforme Luiz Regis Prado, com o este princípio:

Exige-se que o legislador descreva da forma mais exata possível o fato punível. Diz respeito, em especial, à técnica de elaboração da lei penal, que deve ser suficientemente clara e precisa na formulação do conteúdo do tipo de injusto e no estabelecimento da sanção para que exista segurança jurídica. Desse modo, torna-se imperiosa para o Poder Legislativo a proibição de utilização excessiva e incorreta de elementos normativos. De casuísmos, cláusulas gerais e de conceitos indeterminados ou vagos na construção dos tipos legais de delito. Visa cumprir a exigência de certeza (lex certa), no sentido de que o conteúdo da lei possa ser conhecido por seus destinatários, permitindo-lhes diferenciar entre o penalmente lícito e o ilícito.16

Outro princípio a ser analisado é o da Intervenção Mínima, no qual o Direito Penal deverá intervir o mínimo possível nas relações da sociedade, atuando apenas quando necessário, em situações graves e especiais, visando garantir a segurança jurídica e a tutela do bem a ser protegido. Pode-se dizer que o Direito Penal, a grosso modo, é a última alternativa (ultima ratio legis) que a sociedade deve recorrer para ver seus anseios resolvidos, pois a

15 RODRIGUES, op. cit, p. 14.

16 PRADO, Luis Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro, parte geral- arts. 1º ao 120. Vol 1. 8ª ed, p. 132-133.

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regra é a não intervenção na vida social, pois sua aplicação se restringe a casos mais específicos, quando os outros ramos do Direito se mostram insuficientes.

Portanto, o Direito Penal só deve atuar na defesa dos bens jurídicos imprescindíveis à coexistência pacífica dos homens e que não podem ser eficazmente protegidos de forma menos gravosa.17, ou seja, tais bens só devem ser protegidos mediante certos tipos de lesões, quais sejam as consideradas socialmente reprováveis e que sejam objetos de criminalização por parte do legislador.

Mediante tal análise, tem-se a formação de dois subprincípios: o Princípio da Fragmentariedade e da Subsidiariedade. Pela fragmentariedade temos que a proteção aos

bens jurídicos atribuídos à lei penal não é absoluta, mas relativa, em face de todo ordenamento jurídico se ocupar dela. Diz-se que o Direito Penal possui uma tutela seletiva, isto é, sua proteção se apresenta de maneira fracionada. Conforme lição de Cristiano Rodrigues para este princípio expõe o seguinte:

Se o Direito Penal deve intervir minimamente na proteção de bens jurídicos é sinal que ao tutelar um bem específico deve-se fazê-lo de forma fragmentária, ou seja, criminalizando apenas os fragmentos mais importantes e necessários deste bem para garantia do bem-estar social18.

Então, extrai-se do texto acima que nem todo bem jurídico que sofre lesão deve ser protegido na seara penal, fazendo incidir a intervenção mínima, portanto, a proteção não será absoluta, mas apenas do que o legislador achar necessário para garantir a ordem social. Ainda segundo o mesmo autor, o princípio da subsidiariedade pode assim ser definido:

O Direito Penal é apenas mais um ramo do Direito, e junto com os demais (Civil, Tributário, Constitucional, Administrativo, etc), integra o ordenamento jurídico. Porém, como deve intervir minimamente nas relações sociais funciona de forma subsidiária em relação aos demais ramos sendo a última alternativa (ultima ratio) do legislador para tutelar bens jurídicos, garantir a segurança jurídica e proteger a ordem pública19.

Portanto, o Direito Penal continua ser a opção mais distante quando se pretende proteger um bem jurídico, devendo os outros ramos ser acionados primeiramente. Somente com a falta destes, a legislação penal passará a atuar.

17

PRADO, Luis Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro, parte geral- arts. 1º ao 120. Vol 1. 8ª ed, p. 138. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008

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Considerando a fundamentação do ordenamento jurídico do Estado Democrático de Direito e possuindo natureza constitucional, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana serve de alicerce para os demais princípios penais fundamentais. Sua abrangência

interfere tanto na criação das leis quanto na aplicação e execução das penas, tudo isto tendo como referência a Declaração Universal dos Direitos Humanos Fundamentais.

Com a Constituição Federal de 1988 a dignidade da pessoa humana passou a ser tida como valor fundamental assim como os outros direitos, asseverando o Texto Maior: “Art.

1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e

Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como

fundamentos: [...]III - a dignidade da pessoa humana”. Seu emprego na seara penal aparece

de forma mais evidente no âmbito da Teoria da Pena, orientando a aplicação e execução da pena para evitar qualquer tipo de abuso ou transgressão dos Direitos Fundamentais. Com isso, tem-se a proibição no ordenamento jurídico brasileiro de penas que atentem contra a dignidade da pessoa humana, tais como, a de morte (com exceção do elencado no art. 5º, XLVII da Constituição Federal)20, a perpétua, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis.

Em resumo, o Estado além de ser democrático de direito também é social, devendo garantir o primado dos direitos fundamentais, evitando práticas lesivas a estes direitos. Logo, o princípio da dignidade da pessoa humana deve pautar todo ordenamento jurídico positivo, sendo toda lei que viole tal condição ser considerada como inconstitucional.

O próximo princípio a ser destacado é o da Lesividade ou Ofensividade. Sob seu exame se faz necessário haver um bem juridicamente protegido e suscetível de ser danificado, além de que tal lesão deve ser relevante no mundo jurídico para que tal bem possa vir a ser tutelado pelo ordenamento. A lesividade será caracterizada quando o autor (acusado) entrar no âmbito do sujeito passivo (vítima) para lesionar o bem jurídico deste. Importante ressaltar que a concretização do dano ao bem alheio pode ou não ocorrer, sendo este fato irrelevante para que o princípio se caracterize. Ou seja, tal circunstância não impede a punição da tentativa do crime e nem nos chamados crimes de perigo concreto.

Pode-se dizer que o princípio ora abordado impede que um fato seja considerado

20Art. 5ª,CF: “não haverá penas: - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos

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crime para atender apenas ao interesse do Estado ou de um grupo de pessoas, evitando que o Direito Penal seja utilizado como forma de discriminação, ou seja, não se pune o indivíduo por sua situação financeira, física ou emocional, desde que tais fatores não ultrapassem a esfera do próprio sujeito, deixando de afetar o bem de outrem. Observa-se que, devido ao emprego de tal princípio, a autolesão não é punida, pois conforme descrito acima, a lesão deve ser em bem alheio, logo autolesão, independentemente de qual seja o bem lesionado, é tido como fato atípico, portanto não punível.

Importante frisar que decorrente da relevância do bem jurídico alheio, ainda dentro do conceito do Princípio da Lesividade, surge o Princípio da Insignificância ou da Bagatela, caracterizado por não ensejar uma infração penal, apesar de ter ocorrido lesão à

bem alheio, ainda que dolosamente, porque tal dano é tido como ínfimo, pequeno – mínima

non cura praeter. Isto é, são condutas que devem ser tidas como atípicas já que possuem uma

afetabilidade insignificante ao bem jurídico penal. É de bom alvitre salientar que por insignificância não se tem um conceito preciso, tratando-se de matéria incontestavelmente ampla, devendo ser analisada mediante o caso concreto.

A legislação penal se preocupou em excluir das sanções penais as lesões tidas por insignificantes. Esta irrelevante lesão não deverá justificar uma aplicação de pena, ou seja, em razão de um mínimo valor afetado não há base suficiente para configurar um injusto. Logo, não haverá agressão ao bem jurídico alheio se esta lesão for pequena, ínfima, tornando o caso atípico Neste sentido, estabelece Julio Mirabete:

Nos casos de ínfima afetação do bem jurídico, o conteúdo do injusto é tão pequeno que não subsiste nenhuma razão para o pathos ético da pena. É indispensável que o fato tenha acarretado uma ofensa de certa magnitude ao bem jurídico protegido para que se possa concluir por um juízo positivo de tipicidade.21

Outro princípio relevante é o da Pessoalidade ou da Intrascendência da Pena, referindo-se à proibição da pena aplicada, não importando qual tipo (privação de liberdade, restrição de direitos ou multa), ultrapassar da pessoa do condenado, ou seja, é vedado qualquer indivíduo cumprir a sanção penal ou parte dela no lugar do réu, sendo, portanto, personalíssimas. Pode-se dizer que por tal princípio apenas o autor do injusto penal poderá ser

21 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal – parte geral- arts. 1º ao 120 do CP, vol.1. 18ªed, p.118.

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punido, e ninguém mais, sendo a responsabilidade penal sempre subjetiva. As sanções penais, inclusive as medidas de segurança, por determinação da Constituição Federal de 1988 (art. 5º,

XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado [...]) nunca poderão ser transferidas,

transmitidas para outrem, logo são intransmissíveis a terceiros.

Ao garantir a impossibilidade de transferir a pena da pessoa do condenado, surge outro princípio: Princípio da Individualização da Pena. Significa que a pena imposta ao indivíduo deve ser absolutamente individualizada, tanto na sua aplicação quanto na sua execução. A individualização deve ser feita de acordo com o grau de reprovabilidade da conduta realizada, da participação do acusado e suas demais peculiaridades. Isto se faz independentemente de o fato ter sido cometido por dois ou mais sujeitos, ou seja, cada ação deve ser analisada separadamente para que a punição seja aplicada de forma individual, adaptando a pena ao condenado. Portanto, é necessário existir uma medida de equilíbrio entre a gravidade do fato e a pena imposta, decorrente da visão abstrata (legislador) e concreta (juiz).

Importante frisar que tal princípio não atua somente na esfera da dosimetria da pena, sendo utilizado também na execução desta, concedendo, ou não, a progressão de regime, proporcionando ao apenado a possibilidade dele ser reinserido na sociedade. A Lei de Execução Penal -LEP, Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984, é clara quando estabelece a individualização do apenado em seu art 5º: “Os condenados serão classificados, segundo seus

antecedentes e personalidade, para orientar a individualização penal”.

Portanto, o Princípio da Individualização da Pena, também incluso na Magna Carta22, deve ser respeitado a fim de que cada condenado receba uma pena correspondente ao delito cometido, pois a sanção deve ser aplicada de modo proporcional e devidamente adequada à gravidade da lesão ao bem jurídico, bem como ter seu comportamento analisado de forma individualizada durante o período em que estiver recluso.

Seguindo com a análise dos princípios, o preceito da presunção de inocência surgiu na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e estava presente na

22Art. 5º, XLVI, CF: “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação

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Declaração Universal de Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral da ONU. O Princípio da Presunção de Inocência se encontra exposto na Constituição Federal vigente23

e impõe a inocência do indivíduo até que ocorra uma sentença penal condenatória com trânsito julgado, logo ninguém será julgado ou condenado baseado em presunções, apenas em fatos reais e depois de haver o devido processo legal.

23Art. 5º, LVII, CF: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal

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2 O CRIME DE ESTUPRO E DE ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR ANTES DA LEI 12.015/2009

O Código Penal pátrio, antes da reforma sofrida pela Lei 12.015 de 7 de agosto de 2009, trazia em seu bojo o crime de estupro e de atentado violento ao pudor inseridos no Título VI – Dos crimes contra o costume- e Capítulo I- Dos crimes contra a liberdade sexual. Assim, ao se analisar o título do Código Penal, ao qual estava elencado os delitos ora em exame, percebe-se que o legislador não se preocupou em proteger, a priori, a liberdade sexual como sendo um valor intrínseco do ser humano, mas sim os valores morais e éticos arraigados na sociedade.

E por tais valores morais se pode afirmar que seriam os hábitos sexuais ratificados pela moral, ou seja, seria a conduta sexual do ser humano que fosse aprovada pelos “costumes” sociais da época. De tal forma que se resguardavam os valores cheios de moralismo e puritanismo, buscando impor ao indivíduo uma norma, um padrão de conduta ética a ser seguida, deixando de lado a liberdade e a dignidade sexual.

Assim, tais delitos estavam elencados nos artigos 213 e 214, do Código Repressivo, respectivamente, dispostos da seguinte forma:

Art. 213. Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:

Pena- reclusão, de 6(seis) a 10 (dez) anos.

Art. 214. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal:

Pena- reclusão, de 6(seis) a 10 (dez) anos.

Boa parte das doutrinas contemporâneas a este período ensinavam que o bem juridicamente protegido pelos legisladores seria a liberdade sexual, podendo esta ser entendida como a “capacidade que toda pessoa tem de dispor livremente de seu próprio corpo à prática sexual” 24, assegurando o respeito de exercer sua sexualidade.

Porém, ressalta-se que, ao ser observado o título onde estes crimes estavam

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inseridos, nota-se que o legislador estaria tentando proteger, a priori, não a liberdade sexual do indivíduo, mas os valores da sociedade, qual seja os costumes, como bem explicita o próprio código. E esses costumes seriam entendidos como “o comportamento médio da sociedade, no que diz respeito à atividade sexual das pessoas” 25 e “os chamados crimes sexuais (Exposição de Motivos da Parte Especial do CP, item 69) devem ser analisados, sempre, vinculados com a ideia de pudor, que outra coisa não é senão o sentimento não apenas individual, mas também da coletividade, relacionado com a vergonha suscitada por determinado ato de natureza sexual” 26.

Em se tratando de sexualidade, o posicionamento de Maria Berenice Dias é o de que esta poderia ser considerada um direito de primeira geração tanto quanto a liberdade e a igualdade, compreendendo aquela como o direito à liberdade sexual, junto ao direito de tratamento igualitário, independentemente da tendência sexual do indivíduo. Diz ainda que a liberdade individual é um direito da pessoa humana e, como os demais direitos da primeira geração, deve ser inalienável e imprescritível. A sexualidade é um direito natural que acompanha o ser humano desde seu nascimento, posto que decorre de sua própria natureza.27

Mesmo diante do que estava explícito na legislação penal, alguns doutrinadores já se apresentavam contrários à terminologia adotada pelo Código Penal no seu Título VI (“Dos Crimes contra os Costumes”), relatando que o bem tutelado por aqueles tipos penais previstos ali não se tratavam exatamente dos costumes, mas sim da liberdade que todo ser humano deve ter quando o assunto é sua conduta sexual, além do fato de estar diretamente ligado à dignidade da pessoa humana.

Sábias as palavras de Guilherme de Souza Nucci, expondo de forma clarividente os argumentos que serviriam de base para a reforma advinda com a Lei 12.015, no tocante aos crimes sexuais, senão vejamos:

A sociedade evoluiu e houve uma autêntica liberação dos apregoados costumes, de modo que o Código Penal está a merecer uma reforma há muito tempo, inclusive no tocante à vetusta denominação de crimes contra os costumes. O que o legislador deve

25ESTEFAM, André; CAMPOS, Pedro Franco de. Direito Penal 3 – parte especial, p .117. 4ª ed. São Paulo:

Saraiva, 2008.

26

ESTEFAM, André; CAMPOS, Pedro Franco de. op. cit. p. 117.

27 DIAS, Maria Berenice. Liberdade Sexual e Direitos Humanos. Disponível em:

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policiar, à luz da Constituição Federal de 1988, é a dignidade da pessoa humana, e não os hábitos sexuais que porventura os membros da sociedade resolvam adotar, livremente, sem qualquer constrangimento e sem ofender direito alheio, ainda que para alguns, sejam imorais ou inadequados9(...)28

Assim, percebemos que, muito embora os valores da época não pudessem ser totalmente desfeitos perante à lei e a sociedade, seria de bom alvitre fazer uma interpretação extensiva do Título VI do Códex Repressor de acordo com a Constituição Federal, voltando o foco para a tutela da dignidade sexual da pessoa humana. Isto é, apesar de os delitos tipificados sob o nome de estupro e atentado violento ao pudor estarem numa ótica de crimes contra os costumes, se analisados sistematicamente, do ponto de vista teleológico, deveriam, sim, ser interpretados em conformidade com a proteção da dignidade sexual do indivíduo. Fato este que se modificou com a reforma trazida pela Lei Federal 12.015 de 7 de agosto de 2009.

2.1 O art. 213 antes da reforma sofrida em 7 de agosto de 2009.

Antes da reforma promovida pela lei federal 12.015/2009, o delito tido como estupro estava elencado no artigo 213 do Código Penal, cujo bem juridicamente protegido, conforme a doutrina majoritária da época era a liberdade sexual, apesar de este tipo penal estar inserido sob o título de “crimes contra os costumes”.

Em uma leitura histórica, os crimes sexuais, incluindo-se neste rol o estupro, sempre tiveram punição severa pelas sociedades, a qual dependendo da época, da religião e da etnia possuíam formas das mais diversas para aplicar a sanção ao agente ativo do delito.

O Código de Hamurábi, criado na Mesopotâmia no século XVIII a.C, trazia em seu artigo 130 a definição para o crime em cometo, bem como a penalidade para quem o cometesse: “Se alguém viola a mulher que ainda não conheceu homem e vive na casa paterna e tem contato com ela e é surpreendido, este homem deverá ser morto e a mulher irá livre”29. Nota-se que o texto supra procura preservar a pureza da mulher, pois em sendo ela virgem e um homem a desonrasse este deveria receber a pena de morte.

Porém a pena é modificada, tanto para o homem quanto para a mulher, no caso

28 NUCCI, Guilherme de Sousa. Código Penal Comentado,9ª ed, p. 873. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 29 BRASIL. Cultura Brasil. Código de Hamurábi. Disponível em: http//www.culturabrasil.pro.br/hamurabi.htm.

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