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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE LETRAS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE LETRAS

ALTERNÂNCIA DE LÍQUIDAS EMONSETCOMPLEXO:

A PERCEPÇÃO DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA SOB O PONTO DE VISTA DO VALOR SOCIAL

Lívia Fernandes da Silva

Rio de Janeiro 2021

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LÍVIA FERNANDES DA SILVA

ALTERNÂNCIA DE LÍQUIDAS EMONSETCOMPLEXO:

A PERCEPÇÃO DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA SOB O PONTO DE VISTA DO VALOR SOCIAL

Monografia submetida à Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para obtenção do título de Licenciada em Letras na habilitação Português/Inglês.

Orientadora: Profª. Drª. Christina Abreu Gomes

Rio de Janeiro 2021

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CIP - Catalogação na Publicação

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AGRADECIMENTOS

“Sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só. Sonho que se sonha junto, é realidade.” Faço minhas as palavras de Raul Seixas. Eu não teria chegado onde cheguei, conquistado o que conquistei, vivido o que vivi, sem o apoio de tantas outras pessoas. Por este motivo, agradeço:

Aos meus pais, por sempre terem me apoiado e terem me criado para conquistar o mundo. À minha mãe, especialmente, por ter estado desde sempre ao meu lado, acompanhando de perto e participando de cada etapa não só durante a faculdade, como durante toda a minha vida.

Obrigada, mãe, por ser e estar.

Aos meus avós, que são os amores da minha vida e sempre me incentivaram em tudo.

À minha tia, dinda e segunda mãe, Andrea, que sempre cuidou das minhas asas, para que eu pudesse voar em busca dos meus sonhos.

Ao meu tio Marcelo que, infelizmente, não pôde esperar para ver essa conquista e partiu deste plano recentemente. Sou grata pelo carinho que sempre teve comigo e pelos momentos felizes. Descanse em paz, dindo.

Aos meus amigos, presentes que ganhei do Newton Braga, da Faculdade de Letras e da vida, pela parceria na alegria e na tristeza. Em especial, Laryssa: pelos mais de quinze anos de amizade, pela reciprocidade e lealdade de sempre.

Ao Marcelo Melo, por ter cruzado o meu caminho e ter me apresentado à Linguística da melhor maneira que eu poderia ter sido apresentada. Por ter sido meu orientador e meu anjo.

Por ter enxergado e instigado o meu lado pesquisadora. Por ter me proporcionado tantos momentos lindos. Por tanto aprendizado. Por todo o carinho, confiança, disposição e sonhos realizados.

À Christina Gomes, minha orientadora, que surgiu em minha vida de repente e me mostrou que tudo pode ser mais leve. Me mostrou o caminho e caminhou comigo. Contribuiu para o meu crescimento como pesquisadora e como pessoa. Agradeço por toda a generosidade, paciência, suporte e confiança.

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Às instituições que me receberam de braços abertos e contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional: Colégio Brigadeiro Newton Braga, que me moldou para o mundo;

Universidade Federal do Rio de Janeiro, que me apresentou o mundo; Escola Municipal Rodrigo Otávio e Colégio de Aplicação da UFRJ, que me possibilitaram atuar no mundo como estagiária/professora. Ainda, ao Programa de Estudos sobre o Uso da Língua (PEUL) e ao CNPq, por me permitirem atuar no mundo como pesquisadora.

A cada professora e professor que passou pela minha vida e deixou sua marca. Estes foram os meus exemplos, minhas inspirações e verdadeiros responsáveis pela minha eterna admiração pela prática da docência.

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DAS UTOPIAS

Se as coisas são inatingíveis... ora!

Não é motivo para não querê-las...

Que tristes os caminhos, se não fora A presença distante das estrelas!

Mário Quintana

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1. REVISÃO DA LITERATURA ... 12

1.1. A alternância de líquidas em onsetcomplexo no Português Brasileiro ... 12

1.2. A alternância de líquidas em onsetcomplexo na comunidade de fala do Rio de Janeiro ... 15

2. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO ... 19

2.1. Sociolinguística Variacionista ... 19

2.2. Teoria dos Modelos de Exemplares ... 19

2.3. Percepção da variação: o que é? ... 20

3. OS TESTES DE PERCEPÇÃO ... 23

3.1. Metodologia experimental:priming... 23

3.2. Metodologia experimental:matched-guise... 23

3.3. Design dos experimentos ... 23

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 28

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 29

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Escala de força de Hooper (1976) ... 17

Quadro 2: Lista de itens lexicais selecionados para os testes ... 24

Quadro 3: Condições de congruência e incongruência entreprimeetarget... 25

Quadro 4: Teste perfil socioeconômicoxsexo (priming) ... 26

Quadro 5: Testes sexoxidade e sexoxperfil socioeconômico (matched-guise) ... 26

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INTRODUÇÃO

No Português Brasileiro, há dois segmentos que podem ocupar a posição de consoante na posição anterior ao núcleo vocálico, também chamado de onset, ou seja, em início de sílaba: são as consoantes lateral alveolar e o tepe, referidos por Mattoso Câmara Jr.

(1976) como os fonemas /l/ e /r/. O onset não é um constituinte obrigatório na sílaba, entretanto, quando ocorre no Português Brasileiro (doravante PB), pode ser composto por uma ou duas consoantes, recebendo o nome de onset complexo ou ramificado quando existem duas consoantes na posição de ataque, isto é, antes da vogal.

Oonset complexo no Português Brasileiro pode ser constituído por uma consoante obstruinte ocupando a primeira posição e por uma líquida ocupando a segunda posição. Se a segunda consoante é a lateral alveolar, a primeira posição pode ser ocupada pelas consoantes oclusivas (p, b, k, g) e a consoante fricativa lábio-dental (f). Não existe no Português Brasileiro a combinação dl, somente em palavras importadas, como medley (modalidade de natação), assim como ocorre com a combinação vl (Vladimir). A combinação tl é pouco frequente, ocorrendo nos itens atlas, atlético, Atlântico e derivadas, já que esse grupo também não existia no latim (GOMES, 1987). Quando a segunda consoante é o tepe, há mais possibilidades de combinações de consoante na primeira posição: todas as oclusivas (p, b, t, d, k, g) e as fricativas lábio-dentais desvozeada e vozeada (f, v).

Com relação aos itens lexicais que etimologicamente têm a consoante lateral na segunda posição, observa-se a alternância entre a lateral e o tepe no Português Brasileiro, também conhecida pelo nome de rotacismo, como ocorre em Framengo alternando com Flamengo, bicicreta ~ bicicleta, probrema ~ problema, pranta ~ planta. Essa alternância constitui uma variável linguística, conforme definida no âmbito da Sociolinguística, e tem sido objeto de estudo por pesquisadores do Português Brasileiro, cujos principais achados serão apresentados na seção sobre a revisão da literatura. Já osonset complexos que têm o tepe como segunda consoante, apresentam alternância entre realização e ausência da 2ª consoante, como em precisa ~pecisa, livro ~livu.

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O fenômeno da troca de um som lateral por um tepe é antigo e produtivo na Língua Portuguesa, sendo frequente não só no Português falado atualmente pelos brasileiros, como também tendo sido registrado nas mudanças ocorridas na passagem de algumas palavras do Latim para o Português, como em blancu > branco e duplu > dobro (GOMES, 1987;

COELHO et al., 2015). Estudos com base em dados de produção espontânea, do Português Brasileiro contemporâneo, mostram que a variante tepe é mais comum na fala de pessoas de baixo status social e baixa escolaridade, sendo, portanto, estigmatizada (GOMES, 1987). É deste ponto que parte este estudo.

O presente estudo integra um projeto de pesquisa que aborda a dinâmica da variação e da mudança linguística na comunidade de fala do Rio de Janeiro, com foco na percepção da variação por falantes da variedade carioca. O estudo conjuga os pressupostos da Sociolinguística Variacionista e a hipótese de representação da variação de acordo com a Teoria de Exemplares (CRISTÓFARO-SILVA; GOMES, 2017) e tem por objetivo observar o efeito de variáveis linguísticas na percepção das variantes. Outro objetivo é observar o comportamento de indivíduos com diferentes perfis sociais em relação à percepção da alternância de líquidas emonsetcomplexo.

A percepção será acessada através de testes utilizando as técnicas de priming, que consiste na apresentação de um primeiro estímulo (prime) seguido de outro estímulo (alvo) com o objetivo de verificar o efeito das características do primeiro na percepção do segundo (SQUIRES, 2011), e de matched-guise, que verifica que informações sociais os indivíduos atribuem ao falante, baseando-se somente na variante expressa no estímulo oral. Com relação ao experimento com a técnica de priming, o estudo pretende verificar em que medida a exposição a um estímulo, por exemplo, uma sentença que apresente uma variante não-padrão ou estigmatizada, associada à foto de um falante com características de baixo status social (prime), ativa um exemplar e, ao ser exposto a um outro estímulo subsequente (alvo), se a similaridade estrutural (mesma variante) aumenta a probabilidade de o exemplar ativado ser usado para perceber o contexto social do novo estímulo. O experimento consiste em estímulos visuais (fotos de pessoas associadas a categorias sociais) e estímulos orais (com as variantes lateral e tepe). O experimento com a técnica dematched-guisebusca a confirmação da mesma hipótese, utilizando outra técnica: a apresentação de estímulos orais que induzem a

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ideia de que se trata de falantes diferentes, buscando identificar se há correlação entre o estímulo oral e os perfis sociais controlados nos experimentos. A observação do comportamento de participantes com diferentes perfis sociais contribuirá para identificar se há um mesmo padrão de avaliação social das variantes para os falantes da variedade falada na cidade do Rio de Janeiro.

Nesta monografia, apresento as etapas de concepção, produção dos estímulos e organização da base para a montagem dos experimentos. A estrutura deste trabalho é formada por esta introdução seguida de quatro seções: na primeira seção, será feita uma retomada de estudos de cunho sociolinguístico que investigaram o fenômeno em questão - a alternância de líquidas em onset complexo - no Português Brasileiro e na comunidade de fala do Rio de Janeiro, em especial aqueles cujos resultados serviram de base para o estabelecimento das condições dos experimentos, isto é, que condicionamentos linguísticos serão verificados em relação ao seu efeito na avaliação social das duas variantes em questão, a lateral e o tepe, na segunda posição do onset complexo; na segunda seção, serão apresentados os pressupostos teóricos nos quais o estudo se baseia; na terceira seção, serão expostos a metodologia de pesquisa adotada e o design dos experimentos de percepção; a quarta e última seção será relativa às considerações finais sobre o estudo.

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1. REVISÃO DA LITERATURA

Poucos são os estudos que abordam o tepe que alterna com a lateral em onset complexo. A seguir, serão apresentados alguns deles, que foram de grande importância para a construção do presente trabalho. Os estudos, a seguir, estão divididos entre os que tratam desta variável em variedades do Português Brasileiro e os que tratam especificamente de dados da comunidade de fala do Rio de Janeiro.

1.1. A alternância de líquidas em onsetcomplexo no Português Brasileiro

Em Branching onsets in Brazilian Portuguese, Cristófaro-Silva (2002) analisa o cancelamento de líquidas em encontros consonantais tautossilábicos - combinações das obstruintes /p, b, t, d, k, g, f, v/ com as líquidas /l, r/ - no Português Brasileiro. A autora apresenta a redução de encontros consonantais tautossilábicos como sendo um caso de difusão lexical, em que a líquida cai e a obstruinte fica (como em li[vr]o > li[v]o).

Cristófaro-Silva afirma que as motivações para a redução da consoante previamente apresentadas não são adequadas e propõe que a queda da líquida se dê pelo fato de as líquidas, assim como as vogais, serem classificadas como altas na escala de sonoridade e, por isso, estarem sujeitas à exclusão. Assim, a autora postula que a motivação para a redução é a estrutura segmental das consoantes líquidas.

Para Cristófaro-Silva, a redução da consoante é melhor entendida como um caso de variação sonora, que foi implementada lexicalmente. Ela sustenta sua tese sobre o cancelamento de líquidas em encontros consonantais tautossilábicos no Português Brasileiro sob uma perspectiva difusionista, segundo a qual mudanças sonoras são foneticamente abruptas e lexicalmente graduais, diferentemente do que diz a perspectiva neogramática, segundo a qual mudanças sonoras são foneticamente graduais e lexicalmente abruptas.

Segundo a autora, toda forma que apresenta uma sequência deonsetcomplexo pode ser reduzida a uma consoante obstruinte: é o uso que os falantes fazem de um item lexical em um dado contexto que vai regular se uma forma irá ocorrer com ou sem ramificação deonset.

Ao citar Oliveira (1995), ela defende que o efeito de frequência em mudanças sonoras deve

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ser derivado do contexto em que eles ocorrem, isto é, o léxico se adapta às necessidades do falante.

A referida autora, em artigo publicado em 2003 (Sound Change in Tautosyllabic Consonantal Clusters in Brazilian Portuguese), explora a proposta de que algumas mudanças sonoras podem ser atribuídas ao fato de que uma baixa frequência de tipo se move em direção a um padrão de alta frequência de tipo, além de sugerir que, embora a frequência de tipo desempenhe um papel central nas generalizações fonológicas, ela deve ser analisada juntamente com os efeitos da frequência simbólica. Cristófaro-Silva também sugere que as generalizações fonológicas procedem de acordo com os padrões de difusão lexical.

Cristófaro-Silva recorre a uma proposta apresentada por Bybee (2001), de acordo com a qual a mudança sonora pode ocorrer a partir da extensão de um padrão de alta frequência de tipo em detrimento de um padrão de baixa frequência, adotando, assim, os conceitos detype frequency(frequência de tipo) etoken frequency(frequência de ocorrência).

Type frequency diz respeito à ocorrência de padrões no léxico e tem relação com a produtividade, enquanto token frequencydiz respeito ao número de vezes que um padrão ou item lexical ocorre em um corpus.

Segundo o estudo de Cristófaro-Silva (2003), a redução do grupo consonantal não é fonologicamente condicionada e não é marcada socialmente, pois parâmetros como idade, educação e sexo não se provaram ser significantes para a implementação da redução do grupo. Os principais agentes da redução do grupo consonantal são a palavra em si, juntamente ao falante e seu grupo de rede. Bybee sugere que as mudanças sonoras que afetam as palavras de alta frequência antes das palavras de baixa frequência são condicionadas foneticamente e a mudança é fonética e lexicamente gradual. Assim, a frequência de ocorrência terá um papel importante na implementação de tais mudanças. Por outro lado, ela afirma que as mudanças sonoras que afetam as palavras de baixa frequência antes das palavras de alta frequência são devido ao aprendizado imperfeito, porque podem não estar disponíveis na experiência a ser adquirida. Cristófaro-Silva argumenta, então, que a frequência de tipo desempenha um papel importante na implementação de mudanças que se referem aos domínios fonotáticos.

Ao final do estudo, a autora chega à conclusão de que as mudanças que se referem aos domínios fonotáticos podem ser avaliadas à luz da frequência do tipo, enquanto a frequência de ocorrência se aplica às mudanças sonoras que são motivadas foneticamente.

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Segundo as hipóteses de Cristófaro-Silva, podemos postular que a alternância entre lateral e tepe emonset complexo pode estar relacionada à competição de padrões silábicos, na direção do padrão mais frequente. De acordo com levantamento da frequência de ocorrência doonset complexo com a lateral – Cl e do onset complexo com o tepe – Cr, realizado por Cristófaro-Silva (2003:1677), há na língua mais itens lexicais com o tepe como segunda consoante (35.613), do que itens com a lateral como segunda consoante (7.971).

Costa (2011) segue uma vertente teórica que aproxima o tratamento da variação de líquidas da abordagem da variação como representação. Seu estudo é baseado na Fonologia Gestual e inclui análises acústicas de dados de variação com ênfase no caráter gradiente da variação, além de objetivar propor uma representação teórica no âmbito de modelos dinâmicos de fala que possibilite a incorporação dos possíveis detalhes fonéticos envolvidos na realização do rotacismo. Em sua tese, a autora apresenta a abordagem do rotacismo segundo Albano (2001):

Albano (2001) vai postular a existência de um nível que una aspectos fonéticos e fonológicos em sua proposta da Fonologia Acústica Articulatória (FAAR). Para Albano, a Fonologia Gestual modela adequadamente a “fonética linguística”, mas ela defende uma vagueza na distinção entre fonética e fonologia, uma fronteira difusa entre o gradual e o categórico. Defende a ideia de que os lugares de projeção simbólica do gesto sejam suas bordas e seu contínuo gradiente seja o intervalo de pontos entre o início e o fim do gesto. Há um módulo simbólico que incorpora variações cristalizadas na realização dos gestos no léxico, assim a variação inerente à fala pode tornar-se uma variação lexical. (COSTA, 2011, p. 108)

Albano (2001) propõe, ainda, que o espaço acústico-articulatório é definido por regiões discretas do trato vocal que substituem os articuladores na função de agrupar os comandos para a execução do mesmo gesto, além de propor, também, que os róticos (conjuntos de sons classificados como tepe e vibrante), assim como as laterais, têm uma dupla especificação das regiões acústico-articulatórias.

Outro estudo que vale ser citado é o de Quandt (2004), que aborda o comportamento da lateral anterior na fala do Norte Noroeste Fluminense. A análise deste estudo não pôde ser incluída no presente trabalho, devido à dificuldade de obtenção do mesmo. Não foi encontrada versão digital do estudo, e a versão física encontra-se disponível apenas na biblioteca da Faculdade de Letras da UFRJ que, em meio ao contexto de pandemia pelo qual

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ainda estamos passando, está inoperante, impossibilitando, assim, a consulta. Apesar disso, registra-se, aqui, sua importância para a literatura.

1.2. A alternância de líquidas em onsetcomplexo na comunidade de fala do Rio de Janeiro

Gomes (1987) investigou o rotacismo em grupo consonantal, analisando dados de falantes da cidade do Rio de Janeiro e de Ribeirão Preto. Foram entrevistados dois grupos sociais formados por falantes de classe média alta e média e falantes de classe baixa, em cada uma das cidades. Segundo a autora, os perfis dos falantes de classe média nas duas cidades eram semelhantes, enquanto os falantes de classe baixa apresentavam perfis um pouco diferentes, sendo os da cidade de Ribeirão Preto melhor situados como classe média baixa.

Os falantes do Rio de Janeiro, por sua vez, eram, na sua maioria, moradores de favelas. As amostras de fala espontânea foram coletadas pela autora, utilizando a metodologia da Sociolinguística Variacionista para organização de amostras de fala que sejam representativas de uma comunidade. Cada amostra foi composta por 24 indivíduos, sendo metade de cada um dos dois grupos sociais.

Em seu estudo, a autora salienta que o Português padrão tende a privilegiar as formas que possuem a lateral formando o grupo consonantal, e a estigmatizar as formas com o tepe nesses mesmos itens. Prova disto, é o fato de que os falantes com perfil de status socioeconômico alto tendem a evitar ao máximo produzir o tepe e, quando percebem que o fazem, rapidamente buscam “consertar o erro” (entre muitas aspas), produzindo novamente o item lexical com a lateral. Nas duas amostras referentes às duas cidades, não foi encontrada nenhuma ocorrência de itens lexicais com o tepe entre os falantes de classe média e média alta.

Buscando identificar motivações estruturais para a alternância entre lateral e tepe em onset complexo, Gomes (1987) retoma a escala de força proposta por Hooper (1976).

Segundo essa hipótese, a sílaba se organiza em função das relações de força entre os segmentos que a compõem, de maneira que há uma sequência de organização dos segmentos, que vai do segmento mais forte ao mais fraco, definindo hierarquias para tipos de segmentos que melhor ocupam a posição inicial e a posição final de sílaba. Nessa escala, a sílaba é descrita como contendo em seu centro um segmento '+vocálico' e em suas margens

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segmentos '-vocálico'. Assim sendo, segundo a escala de força, a lateral é marcada como '+forte' em relação ao tepe. Espera-se, portanto, que haja a presença da lateral com mais frequência quando esta for precedida por consoantes que ocupam posição mais alta na escala de força. São classificados como mais fortes nessa escala as consoantes oclusivas em relação às fricativas, nasais e líquidas, nesta ordem, sendo os segmentos desvozeados considerados mais fortes que os vozeados. Portanto, consoantes menos fortes na primeira posição, fricativas ou segmentos sonoros irão favorecer o tepe, que é menos forte que a lateral.

Em Gomes (1987) também foram considerados outros condicionamentos estruturais, como o tamanho do item lexical, medido em número de sílabas, tonicidade da sílaba, vogal da sílaba, posição da sílaba na palavra e presença de outra líquida no item lexical. Com relação à tonicidade da sílaba, foi testada a hipótese de favorecimento da realização do tepe em sílabas fracas do ponto de vista da tonicidade, átonas finais, principalmente, e pré e pós-tônicas não finais. Com relação à posição da sílaba na palavra, foi testada a hipótese de que sílaba em posição inicial tende a ser preservada, desfavorecendo então a ocorrência do item com o tepe. Com relação à vogal da sílaba, a expectativa foi de que não haveria influência deste segmento dado que a lateral e o tepe alveolares compartilham a característica de mesmo ponto de articulação. Finalmente, por serem registradas mudanças em que houve historicamente registro de mais alternância de líquidas em palavras com mais de uma líquida (pílulas ~ pírolas), foi verificada a hipótese de a presença de outra líquida na palavra favorecer a realização do tepe.

Os resultados encontrados pela autora apontaram somente para uma acentuada interferência da classe social no uso das variáveis estudadas. O teste do qui-quadrado não revelou a significância de nenhum dos grupos de fatores estruturais mencionados nos dois parágrafos anteriores. A ocorrência do rotacismo foi registrada somente entre os falantes de classe média baixa de Ribeirão Preto (22,05%) e de classe baixa do Rio de Janeiro (34,41%).

Os resultados também indicaram que as características dialetais podem contribuir para diminuir o caráter de estigmatização da variável com o tepe, visto que esperava-se que os falantes de Ribeirão Preto pertencentes à classe que mais se aproximava da classe média não produzissem o rotacismo no estilo formal, o que não aconteceu. Gomes indica a possibilidade de haver condicionamento lexical na realização do tepe, já que encontrou indícios de maior ocorrência do tepe em itens de maior frequência de ocorrência nas amostras. No entanto, a

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autora alerta que não havia meios de determinar a frequência de ocorrência no momento em que realizou sua pesquisa, na década de 1980.

Mollica e Paiva (1991) observaram, com dados da Amostra Censo 1980, dois processos de variação nos grupos consonantais formados por consoantes oclusivas ou fricativas seguidas de líquidas no Português falado no Rio de Janeiro: a alternância entre [l] e [r] e a supressão de /r/. Assim como Gomes (1987), Mollica e Paiva (1991) também verificaram o efeito da escala de força proposta por Hooper (1976). Segundo as autoras, há maior probabilidade de haver rotacismo quando a primeira consoante do onset complexo é uma oclusiva desvozeada. Essa hipótese difere da de Gomes (1987), com base em Hooper (1987).

As análises das autoras evidenciaram que houve efeito relevante da presença ou ausência de outro segmento líquido na palavra, do modo de articulação e sonoridade da consoante base do grupo.

Tem Tem (2010) também investigou a rotacização das líquidas nos grupos consonantais, em crianças de escola pública da Zona Oeste do Rio de Janeiro. A autora resgata o estudo de Mollica e Paiva (1991) e os resultados encontrados, assim como a escala de força proposta por Hooper (1976), que pode ser observada no quadro 1, a seguir:

Quadro 1: Escala de força de Hooper (1976) (TEM TEM, 2010, p. 80)

Tem Tem (2010) considerou como variável dependente a ocorrência ou não da troca entre as líquidas /l/ e /r/ nos grupos consonantais e dividiu as variáveis independentes em estruturais e sociais. As variáveis estruturais ou linguísticas consideradas foram: modo de articulação do segmento precedente à líquida no grupo consonantal, vozeamento do segmento precedente à líquida, tonicidade da sílaba do grupo consonantal, posição do grupo consonantal na palavra e presença de outro segmento líquido na palavra. Já as variáveis sociais ou extralinguísticas consideradas foram: faixa etária, sexo, escolaridade dos informantes, escolaridade do pai e da mãe.

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Relativamente a quais condicionamentos linguísticos e quais contextos foram significativos e favorecedores ao aparecimento do tepe, os resultados revelaram que: as oclusivas favorecem a rotacização; segmentos sonoros precedentes à líquida favorecem o rotacismo; a incidência de rotacismo foi maior nos grupos consonantais situados em sílaba tônica; houve peso maior de ocorrência de rotacismo em palavras nas quais o encontro consonantal apresenta-se em sílaba inicial; a presença de outra líquida favoreceu um percentual um pouco mais alto de rotacismo. A autora alega, ainda, que houve uma redução no percentual de rotacismo com o aumento da escolarização dos informantes: quanto menor a escolaridade dos pais, maior a ocorrência de rotacismo na produção dos filhos.

Recentemente, Gomes (2021) retomou os resultados de Gomes (1987) e os revisitou tomando por base os pressupostos teóricos dos Modelos de Exemplares. Uma questão que se coloca é a diferença de resultados relativos aos condicionamentos estruturais do estudo de Gomes (1987) e os demais estudos, não havendo evidência de condicionamento estrutural de nenhum tipo no primeiro estudo. Com base também em evidências de dados diacrônicos, Gomes (1987) defende que o rotacismo se propagou por difusão lexical, o que também se verifica nos dados do Português contemporâneo. Gomes (2021) pondera que o efeito de condicionamento lexical não foi verificado em nenhum dos estudos que indicam condicionamento estrutural de alguma natureza. Assim, para que esta questão seja melhor esclarecida, a autora sugere que estudos futuros com dados de produção espontânea considerem o item lexical, em um tratamento estatístico, como uma variável de efeito aleatório, em um tratamento de regressão com efeitos mistos, juntamente com as variáveis independentes estruturais de efeito fixo.

Para verificar o efeito de condicionamentos linguísticos na percepção das duas variantes, lateral e tepe, em que pese a ausência de evidências deste tipo no estudo de Gomes (1987), foram consideradas duas características que serviram de condições para a seleção dos itens lexicais que integram os estímulos: a presença de outra líquida na palavra e a frequência de ocorrência do item lexical, conforme verificado na base ASPA da UFMG. Essas questões serão tratadas na seção 3, referente aos experimentos.

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2. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO 2.1. Sociolinguística Variacionista

Este estudo se baseia nos pressupostos da Sociolinguística Variacionista, o que significa dizer que se estabelece uma relação entre a língua que falamos e a sociedade em que vivemos, partindo do princípio de que a variação linguística indexa aspectos sociais. A Sociolinguística surgiu jogando por terra a ideia previamente postulada de que o sistema linguístico é homogêneo e invariável, e apresentou uma nova visão: a de que a variabilidade é inerente às línguas humanas e está sujeita às pressões sociais. O falante inserido na comunidade de fala se tornou o foco da investigação e o contexto social se tornou a base para o estudo da língua. Por isso, neste estudo se pretende verificar o efeito de falantes com diferentes perfis sociais na percepção da alternância de líquidas emonsetcomplexo. Partimos do princípio proposto por Labov (1994), segundo o qual a variação é inerente ao conhecimento linguístico. Ainda com base na Sociolinguística, adotamos, também, a ideia de que há uma relação entre as condições de produção e as características sociais dos falantes.

2.2. Teoria dos Modelos de Exemplares

Consideramos, também, a hipótese dos Modelos de Exemplares, segundo a qual a variação tem status representacional (CRISTÓFARO-SILVA; GOMES, 2017), isto é, a variação está representada no léxico do falante. Por ter status representacional, a mudança sonora pode ser compreendida como uma atualização dos exemplares em função da produção do falante. Os Modelos de Exemplares entendem que as representações linguísticas consistem de traços detalhados de memória da experiência com a língua. Esses modelos defendem que o conhecimento linguístico envolve o armazenamento de memórias detalhadas das experiências linguísticas e, dessas experiências com a língua, emergem generalizações. O conhecimento linguístico é, então, o resultado da interação entre aspectos inatos da cognição humana e da experiência com a língua. Os Modelos de Exemplares postulam que a experiência com a língua impacta as representações abstratas e não há separação entre léxico e gramática. Ainda de acordo com os Modelos de Exemplares, os itens lexicais estão organizados em redes de conexões baseadas em semelhanças sonoras e semânticas ou ambas, das quais emergem as relações morfológicas.

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2.3. Percepção da variação: o que é?

O que seria, afinal, a percepção da variação? A percepção da variação se circunscreve à mesma delimitação de percepção linguística. Segundo Squires (2011), percepção da variação seria a capacidade cognitiva que o falante/ouvinte tem de identificar e interpretar formas linguísticas, considerando que o processamento da informação linguística é associado à indexação social.

Pode-se dizer que percepção da variação é o mesmo que percepção linguística porque existem evidências de que, durante o processamento linguístico, falantes integram informação social e informação gramatical. Serão apresentadas, a seguir, evidências de dois estudos.

A respeito da relação entre forma linguística e características sociais dos falantes, o estudo neurolinguístico de Van Berkumet al. (2008) mostrou que as características sociais de quem fala estão presentes desde o início do processamento da informação sintática. O estudo avaliou, através do ERP (event-related potential) - um método experimental que mede a resposta do cérebro que resulta diretamente de um evento sensorial -, pares anômalos de sentença-falante. Nesse estudo, o ouvinte se deparava com frases que quebravam a expectativa, como por exemplo a voz de um homem dizendo “If only I looked like Britney Spears” (Se pelo menos eu me parecesse com a Britney Spears); ou a voz de um adulto dizendo “I cannot sleep without my teddy bear in my arms” (Eu não posso dormir sem estar abraçado ao meu ursinho de pelúcia). Essas frases foram processadas da mesma maneira, isto é, tiveram o mesmo tipo de atividade cerebral que anomalias semânticas “puras”, como por exemplo: “Dutch trains are sour and blue” (Os trens holandeses são azedos e azuis) e “Dutch trains are white and blue” (Os trens holandeses são brancos e azuis), frases que causariam estranheza, respectivamente, em função da sua estrutura e do conhecimento de mundo.

Os autores concluem dizendo que os participantes usaram a identidade social do falante do estímulo no processamento da sentença desde seu início, e que a construção do significado não se baseia somente nas informações linguísticas e de conhecimento de mundo, mas também nas características sociais da pessoa que fala. Dessa forma, o estabelecimento do significado do que se quer dizer não pode ser separado dos aspectos sociais da língua em uso.

É interessante observar que as características sociais testadas no estudo de Van Berkumet al.

foram a idade, o sexo e o status socioeconômico dos possíveis falantes dos estímulos,

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características estas que normalmente compõem as variáveis estratificadoras de amostras de comunidades de fala organizadas nos estudos desenvolvidos na Sociolinguística.

Outro estudo que mostra que características sociais dos falantes estão associadas à interpretação do significado do que se ouve é o de Casassanto (2010). Esse estudo mostra que a informação social sobre o falante pode ser usada para resolver casos de ambiguidade. O teste de Casassanto consistia em apresentar sentenças contendo uma forma fonética ambígua, que poderia corresponder a duas palavras diferentes do Inglês, e utilizar a informação social de quem fala para ajudar a desfazer a aparente ambiguidade. As formas fonéticas ambíguas eram associadas à variável “t/d deletion”, uma variável linguística verificada no Inglês americano que corresponde à realização variável da consoante oclusiva alveolar t/d em final de palavra como em past ~pas,left -lef. Por exemplo, a forma ma[s] pode corresponder à variante que alterna com mas[t] (mastro), ou ser a forma sonora de mass (missa), que não possui a consoante em coda em final de palavra.

Assim, no teste, a sentença incompleta “The ma[s] probably lasted” aparecia sendo seguida de duas possibilidades de continuação, ambas possíveis: a.through the storm. e b.an hour on Sunday. Essa seria uma sentença ambígua, conforme já mencionado, porque ma[s]

pode ser ‘missa’ ou uma das variantes de ‘mast’, que significa ‘mastro’ e que pode ocorrer sem a última consoante. No Inglês, é comum acontecer a alternância entre a terminação com e sem a consoante em palavras como essa, mas a ausência da consoante é típica do falar do Inglês afro-americano. Os participantes do teste ouviam a primeira parte de uma sentença, que terminava na forma fonética ambígua, enquanto viam a foto de um possível falante daquela sentença: um falante negro ou branco. Depois, ouviam uma das duas possibilidades de continuação daquela sentença e tinham que escolher qual seria a continuação, resolvendo, assim, a questão da ambiguidade.

O comportamento dos participantes foi analisado em função do tempo que eles levaram para decidir se a continuação da sentença era possível (e qualquer uma das duas seria). Os resultados mostraram que os tempos de resposta menores indicavam a continuação compatível com a interpretação de ma[s] como variante de mast (mastro) (sentença a.), quando o estímulo estava associado à foto de falante negro. A continuação da sentença b., compatível com a interpretação de ma[s] como missa, cuja forma sonora não contém

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consoante final, associada a foto de falante branco, também apresentou tempos menores de decisão. Já os tempos maiores de resposta ocorreram quando os estímulos foram pareados, respectivamente, com foto de falante branco e negro. Com isso, a autora concluiu que os falantes fazem uso da variação sociolinguística no processamento linguístico para resolver ambiguidade.

Os resultados dos dois estudos apresentados nesta seção são indicativos da relação entre forma linguística e características sociais dos falantes, com base na percepção. Essa relação tem sido verificada nos estudos sociolinguísticos majoritariamente com dados de produção.

Portanto, a elaboração dos experimentos de percepção do rotacismo em onset complexo busca contribuir para o entendimento da relação entre as variantes e o valor social atribuído a elas com base em dados de percepção.

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3. OS TESTES DE PERCEPÇÃO

Nesta seção, serão apresentados os dois experimentos elaborados para o estudo da percepção do rotacismo na comunidade de fala do Rio de Janeiro.

3.1. Metodologia experimental:priming

Em nosso estudo, adotamos oprimingcomo uma das metodologias experimentais. O priming é um fenômeno cognitivo que pode ser detectado em relação a diversos tipos de comportamento, de maneira que a experiência com determinado evento ativa o acesso a esse evento e a outros semelhantes a ele. A técnica de priming consiste na apresentação de um primeiro estímulo (prime) seguido de outro estímulo (alvo) com o objetivo de verificar o efeito das características do primeiro na percepção do segundo (SQUIRES, 2011). O uso da técnica de priming em estudos sociolinguísticos testa a hipótese de que a interpretação da variação é suscetível a efeitos de priming. Segundo essa hipótese, os participantes do teste terão maior probabilidade de interpretar estímulos que apresentam variantes não-padrão (target/alvo) ou estigmatizadas, se tiverem experienciado a variante não-padrão imediatamente antes (prime), se comparado à situação em que oprimeé padrão e vice-versa.

3.2. Metodologia experimental:matched-guise

Adotamos, também, o método de matched-guise, que verifica quais informações sociais os indivíduos atribuem ao falante, baseando-se somente na variante expressa no estímulo oral. Esse método consiste em pares de estímulos produzidos pela mesma pessoa, mas que apresentam diferenças em relação às variantes de uma variável.

3.3. Design dos experimentos

Conforme previamente mencionado, com o objetivo de observar o efeito de variáveis linguísticas na percepção das variantes, serão aplicados dois testes que se caracterizam por utilizarem diferentes técnicas experimentais. Os testes consistirão na observação do comportamento de indivíduos com diferentes perfis sociais em relação à percepção da

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alternância de líquidas em onset complexo, para identificar se há um mesmo padrão de avaliação social das variantes para os falantes da variedade falada na cidade do Rio de Janeiro. Partindo dos resultados de Gomes (1987), em que não foi observado efeito de variáveis linguísticas na alternância, nossa hipótese é a de que, devido ao alto estigma da variante com tepe, nenhuma das variáveis controle interferirá na percepção da variante com o tepe.

Os testes contarão com 24 estímulos. Serão 12 estímulos formados por itens lexicais mais frequentes e 12 estímulos formados por itens menos frequentes, de acordo com o levantamento realizado na base ASPA da UFMG. Em cada grupo de itens lexicais em função da frequência, metade é composta de itens sem outra líquida na palavra e metade com outra líquida na palavra. As variáveis de controle serão a frequência do item lexical e a presença ou ausência de outra líquida na palavra.

O quadro 2, a seguir, apresenta os itens lexicais que foram selecionados para compor os estímulos dos testes. A seleção dos itens foi feita de acordo com as variáveis de controle e os critérios de montagem das sentenças incluíram: escolha de sentenças de tamanhos equivalentes; que pudessem ser produzidas por qualquer pessoa (termos técnicos, por exemplo, não foram considerados); que não contivessem conteúdos que fossem diretamente relacionados à idade ou sexo, para não enviesar as respostas.

Quadro 2: Lista de itens lexicais selecionados para os testes

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Um dos testes que será aplicado, utilizará a técnica depriminge verificará a percepção dos participantes em relação ao perfil socioeconômico x sexo dos falantes. Nesse teste, o prime linguístico é a sentença com a variante em questão (estímulo oral) e otarget(alvo) são as fotos com a característica social avaliada. A tarefa do participante do teste será associar uma variante a um determinado perfil social. Para esse teste, haverá duas condições. Na primeira, há congruência entre a variante do estímulo prime e a variante do estímulo alvo (lateral noprime e notargetou tepe noprimee notarget). Nesse caso, se, de fato, existe uma associação entre uma variante e um perfil social específico, espera-se que o tempo de resposta seja rápido. Já na segunda condição, há incongruência entre prime etarget, isto é, a variante apresentada no estímuloprime é diferente da variante apresentada no estímulo alvo.

Nesse caso, se realmente houver valor social associado à escolha dos participantes, o esperado é que o tempo de resposta seja maior. Nenhum participante ouvirá a mesma sentença com as duas variantes. As condições de congruência e incongruência entre primee target, assim como o design do experimento, podem ser observados nos quadros 3 e 4, a seguir:

Quadro 3: Condições de congruência e incongruência entreprimeetarget

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Quadro 4: Teste perfil socioeconômicoxsexo (priming)

Outro teste que será aplicado, seguirá o método de matched-guise. Nesse teste, a tarefa do participante será ouvir o estímulo oral e fazer a associação com um determinado perfil social. Nenhum participante ouvirá a mesma sentença com as duas variantes. O design do experimento pode ser observado no quadro 5, a seguir:

Quadro 5: Testes sexoxidade e sexoxperfil socioeconômico (matched-guise)

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A utilização de duas técnicas experimentais diferentes visa acessar de formas diferentes o valor social atribuído às variantes. A técnica experimental de primingpermite verificar o processamento mais diretamente a partir da medição do tempo de resposta. Por outro lado, o método dematched-guisepermite acessar a associação entre forma e perfil social que a forma linguística, no caso, a variante, evoca, isto é, a partir do tipo de resposta do participante.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo buscou promover a reflexão acerca do comportamento de indivíduos com diferentes perfis sociais em relação à percepção da alternância de líquidas em onset complexo e, principalmente, sobre o efeito de variáveis linguísticas na percepção das variantes, com base na proposta de dois experimentos de percepção da variação. Para tanto, foram apontados estudos sociolinguísticos que buscaram identificar condicionamentos linguísticos e sociais da variação, hipóteses de representação da variação no conhecimento linguístico do falante, evidências de mudança em progresso ou variação estável, além do significado social da variante tepe na comunidade estudada.

Em nosso estudo, pretendemos responder os seguintes questionamentos:

a) Falantes/ouvintes da mesma comunidade de fala compartilham os mesmos padrões de avaliação social das variantes das variáveis estudadas?

b) De que maneira a forma linguística aciona expectativas do ouvinte sobre as características sociais do falante?

c) De que maneira características sociais do falante afetam a percepção da forma linguística pelo ouvinte?

d) Condicionamentos linguísticos observados nos dados de produção afetam a percepção?

A fim de responder tais questões, serão aplicados testes de percepção com base nos métodos depriming ematched-guise. Entendemos que pensar a percepção da variação sob a ótica da Sociolinguística Variacionista e da Teoria dos Modelos de Exemplares é não desconsiderar que cada falante tem sua “bagagem lexical” e que essas “bagagens” se relacionam de diversas formas. Ao conjugar essas teorias, um leque de opções de interpretações é aberto. A observação do comportamento de participantes com diferentes perfis sociais contribuirá para identificar se há um mesmo padrão de avaliação social das variantes para os falantes da variedade falada na cidade do Rio de Janeiro. Os experimentos estão em fase de montagem para aplicação online em grupos de participantes com perfis de escolaridade definidos.

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