• Nenhum resultado encontrado

Percepção de professores de língua portuguesa sobre criatividade em produções textuais

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Percepção de professores de língua portuguesa sobre criatividade em produções textuais"

Copied!
79
0
0

Texto

(1)

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Stricto Sensu em Educação

PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUA

PORTUGUESA SOBRE CRIATIVIDADE EM

PRODUÇÕES TEXTUAIS

Brasília - DF

2012

(2)

GLAUCIA MADUREIRA LAGE E MORAES

PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUA PORTUGUESA SOBRE CRIATIVIDADE EM PRODUÇÕES TEXTUAIS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Educação da Universidade Católica de Brasília como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração de Ensino-Aprendizagem.

Orientadora: Dra. Eunice Maria Lima Soriano de Alencar

(3)

Dissertação de autoria de Gláucia Madureira Lage e Moraes, intitulada "Percepção de Professores de Língua Portuguesa sobre a Criatividade em Produções Textuais", apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação da Universidade Católica de Brasília, em 28 de fevereiro de 2012, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

pror. Df!. Eunice Maria Lima Soriano de Alencar Orientadora

Prot". Df'. Ranilc8:i: Guimarães Iosif Examinadora Interna

pror. Df!. Denise de Sousa Fleith Examinadora Externa

(4)

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

M827p Moraes, Glaucia Madureira Lage e

Percepção de professores de língua portuguesa sobre criatividade em produções textuais. / Glaucia Madureira Lage e Moraes – 2012.

76f. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2012. Orientação: Eunice Maria Lima Soriano de Alencar

1. Criatividade na escrita. 2. Produção discente. 3. Ensino

fundamental. 4. Professores. I. Alencar, Eunice Maria Lima Soriano de, orient. II. Título.

(5)

Para Gerald, mão do meu carinho, esteio e chão.

Jade e Júlia, amor sem fim.

A meu pai (in memoriam), uma das pessoas mais

(6)

AGRADECIMENTOS

Aos professores do Programa de Mestrado da UCB, que me auxiliaram nesta caminhada dando, cada um, sua contribuição para que este projeto se concretizasse.

Aos meus colegas do Mestrado, que me indicaram professores e escolas para as entrevistas.

Aos meus colegas de trabalho, que me auxiliaram com empréstimo de material multimídia, que me substituíram quando precisei faltar ou atrasar e à minha chefia, que flexibilizou meu horário e me apoiou nesta jornada.

Aos professores que me concederam as entrevistas e às escolas que me abriram suas portas, para que esta pesquisa fosse feita.

Às Professoras Doutoras Denise de Souza Fleith e Ranilce Guimarães-Iosif, por terem aceitado o convite para fazer parte da banca examinadora e pela valorosa contribuição no trabalho.

Por fim, agradeço à minha orientadora, Professora Dra. Eunice Maria Lima Soriano de Alencar, pela orientação primorosa, pela disposição, pela paciência, pela imensa vontade de ajudar.

(7)

RESUMO

MORAES, Gláucia Madureira Lage e. Percepção de professores de língua portuguesa sobre criatividade em produções textuais. 2012. 76f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.

Reclama-se que os jovens não sabem escrever, mas, tem a escola se esforçado para ensinar isso a eles? Como fazer um trabalho criativo de produção de textos diante das condições oferecidas pelo nosso sistema educacional? O que o sistema educacional tem feito para enfrentar os desafios do ensino criativo da escrita? No intuito de encontrar respostas para essas questões foi desenvolvido este estudo, que teve como objetivo investigar elementos que, na percepção de professores, agiam como inibidores ou facilitadores da criatividade em produções textuais discentes. Foram entrevistados 12 professores de Língua Portuguesa do segundo ciclo do Ensino Fundamental de escolas públicas e particulares de Brasília – DF. Os resultados indicaram que a produção de texto era pouco trabalhada no ambiente escolar, sendo a falta de tempo para as correções a principal barreira para uma prática mais frequente. Não havia uma ocasião específica para exercitar a escrita, embora um evento ou uma data comemorativa pudessem representar um pretexto para as produções. Conquanto a quase totalidade dos professores se considerasse criativa na tarefa de ensinar a redigir, essa criatividade não vinha surtindo efeito nas produções textuais discentes, já que a maioria dos entrevistados não percebia como criativos os textos produzidos pelos estudantes. Para os docentes, um texto era considerado criativo quando apresentava um viés humorístico, um pensamento desafiador ou quando era bem fundamentado. Nenhum dos entrevistados teve disciplina relacionada à criatividade na graduação e a maioria deles acreditava ser importante uma matéria que tratasse do assunto, a fim de auxiliar os professores a trabalhar determinados temas e aliar teoria à prática. Os procedimentos pedagógicos citados como os mais utilizados para o incremento da criatividade nas produções escritas foram: aumento e diversificação de leituras; utilização de recursos variados; envolvimento com a arte; liberdade para o aluno escrever e menor apego às normas e regras rígidas para a escrita; busca de envolvimento com a realidade dos educandos; maior incitamento à revisão e reescrita dos textos e divisão da responsabilidade da leitura e da escrita com outras disciplinas. Os elementos apontados como impeditivos a uma produção textual mais criativa, no que dizia respeito aos estudantes, foram: falta de leitura; medo do julgamento alheio; falta de pré-requisito; ausência de prática de escrita fora da escola; falta de incentivo em casa; desinteresse; visão da escrita como um ato punitivo. Com relação ao trabalho dos docentes, os elementos apontados como impedidores de uma ação mais eficaz, concernente à produção de textos, foram: falta de tempo; cobrança de resultados baseada em nota; exigência rigorosa de uma norma padrão; falta de sensibilidade para o reconhecimento do aluno criativo. No que tange à escola, a falta de material, a estrutura inadequada e condições precárias de trabalho, bem como a ausência de incentivo foram os elementos mais lembrados como impeditivos de uma prática eficiente de produção textual.

(8)

ABSTRACT

MORAES, Gláucia Madureira Lage. Portuguese Language Teacher Perception of Creativity in Written Productions. 2012. 76p. Thesis. (Masters in Education) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.

Some complain that youngsters do not know how to write but have schools made efforts to teach them how to? How does one write creatively with the conditions offered by our educational system and what has the educational system done to face the challenges of creative teaching in writing? The present study was developed in order to seek answers to these questions. Its main objective was to investigate elements which, in teacher perceptions, inhibited or facilitated creativity in written productions by students. Twelve Portuguese Language teachers were interviewed from the second cycle of both public and private elementary schools in Brasília, DF. The results showed that written construction was underdeveloped in school and that the main impediment to more frequent writing was the lack of time for correction by teachers. There were no specific occasions for writing practice though events or commemorative dates could sometimes present a pretext for such. Although almost all teachers considered themselves creative when teaching students how to write, this creativity did not manifest in written productions by students because the majority of the teachers interviewed did not consider the texts produced by students creative. For the teachers a text was considered creative when it showed some kind of humor, challenging thought or when it was well founded. No teacher had studied any unit related to creativity in their graduation courses though most recognized the importance of such a unit dealing with this subject in the course in order to help the teachers work on determined themes and put theory into practice. The pedagogical procedures identified as most commonly used in writing were: increasing and diversifying reading; utilizing diverse resources; relating writing to art; freedom to write with less adherence to strict writing norms and rules; seeking involvement with student realities; stimulating more revision and rewriting of articles and a separation from reading and writing requirements with other subjects. In relation to students, the elements identified as inhibitors to more creative writing were: insufficient reading; fear of outside opinions; lack of prerequisites; lack of written practice outside school; lack of stimulus at home; general disinterest; and regarding writing as a punishment. In relation to teachers’ work, the elements identified as inhibitors to better text production were: results based on evaluation grades; strict standard norm requirements; and a lack of sensibility to recognize creative students. As regards school, the lack of material, inadequate structure, poor working conditions as well as a lack of stimulus were also noted as elements inhibiting efficient writing.

(9)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Síntese dos dados dos professores entrevistados ... 40

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

CAPÍTULOI - REVISÃODELITERATURA ... 10

1.1. Composição, redação ou produção de texto? ... 10

1.2. A escrita como castigo ... 12

1.3. “O outro” - limite e valor ... 15

1.4. Ensinar a escrever é ensinar a pensar ... 17

1.5. Um pouco do conceito de criatividade ... 20

1.6. O papel da escola e do professor no desenvolvimento do potencial criativo ... 22

1.7. Atmosferas criativas ... 25

1.8. Criatividade na formação de professores... 27

1.9. Desenvolvendo a escrita criativa ... 30

CAPÍTULOII - DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ... 37

CAPÍTULOIII -METODOLOGIA ... 39

3.1. Caracterização da pesquisa ... 39

3.2. Participantes ... 39

3.3. Instrumento ... 41

3.4. Procedimentos ... 42

3.5. Análise dos dados ... 42

CAPÍTULOIV-RESULTADOS ... 43

4.1 Solicitação de produções textuais em sala – frequência e justificativas ... 44

4.2. Percepção dos professores quanto à criatividade nas produções escritas dos alunos ... 46

4.3. Valor atribuído à criatividade na formação do professor no curso de Letras ... 48

4.4. Como os professores avaliam a própria criatividade no ensino da redação ... 49

4.5. Práticas propícias ao incremento da criatividade nos textos escolares ... 51

4.6. Elementos pessoais e institucionais inibidores da criatividade nas produções escritas ... 53

4.7 Acréscimos ... 54

CAPÍTULOV - DISCUSSÃOECONCLUSÕES ... 60

REFERÊNCIAS ... 69

ANEXO I -ROTEIRODEENTREVISTA ... 75

(11)

INTRODUÇÃO

Minha preocupação com a escrita nasceu em 1993, quando, recém-formada, fui dar aulas de língua portuguesa e redação numa escola pública de ensino médio na periferia de Belo Horizonte. Sem experiência com adolescentes, e com um público bem diferente daquele com que estava acostumada a lidar (havia feito o caminho inverso, começando a lecionar no ensino superior, na própria universidade em que me graduara), procurei primeiramente trocar ideias com outros professores, a fim de saber o que estava sendo realizado naquele momento com relação ao incentivo à escrita.

As respostas dos docentes vieram em uníssono: quase não se produzia textos em sala de aula, pois, devido à elevada carga horária de trabalho, os professores não tinham tempo de ler e corrigir os textos de cada aluno. Assim, era preferível enfatizar a interpretação em detrimento da produção de textos; além disso, havia uma reclamação generalizada quanto à extensão do programa de gramática da língua portuguesa, quase não sobrando espaço para a produção textual. Concluí, dessa forma, que se quisesse trabalhar as várias modalidades da escrita, como havia intencionado, teria que fazer meu próprio caminho, já que não havia um caminho a seguir.

Numa enquete feita por mim, nas turmas em que lecionava naquele ano, apenas 10% dos alunos pretendiam fazer o vestibular e prosseguir nos estudos. Para os outros 90%, o ensino médio seria o final da linha, o que aumentou minha inquietação com o que e como ensinávamos para aqueles estudantes. Para quem ia prosseguir nos estudos, a intimidade com a escrita seria de suma importância, pois sem ela não se é aprovado em vestibular e, caso o seja, os problemas com a escrita aparecerão mais tarde, na necessidade de fazer uma monografia, um resumo ou um simples trabalho escolar.

Para aqueles que consideravam o ensino médio o máximo de escolarização que poderiam alcançar, a situação era ainda pior, pois terminaria ali sua maior oportunidade de aprimoramento da escrita. Isto seguramente os deixaria em condições de desvantagem numa seleção ou concurso que exigisse uma redação, fosse para o cargo de secretária, policial ou auxiliar de escritório, profissões almejadas pelos meus alunos, à época.

(12)

a escrita? Percebi que a certeza de não ter um leitor para o que escreviam fazia com que os estudantes não tivessem cuidado com a própria produção, buscando apenas cumprir a tarefa exigida, oferecendo um trabalho padronizado, sem reflexão, sem cuidado com as palavras.

Os primeiros resultados apresentavam todos os problemas cabíveis em uma produção textual: pontuação irregular, desajuste vocabular, falta de coesão e coerência textual e, em muitos casos, inadequação ao tema proposto. Minha preocupação aumentou, pois considerava inadmissível que aqueles alunos, depois de oito anos no ensino fundamental, e já quase saindo do ensino médio, ou seja, depois de, no mínimo, 11 anos na escola, saíssem dela com graves dificuldades no uso da escrita.

Com a confiança de que somente aprendemos a escrever escrevendo, demos início a uma longa jornada de práticas de produções escritas variadas, de cartas a contos de fadas, textos técnicos, crônicas, poesias... O progresso de meus alunos foi claramente percebido no decorrer daquele ano letivo, com o exercício incansável de escrever e reescrever até que o texto se tornasse claro e transmitisse uma ideia, uma intenção, um recado, uma história. Escrever já não era um sofrimento, mas uma oportunidade de se expressar, de dizer o que poucas vezes a escola permitia ou solicitava.

Nunca mais tive notícias daqueles meus alunos. Mudei de cidade, de estado e não tivemos mais contato. Minha experiência com eles resultou em uma publicação (BORGES, 1995), porém, ainda hoje me pergunto onde estará cada um daqueles estudantes. Meu trabalho teria feito diferença em suas vidas? Talvez eu nunca venha a saber. O que importa é que, com muita criatividade e motivação, vencemos, naquele ano, os percalços de uma educação marcada pelo desânimo, pela precariedade, pelas reclamações, pelos baixos salários e pelas ameaças e concretizações de greve.

Hoje, transcorridos 18 anos daquele meu contato inicial com adolescentes, me pergunto se a escola e os professores da atualidade têm dado a devida atenção às produções escritas dos estudantes. Reclama-se que os jovens não sabem escrever, mas a escola tem se esforçado a ensinar isso a eles? E como fazer um trabalho significativo diante das condições oferecidas dentro do sistema educacional? Mais que isso, vale perguntar: o que nosso sistema educacional tem feito para enfrentar os desafios do ensino criativo da escrita?

(13)

CAPÍTULO I - REVISÃO DE LITERATURA

Neste capítulo, serão abordados tópicos referentes à produção textual e ao tratamento que esse assunto tem recebido nas escolas, bem como a possibilidade de desenvolver a escrita criativa, mesmo em condições desfavoráveis a isso.

1.1. Composição, redação ou produção de texto?

Essas três expressões, separadas pelo tempo, nada mais são que os nomes dados ao processo de produzir textos. O que as diferencia é a vinculação às diversas teorias que apregoam distintas formas de apreciar não só a ação de escrever como a de ensinar a escrever textos, bem como a ação de exercitar a linguagem através da organização do pensamento.

De acordo com Guedes (2009, p. 88), o termo composição é o mais antigo dos três

usados para nomear textos escritos nas escolas. Vinculado à mesma teoria que dá embasamento à gramática tradicional, “vê a linguagem como instrumento de organização e de expressão do pensamento dentro dos princípios da lógica formal. Interessa mais a correção do processo de raciocinar do que a finalidade com que o raciocínio é enunciado”.

Na composição, segundo esse autor, a ação de escrever textos aparece como uma atividade de compor, dispor, combinar, juntando conceitos, imagens e figuras em um texto, preferencialmente com palavras bem escolhidas entre aquelas não comumente usadas no dia-a-dia. Também Condemarín e Chadwick (1987, p. 209) compartilham dessa ideia, ao afirmarem que a composição “refere-se ao processo de estruturar as palavras de acordo com um plano organizado, a fim de elaborar uma mensagem efetiva e geralmente gramatical”. Ao corrigir uma composição, privilegiava-se a parte gramatical em detrimento das ideias e sentido do texto. O importante é que estivesse escrito de acordo com as normas da gramática tradicional, o que levava os alunos a seguirem padrões muitas vezes duvidosos, resultando em textos empolados e ocasionalmente ininteligíveis.

O nome redação passou a ser usado a partir dos anos 1950, perpassando todo o

momento do Milagre Econômico brasileiro e findando junto com a crise econômica de

(14)

Bonetti (2001) explica que o conflito entre os termos redação e texto se ampliou ao

longo dos tempos, sendo a palavra redação usada com mais frequência a partir de 1978 quando, nos exames vestibulares, por ordem do Decreto 79.298, de 24 de fevereiro de 1977, houve a inclusão obrigatória de prova ou questão de redação em Língua Portuguesa. Segundo essa autora, pela grande quantidade de manuais de redação à venda ou adotados nas escolas, é evidente que o trabalho de produção escrita tem sido baseado na palavra redação, visto que esses manuais se dispõem a revelar alguns mecanismos que o leitor possui para redigir bem. Eles ajudam a organizar as ideias de modo a fazer redações lógicas, inteligíveis e bem elaboradas, trabalhando de forma bastante técnica e um tanto artificial, como se nosso pensamento e nossa linguagem atuassem de maneira estanque. Em sua opinião, tal procedimento justifica-se pela preocupação constante do sistema educacional com o concurso vestibular, direcionando o ensino da escrita com o objetivo de atender, principalmente, a esse fim.

A palavra redação está etimologicamente vinculada à ideia de reunião, agrupamento, organização. Juntar e combinar as ideias de forma lógica é, portanto, uma redação, mas não um texto. No ensino de redação, a estruturação: começo, meio, fim ou introdução, desenvolvimento e conclusão tem sido enfatizada como aspecto principal de organização lógica. Contudo, para a construção de um texto, a disposição lógica vai mais além, dado que está ligada ainda aos níveis da significação e ao contexto (BONETTI, 2001; VAL, 2004).

A terminologia produção de texto, a mais nova entre as três, expressa o ato de escrever

como um trabalho entre tantos: produzir, fazer, criar. De acordo com Guedes (2009), não se trata mais de compor, ou seja, combinar, ajustar; nem de redigir, isto é, organizar, escrever

ordenadamente, mas de dar origem a, gerar, transformar e mudar, mediante a própria ação do escrevente. A origem da palavra “texto” diz muito de seu significado: tecer, costurar ponto a ponto, com cuidado e zelo, uma história, seja ela verdadeira ou retirada de nossa imaginação. Quem escreve fala de um tema de seu interesse, e sobre ele pesquisa, se informa, discute, pensa e repensa.

(15)

Entretanto, garante Guedes (2009), de nada adianta mudar o nome se não se muda o objeto. Na verdade, ao solicitar uma redação em sala de aula, o que o professor espera mesmo é que o aluno produza um texto. Porém, quando este é devolvido apenas com os erros assinalados, sem qualquer sugestão ou chance de reescrita, o professor não está dando ao aluno condições de progresso nessa área, mas apenas informando a ele que o trabalho não está de acordo com o esperado.

1.2. A escrita como castigo

Utilizada muitas vezes para castigar alunos e turmas irrequietas ou para preencher um tempo ocioso, a produção de textos costuma ser rechaçada até mesmo por aquelas pessoas usualmente comunicativas, sobretudo se apresenta um tema pouco explanado, desconhecido ou que foge ao interesse do escrevente. A escola, acostumada a trabalhar com a dicotomia certo/errado, exibe modelos a serem seguidos, deixando de oferecer ao estudante a possibilidade de construir seus próprios métodos criativos. O resultado dessa ideologia dominante são produções textuais muitas vezes corretas, mas isentas de personalidade e de criatividade, vazias de sentido e recheadas de frases feitas, pois, conforme já observado, a correção gramatical e a divisão adequada em parágrafos não são garantias de um bom texto (BRITTO, 2006; COSTA, 2006; FRANCHI, 2008; GERALDI, 2006a; PÉCORA, 1992; VAL, 2004).

De acordo com Andrade (2001), embora seja grande o número de escritores, o número de leitores ainda é maior. Das pessoas que sabem escrever, a maioria utiliza a escrita de maneira bastante precária, como deixar bilhetes e mandar recados. Após a invenção do telefone, o hábito de escrever cartas foi sendo deixado de lado, já que falar por telefone é mais prático, tem uma resposta imediata, representando ganho de tempo e trazendo a impressão de proximidade no contato com a voz. Outro motivo que faz com que as pessoas prefiram a fala, segundo essa autora, é que um erro na oralidade não é tão perceptível quanto na escrita.

(16)

As dificuldades encontradas pelos estudantes no cumprimento da tarefa de escrever terão reflexos por toda a sua vida. Inicialmente, a escrita desempenhava um papel documental, de resguardar o conhecimento, daí o estilo imponente que adquiriu em muitas ocasiões de nossa história, de acordo com Costa (2006, p. 36):

Ao longo do tempo nós nos habituamos à idéia de que a escrita é uma ‘roupa de missa’ para a linguagem, ou seja, um processo que executamos para cumprir um protocolo do qual não estamos muito convencidos. Isso elimina as possibilidades de prazer que existem no ato de contar uma história.

Assim, o problema mais grave encontrado nas produções de texto não está na dificuldade de absorção das regras e restrições da língua modelo, “mas, justamente, na excessiva facilidade em assimilar um padrão de linguagem, portanto, um padrão de referência para pensar e interpretar o mundo, para constituir a própria experiência” (PÉCORA, 1992, p. 15). Esse medo de se expor e ser julgado gera falsas produções, preenchidas por um discurso vazio, sem identidade, sem individualidade:

Quando se analisam as principais dificuldades de redação nos diferentes níveis de escolaridade, frequentemente se encontram narrações que “não contam histórias”, cartas que não parecem cartas, textos expositivos que não expõem ideias, textos argumentativos que não defendem nenhum ponto de vista. Além disso, e apesar de todas as correções feitas pelo professor, encontram-se também enormes dificuldades no que diz respeito à segmentação do texto em frases, ao agrupamento dessas em parágrafos e à correção ortográfica. Uma das prováveis razões dessas dificuldades para redigir pode ser o fato de a escola colocar a avaliação como objetivo da escrita. (BRASIL, 1997, p. 4)

Observa-se que, de modo geral, o jovem estudante escreve não pelo desejo de escrever, de se expressar, mas para receber uma nota. Sendo assim, desde os primeiros anos de escolarização, o aluno aprende que o melhor é que vá direto ao ponto e diga não o que pensa, mas o que imagina que o seu avaliador deseja ouvir, sem perder tempo com reflexões e sem se comprometer, permanecendo na média aceitável pelo leitor (BERNARDO, 2010; BORGES, 1995; BRITTO, 2006; COSTA, 2006; GUEDES, 2009; PÉCORA, 1992; VAL, 2004).

Na apresentação do livro Da redação à produção textual: o ensino da escrita

(GUEDES, 2009, p. 11), o linguista e professor de língua portuguesa Carlos Alberto Faraco lembra que trabalhar com produção de textos no Brasil não tem sido um trabalho fácil:

Nossa cultura escolar pouco tem feito para enfrentar o desafio do ensino da escrita. O máximo que a pedagogia tradicional conseguiu foi criar o famigerado gênero ‘redação escolar’, cuja característica principal é, dado um tema vazio, escrever para ninguém ler. Mero exercício de preenchimento de umas tantas linhas.

(17)

Faraco ressalta ainda que, ao ser realizado como forma de penitenciar uma turma que se comporta de forma inadequada, ou para preencher um tempo vazio, o exercício da redação torna-se um castigo ou um passatempo torna-sem importância. Nessas situações, o aluno logo procura “desenvolver estratégias de preenchimento” para se livrar daquele trabalho, sem se entregar a ele. Também Geraldi (1984, p. 19) denuncia a precariedade de condições oferecidas aos alunos para a produção textual:

Queremos que nossos alunos escrevam, mas não lhes criamos as condições para tal. O processo rotineiro de orientar a redação tem sido mais ou menos assim: damos um título (silencioso por excelência porque coisa alguma lhes sugere!) ou aumentamos o sofrimento deles, deixando o tema livre e esperamos tranquilos o fim da aula para recolher o produto suado daqueles angustiados minutos. Todos sabemos o quanto nos custava atingir os limites mínimos de linhas (estes limites são indispensáveis neste processo, do contrário ninguém escreve nada!). Mas assim mesmo, continuamos a submeter nossos alunos a essa tortura monstruosa que é escrever sem ter ideias.

Nessa mesma linha de pensamento, Bernardo (2010) observa que na escola aprendemos a escrever para um único leitor: o professor. Este, em muitos casos, não nos dá qualquer retorno, mas nos “enquadra”. Dessa forma, a inclinação natural do aluno é escrever apenas o que lhe acarretará imagem e notas mais satisfatórias - ou menos desagradáveis - o que faz com que o ato de escrever perca sua principal essência e um de seus objetivos fundamentais, o de autoafirmação, para assumir o sentido oposto, o de autonegação.

Alencar e Fleith (2003) lembram que, apesar de os novos tempos exigirem um perfil proativo, autoconfiante, persistente, independente, com coragem para enfrentar novos desafios e apresentar ideias novas para novos problemas, os traços mais cultivados em muitas escolas têm sido a obediência e a passividade. Para essas autoras, o potencial criativo tem sido bloqueado e inibido no ambiente escolar, onde se percebe uma postura negativa com relação ao risco, à aventura e à criação. Numa atmosfera em que predomina o temor ao ridículo, ao julgamento e à reprovação, o sonho e a fantasia são deixados em segundo plano:

[...] esse potencial tem sido usualmente subestimado, bloqueado, inibido e ignorado por uma educação que valoriza em excesso a reprodução dos ensinamentos, que pouco faz para manter viva a curiosidade, que mina a confiança do aluno no seu valor como pessoa, na sua própria competência e na sua capacidade de criar e resolver problemas novos, fechando-lhe inúmeras possibilidades de um melhor aproveitamento de seu potencial criativo, com consequências nefastas para sua vida pessoal e profissional. (p.7)

(18)

De acordo com essa autora, o modelo seguido pela maioria das escolas, no qual a aprendizagem é motivada pelo medo, atribuindo recompensas ou punições a quem segue ou não a cartilha adotada, não atende aos interesses pessoais, tampouco desenvolve a motivação para aprender. Assim, a aprendizagem vai se tornando cada vez mais enfadonha, triste e cheia de regras, à medida que os indivíduos vão alcançando níveis mais elevados de escolaridade. Um bom exemplo disso é o ato de contar histórias, que ocorre com mais frequência na pré-escola, sendo deixado de lado à proporção que os estudos avançam, tornando o ensino pesado e sem atrativos.

Dessa mesma forma, Costa (2006) observa que, no ambiente escolar, onde a imaginação e a criatividade deveriam ser trabalhadas, quase sempre a energia é gasta no treinamento da memória, advertindo que, em muitos casos, o objetivo dos professores é o de que os alunos se tornem iguais a eles, pela imitação e repetição, o que faz da escola um lugar destinado à memorização de fórmulas, datas, nomes e comportamentos, com o que concorda Averbuck (1991, p. 65): “A sala de aula, antes de ser o território da inventividade, é, na maioria das vezes, o lugar onde se anulam as possibilidades de criação e inovação.”

Alves e Dimenstein (2003) também refletem sobre seus anos passados na escola: eles recordam que esta parecia desligada da realidade, não levando em consideração o que interessava aos estudantes, demonstrando um descompasso enorme entre a curiosidade destes e os programas curriculares. Estes últimos não pareciam ter qualquer função educativa, a não ser castigar e fazer sofrer, de acordo com os autores. Assim, para sobreviver à escola, a estratégia adotada era a de cumprir todas as regras e tarefas, a fim de que sobrasse tempo para fazer algo que de fato fosse interessante.

1.3. “O outro” - limite e valor

(19)

pensar do escrevente), o estudante prefere ficar na zona intermediária, mostrando-se imparcial e moderado. Assim, devido ao peso que a crítica externa exerce sobre o resultado da narrativa, quem escreve normalmente procura agregar ao seu texto elementos que considera aceitáveis pelo leitor, causando um distanciamento entre o narrador e a história e gerando produções vazias de sentido e de autoria. Para Costa (2006), talvez pelo fato de que em seus primórdios a escrita tinha um caráter mais documental que literário, ao longo dos anos nos acostumamos com a ideia de que falamos de um jeito, mas devemos escrever de outro. Isso explicaria o estilo imponente e distante que muitos alunos adquirem ao redigir um texto.

Para agravar a situação de nossos pretensos escritores, de acordo com Val (2004), mostrar-se imparcial e moderado é a recomendação mais ouvida em muitos cursinhos preparatórios para vestibulares e concursos, não devendo o aluno dizer nada que possa comprometê-lo, tampouco ousar estabelecer nas redações qualquer opinião individual que fuja do modelo. O temor é o de que o caráter pessoal na abordagem do tema possa ser considerado como dificuldade de dar tratamento lógico e neutro a uma questão.

Porém, de acordo com Bernardo (2010, p.41): “Escrever é um contrato com a verdade (ou com a mentira); um contrato com o outro e consigo mesmo”. Para esse autor, o ato de escrever deve estar relacionado ao desejo. O desejo de nos recriarmos e nos multiplicarmos através de nossas palavras, pois quem escreve se compromete e se define. Entretanto, por medo do julgamento alheio, muitas pessoas preferem não se comprometer e não se definir. Escrever com clareza também implica compromisso com as palavras transmitidas, pois o outro vai lê-las e vai entendê-las, e consequentemente vai reagir a elas, de forma favorável ou desfavorável.

Também Silva (2006) compartilha dessa opinião ao afirmar que escrever é um encorajamento à leitura e à dúvida permanente; é o instante dedicado à organização do pensamento e ao diálogo com outros autores. Ao ler e escrever, descobrimos que as certezas são passageiras e que as dúvidas, essas sim, nutrem a mente, na medida em que nos levam a percorrer novos caminhos e buscar respostas que gerarão outras incertezas e assim por diante. Para esse autor, escrever é se expor, é arriscar-se; por isso a necessidade premente da autovigilância.

(20)

1.4. Ensinar a escrever é ensinar a pensar

A originalidade é uma qualidade importantíssima nas produções textuais, porém esta é comumente confundida com o rompimento de regras ou estruturas linguísticas, valores ou crenças sociais. Entendemos um texto original como aquele que tem origem em quem o produziu, que seja resultante de uma elaboração personalizada do enunciador, e não uma mera reprodução de ideias e fórmulas prontas. Obviamente existem diversos graus de originalidade, e nem todos conseguem atingir o nível de criatividade dos grandes escritores, mas o esforço permanente de evitar opiniões, frases e juízos de valor desgastados contribui para uma personalização do texto, tornando-o criativo. De acordo com Fiorin e Savioli (1995, p. 360): “Sujeitar-se a esquemas prontos é revelar uma percepção de mundo feita através dos olhos alheios e não dos próprios olhos”.

Para Alencar (2009), existe uma contradição dentro da própria escola, pois é comum que esta exija dos alunos a apresentação de respostas “corretas” e a reprodução de fórmulas conhecidas; no entanto, percebe-se uma reclamação generalizada entre os professores, de que muitos de seus alunos não sabem pensar, limitando-se a reproduzir o que lhes é ensinado ou o que leem, ou seja, os estudantes não têm sido treinados a apresentar soluções criativas para problemas novos e velhos. Por isso, a importância de ensinar a pensar, conforme sugere Demo (2000, p. 47). Para esse educador, ensinar a pensar é, antes de tudo, questão de cidadania, pois quem reflete, “mais que adaptar-se à realidade, passa a nela intervir”. Logo, saber pensar inclui a capacidade de se inserir em uma sociedade marcada por profundas e constantes inovações. Não se trata, apenas, de aprendizagem escolar, mas de aprendizagem para a vida.

Segundo Garcia (1995), a escrita e o pensamento estão intimamente ligados, pois escrever nada mais é que buscar ideias e encadeá-las, construindo um todo homogêneo a que chamamos texto, não sendo possível, portanto, transmitir algo sobre o qual não se pensou. Pode-se afirmar, de acordo com Oliveira e Sisto (2005), que produzir um texto requer a capacidade cognitiva de solucionar problemas com palavras, entendendo relações e extraindo conclusões lógicas. Escrever, destarte, envolve pensar a partir do abstrato, implicando um processo de raciocínio dedutivo e indutivo, por isso assumimos que ensinar a escrever é ensinar a pensar.

(21)

Enriquecer as aulas com informações, indagações e fontes de ideias é uma das estratégias que podem ser utilizadas para a melhoria dos textos produzidos em sala de aula. É tarefa do professor, portanto, ajudar o aluno a construir um texto verdadeiramente dotado de

textualidade, aquele conjunto de características que diferenciam o texto de um amontoado de

frases desconexas e sem sentido, colocadas no papel apenas para cumprir uma tarefa enfadonha com número definido de linhas.

Um texto bem estruturado deve conter todos os elementos necessários à sua compreensão, atendendo às condições de informatividade, continuidade (retomada de dados) e progressão, para, por si só, produzir a comunicação. Entre esses elementos estão - no aspecto semântico - a coerência (responsável pelo sentido do texto), qualidade que envolve não somente aspectos lógicos e semânticos, mas também cognitivos, pois depende da troca de conhecimentos entre os interlocutores; e, no aspecto formal, a coesão, construída por meio de mecanismos gramaticais e lexicais (concordância verbal e nominal, correlação entre os tempos verbais, conjunções etc.) e que responde pela unidade formal do texto (KOCH, 1991, 1999; KOCH; TRAVAGLIA, 1991; VAL, 2004).

Outros fatores, estes mais pragmáticos, também são indispensáveis na construção de um bom texto, como a intencionalidade; a situacionalidade; a aceitabilidade; a informatividade e a intertextualidade, que se referem, respectivamente, à meta que se deseja alcançar com o texto, ou seja, a intenção ao escrevê-lo (pode ser informar, convencer, pedir, ofender); que este seja adequado ao que se pretende transmitir, considerando o tipo de leitor e a situação em que será apresentado; que satisfaça à expectativa do leitor, em termos de informação, de utilidade e relevância; que tenha suficiência de dados no que diz respeito ao que informa e que dialogue com outros escritos, o que demonstra busca por diferentes posições e pontos de vista na construção de um texto único (KOCH, 1991, 1999; VAL, 2004).

(22)

Escrever é um ato trabalhoso: este requer tempo, reflexão, disposição para fazer e

desfazer, reescrever, apagar, encontrar a palavra precisa, a expressão correta, até que o texto venha à luz, pronto para ser lido e julgado. Não se escreve do nada. É preciso planejar, pesquisar, organizar, refletir, ler e reler o escrito, até que este soe coerente e capaz de convencer o leitor, como afirma Calkins (1989, p. 29):

Muitos estudantes [...] acreditam que escrever um ensaio é sentar-se à escrivaninha, pegar uma caneta e, então, escrever uma idéia central seguida por três parágrafos de apoio [...] Estão utilizando uma estratégia errônea para escrever. Não se dão conta de que somente através da reflexão, rascunho, revisão, comunicação com outras pessoas e, às vezes, mais reflexão ainda, a maioria dos escritores consegue saber o que pretende dizer.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa (BRASIL, 1997) também fazem menção a isso, sugerindo a discussão em sala de aula de certas fantasias existentes em torno dos grandes escritores, como a facilidade que eles teriam de redigir. O documento alerta para o fato de que, quando pronto, o texto não deixa traços do caminho percorrido para sua produção. Entretanto, é de suma importância mostrar aos alunos que escrever não é fácil para ninguém, nem para aqueles que estão acostumados a essa gratificante tarefa.

Escrever é um ato consciente e direcionado: as palavras não virão num momento

divino de inspiração. De acordo com Villegas (1999 apud OLIVEIRA; SISTO, 2005), a

atividade escrita exige um processo cognitivo de elaboração, coordenação e integração. Para Sawyer (2006), o mito romântico de que o escritor não precisa suar para escrever foi, em muitos momentos históricos, alimentado pelos próprios escritores; porém, recentes pesquisas mostram que todo bom escritor tem um objetivo que precisa ser buscado, e um bom livro pode levar anos para ser finalizado.

Portanto, mais que o conhecimento de técnicas para uma boa escrita, é preciso ter uma finalidade a ser alcançada, conforme afirma Calkins (1989, p. 27):

Os escritores não começam uma peça, como muitos currículos sugerem, dizendo: “eu quero escrever um ensaio persuasivo de três parágrafos”. Eles começam, em vez disso, com algo a dizer: “Preciso convencer as pessoas a tomar cuidado com os perigos do sal em demasia”, ou “Quero explorar o relacionamento entre as habilidades de leitura crítica e a revisão literária.”

Escrever é uma atividade colaborativa e socialmente construída: ninguém escreve

(23)

O ato de escrever integra diferentes processos: físicos, linguísticos, cognitivos e também sociais e afetivos, em diferentes níveis, de acordo com a idade do escrevente, sua experiência e propósitos. O intuito do escritor é mostrar que se pensa uma ideia elaborada progressivamente, e como se pensa, demonstrando o desenvolvimento de um raciocínio. Pode-se dizer, portanto, que não é possível a existência de um discurso construído sem uma base lógica (MEADOWS, 1990; OLIVEIRA; SISTO, 2005).

Lin (1998 apud CHEUNG, TSE e TSANG, 2003), descreve uma ligação integral entre criatividade e escrita, baseado no pressuposto de que a escrita é um elemento de manifestação da criatividade. Para ele, o processo de preparação da escrita (planejamento, revisão, organização, objetivo) pode ser visto como um meio primário de fomento à criatividade dos estudantes, uma vez que contribui para a geração de ideias.

1.5. Um pouco do conceito de criatividade

Criatividade, consensualmente, refere-se à capacidade humana de produzir algo simultaneamente novo e de valor em algum aspecto e grau (ALENCAR; FLEITH, 2003; MITJÁNS MARTÍNEZ, 2002; NEVES-PEREIRA, 2007). Contudo, julgar a criatividade alheia por esse prisma pode ser bastante comprometedor, pois o novo pode também ser algo reciclado; uma apropriação do velho para dar-lhe distinto e inusitado significado. Seria ilusório acreditar na existência de um discurso totalmente original e exigir isso do aluno, já que os discursos são construídos a partir de outros já existentes (MELO, 2004; VAL, 2004).

(24)

De acordo com Madrid Vivar (2006), as características da personalidade associadas à criatividade nos primeiros anos de vida são o inconformismo, a coragem para correr riscos e a motivação interna, gerada pela curiosidade. Quase todas as crianças possuem estes predicados, o que pode ser interpretado como um indicador de que todas as crianças têm um potencial criativo. Esta é uma razão importante para animar os educadores a trabalhar com o desenvolvimento dessa capacidade. Além disso, existe outro argumento decisivo: a plasticidade cerebral dos primeiros anos de vida.

Segundo essa autora, até metade do século XX, os cientistas acreditavam que o cérebro crescia de acordo com um padrão imutável, determinado geneticamente. Agora, sabe-se que o cérebro pode ser moldado mediante a experiência, sobretudo durante os primeiros anos de vida, quando cresce mais rapidamente. A riqueza de nossa diversidade genética coloca um criador dentro de cada um de nossos cérebros; sabe-se, contudo, que essa criatividade recebe influência de diversos fatores, sejam eles ambientais, sociais, pessoais ou situacionais, o que leva a crer que o desenvolvimento e a expressão da criatividade ultrapassam a dimensão individual.

Tanto Mitjáns Martínez (2002), quanto Wechsler (2002) concordam que essa capacidade é um processo plurideterminado, ou seja, mediatizado por diversos fatores: econômicos, socioculturais, conjunturais e subjetivos, e que, muitas vezes, a banalização do próprio conceito de criatividade cria barreiras para um trabalho positivo no sentido de alcançar resultados satisfatórios; limitar a criatividade ao meio artístico é uma delas, como bem afirma Franchi (2008, p. 47):

[A criatividade] Não tem, enquanto processo, um domínio privilegiado: está nas artes, nas ciências, nas várias formas de representação e organização das experiências, na seleção dos materiais ou dos instrumentos adequados ao trabalho e aos propósitos que lhes atribuímos. Está onde se dão possibilidades de opção, mesmo a de optar pela opção dos outros.

As características subjetivas que compõem a expressão criativa do indivíduo são constituídas e desenvolvidas no decorrer de sua existência em derivação das conexões que este tem com os diferentes contextos sociais de ações e relações, conforme assevera Franchi (2008, p.45): “Criatividade é, pois, mais que um elo entre o conhecimento e a arte. Liga-os à própria vida e à ação do homem sobre o mundo. Mais que elo entre diversas atividades e projetos, é condição deles.”

(25)

Os alunos mais criativos apresentam maneiras de pensar e agir diferentes dos demais; contudo, esse estilo diferenciado nem sempre é reconhecido pelos professores em sala de aula. Assim, estudantes criativos são geralmente castigados pelo sistema tradicional de ensino que valoriza o pensamento convergente, ou seja, aquele que busca um modelo, uma única resposta certa, além de apreciar os alunos mais quietos, e, de preferência, obedientes e bem educados (ALENCAR, FLEITH, 2003, WECHSLER, 2002). Sobre isso, afirma Franchi (2008, p. 41): “O ideal não é um aluno passivo e recipiente, mas ativo e interferente: o conhecimento tem que resultar de um processo de construção conduzido pelo próprio sujeito.”

1.6. O papel da escola e do professor no desenvolvimento do potencial criativo

De acordo com Paulo Freire (1996), é a curiosidade que move a busca. Sem ela não se aprende nem se pode ensinar. O professor autoritário, que dificulta ou inibe a curiosidade do educando não está ensinando, mas domesticando seus alunos, fazendo com que eles memorizem, mas sem aprender. Para esse autor, somente é possível crescer e aprender na diferença e no respeito a ela, por isso afirma que ensinar é respeitar a autonomia do ser do educando:

O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem [...] o professor que ironiza o aluno, que minimiza [...] ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima [...] afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu direito de estar sendo curioso e inquieto. (p. 35)

Alves e Dimenstein (2003) concordam com esse ponto de vista, e advertem que os alunos aparentemente indisciplinados podem estar, na verdade, buscando uma disciplina interna, pois muitas vezes este aluno, considerado licencioso e com dificuldades de concentração, passa horas imerso em outras atividades consideradas por ele mais interessantes, como praticar esportes, fazer algum trabalho manual, tocar um instrumento. A partir do momento que o jovem tem um envolvimento real, não é preciso pedir ou exigir que tenha disciplina para lidar com o objeto de seu interesse; porém, quando se faz necessária a imposição da disciplina, é porque há algo errado na relação com o objeto. Para esses autores, a escola só pode dar certo se for lugar de experimentação, e o bom professor é aquele que atua como um gestor de experiências e de curiosidade. Se ele não for um experimentador e não tiver o prazer da incógnita, jamais conseguirá transmitir isso aos seus alunos.

(26)

Duas razões básicas levam à necessidade de investir no desenvolvimento da capacidade criativa dos alunos: primeiro, a demanda cada vez maior de pessoas criativas, flexíveis, abertas a mudanças e dispostas a acompanhar as rápidas transformações pelas quais passa a sociedade atual; segundo, porque é sabido o quanto a criatividade pode ser benéfica para a saúde e o bem-estar emocional das pessoas. Essa concepção tem estreita relação com a ideia emergente de que a escola pode e deve ser um espaço de promoção de saúde, para o qual o desenvolvimento da criatividade contribui de forma expressiva. Devido a essa constatação, vários educadores têm destacado a importância da necessidade de se promover na escola um ambiente favorável ao desenvolvimento e expressão da capacidade inventiva (ALENCAR, 2002, 2007, 2009; CASTANHO, 2002; DE LA TORRE, 2006b; MITJÁNS MARTÍNEZ, 2002, 2006; WECHSLER, 2002).

Alencar (2002), assim como Parnes (1985 apud CHEUNG, TSÉ e TSANG, 2003), enfatizam o valor do docente no favorecimento da criatividade, ressaltando que é de fundamental importância que esse profissional tenha amor e entusiasmo pelo seu trabalho, que seja flexível e tolerante diante de diferentes opiniões. Esses autores caracterizam o professor propiciador da expressão criativa como aquele que, entre outros procedimentos: considera os questionamentos e opiniões dos estudantes; faz perguntas desafiadoras; reconhece as ideias singulares dos alunos e os convence da qualidade de seu talento criativo; incentiva a independência, a autoconfiança, a persistência, a motivação, a curiosidade e ajuda os alunos a lidarem com a frustração e o fracasso, de tal forma que tenham coragem de experimentar coisas novas e de encarar tarefas difíceis.

Também Freire (1996, p. 52) sublinha que é a curiosidade que inquieta, que estimula a pergunta e a reflexão crítica sobre a própria pergunta. Para ele, o bom professor é aquele que concede ao aluno o direito à curiosidade e ao questionamento:

Com a curiosidade domesticada, posso alcançar a memorização mecânica do perfil deste ou daquele objeto, mas não o aprendizado real ou o conhecimento cabal do objeto. A construção ou produção do conhecimento do objeto implica o exercício da curiosidade, sua capacidade crítica de ‘tomar distância’ do objeto, de observá-lo, de delimitá-lo de cindi-lo, de ‘cercar’ o objeto ou fazer sua aproximação metódica, sua capacidade de comparar, de perguntar.

(27)

A solução inovadora de problemas, a capacidade de problematizar a informação recebida, as perguntas interessantes, a elaboração própria do conhecimento, a curiosidade, o estabelecimento de relações, às vezes remotas, mas pertinentes, são formas de expressão de criatividade que devem e podem ser estimuladas no contexto escolar. As atitudes e ações criativas no processo de produção de conhecimento constituem a base para a capacidade de aprender a aprender, tão valorizada hoje como competência profissional e consequentemente como um objetivo educativo importante. (p. 192)

Desenvolver a criatividade nos alunos pressupõe, portanto, não só estimular sua expressão criativa, mas também auxiliar no desenvolvimento dos traços pessoais que concorrem para torná-la possível. Assim, segundo essa autora, é papel do professor e da escola, entre outros: estabelecer um clima emocionalmente positivo e motivador na relação professor-aluno; ter respeito à individualidade; valorizar o esforço e realizações originais; e incentivar o processo de busca de alternativas, sem censurar os erros.

Além disso, é importante que a escola procure identificar e neutralizar possíveis barreiras à criatividade. Ao mesmo tempo, busque também favorecer os pontos fortes que a instituição possui no que diz respeito a elementos que contribuem para a elevação dos níveis de criatividade, propiciando um ambiente oportuno à utilização intencional de estratégias sistêmicas que levarão a movimentos qualitativos nesse sentido. Essas ideias são corroboradas por Wechsler (2002), para quem o ensino criativo não só pode como deve ser utilizado para todos os tipos de alunos, trazendo benefícios tanto para o seu pensamento e produção acadêmica, como também lhes mostrando maneiras mais criativas de utilizar o seu conhecimento e sua prática. Entretanto, para essa autora, é preciso que o professor reconheça suas próprias limitações e tenha interesse em buscar uma maneira mais adequada de ensinar:

[...] o grande desafio para uma escola mais criativa é despertar professores para as suas dificuldades nas formas de ensinar, quer seja para alunos regulares, portadores de deficiência ou ainda pertencentes a diferentes segmentos raciais. Na maioria das vezes, os docentes não reconhecem ou não querem ver a inadequação de suas estratégias de ensino e possuem uma percepção distorcida quanto à sua própria docência. (p. 185)

(28)

1.7. Atmosferas criativas

Atualmente percebe-se que a criatividade pode vir a ser uma das principais disciplinas do futuro, embora sua investigação e experiências práticas sejam recentes se comparadas com outros campos de estudo. Um grande desafio para os próximos anos será criar um corpo teórico-metodológico que auxilie a descoberta de novas ideias e melhores vias para solucionar problemas. Para isso, é preciso favorecer a existência do que Betancourt Morejón (2006) chama de Atmosferas Criativas, um conjunto de atitudes capazes de modificar o ambiente

escolar, tornando-o propício à criatividade.

De La Torre (2006a) explica, de forma metafórica, a importância do meio e da troca na construção de atmosferas criativas: quando estão perto de outras árvores da mesma espécie, as laranjeiras produzem mais, pois a polinização favorece o desenvolvimento e o crescimento dos frutos. Quando isoladas, a escassa ou nula polinização por parte da espécie empobrece a produção. Portanto, se queremos que a criatividade seja um elemento substantivo na formação de futuros cidadãos desde a infância, é preciso polinizá-los em todos os parâmetros do processo criativo.

Converter a sala de aula em um lugar criativo implica, neste início de século, que o educador seja um excelente facilitador de processos grupais, assim como uma boa ponte entre o conhecimento que tem o aluno e o que deseja alcançar. Apresentamos, a seguir, alguns princípios que podem ajudar a criar um ambiente criativo em sala de aula, de acordo com diversos estudiosos (ALENCAR, 2007; AMABILE, 1999; BETANCOURT MOREJÓN, 2006; DE LA TORRE, 2006a; NAKANO; WECHSLER, 2007; NEVES-PEREIRA, 2007; WECHSLER, 2002):

• Deve-se valorizar a criatividade não só através do produto, como também do processo. Ambos têm igual importância e não se pode apreciar um em detrimento do outro.

• Em sala de aula é importante proporcionar um clima onde aconteça o casamento entre os afetos e o intelecto, de tal forma que ocorra um espaço dinâmico e motivador para o bem pensar e criar.

(29)

• Uma atmosfera criativa deve estar associada a valores humanos; deve-se apreciar e favorecer atitudes como: responsabilidade social, fraternidade, tolerância, respeito aos demais, humildade, perseverança, fortaleza, justiça e prudência, entre outros. Há de estimular sem doutrinamento, sem imposição.

• As condições materiais são um elemento importante para criar uma atmosfera criativa. O desenho do espaço, a iluminação, a ventilação, a disposição das cadeiras, o tamanho do local, os materiais disponíveis para utilização. Entretanto, nenhum deles, por si só, satisfaz a todos os requisitos necessários para uma atmosfera criativa.

• O clima criativo deve favorecer o humor, sendo o riso sua melhor expressão. É importante não inibir essa manifestação, que relaxa, elimina tensões e é indicador importante de um ambiente psicológico positivo e cultivador do pensamento e atitude criativos.

• Um elemento chave para um clima criativo é fomentar não só o trabalho individual como também o grupal. Quanto mais heterogêneos forem os grupos, melhor, pois através da cooperação, seus integrantes, procedentes de diferentes contextos, trocam experiências e interesses.

• Um ambiente propício à criatividade não se reduz simplesmente à capacidade de relacionar elementos de uma maneira nova, mas de transformá-los e comunicá-los de uma maneira diferente.

Em um clima criativo são aprendidas novas formas de comunicação com as pessoas e consigo mesmo. Aprende-se a se colocar no lugar do outro, escutá-lo e olhá-lo com respeito, comprometer-se com suas ideias e permitir que ele se intrometa nas nossas. Aprende-se a tolerar o diferente e enriquecer com a diversidade, compartilhando fortalezas e limitações, sonhos e obstáculos.

Para manter as Atmosferas Criativas é preciso evitar que elas sejam contaminadas pelo

(30)

Em nível pessoal (associados ao inconsciente):

• medos e traumas acumulados ao longo da existência, que geram um estado emocional e mental inibitório, limitando todas as possibilidades de pensamento e ação livres;

• estar sujeitos a dogmas impostos, obedecendo sem questionar, por medo do castigo;

• ser escravos da rotina e de fórmulas paralisadas no tempo; e

• possuir estereótipos e pré-julgamentos eternamente invariáveis, entre outros.

Em nível social (associados à consciência racional e social):

• não aproveitar os melhores recursos e as melhores ocasiões;

• ter excesso de trabalho administrativo;

• ver como ameaças aquelas ideias ou pessoas que desafiam os paradigmas;

• cumprir apenas com o esperado;

• seguir, sem reflexão, as normas estabelecidas; e

• ter medo da sanção e necessidade exagerada de referendo ou aprovação.

Para Betancourt Morejón (2006), atender aos procedimentos e protocolos de atuação social e profissional esperados constitui uma forma profunda de socialização que dificulta o experimento e a exploração de outras possibilidades que não estão estabelecidas no contexto social. Além disso, o hábito de estimular a criatividade nos resultados e não nos processos impede que a iniciativa, o ensaio e o erro sejam vistos como positivos e indispensáveis a todo e qualquer processo criativo.

1.8. Criatividade na formação de professores

(31)

Há a inclinação em pensar que a criatividade de professores pode e deve ser incentivada apenas por meio de programas, cursos e encontros. Na prática, esse tem sido o meio mais utilizado para a busca do desenvolvimento da criatividade, porém, de acordo com Mitjáns Martínez (2002), há outras estratégias que devem ser consideradas, sendo uma delas a necessidade de incentivar a criatividade dos professores no período de sua formação, não apenas por meio de uma disciplina de criatividade, mas também através de um sistema de ensino-aprendizagem criativo, em que os futuros profissionais possam experimentar o que posteriormente poderão fazer como professores:

Assumir a criatividade e a inovação como objetivos, valores e metas organizacionais; reconhecer, valorizar e premiar a expressão criativa de professores, alunos e membros da instituição escolar; e favorecer um sistema de relações interpessoais de franqueza e diálogo onde se aceite a diversidade e se trate de potenciar o melhor de cada pessoa são algumas das formas pelas quais a cultura e o clima organizacional podem contribuir para o desenvolvimento da criatividade e da inovação. (p. 203)

Diversos estudos (HERREIRA, 2000; OLIVEIRA; ALENCAR, 2007; RIBEIRO; FLEITH, 2007; SOUZA; ALENCAR, 2006) apontam a necessidade da implementação de disciplina relacionada à criatividade em cursos de formação de professores, pois embora reconhecendo a importância da criatividade para uma boa aula, muitos educadores sentem dificuldade em programar estratégias criativas em sala.

Em pesquisa realizada com professores do curso de Letras de instituições particulares e públicas de Brasília – DF, Oliveira e Alencar (2007) verificaram que há, nesse curso, ausência de informação a respeito de criatividade e como esta pode ser desenvolvida nos alunos. Essa carência foi constatada na formação dos professores entrevistados e consequentemente na formação de seus alunos, pois se torna difícil formar professores criativos quando não se tem informações e ferramentas que levem a atitudes criativas. Nessa pesquisa, constatou-se que não havia uma disciplina específica sobre criatividade no currículo do Curso de Letras. Os professores entrevistados, apesar de acreditarem na importância da criatividade, apontaram várias barreiras à promoção da capacidade criadora de seus alunos em sala de aula, não sabendo como desenvolvê-la eficazmente.

(32)

explorado no currículo. Os dados indicaram que os professores entendem o valor da promoção à criatividade, porém apresentam dificuldade em adotar táticas de ensino que favoreçam o desenvolvimento desse atributo nos alunos.

Mesma constatação foi feita por Ribeiro e Fleith (2007), em estudo cujo objetivo foi o de investigar o estímulo à criatividade em cursos de licenciatura. Essas pesquisadoras sinalizaram que, sem dúvida, há a necessidade de se reestruturar o currículo de cursos de licenciatura de modo a incluir a criatividade como um instrumento de trabalho imprescindível para a formação docente. Não sendo a criatividade valorizada nesses cursos, dificilmente será praticada pelos novos profissionais que irão atuar em sala de aula, seja no ensino básico, médio ou superior.

Dentro da linha de produção textual, Herreira (2000), em pesquisa realizada com professores, gestores e alunos de quatro escolas públicas da região oeste do Paraná, apresenta uma visão panorâmica da prática de produção de textos no ensino fundamental e médio, desde a motivação até a avaliação. Nesse estudo, a falta de criatividade e técnicas do professor foi mencionada por 66% dos entrevistados como um dos principais fatores que prejudicam a produção de textos na escola. Segundo essa pesquisadora, faz-se necessário formar profissionais dotados de espírito inventivo, capazes de criar coisas novas, que procurem fugir da rotina da sala de aula e que, com entusiasmo, consigam aproveitar todas as oportunidades de encantar o aluno mesmo com as coisas mais simples, uma vez que a criatividade não é dispendiosa; ela tem a ver com imaginação, com inovação, com transformação, com gosto pelo que faz.

Embora os próprios professores admitam que a falta de técnica e criatividade seja uma falha real, apurou-se, na mencionada pesquisa, que quando se coloca em prática a atividade de produção de textos, observa-se grande dificuldade por parte da maioria dos educadores em aplicar tanto as técnicas quanto a criatividade nesse exercício. Estes, na maioria das vezes, apegam-se a técnicas obsoletas, pouco atrativas, sem aproveitamento, fazendo com que os alunos acabem criando aversão pela escrita.

(33)

Não ignoramos os inúmeros problemas que sempre assolaram e ainda assolam o sistema educacional, mas acreditamos que, com criatividade, muitos deles podem ser minimizados. De acordo com Neves-Pereira (2007), não há no Brasil uma preocupação com a formação de professores, no sentido de prepará-los para a interposição de um ensino criativo, pois diante de tantas outras demandas educacionais mais urgentes, a criatividade parece algo supérfluo. Entretanto, quem pesquisa a criatividade no contexto educacional sabe do valor desse tema para o desenvolvimento humano e cultural de uma sociedade.

Por outro lado, sabe-se também que, repetidas vezes, a própria necessidade faz surgir soluções criativas para muitos problemas. Conforme afirma Garcés Blásquez (2011), foram as privações e carências, unidas ao fascínio da curiosidade e do incômodo que, em vários momentos históricos, impulsionaram grandes criações. Também Kohánkyi (2005), em estudo feito com escritores de sucesso, ouviu destes, relatos de falta de proteção e até abusos na infância. Essa negligência por parte de quem os devia proteger, fez com que se refugiassem num mundo imaginário, tornando-se grandes criadores de histórias.

Igualmente, Saturnino de La Torre (2006b) afirma que há sinais incontestáveis da existência de um potencial criativo que emerge de situações de adversidade pessoal, institucional ou social. Essa capacidade de criar, apesar da dificuldade ou até mesmo por causa dela, é chamada por esse pesquisador de criatividade paradoxal, uma vez que não é fruto da habilidade consciente

de resolução de problemas, mas, sim, uma consequência de acontecimentos adversos ou de uma necessidade; paradoxal porque essa energia transformadora que existe em cada um não surge da abundância, mas da adversidade. Ela vem acompanhada de consciência da situação, energia emocional e superação, que ajuda a transformar-se e transformar o meio de forma positiva. Portanto, a criatividade tanto pode surgir devido a estímulos e apoio quanto pode surgir na falta destes, como compensação a uma situação insustentável.

Da mesma forma, para Mitjáns Martínez (2006), a criatividade e a necessidade possuem estreita relação, tendo as mudanças, em geral, uma origem na necessidade. Ocorre que, para alguns, situações tidas como adversas são molas propulsoras para a criatividade; para outros, entretanto, são barreiras que impedem a emergência no trabalho profissional.

1.9. Desenvolvendo a escrita criativa

(34)

próprios alunos. Também precisa compreender que as turmas são diferentes umas das outras, e que uma estratégia funciona bem com uma, mas não dá bons resultados com as demais. Diante disso, gostaríamos de mostrar resultados de alguns estudos feitos na área de produção textual e registrar a importância de pequenas mudanças de atitudes, mais do que oferecer fórmulas para trabalhar com textos.

Escrever se aprende escrevendo: a literatura tem nos mostrado que é possível, sim,

fazer um trabalho significativo de produção textual em sala de aula. Contudo, é necessário ter em mente que a escrita requer um ritmo diverso do que normalmente é utilizado nas escolas, pois quem escreve precisa de tempo para esboçar e revisar, compartilhar seus textos com outros, trocar ideias, conforme afirma Calkins (1989, p. 36):

Um esforço prolongado e a persistência são essenciais, para a boa escrita; ainda assim, essas características são contrárias à maneira de nossas escolas modernas. Vivemos em uma sociedade sem tempo para ensaios e rascunhos, uma terra de alimentos instantâneos, lâminas de barbear descartáveis e sapatos de plásticos. Selecionamos soluções ‘rápidas’ e fáceis, porém efêmeras. Nossa sociedade deixa pouco tempo para o esforço prolongado, para que se saiba o que é fazer o melhor e fazer esse ‘melhor’ com maior perfeição [...]

Uma coisa é certa, e quanto a isso há unanimidade: não é possível ensinar a escrita sem a prática constante do exercício da escrita (CALKINS, 1989; CONDEMARÍN; CHADWICK, 1987; CUNHA; SANTOS, 2005; FRANCHI, 2008; POSSENTI, 1996, 2008). Neste sentido, sinaliza Calkins (1989, p. 38):

[...] é quase impossível criar-se uma oficina de escrita efetiva, se os estudantes escrevem somente uma ou duas vezes por semana. [...] É como qualquer esporte [...] se você praticar esta modalidade de esporte todos os dias, sua prática se tornará cada vez mais fácil; você encontrará seu próprio passo, entrará em um ritmo. A mesma coisa pode ser dita quanto à escrita [...]

Segundo essa autora, o estabelecimento de um período para a escrita é importante porque permite que os alunos assumam controle sobre seus próprios processos. Quando existe uma rotina de escrita em sala de aula e os alunos sabem disso, eles se preparam para o trabalho, podendo se planejar, desenvolver estratégias, pensar no que vão escrever, pesquisar sobre o assunto a ser tratado. Porém, se os horários para a oficina estão sempre mudando, ou se existem apenas para tapar algum buraco na agenda escolar, os estudantes permanecem inertes à espera da vontade do professor. Assim, sem planejamento, não há assunto que possa ser tratado com profundidade ou criatividade.

O mito da cobertura: outro ponto importante que contribui negativamente para o efeito

(35)

praticamente impossível dentro do espaço de tempo destinado a cada disciplina. Assim, considerando que o tempo é o nosso recurso mais escasso, em vez de tentar abarcar tudo sobre algum assunto, o mais sensato é que olhemos para nosso currículo escolar e analisemos o que de fato é necessário dentro dele.

Possenti (1996) corrobora a ideia da autora, e acrescenta que devemos ensinar aos alunos apenas o que eles não sabem. Para esse autor, muito tempo é perdido com o ensino do óbvio, de conteúdos que os alunos já dominam, por serem falantes da língua, citando como exemplo o estudo de gênero, número, grau e estruturas simples de frases. Em sua opinião, esse tempo poderia ser destinado ao estudo de conteúdos mais úteis, como ler, escrever, discutir, reescrever, afinal, “não se aprende por exercícios, mas por práticas significativas”. (p. 46)

Mudando o foco do produto para o processo: para o incremento da qualidade das

produções textuais, alguns estudiosos (CALKINS, 1989; CONDEMARÍN; CHADWICK, 1987; GERALDI; FONSECA, 2006; GIL NETO, 1993; GURGEL; BREDA, 2009; RATIER, 2009) propõem a mudança do produto para o processo, lembrando que muitas crianças tendem a desanimar rapidamente quando suas primeiras tentativas de escrita são devolvidas apenas com as indicações de erros ortográficos e gramaticais.

Antes, há não muito tempo, a escrita não era ensinada, mas exigida e depois corrigida. O foco estava na categorização dos produtos escritos: os professores relacionavam as características dos principais tipos de texto (narração, descrição e dissertação) e mostravam exemplos de cada um deles. Nessa abordagem antiga, a ênfase estava no produto final, não no processo que levava até ele. Os alunos não aprendiam a levar em consideração quem seriam seus leitores, por isso a ausência de uma reflexão sobre uma estratégia de colocar as ideias no papel. É imprescindível, portanto, que antes de escrever o aluno saiba a finalidade de seu texto, a quem ele se dirige, o meio de veiculação do mesmo e tenham em mente sua intenção comunicativa, para convencer o leitor.

Imagem

Tabela 1 – Síntese dos dados dos professores entrevistados
Tabela 2 – Frequência com que são solicitadas produções escritas e justificativas

Referências

Documentos relacionados

• Qualquer campo não válido que tenha sido incorretamente invalidado pela entidade de validação (Agrupamento de Escolas ou Escola Não Agrupada), constante da lista

Além disso, se quiser trazer um clima ainda mais descontraído, pode optar por tintas que transformam a parede em lousa - uma ótima opção para quem gosta de desenhar e que também

 Coñecer e empregar axeitadamente os elementos básicos da linguaxe musical necesarios para a correcta interpretación de partituras e comentario de audicións (compases

▪ Ex.: O sistema de projeção UTM apresenta um sistema de coordenadas métrico, cartesiano com origem no Equador para coordenadas N (norte = lat) e o meridiano central de cada zona,

Nos trabalhos de Moura, Oliveira e Leão (2007) e de Oliveira e Decanini (2002) também são discutidas as questões sobre semiologia gráfica e percepção visual, no qual o primeiro

O RC de Brasília Norte teve convidados: Hugo Batista, pai do Companheiro Sergio; Odete, esposa do Companheiro Machado; Lia Bazzo, esposa do Companheiro Humberto; Helena

A proposta desse artigo é entender as formas de resistência das mulheres que fazem parte do Movimento Social Aprendizes de Sabedoria (MASA), formado por Benzedeiras e

206 “Cardeal analisa documento sobre a situação Nacional”. 207 Carta Excelência Reverendíssima. Disponível no Arquivo LEV/ UCSAL, pasta assuntos referentes a títulos e