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O modelo participativo na construção do saber científico em atividade de ensino-aprendizagem prática

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Academic year: 2021

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Publicação

Anhanguera Educacional Ltda. Coordenação

Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Correspondência

Sistema Anhanguera de Revistas Eletrônicas - SARE rc.ipade@anhanguera.com

REVISTA DE EDUCAÇÃO

PALAVRAS-CHAVE: Modelo participativo; dramatização; construção da aprendizagem KEYWORDS:

participative model, dramatization, construction of the apprenticeship

Artigo Original

Recebido em: 22/12/2010 Avaliado em: 14/09/2011 Publicado em: 09/05/2014

RESUMO: Buscando a participação interativa na construção da aprendizagem e aproveitando os conhecimentos advindos das realidades sociais, a dramatização foi escolhida como estratégia de ensino-aprendizagem em grupo em uma aula prática do curso de Enfermagem de uma Instituição de Ensino Superior privada, no município de Bauru-SP. Participaram 64 alunos, distribuídos, igualitariamente, nos período diurno e noturno, em quatro grupos de oito participantes, criando-se grupos específicos para realizar a dramatização durante 15 minutos, sobre o tema “Interação do Enfermeiro com o usuário do serviço de saúde e sua família”. Resultados: as cenas retrataram tratamento humanizado e não humanizado no atendimento, onde os alunos identificaram-se com as situações expostas e participaram da construção da aprendizagem, aproveitando princípios e conceitos oferecidos pelo grupo, de forma criativa, mostrando que o aprendizado não significa a transmissão vertical de conhecimentos e sim uma interação educativa e democrática entre professor – alunos e entre os alunos.

ABSTRACT: Looking for the interactive participation in the construction of the apprenticeship and using them knowledge resulted from the social reality, the dramatization was chosen as a teaching-apprenticeship strategy in groups during a practical classroom of a Nursing course in a private Institution of Superior Teaching, at Bauru-SP. There were 64 students, equally distributed, in the daytime and nighttime periods, in four groups of eight participants, when specific groups are created to carry out the dramatization during 15 minutes, on the subject “Interaction of the Nurse with the user of the service of health and his family”. Resulted: the scenes showed humanized and not humanized treatment in such service; the students identified themselves with the exposed situations and participated on the apprenticeship construction; showing that the apprenticeship does not mean the vertical transmission of knowledge but an educative and democratic interaction between teacher – students and between the students.

O MODELO PARTICIPATIVO NA CONSTRUÇÃO DO

SABER CIENTÍFICO EM ATIVIDADE DE ENSINO

Patrícia Ribeiro Mattar Damiance, Patrícia Soares Baltazar Bodoni, José Roberto Magalhães Bastos - Faculdade de Odontologia de Bauru

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1. INTRODUÇÃO

A educação, através de seus processos educativos, é a base para a formação do ser humano e deve ser fundamentada no indivíduo e em sua vida na sociedade. O processo educativo influi sobre a ação cotidiana dos indivíduos e na dinâmica destes na construção da realidade social.

Educar não deve significar somente a transmissão de conhecimentos por meio de processos de ensino-aprendizagem calcados em valores políticos, sociais, econômicos e culturais de um dado momento histórico e institucional, ou seja, não deve significar a simples reprodução de um modelo vigente. Deve ser fundamentado em um processo de ensino– aprendizagem interativo, no qual o estudante participe ativamente e que, principalmente, gere mudanças em si mesmo e na sociedade.

Partindo desses pressupostos, este estudo pretende que os participantes do processo educativo (professor– alunos) habituem-se ao ensino democrático, descentralizado, ao aprendizado e ao trabalho em grupo, desenvolvendo a consciência crítica e a responsabilidade social. Baseia-se na concepção pedagógica de que o aluno é sujeito ativo e participativo no processo de ensino-aprendizagem, que traz na bagagem conhecimento prévio que deve ser considerado nesse processo, e que as condições de ensino devem buscar a promoção do aprender a aprender, aprender a fazer, a ser e a conviver.

Nessa concepção, o professor é desafiado a orientar e facilitar o processo de ensino-aprendizagem mediando à relação entre o sujeito que aprende e o objeto a ser apreendido.

Faz-se necessário ter o desenvolvimento interpessoal como parte dos objetivos acadêmicos, principalmente naquelas áreas cuja atuação depende criticamente da qualidade das relações profissional-cliente, como na Enfermagem.

As atividades para o desenvolvimento interpessoal devem propiciar transformações e mudanças de atitudes: sejam elas de ordens raciais, de classe econômica, entre outras, uma vez que a diversidade faz parte da sociedade.

O objetivo de formar profissionais de saúde generalistas, com visão crítica, reflexiva e contextualizada de sua prática profissional, buscando enfatizar na formação aspectos de ética, humanismo, cidadania, trabalho multiprofissional e atuação na comunidade, faz parte das diretrizes nacionais curriculares dos cursos de graduação em saúde no Brasil e é importante, quando se fala em formação, ter isso sempre presente, principalmente quando se pretende que o enfermeiro (a) possa participar de modo ativo no planejamento, execução e avaliação das atividades assistenciais.

Os cursos de formação não atendem ao modelo de atenção proposto pelo SUS – “o modelo de atenção ainda hoje é centrado na doença, no privado, no hospital e em um único profissional e as universidades (formaram) e formam profissionais que possam se inserir nesse sistema...”. (HADDAD, 2009).

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Segundo Gomes et al. (2008), a educação na área da saúde deve ser entendida como um processo sistemático, interativo, de caráter individual e coletivo (relacionado a comunidades e sociedade em geral), cujos objetivos são aliar estrutura cognitiva e patrimônio cultural coletivo, conhecimentos e significados.

Leão et al. (2006, p. 177), diz que “o processo ensino – aprendizagem tem de ser compreendido como estrutura fundamental do processo educacional trazendo como seu resultado: satisfação dos alunos, alto rendimento cognitivo e desenvolvimento humano”.

No Brasil, a grande maioria das instituições universitárias adota a metodologia tradicional como modelo pedagógico, alicerçada na aula expositiva e na pouca participação do aluno. Este recebe e memoriza os conteúdos, sem refletir ou questionar o que lhe é transmitido. Assim, torna-se extremamente trabalhoso para o estudante a inversão de papéis, a construção do conhecimento e a articulação teoria e prática. O professor deve elucidar ao estudante os ganhos pessoais e técnico-científicos do ensino participativo: habilidades sociais, raciocínio lógico e crítico, estabelecimento de relações entre o saber científico e o fazer (SCHERER; SCHERER; CARVALHO, 2006).

O ensino no modelo participativo sugere mudanças nos métodos e nas técnicas do ensino tradicional, que se baseiam na transmissão de conhecimentos e na individualização das tarefas de aprendizagem.

Freire (2003) enfatiza que transferir conhecimentos mecanicamente não é ensinar. A construção do ensinar crítico-reflexivo e participativo inicia-se na significação crítica do ato de ensinar e no do aprender, pois para ele, “não existe ensinar sem aprender” e “o ensinante aprende primeiro a ensinar, mas aprende a ensinar algo que é reapreendido por estar sendo ensinado.” (p. 28).

O educador desafia o ensinante à busca diária de um fazer diferente no ato de ensinar, envolvendo a aprendizagem anterior do aprendiz, buscando a síntese entre o saber do senso comum e do saber sistemático, da prática e da teoria, da linguagem simples e da linguagem científica, para possibilitar a leitura e compreensão crítica do texto e do contexto (FREIRE, 2003).

Nas palavras de Menezes: “Ensinar é garantir que os conhecimentos façam um sentido amplo para todos os estudantes, em sua vida para além das salas de aula, ou seja, para que possam, efetivamente, construir e promover cultura” (MENEZES, 2009, p. 134).

Ferreira e Ramos (2006) ressaltam a importância dos contextos e conflitos das vivências e convivências coletivas e profissionais como “pano de fundo” do ensino e da aprendizagem da ética, como opção a métodos e estratégias de ensino de transmissão de normas e valores aos alunos. Com dados de realidade, professor e alunos dialogam e a relação ensino-aprendizagem se dá de maneira mais eficaz.

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Luckesi (1996) afirma que a educação reproduz o vigente na sociedade, mas também a renova, e que o desenvolvimento do educando deve contemplar diversas peculiaridades próprias do ser humano, levando-o à formação de crenças afetivas, políticas e sociais. O autor alerta sobre qual cidadão que se quer formar.

Hannoun (1998) também reflete sobre o papel do educador na construção do futuro e sua pretensão em criar o homem de acordo com suas próprias crenças, questionando se esta “criação do homem pelo homem” estará à altura do criador. Aborda essa indagação sobre três perspectivas: 1) na prática da educação, considerando os aspectos bioafetivos, sociológicos, psicológicos, psicossociológicos, na relação educador-educando; 2) na ciência da educação, nos seus aspectos legais; e na 3) filosofia da educação, enfocando seu sentido e finalidade.

Assim, a educação postulada pelas demandas humanas e sociais contemporâneas possuiria pressupostos a serem considerados pelos educadores-docentes, que o autor divide em fundamentais e instrumentais.

Os pressupostos fundamentais supõem que a humanidade seja construtora da felicidade do Homem, a manutenção de uma imagem positiva do Homem que vai se formando e a capacitação do ser humano para a liberdade.

Dentre os pressupostos instrumentais, supõem-se a educação como representante de algo mais do que uma “conversa fiada”; o embasamento de suas finalidades; a adequação das estruturas escolares; a determinação científica dos conteúdos escolares; a avaliação escolar como ato objetivo; à vontade de ensinar e capacidade de fazê-lo; que a mensagem coletiva deve atingir e motivar o aluno-indivíduo; o reconhecimento da aptidão a partir da competência; a viabilidade da comunicação interindividual; a não concepção da educação como meio de manipulação e que a virtude possa ser ensinada (HANNOUN, 1998).

Diante da evolução cultural e econômica da sociedade e do mercado de trabalho, houve mudanças na concepção do que é educação, dos conteúdos educativos, dos processos de construção do conhecimento e de aprendizagem, que também propiciaram novas discussões sobre modelos de currículos.

Para Sacristán (2000), “... não será fácil melhorar a qualidade do ensino se não se mudam os conteúdos, os procedimentos e os contextos de realização dos currículos” (p. 10). A Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) vigente no Brasil contém normas que são gerais, e isso possibilita liberdade de organização para as instituições educacionais. Porém, os professores precisam ter liberdade de ensino, pois o contexto de sala de aula não é algo objetivo onde as relações estão demarcadas, mas um campo de negociação de sentidos e significados entre os educandos e o educador.

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Para Bruner (2001, p. 46), “... um sistema de educação deve ajudar aqueles que estão crescendo em uma cultura a encontrar uma identidade dentro dela mesma. Sem ela, eles tropeçam em seu esforço em busca de significado...”. Ela avança mais na sua consideração sobre cultura da educação, vendo-a como uma pratica social

... arriscada, pois ela alimenta o senso de possibilidade. Mas não conseguir equipar as mentes com habilidades para compreender, sentir e agir no mundo cultural não significa apenas tirar um zero pedagógico. Quando isso acontece, corre-se o risco de criar alienação, oposição e incompetência prática. E isto diminui a viabilidade de uma cultura (BRUNER, 2001, p. 46).

Alguns cursos superiores estão em processo de implantação de novos currículos alicerçados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e, entre eles, os da Faculdade na qual o estudo foi realizado.

As inúmeras mudanças, adaptações e experiências que estão sendo utilizadas, inclusive na graduação em Enfermagem, obedecem a Resolução CNE/CES nº3 de 2001, norteando o docente de enfermagem à auxiliar a promoção do desenvolvimento intelectual e profissional autônomo e permanente do aluno e futuro enfermeiro.

Assim, as diretrizes apregoam que o aluno deve a) ser construtor do seu conhecimento a partir da reflexão e indagação de sua prática; b) participar do seu processo de formação de uma maneira ativa, criativa e crítica; c) ser capaz de realizar análises, interpretações e síntese do objeto a ser aprendido, compromissado com a sua formação e com a transmissão de conhecimentos a terceiros.

O intuito de integrar os currículos às resoluções da LDB e as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem à Instituição de Ensino Superior (IES) fundamenta-se, também, em necessidades emergentes do mundo globalizado, possibilitando, a partir de análises pontuais da realidade, a inserção do aluno no mercado de trabalho.

Os representantes do curso de graduação em Enfermagem da Faculdade de Bauru participam, juntamente com representantes de outras Instituições de Ensino de Enfermagem, das discussões e implementações das novas diretrizes curriculares para os cursos de enfermagem, visando viabilizar também a política do HumanizaSUS.

O HumanizaSUS - Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão no Sistema Único de Saúde - foi instituído pelo Ministério da Saúde em 2003, como uma nova política pública de saúde e modelo de gestão. Propõe o comprometimento com a humanização nas atenções básica, especializada e hospitalar, incluindo a assistência pré-hospitalar e os serviços de atendimento de urgência e emergência, esperando-se substituir o modelo de atenção centrado na relação queixa-conduta, para o modelo centrado na humanização (BRASIL, 2008).

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Messa, Zambrano e Damiance (2009) revisaram a literatura fundamentada no HumanizaSUS, procurando saber o ponto de vista do usuário sobre o atendimento recebido. Os resultados mostraram que os profissionais da saúde tem dificuldade em lidar com os aspectos subjetivos do ser humano e que a humanização, preconizada nesse modelo, mais parece característica pessoal de alguns profissionais do que uma filosofia de trabalho.

Scherer, Scherer e Carvalho (2006), enfocando especificamente o ensino de enfermagem, ressaltaram os constantes exames minuciosos de propostas pedagógicas e a implantação de mudanças curriculares voltadas para um maior conhecimento do homem e uma cultura capaz de desenvolver as potencialidades da condição humana. Segundo os autores,

É esperado que os centros formadores assumam, de forma articulada ao mundo do trabalho, sua responsabilidade na formação de recursos humanos necessários à viabilização e consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), que visa à universalidade, descentralização e eqüidade no acesso aos serviços de saúde e a abordagem integral da pessoa inserida na família e na sociedade (SCHERER; SCHERER; CARVALHO; 2006, p. 286).

Apesar dos movimentos de reforma curricular nos cursos de graduação e pós-graduação no Brasil, o atual sistema de ensino - incluindo o de Enfermagem - ainda centraliza a educação e os processos educativos no professor e na matéria, fazendo-se necessário o questionamento e discussão sobre o tema educação, indivíduo, sociedade moderna, relacionando-os ao conceito de cidadania, liberdade e autonomia. Esse é um papel do educador da área da saúde e de toda a sociedade civil para que a construção de um profissional com compromisso ético, humano e político seja realidade.

Nos cursos de da área de saúde, acontecem movimentos de discussão e implementação de ações fundamentadas no modelo participativo. Neste, o processo educativo destaca a transformação dos indivíduos, grupos e comunidade e entende que a educação é intrínseca as relações do indivíduo com o meio e do indivíduo com o grupo.

Desde 1998, a Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) implementou no curso de Enfermagem o currículo integrado, desenvolvido conforme a metodologia problematizadora. (CHIRELLI, 1999).

Segundo Chirelli (1999), na metodologia problematizadora, estudar é ato intencional e organizado no sentido de resolver problemas. As situações de ensino–aprendizagens são contextualizadas e consideram a estrutura cognitiva, social e psicológica do aluno. Os perfis do aluno, do professor e do conteúdo devem atender a alguns aspectos peculiares, como:

- o aluno deve ser construtor do seu conhecimento a partir da reflexão e indagação de sua prática; deve ser participativo no seu processo de formação de uma maneira ativa, criativa e crítica; capaz de realizar análises, interpretações e síntese do objeto a ser aprendido; compromissado com a sua formação e com a transmissão de conhecimentos a terceiros;

- o professor deve ser condutor do processo, provocador de dúvidas, autoridade competente, sendo de fato responsável pelas tarefas de ensino, explicação das matérias,

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orientação das atividades, colocação de exercícios, controle e verificação da aprendizagem. Deve compreender o aluno como pessoa concreta, objetiva, com características pessoais determinadas pela sua história de vida e pelas condições políticas-econômicas-sociais e culturais nas quais vive; e

- os conteúdos são os conhecimentos selecionados das bases das ciências e dos modos de ação acumulados pela experiência social da humanidade e organizados para serem ensinados na escola. São habilidades, métodos e procedimentos de aprendizagem e de estudo, atitudes e convicções, envolvendo o modo de agir, sentir e de enfrentar o mundo. Sua seleção deve atender aos fundamentos filosóficos, psicológicos, sócio–culturais do método e deve contemplar as competências para a formação, no caso, do enfermeiro, que o Curso propõe, por meio de situações de ensino–aprendizagem pautada em objetivos educacional pré–determinados.

Portanto, considerando as afirmações acima, pode se concluir que a educação tem uma abrangência muito maior do que a educação praticada nos espaços escolares. Representa um amplo fenômeno humano–social (CHIRELLI, 1999).

A educação pode existir livre, como forma de socializar crenças e idéias daquilo que é comunitário “como bem, como trabalho ou como a vida”; e a educação pode existir imposta e centralizada, a serviço de quem está no poder, usando e controlando o saber como forma de cristalizar e reforçar desigualdades na divisão de bens, dos direitos, dos símbolos e do trabalho entre os homens (BRANDÃO, 1985).

Na perspectiva de uma educação livre, há a necessidade da criação de uma nova cultura pedagógica, que considere que as pessoas trazem suas representações prévias sobre os problemas enfrentados no dia-a-dia de suas vidas. A intervenção profissional vai ter que levá-las em conta se quiser realizar um processo educativo efetivo, porque envolve tanto mudanças de comportamento como de atitudes diante das questões postas. Há a necessidade de olhar as pessoas atendidas como seres pensantes.

Esta perspectiva pedagógica é marcada pela reciprocidade. Ela deve ajudar os indivíduos a entenderem melhor, presumindo que “... todas as mentes humanas são capazes de ter crenças e idéias que, por meio de discussão e de interação, pode ser movida em direção a certa estrutura de referência compartilhada...” (BRUNER, 2001, p. 62).

A educação libertadora, assim chamada por Paulo Freire (1997), parte do princípio de que em um mundo de mudanças rápidas e profundas, o importante não são os conhecimentos ou idéias, nem os comportamentos corretos e fiéis ao esperado e, sim, o aumento da capacidade das pessoas e grupos em detectar os problemas reais e buscar-lhes solução original e criativa. Ainda mais, é o desenvolvimento da consciência de que

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tornamos capazes de intervir na realidade, tarefa incomparavelmente mais complexa e geradora de novos saberes do que simplesmente a de nos adaptar a ela. É por isso também que não me parece possível e nem aceitável a posição ingênua ou, pior, astutamente neutra de quem estuda, seja o físico, o biólogo, o sociólogo, o matemático, ou o pensador da educação. Ninguém pode estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra. Não posso estar no mundo de luvas nas mãos constatando apenas. A acomodação em mim é apenas um caminho para a inserção, que implica decisão, escolha, intervenção na realidade (FREIRE, 1997, p. 86).

O estímulo à educação independente, visando à progressiva autonomia profissional e intelectual do aluno está no Parecer número 67/2003 – do Referencial para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação do Conselho Nacional de Educação. Instituições e empresas educacionais estão adequando-se ao Parecer e aos artigos constituintes da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.

Nesse processo de adequação, a teorização e a concretização de currículos baseiam-se em novos conceitos como: a construção de competências, avaliação contextualizada e processo ensino-aprendizagem interativo-participativo.

Com essas mudanças espera-se promover o autoconhecimento, o compromisso e o desempenho de alunos e docentes de modo coletivo.

2. ENSINO APRENDIZAGEM

Abreu e Masetto (1985) vêem o “ensinar” e “aprender” como duas perspectivas indissociáveis, mas que toda instituição de ensino deve optar por privilegiar uma ou outra, sendo que os autores optam pela ênfase na aprendizagem. Decodificando o significado de “ensinar”, apresenta verbos que mostram o professor como aquele que é o responsável pelo ensino, ou seja: instruir, fazer, comunicar conhecimentos, mostrar, dirigir; enquanto que o significado de “aprender” remete ao aluno, as condições, possibilidades e capacidades para que aprenda. Utilizando a proposta de objetivos operacionalizados de Mager (1962, 1972 apud Abreu e Masetto, 1985), Abreu e Masetto (1985) dividem a aprendizagem em três categorias: modo cognitivo (o que o aluno conhece e compreende), mudança de atitude (valores que o aluno dá ao que conhece seus sentimentos perante os fatos e idéias), e a categoria das habilidades (quando o aluno aprende a fazer e ou lidar com o que aprendeu).

Complementam apresentando quatro tendências de aprendizagem que buscam responder a pergunta “para quê aprender”. São elas: o desenvolvimento mental (aspecto cognitivo), o desenvolvimento da pessoa singular e como um todo (aspectos cognitivo, afetivo, social), o desenvolvimento das relações sociais (realidade social e interação dos aprendizes com ela), e o desenvolvimento da capacidade de decidir (habilidade para assumir responsabilidade social e política).

Independente da tendência escolhida, os autores citam como princípios comuns de aprendizagem, que:

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1. toda aprendizagem precisa ser significativa para o aprendiz, envolvendo idéias, cultura, sentimentos, exigindo que a aprendizagem

se relacione com o seu universo de conhecimentos, experiências, vivências; lhe permita formular problemas e questões que de algum modo o interessem, o envolvam ou lhe digam respeito; lhe permita entrar em contato experiencial com problemas práticos de natureza social, ética, profissional, que lhe sejam relevantes; lhe permita participar com respondabilidade do processo de aprendizagem; lhe permita e o ajude a transferir o que aprendeu na escola para outras circunstâncias e situações de vida; suscite modificações no comportamento e até mesmo na personalidade do aprendiz (ABREU; MASETTO, 1985, p. 9-10).

2. toda aprendizagem é pessoal;

3. toda aprendizagem precisa visar objetivos realísticos;

4. toda aprendizagem precisa ser acompanhada de feedback imediato;

5. toda aprendizagem precisa ser embasada em um bom relacionamento interpessoal entre aluno, professor e colegas de classe.

Para Delors (2000), a educação no século XXI deve ser organizada sob quatro aprendizagens fundamentais e que serão os pilares do conhecimento durante toda a vida dos indivíduos: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e, por fim, aprender a ser. Antes de aprender a conhecer, é necessário aprender a aprender, ou seja, a educação voltada ao exercício da atenção, a memória e ao pensamento (método indutivo e dedutivo).

Aprender a conhecer visa à aquisição de saberes, dos avanços da ciência, dos paradigmas atuais e de domínios dos conceitos, instrumentos e referências. É conhecer o necessário para se comunicar, se profissionalizar e viver dignamente. Conhecer pelo prazer de descobrir, compreender, para despertar a curiosidade, estimular o senso crítico, a aquisição de autonomia, a capacidade de discernimento e a formação cultural.

Aprender a fazer está atrelado ao aprender a conhecer, em um contexto do mundo do trabalho (social e econômico), mais ligado à questão da formação profissional, no caráter cognitivo e informativo nos sistemas de produção, mas sem desconsiderar a técnica. Fala-se em qualificação profissional, competência pessoal, comportamento social, aptidão para o trabalho em equipe, capacidade de iniciativa, de gerir e resolver conflitos e aptidão para as relações interpessoais. Exige que as formações tradicionais cultivem as qualidades humanas na capacidade de estabelecer relações estáveis e eficazes entre as pessoas.

Aprender a viver juntos - aprender a viver com os outros, define-se como um dos maiores desafios da educação, em um mundo cheio de violência, com grande potencial de autodestruição. Fatores que contribuem: preconceitos de etnia, cor, situação financeira e social, prioridade pela educação e sociedade ao espírito de competição e ao sucesso individual. A educação deve promover: a descoberta de si mesmo; a descoberta progressiva do outro (conhecimento da diversidade e das relações de interdependência humana, colocar-se em

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situação de empatia, argumentação e diálogo); caminhar por objetivos e projetos comuns (educativos, de cooperação, desportivos, científicos, estéticos, artísticos, culturais, sociais e humanitários), visando o respeito ao pluralismo, a compreensão mútua e a paz.

Aprender a ser deve contribuir no desenvolvimento global do individuo: espírito, corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal e social. O ser humano deve ser preparado para agir de maneira autônoma e crítica com seus próprios juízos de valor e de decisão.

Com a possível amplitude midiática no séc. XXI, define-se como essencial à educação conferir à todos os seres humanos a liberdade de pensamento, discernimento, sentimentos, imaginação e criatividade de que necessitam para desenvolverem seus talentos, suas personalidades e inovarem e compreenderem o mundo, atuando de maneira responsável, autônoma e justa, entendendo que o ser humano faz parte de um processo individualizado em uma construção social e interativa (DELORS, 2000).

Para promoção da socialização, a obtenção de competências sociais e acadêmicas, controle dos impulsos agressivos, dentre outros, Monereo e Gisbert (2005) apresentam a aprendizagem cooperativa ou o uso educativo das relações entre alunos. Baseados em Johnson, Johnson e Halubec (1999 apud Monereo; Gisbert, 2005), citam cinco condições para que haja cooperação grupal: interdependência positiva, interações face-a-face, responsabilidade individual, habilidades sociais e auto reflexão de grupo.

Para Rodrigues (2010), alguns procedimentos didáticos são necessários para serem condizentes com uma educação fundamentada nos quatro pilares, tais como: aproveitar a experiência do estudante no desenvolvimento dos temas em salas de aula; envolver o aluno em processos em que ele se comprometa com a prática; auto-aprendizagem e co-responsabilidade no processo do aprender; e uso de jogos pedagógicos.

Dentre esses procedimentos, a dinâmica de grupo tem se mostrado eficaz nos trabalhos grupais.

3. DINÂMICA DE GRUPOS

Segundo Minicucci (2002), a expressão Dinâmica de Grupo foi criada em 1944, pelo psicólogo social alemão Kurt Lewin, para quem o estudo do pequeno grupo seria capaz de propiciar ao pesquisador a compreensão do macrogrupo. Atualmente, a expressão tem sido utilizada de diversas formas e áreas (antropologia, ciências políticas, economistas, marketing, pedagogia, saúde, esporte), tendo sempre em comum à idéia de comportamento grupal.

Idáñez (2004) diferencia as terminologias trabalho com/de/em grupos (toda e qualquer ação realizada de modo coletivo), de técnicas grupais (instrumentos para desenvolver o trabalho em grupo), dinâmica de grupos, que se fundamenta em “... interações e processos que são gerados no interior do grupo como conseqüência de sua existência” (p. 15).

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Essa autora parte do pressuposto de que o grupo é muito mais do que a simples soma de seus membros e da soma das forças individuais, tornando-se fonte de capacidade e energia que, isoladamente, seus membros a desconhecem. Dinâmica de Grupos pode ser entendida como 1) teoria, 2) técnica ou modo de atuação no grupo ou 3) espírito grupal.

Como teoria, a dinâmica de grupo é uma ramificação da psicologia social que tem os grupos humanos e os processos sociais como objeto de estudo; como técnica de atuação é a soma dos meios e procedimentos utilizados em grupos, que objetivam emergir os processos grupais que estão ocorrendo no coletivo em que são aplicados; e como espírito grupal, entende-se como estão ocorrendo às participações entre os diversos membros do grupo, baseando-se no respeito um ao outro e participação maior e democrática (IDÁÑEZ, 2004).

De acordo com Masetto (2003), as técnicas coletivas devem trazer vantagens diferentes e favorecer aprendizagens que não seriam possíveis se obter individualmente.

Segundo o autor, a dinâmica de grupos pode desenvolver: a capacidade de estudar um problema em equipe; a capacidade de discussão e debate em conjunto, superando-se a simples justaposição de idéias; chegar a conclusões após a análise aprofundada de um tema; aumentar a flexibilidade mental através do reconhecimento de diversas interpretações sobre um mesmo tema; desenvolver a capacidade de verbalizar e relacionar-se em equipe, observação e crítica do desempenho grupal; confiar na possibilidade de aprender não só com o professor, mas também com os colegas; e valorizar o trabalho em equipe, a qual considera uma das exigências para qualquer profissional.

Maseto (2003) coloca como regras básicas: que os objetivos estejam bastante claros para todos os membros do grupo; que as funções sejam distribuídas a todos os componentes; que cada um ouça o que o outro está falando; que haja registro por escrito das idéias principais resultantes da discussão do grupo.

Idáñez (2004) também estabelece princípios básicos para que o grupo realmente seja participativo, que são: atmosfera grupal (ambiente físico, relacionamento de igualdade e sem intimidação e forma de iniciar a reunião); processos de comunicação verbal ou não verbal; participação e espírito de grupo; distribuição da liderança; formulação de objetivos claros; flexibilidade e capacidade de adaptação a situações novas; consenso; compreensão do processo e avaliação contínua.

Felippe (2007) enfatiza que a dinâmica de grupo possibilita comportamentos, que poderão ser modificados – de acordo com o que se exige no mundo do trabalho – por meio de vivências, em sala de aula, facilitando o crescimento interno de cada um e suas dimensões afetivas e sociais.

Segundo Minicucci (2002), é possível trabalhar com afetividade e com a organização das relações vividas em grupo de diversas maneiras, como por exemplo o psicodrama e o sociodrama, técnicas introduzidas por Jacob L. Moreno, no início da década de 20.

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4. DRAMA-AÇÃO: DRAMATIZAÇÃO

Psicodrama é “... um método de psicoterapia de grupo que utiliza um modelo dramático e procedimentos teatrais”. Dentre as várias técnicas disponíveis, a inversão de papéis é uma das mais utilizadas, possibilitando a vivência do mundo a partir do olhar do outro e perceber o impacto que isso causa no outro e nele próprio, transcendendo as limitações habituais do egocentrismo (HOLMES; KARP, 1992, p. 28).

Para Schützenberger (1970 apud Fonseca Filho, 1980),

a essência do psicodrama baseia-se na definição do homem em quatro dimensões: a) o conjunto de papéis que representa na vida; b) rede de interações de todas as pessoas com as quais está em relação; c) seu “átomo social” (seu mundo pessoal afetivo); d) seu “status sociométrico”, ou seja, sua “cota de amor” nos grupos a que pertence. Seu “ser no mundo” se manifestaria também por seu grau de espontaneidade e de comunicação verdadeira (tele) (FONSECA FILHO, 1980, p. 8).

Toda teoria de Moreno é baseada na ação, pois para ele, “o ser humano tem fome de ação – ação física, assim como a mental”. (MORENO, Z., 2001, p. 17). A própria palavra, “drama”, vem do grego e significa “ação” (FONSECA FILHO, 1980; p. 10).

Tanto o psicodrama quanto o sociodrama são realizados em grupos, sendo que o ênfoque no psicodrama é sobre o indivíduo e, no sociodrama, no grupo como um todo.

O psicodrama vem sendo utilizado na educação, possibilitando que o grupo, através de dramatizações, confronte e seja confrontado com as diferenças individuais e, com isso, aprendam a distinguir a sua experiência emocional e a dos outros, transformando-os em agentes transformadores uns dos outros.

Também vem sendo usado para identificar razões e graus de agressividade presente no grupo; ampliação e enriquecimento das possibilidades metodológicas de ensino; desenvolvimento da criatividade e humanização na relação aluno-professor-aluno, melhorando a qualidade do vínculo; aperfeiçoamento dos professores através do treino de papéis, entre outros (FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE PSICODRAMA, 2010).

Para Moreno, o carisma de uma pessoa depende mais de sua espontaneidade do que de sua inteligência.

Domenico e Ide (2005) pesquisaram com 22 docentes de uma instituição pública como fazem para que os alunos desenvolvam as competências necessárias para cada nível de titulação em Enfermagem, tais como tomada de decisões, liderança, comunicação, atenção à saúde, ético-políticas, técnico-científicas, que garantam a qualidade e humanização do atendimento nos serviços de saúde. Um dos resultados principais foi à preocupação em associar teoria à prática.

De acordo com Abreu e Masetto (1985), estratégias que utilizam situações simuladas, que reproduzem ou se assemelham à situação real equivalente, tais como dramatizações, desempenho de papéis (role playing), jogos dramáticos, apresentam a vantagem de protegerem o aluno, uma vez que a situação é hipotética (como se) e em sala de aula. Outras

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vantagens: distanciamento da situação real, permitindo perceber a situação sem se perder no envolvimento que a vivência real poderia ocasionar; e que é mais fácil à transferência da aprendizagem para a situação real do que se o tema tivesse sido trabalhado apenas teoricamente.

A dramatização, segundo Maseto (2003), possibilita a inversão de papéis que desenvolve a empatia e a análise de situações sob o ponto de vista do outro. Moreno, Z.; Blomkvist e Rützel (2001, p. 41) afirmam que “a inversão de papéis é a técnica do absoluto envolvimento, da capacidade de ver a trama de outro ponto de vista, qualquer que seja ele”. O aprendizado essencial, quando realmente se consegue inverter o papel com o outro, é uma mudança de percepção, é perceber que, daquela perspectiva (do outro), o modo pelo qual se via as coisas é diferente.

Além do aprendizado que a técnica permite, também possibilita o desenvolvimento de atitudes e habilidades dos alunos (MASETTO, 2003).

Tobase; Gesteira e Takahashi (2007) revisaram a literatura sobre a utilização da dramatização no ensino de enfermagem entre 1994 e 2005. Encontraram 31 resultados que demonstraram a existência de uma relação positiva da dramatização como estratégia facilitadora, pois favorece a aprendizagem, confere significados aos conteúdos, colabora no desenvolvimento de habilidades técnicas e comunicacionais, na percepção do ser humano de maneira holística e favorece a construção de competências do profissional em Enfermagem.

Moreno queria ser lembrado como “O Homem que Trouxe a Alegria e o Riso à Psiquiatria”, sendo que o riso pode trazer leveza e alívio à situações estressantes, criando uma distância objetiva que pode facilitar o aparecimento de atitudes e respostas totalmente novas. “Isso não quer dizer que transformemos uma situação trágica em algo sem sentido, mas sim que lançaremos uma nova luz sobre ela” (MORENO, Z., 2001, p. 54).

A dramatização desenvolve a criatividade e espontaneidade entre os atores, dando respostas novas a velhas situações; renovando e mudando velhos papéis. Confrontando e sendo confrontados com as diferenças individuais nos relacionamentos, o aluno aprende a distinguir sua experiência emocional da dos outros, transformando-se em um propulsor de mudança (MORENO, Z., 2001).

É preciso que a educação esteja – no seu conteúdo, nos seus programas e nos seus métodos – adaptada ao fim que se persegue. Permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, entabular com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história (...). O homem não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da realidade, se não for ajudado a tomar consciência da realidade e da sua própria capacidade para transformá-la (...) importa preparar o homem para uma autêntica educação: uma educação que liberte, não que adapte, domestique ou subjuque. Isso obriga a uma revisão total e profunda dos sistemas tradicionais da educação, os seus programas e os seus métodos (FREIRE, 1977, p. 47).

Neste sentido são relevantes às considerações de Fromm (1967) sobre a liberdade, que é vista por ele como:

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ato de se libertar no processo de fazer escolhas. Nesse processo, o grau de nossa capacidade para escolher varia com cada ato, com nossa prática de vida. Cada passo na minha vida que aumenta minha confiança em mim mesmo, minha integridade, minha coragem, minha convicção, também minha capacidade para escolher a alternativa desejável, ate que enfim torna-se mais difícil escolher a ação indesejável do que a desejável (FROMM, 1967, p. 152).

Ao retomar Freire (1980), ele vai ao sentido de que

o importante é advertir que a resposta que o homem dá a um desafio não muda só a realidade com a qual se confronta: a resposta muda o próprio homem, cada vez um pouco mais, e sempre de modo diferente. [...] pela ação e na ação, é que o homem se constrói como homem (FREIRE, 1980, p. 37).

Para Cukier (1992, p.29), “dramatizar é muito mais do que uma brincadeira de representar. É assumir e sentir o que seria a vivência de outra pessoa ou objeto, e, para tal, se faz necessário desligar-se de si e mergulhar no papel a ser vivido”.

Idáñez (2004) ressalta que, diferente de outras técnicas, a dramatização, ao invés de falar, mostra alguns aspectos da situação que está sendo enfocando. Através da visualização da cena, funciona como disparador do trabalho grupal.

Friedmann (2004) mostra que técnicas expressivas contribuem para a Educação preconizada pela Comissão Internacional para a educação no século XXI (Delors, 1999), tomando por base os quatro pilares propostos. Nelas, o lúdico aparece como recurso importante para a aprendizagem (aprender a conhecer), reconhecido por educadores como Piaget, Montessori, Decroly, até os especialistas contemporâneos; no aprender a fazer, onde o lúdico apresenta-se como recurso motivacional eficaz; no aprender a conviver, onde as brincadeiras, dinâmicas, jogos facilitam e forma valores de cooperação, respeito pelas diferenças individuais; trabalho em equipe; e no aprender a ser, onde o brincar facilita a expressão de valores, criatividade, crenças, atitudes.

Friedmann (2004) elenca algumas condições a serem refletidas por aquele que se propõe a trabalhar com formação e processos de transformação de alunos, que são: 1) compromisso com os próprios ideais e para com o outro; 2) humanização, abertura para receber o outro; 3) confiança em si mesmo e nos acontecimentos, mesmo os imprevistos; 4) autenticidade nas relações; 5) responsabilidade/consciência com tudo o que transmitir ao outro; 6) flexibilidade no corpo, nas idéias, sentimentos, posturas; 7) presença/atenção no aqui e agora, sem deixar a mente divagando; 8) paciência e sabedoria para aguardar resultados em longo prazo; 9) humildade; 10) afetos educador/aluno, empatia e autenticidade nos contatos; 11) humor/ seriedade; 12) sabedoria própria e no seu aluno - resgate esse poder interno; 13) coragem de tomar decisão e crescer, lidar com sentimentos, vínculos, erros e conflitos; 14) disciplina, perseverança; 15) cuidado com o gesto, idéias, reações, palavras; 16) compaixão, mistura de ternura e perdão que vem do coração; 17) amor, doação; 18) cenas temidas; 19) contenção de emoções e impulsos sobre o outro, elaborar as emoções dentro de si; 20) inseguranças que devam ser assumidas e elaboradas, antes de serem expostas; 21) ansiedade de acertar, frente a reações hostis dos alunos, críticas; 22) abaixar as expectativas para diminuir as frustrações; 23) manter os pés no chão.

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Segundo o mesmo autor, medos tendem a diminuir com a prática de respiração profunda, até que, mais calmos, possam ser encarados e resolvidos; ingenuidade de idealizar situações carece de amadurecimento; ignorância: sempre temos algo a aprender; devemos aprender a lidar com críticas; a inveja do outro pode nos remeter a ver que também temos como potencial aquele algo invejado dentro de nós; o erro deve ser visto como oportunidade de crescimento.

Também elenca temas como prazer e dor; administração de conflitos, fofocas; cenas previsíveis; facilitação de processos; expressão; graus de liberdade na condução; empatia; escolhas; insights/idéias; estímulos; curiosidade/indagação, para meditação ao educador.

Para o trabalho com dinâmicas de grupo, Friedmann (2004) sugere alguns pontos para reflexão. Segundo a autora,

A beleza do brincar está nas surpresas que iremos encontrar quando “abrirmos a nossa caixa de brinquedos”; na espontaneidade com que os jogadores entregam-se ao jogo; na imprevisibilidade do que irá acontecer; na incerteza das reações que cada um possa ter. Há, porém, certas atitudes e reações que são comuns no trabalho com grupo. (FRIEDMANN, 2004, p. 127).

Quem se entrega à dinâmica, terá emoções afloradas nos diferentes canais de expressão, podendo ser reações positivas (riso, alegria, autodescoberta) e/ou negativas (críticas, defesas, choro). Também sempre haverá nos grupos o arrogante, aquele que não participa o crítico, dentre outros. Como facilitador, é importante que o professor esteja preparado para lidar com essas situações (FRIEDMANN, 2004).

Segundo Idáñez (2004), a dramatização é uma técnica flexível, que facilita um ambiente espontâneo e permissivo, liberam inibições, onde todos os membros do grupo, mesmo em sua heterogeneidade, tenham algo a contribuir. A limitação da técnica centra-se no risco do seu fechamento não ser bem elaborado e a discussão girar apenas em torno das cenas representadas, e não atingir a realidade complexa e concreta do grupo, não teorizando/ esquematizando o conhecimento adquirido. Sugere, ao final, perguntas para os atores e participantes, tais como:

Achamos que a cena representa uma situação real? Algum problema que nos afeta diretamente? Acontece na vida real ou não? Sentimo-nos identificados com algum personagem? Em que aspectos: nos sentimentos, nas atitudes, nos modos de raciocinar, etc? Por que achamos que acontecem essas situações? O que podemos fazer para modificá-las? (Aos atores) Como viveu seu papel na representação? O que sentiram? Houve compreensão da postura do outro, etc? (IDÁÑEZ, 2004, p. 160).

Monereo e Gisbert apresentam a aprendizagem cooperativa (“uso instrutivo das interações entre alunos”), como um recurso a mais para o professor utilizar em sala de aula, com vantagens frente à diversidade e heterogeneidade entre os alunos, potencializando habilidades de interação “com relação aos outros, negociação, auto-estima, aceitação de pontos de vista, com fundamento na colaboração e solidariedade, que funcionam como “um motor para a aprendizagem significativa” (MONEREO; GISBERT, 2005, p. 10)

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Os autores citam diversas pesquisas que corroboram com sua filosofia, como a de Coll e Colomina (1999) cujos resultados mostraram que a interação entre iguais (alunos) reflete positivamente na aquisição de competências sociais, no controle de impulsos agressivos, no processo de socialização, no aumento das aspirações e na melhora do desempenho acadêmico, na relativização dos pontos de vista.

Segundo Sole (1997, apud Monereo e Gisbert, 2005, p.11-12), o “trabalho em grupo dos alunos é entendido como uma das modalidades de interação educativa que está no âmago dos processos de ensino e aprendizagem e que explica que o progresso pessoal é inseparável da relação interpessoal”.

Gonçalves e Perpétua (2000) acreditam que o efeito dos brinquedos para formar a criança - salvo o grau de consciência diferenciado entre adultos e crianças - é o mesmo nos adultos. Brincar, que é uma atividade puramente prazerosa para a criança, tem como paradoxo que ela opera com significados alienados numa situação real e aprende a renunciar ao que quer os seus impulsos, para se sujeitar às regras dos jogos. Assim, a regra passa a tornar-se um desejo, satisfazer as regras passa a ser uma fonte de prazer.

Ainda, Gonçalves e Perpétua (2000) definem a proposta pedagógica das dinâmicas de grupo na combinação de conteúdos com interação e integração espontânea dos participantes, acrescida de uma condução entre a vivência do grupo, a experiência anterior que trouxeram e a prática social de cada um, realizada pelo Formador. A reflexão coletiva do final – integrante da técnica – possibilita ao grupo, apoderar-se da cultura, da história, dos conhecimentos técnicos e científicos que se desenvolveram na atividade, além da avaliação reflexiva e crítica sobre a própria experiência.

Outro objetivo é o de “formar seres inteligentes, capazes de visão ampla da realidade natural e humana e, conseqüentemente, mais feliz”, e “aptas a participarem ativamente da” vida comunitária, sem a inclinação de se deixarem dominar por outras pessoas “mais espertas, de maior conhecimento, que se amparam no seu saber para impor decisões favoráveis à perpetuação do domínio e dos privilégios” (GONÇALVES; PERPÉTUA, 2000, p. 21).

A pluralidade de conhecimentos, história, bagagem de cada um, possibilita a troca e aumento da capacidade cognitiva, conseqüente do esforço partilhado na busca de soluções para os problemas, cabendo ao Formador, garantir a proporcionalidade nas relações que vão sendo estabelecido, garantir a comunicação produtiva, compreensão mútua, condições de colaboração (GONÇALVES; PERPÉTUA, 2000).

As autoras também vêm as dinâmicas de grupo como uma educação alternativa, que tem um conteúdo político de classe, pois produzem conhecimento a partir da prática concreta do povo, do seu dia-a-dia, usam uma metodologia participativa e democrática, sem privilegiar a tradicional divisão entre o professor – que sabe – e o aluno que não sabe.

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5. O ENSINO TRADICIONAL X ENSINO TRANSFORMADOR E O PAPEL

DA DINÂMICA DE GRUPOS

Segundo Pimenta e Anastasiou (2010), pesquisas recentes sobre o processo de ensino e aprendizagem têm buscado explicar alguns problemas no ensino superior, tais como a evasão e os resultados precários das aprendizagens. Além dos fatores externos, como os socioeconômicos, fatores intrínsecos ao ensino, seriam responsáveis por esses problemas, tais como concepção e prática tradicional do ensino; os resultados da escolaridade prévia e cultural dos alunos e os referentes às qualificações e condições de trabalho dos docentes universitários.

No ensino tradicional, baseado na “lógica da exclusão, em pouca criticidade, voltado para os produtos (passar no vestibular) e não para a aprendizagem” (p. 233), o aluno chega à faculdade com a visão de que bom professor é aquele “showman”, execelente na capacidade de explicar e garantir a atenção dos alunos, cujo papel é ouvir com atenção, anotar e memorizar o conteúdo exposto, para reproduzi-los fielmente - o que ouviu ou leu nos livros indicados pelos professores - no momento da prova.

Citando Chauí (2001, apud Pimenta e Anastasiou, 2010, p. 229), as autoras afirmam que os alunos vêm sendo submetidos a um ensino que considera a ciência “pronta e acabada, à espera de aplicação”. Assim, renunciam ao pensar e “desentranhar o sentido de uma experiência nova ou de uma ação por fazer, sendo reforçados na repetição de modelos abstratos e na aplicação mecânica desses modelos sob a forma de estratégias variadas”.

Para reverter essa situação e introduzir a concepção transformadora ao ensino, as autoras sugerem que os professores transformem o aluno em sujeito ativo do processo de aprendizagem, iniciando por conhecer o perfil e características dessa geração com quem partilha a aula. Sugerem dados como origem geográfica e social, experiências anteriores de escolarização, faixa etária, turno diurno ou noturno, trabalhador ou estudante, inserção profissional, significado da profissão na vida presente e futura, tempo livre; descobrir e analisar os motivos que os levaram ao curso, expectativas quanto a ele e à disciplina, a forma pela qual operacionalizam suas próprias aprendizagens (hábitos de estudo), o nível de conhecimento que possuem habilidades que dominam, dentre outros. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Pesquisa de pós-doutorado coordenada por Anastasiou com a orientação de Pimenta, nos anos 2000 e 2001, realizada com 140 professores de uma IES em seis cursos superiores, predominantemente no horário noturno, apontou para os problemas relacionados: ao desempenho dos alunos (falta de interesse, de motivação ou de comprometimento com a própria aprendizagem; passividade, individualismo. Interesse na nota e em passar de ano e/ou obter diploma; indisciplina, hábitos de estudo insuficientes); à escolaridade anterior (nível de conhecimento prévio insuficientes para acompanhar a graduação; dificuldade

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na interpretação, redação, leitura; dificuldade de raciocínio; falta de criticidade; alta heterogeneidade em cada classe e diversidade de maturidade geral; interesse na nota e em passar de ano e/ou obter diploma; falta de tempo para estudar, com pouco contato extraclasse; aluno trabalhador); e outros, como as instituições.

Quanto aos problemas relacionados às instituições, foram levantados: ausência de clareza da área do conhecimento nas instituições de ensino, do seu universo epistemológico e profissional e relações com o mundo, a sociedade, a vida; falta de informações claras sobre o percurso formativo que deverão realizar e sobre as exigências que lhes serão feitas; percursos formativos estritamente voltados a disciplinas, a aulas, sem perspectivas para o conhecimento das possibilidades de desenvolvimento de pesquisas, de estudos em outros espaços, como as escolas, os espaços culturais em geral, os campos de trabalho; sem perspectivas para o estabelecimento de relações interpessoais e de trabalho com colegas e com os professores.

Em pesquisa realizada por Castanho (1989 apud PIMENTA; ANASTASIOU, 2010) identificou-se que a defasagem entre a faixa etária dos alunos que cursam o diurno e o noturno não é excessiva, a maioria cursou escola pública noturna no segundo grau, possuem pouca história de reprovação e espera que com o diploma alcancem melhor qualificação. Os alunos são trabalhadores, o que possibilita que o professor utilize dessa experiência para facilitar a aprendizagem na sala de aula.

Pimenta e Anastasiou (2010) sugerem mudanças no paradigma da lógica dominante como solução, envolvendo instituições, que muitas vezes consideram o “aluno como “cliente”, que ali está pagando por um “produto”, sendo a função de o professor tornar esse produto “atraente”, numa situação em que o importante é o certificado, e não necessariamente a qualidade das aprendizagens”. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010, p. 235).

A partir dessa mudança, nova identidade deverá ser construída por professores e alunos, com contratos de ensino e aprendizagem com maior autonomia para ambos.

Partindo do pressuposto que dinâmica de grupos favorece a interação grupal e facilita a aprendizagem tornando-a significativa, Teodoro e Vasconcelos (2005) ressaltam que o esperado do grupo é que, além dos conhecimentos de cada membro, que o grupo possa analisar e discutir essas contribuições e que, com essa discussão, os estudos progridam e superem os já apresentados pelos participantes.

Este artigo é resultado de uma atividade de ensino-aprendizagem interativa e lúdica, em uma aula prática, na disciplina de Enfermagem na Saúde do Idoso, na quinta série do curso de graduação em Enfermagem, da Faculdade Anhanguera de Bauru, que busca provocar e promover posturas profissionais mais humanas, para influenciar as atitudes do Enfermeiro frente às pessoas assistidas.

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6. OBJETIVOS

6.1. Geral

Descrever um estudo de caso com a temática: interação do enfermeiro com o usuário do serviço de saúde e sua família desenvolvida na disciplina de Enfermagem na Saúde do Idoso.

6.2. Específicos

Avaliar as habilidades dos alunos em trabalho em grupo; na comunicação com base em princípios éticos e de cidadania; refletir sobre o papel do idoso na sociedade e sobre as políticas públicas voltadas para a terceira idade através de inversão de papéis; visualizar situações do cotidiano no atendimento nos serviços de saúde, com a distância que possibilite outro olhar e discutir como ocorre a construção do conhecimento utilizando o modelo participativo.

7. METODOLOGIA

Considerando que as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação apregoam que o aluno deve participar do seu processo de formação de uma maneira ativa, criativa e crítica; deve ser capaz de realizar análises, interpretações e síntese do objeto a ser aprendido e de trabalhar cooperativamente, a atividade foi desenvolvida utilizando-se o estudo de caso como estratégia educativa e metodológica. A utilizando-seguir, descreve-utilizando-se os participantes, instrumentos, local, procedimentos e o processamento da dinâmica.

7.1. Participantes

Participaram 64 alunos do curso de Graduação em Enfermagem da quinta série, divididos, igualitariamente, no período matutino e noturno.

7.2. Instrumentos

Foram utilizados materiais e equipamentos do universo hospitalar, tais como: camas hospitalares, macas, cadeira de rodas, manequim humano articulado, cadeiras, suportes de soro, mesas de cabeceira hospitalar, biombo, escada com dois degraus, estetoscópios, esfigmomanômetro, papagaio, luvas, seringas pertencentes ao laboratório de enfermagem da instituição, no qual acontecem atividades práticas.

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7.3. Local

A atividade de dramatização foi realizada no Laboratório de Enfermagem da IES.

7.4. Procedimento

Com uma semana de antecedência, a professora propôs a experiência da utilização de dramatização em atividade de ensino-aprendizagem prática, em laboratório de enfermagem, definindo, após concordância sobre o uso da estratégia, data, local, hora, equipamentos, materiais disponíveis, montagem da dramatização e sobre as fases do ciclo de aprendizagem vivencial.

Os alunos foram divididos em quatro grupos de oito participantes, de acordo com a lista de presença. Os grupos foram especificados em: grupo I – atendimento não humanizado; grupo III – atendimento humanizado; grupo II – grupo de processamento; e grupo IV – registro da aula prática, suas percepções do atendimento humanizado e não-humanizado.

Foram-lhes, entregues, o seguinte estudo de caso, formulados pelo professor: Um senhor, com 89 anos de idade, terceiro grau completo, aposentado, advogado, renda mensal alta, viúvo, atualmente mantendo união consensual com uma mulher de 32 anos, com cinco filhos (três dependentes da renda do pai e dois independentes da renda mensal), com cuidadora particular. Doenças de base (HAS/DM). Queixa principal: hematomas, em face decorrente de queda da própria altura.

Os estudantes pertencentes ao grupo I e III deveriam preparar uma dramatização de 15 minutos cada, envolvendo os oito participantes do grupo, respeitando a seguinte ordem de apresentação: nome dos integrantes do grupo e o nome do papel que iria representar, assim como a sinopse da história (local, cidade, ano), equipamentos e materiais utilizados e disposição em círculo ao redor da cena.

O grupo II recebeu orientações de como realizar processamento de dinâmica de grupo e o que deveria observar: organização, conteúdo, participação.

Para realizar o registro da atividade (fechamento), foi solicitado ao grupo IV, que elaborasse um texto manuscrito ao término da atividade, enfatizando a percepção e sentimento do grupo em relação à atividade dramatizada pelos grupos I e III e o processamento realizado pelo grupo II.

Os grupos receberam a informação de que seriam avaliados pelo grupo de processa-mento e pelo professor, e que após a dramatização e processaprocessa-mento, o professor iria conceit-uar, em cinqüenta minutos, pontos chave do problema: comunicação, relacionamento inter-pessoal, ética nas relações, a marcação das cenas para discutir questões como identificação pessoal, técnicas de comunicação, sigilo profissional, dinâmica de trabalho no setor saúde, assim como sanar dúvidas.

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O professor explicitou, novamente, o plano de ensino da disciplina, salientando os desempenhos a serem adquiridos – trabalhar em grupo; comunicar-se com base em princípios éticos e de cidadania; refletir sobre o papel do idoso na sociedade e as políticas públicas voltadas para a terceira idade e o sistema de avaliação do primeiro bimestre. Enfatizou a atividade como atividade prática de valor igual a um (1) com os seguintes critérios para se atingir a pontuação: presença no dia agendado, participações ativa no grupo e na discussão. Fase preparatória e de construção (AQUECIMENTO)

Após resistência inicial, os alunos se organizaram nos pequenos grupos e começaram a elaborar a atividade. Solicitaram à coordenadora do laboratório de enfermagem para ensaiar a dramatização antes da data programada e prepararam com antecedência o figurino e apresentações, bem como o laboratório aonde seria realizada a atividade.

Desenvolvimento (AÇÃO):

As dramatizações foram realizadas de manhã (grupo matutino) e a noite (grupo noturno). O grupo I do período noturno retratou o atendimento humanizado, em um hospital privado, no setor de urgência e emergência. Na sala de triagem a enfermeira, auxiliar de enfermagem, médico acolheu, em equipe, o idoso, sua companheira e seus filhos com educação, cordialidade e respeito (os alunos enfatizaram “senhor”,... “seu José, “...com licença”... “obrigado”...) identificaram, selecionaram o acompanhante de acordo com o desejo do idoso. Equipe atenciosa, realizaram os procedimentos em conjunto, cada um executando sua atribuição... médico e enfermeiro examinaram o idoso, que foi acomodado na maca, com travesseiro... o médico prescreveu a terapêutica, a enfermeira executou procedimentos terapêuticos e prescreveu cuidados de enfermagem; a auxiliar juntamente com a enfermeira realizaram as atividades de enfermagem

A cena dramatizada pelo grupo I do período diurno, demonstrando tratamento humanizado, passava-se num Hospital público, setor de urgência e emergência, quarto de hospital simples, com todos os dispositivos simples (termômetro, estetoscópio...), equipamentos, mobiliário. O idoso chegou com sua acompanhante, sendo acolhido pela enfermeira caracterizada com roupa branca “impecável”, cabelo preso, prancheta em mãos. Acolheu o idoso e sua companheira, tranqüilizando-os quanto à situação, cuidando imediatamente do ferimento, acompanhou o idoso em todos os procedimentos, fez intervenções, trabalhando em equipe.

A dramatização realizada pelo grupo III do período noturno, retratando o atendimento não-humanizado, utilizou personagens e caricaturas de enfermeira, auxiliares de enfermagem, médico, idoso, acompanhante e usuários de um serviço de saúde do setor público. O tratamento utilizado no diálogo com o indivíduo hospitalizado foi impessoal, e a

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equipe apresentou-se com dificuldades de comunicação entre eles, com o paciente e o familiar. A cena ocorria em um quarto de hospital, na qual a auxiliar de enfermagem entrevistava o idoso e sua acompanhante, fazendo ironias à sua situação conjugal e financeira, enquanto o usuário no leito ao lado estava solicitando, desesperadamente, um papagaio para urinar, verbalizando que iria levantar, até que o fez e cair no chão.

O grupo III do período diurno dramatizou outra cena que demonstrava claramente a comunicação não-verbal em atendimento médico e de enfermagem, em unidade de Pronto-Atendimento onde, tanto a enfermeira quanto o médico demonstravam faces de tédio, descaso e alívio. A enfermeira sequer olhou para o idoso na triagem, durante a verificação de sinais vitais: pulso, Pressão Arterial, temperatura, mantendo-se conversando com colega ao lado, com face alegre. Quando o idoso ou acompanhante faziam algum questionamento, a Enfermeira, respondia de costas e com face de raiva. E depois com expressão de alívio, encaminhou o usuário ao atendimento médico.

Esse médico estava no celular, conversando alegremente. Chamou o idoso demonstrando raiva e descaso. Olhou somente para o hematoma da face do idoso, sem verificar que apresentava outros hematomas sugestivos de agressão. Tampouco observou a presença de dificuldade de marcha, solicitando a acompanhante (companheira) que o levasse à sala de Raios-X deambulando.

Processamento da dinâmica – Compartilhamento Verbal

Os componentes do grupo II sentiram, durante a preparação da turma da manhã, que “os alunos mostraram-se apreensivos e muito motivados”. Colheram relatos do grupo que estava assistindo, tais como:

Turma da manhã

Atendimento não humanizado

“a enfermeira responsável pelo plantão sem nenhuma ética; passagem de plantão inadequada e desordem total, funcionários estressados e sem técnica correta para os procedimentos...foi até divertido...rimos um monte, mas isso às vezes mostra como é a realidade em muitos locais de serviço, setores cheios, poucos funcionários...o grupo se apresentou de maneira clara, deixando-se levar um pouco para o lado do humor....”

Atendimento humanizado

“enfermeira atenciosa, chamando o senhor pelo nome, dando a devida atenção, exame físico completo, troca de plantão sem desordem...realizado o atendimento em um hospital da rede particular com número adequado de pacientes para cada funcionário...quem tem mais dinheiro pode pagar por um atendimento melhor...o que não deveria ocorrer, pois está escrito na constituição que todo o cidadão tem direito à saúde...”

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Turma da noite

Atendimento humanizado

“o idoso internado, encontrava-se em leito apropriado e limpo, a enfermeira e os funcionários o chamam pelo nome, quanto aos acompanhantes que estão aflitos pela situação de internação a enfermeira orienta e explica todos os procedimentos que iram ser feitos...explica ao idoso todos os cuidados que irão ser realizados...”.

“a realização dos sinais vitais é feita na técnica correta e com orientação...a enfermeira realizou a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) corretamente”.

Atendimento não humanizado

“ ao chegar a recepção do hospital de cadeira de rodas o idoso já encontra dificuldades, como demora para ser atendido...no local de atendimento não tem funcionário da enfermagem para recepcioná-lo e o idoso se levanta da cadeira...senta-se em local inapropriado a sua idade...”

“a auxiliar de enfermagem verifica os sinais vitais sem muito interesse e cuidado ...a médica que o examinou (nem ao menos olhou para o paciente) ...a enfermagem explica o básico de informação e não acompanha o idoso ao setor de raio X...”

“ os profissionais comentam entre si e com outros pacientes a situação social e afetiva do idoso...”

“ a funcionária da enfermagem chama o paciente não pelo nome e sim com apelidos desnecessários como “vô”, “vôzinho”, “bicicletinha”...e conversa com o idoso enquanto lixa as unhas”

Processamento da dinâmica – sistematização escrita Turma da manhã

“os alunos desempenharam bem os papéis que foram propostos, deixando evidente a diferença de um atendimento para o outro, mesmo em um curto espaço de tempo para a elaboração das apresentações e conseguiram atingir os objetivos propostos”

Turma da noite

“...a atividade foi de grande ajuda para observarmos na prática como são tratados os idosos”.

Após o fechamento feito pelo grupo, a Professora retomou conceitos (que continuou explorando nas aulas seguintes), utilizando dos conteúdos emergidos nas cenas dramatizadas, sobre conceito de comunicação; comunicação verbal e não-verbal (ex: médica e da funcionária da enfermagem lixando as unhas); comunicação com o idoso, peculiaridades anatômicas e

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fisiológicas do envelhecimento: mudanças no cérebro, nos sentidos, o que é acolhimento, segundo o Humaniza SUS; e os princípios da carta dos direitos dos usuários da saúde, que cabe aqui transcrever: 1. Todo cidadão tem direito ao acesso ordenado e organizado aos sistemas de saúde; 2. Todo cidadão tem direito a tratamento adequado e efetivo para seu problema; 3. Todo cidadão tem direito ao atendimento humanizado, acolhedor e livre de qualquer discriminação; 4. Todo cidadão tem direito a atendimento que respeite a sua pessoa, seus valores e seus direitos; 5. Todo cidadão também tem responsabilidades para que seu tratamento aconteça da forma adequada; e 6. Todo cidadão tem direito ao comprometimento dos gestores da saúde para que os princípios anteriores sejam cumpridos.

8. DISCUSSÃO

O papel da educação atual mundial consiste em propiciar meios para o desenvolvimento humano nos campos cognitivo, afetivo, social e político e garantir a inserção dos indivíduos ao meio social. Para se atingir isso, é necessário propiciar vivências educacionais nas quais os núcleos do processo ensino-aprendizagem atendam às novas perspectivas da sociedade.

A partir do momento em que se fez a proposta para a atividade descrita neste trabalho, a resposta inicial dos alunos foi de recusa e desinteresse, com conversas entre eles e frases ditas em volume suficiente para o professor ouvir, que queriam aula expositiva, que “onde já se viu... a professora não dar aula...”, sugerindo apreensão com a novidade. Essa estranheza é conseqüência da cristalização de modelos onde o professor é o detentor do saber e o aluno escuta, memoriza e depois reproduz na prova exatamente como lhe foi dito ou lido nas bibliografias indicadas pelos professores, como bem colocado na literatura por Pimenta e Anastasiou (2010).

Porém, tão logo os alunos aceitaram a atividade, começaram a se organizar e a trabalhar em grande e pequeno grupo, demonstrando interesse e envolvimento, num fluir de idéias e sugestões, retratando o que Luckesi (2006) quer dizer quando afirma que a educação reproduz o vigente na sociedade, mas também a renova.

Conforme visto em Felipe (2007), uma atividade simples, inicialmente aversiva, pode transformar-se em algo motivador, agrupando pessoas em prol de um objetivo em comum, intensificando a interação entre os envolvidos.

A mobilização com a atividade se estendeu durante toda a semana que a antecedeu, estreitando o relacionamento e enriquecendo os detalhes das cenas e atuação dos atores, relacionadas, para a maioria, às cenas presenciadas no dia-a-dia de seus trabalhos. Isto é, o conteúdo grupal foi conseqüência das experiências prévias de cada um, na grande maioria trabalhadora e, na sua totalidade, usuários dos serviços de saúde. Tanto na posição do profissional, do usuário ou acompanhante, todos já tinham vivenciado algum tipo

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de atendimento que trouxeram para a montagem das cenas, enriquecendo-a. Essa soma dos indivíduos que se transforma na do grupo e torna-se fonte de capacidade e energia desconhecida pelos membros isoladamente, foi descrita na literatura por Idáñez (2004).

Na dramatização, propriamente dita, as cenas do tratamento humanizado e não humanizado pelos alunos do período matutino e noturno retrataram com fidedignidade as encontradas nos serviços de saúde: profissionais antiéticos, descaso, morosidade, displicência e negligência, contrapondo-se a acolhimento humanizado, onde as informações pessoais e a intimidade dos usuários são respeitadas e tratadas de forma sigilosa, acolhedora e confortável, conforme preconizado pela política do HumanizaSUS. Desde a apresentação pessoal, passando pelo acolhimento, verificações dos sinais vitais, exames nas consultas, encaminhamento até a finalização do atendimento, foram mostradas nas dramatizações e depois retomadas no processamento: os pontos positivos e negativos, as condutas adequadas e inadequadas dos profissionais, mostrando a pesquisa e reflexão que os alunos fizeram sem a participação do professor.

De modo geral, um dos grupos tendeu para o humor, deixando o campo relaxado, favorecendo a participação e integração de todos. E nem porisso, como enfatiza Cukier (1992) e Moreno, Z. (2001), as situações retratadas foram banalizadas, mas, pelo contrário, deixaram bastante claros conceitos importantes sobre ética, cidadania, respeito ao idoso, acolhimento, humanização, dentre outros.

Interessante observar que a deixa (ou “consigna”, no psicodrama) para as “fofocas” decorrentes da diferença de idade tão elevada entre o cliente e sua companheira - tão comuns em situações desse tipo nos ambientes de trabalho, como podemos ver na literatura (Friedmann, 2004), - foram pouco exploradas pelos grupos, apesar da caracterização dos atores evidenciarem essa condição.

Outro aspecto que chamou a atenção, contrariando o esperado, conforme levantado por Friedmann (2004), é que não houve nenhuma reação negativa, não aparecendo a figura do arrogante, do crítico e nem daquele que não participa: todos os alunos participaram, com conteúdos sérios e importantes, expressos de forma espontânea e permissiva.

Os grupos de processamento e fechamento cumpriram o seu papel, dando feedback, documentando a atividade e fechamento à vivência grupal.

As lacunas, pontos importantes e conteúdos adicionais foram preenchidos pela professora, num clima de troca e maior envolvimento. Como afirma Ferreira e Ramos (2006), com dados de realidade, professor e alunos dialogam e a relação ensino-aprendizagem se dá de maneira mais eficaz.

Retomando as constatações de Tobase; Gesteira e Takahashi (2007), a dramatização é uma ótima estratégia para facilitar a aprendizagem, pois dá significado aos conteúdos, permite uma visão integral do outro, favorecendo as competências necessárias para o profissional de Enfermagem que o mercado busca e valoriza nos tempos atuais.

Referências

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