CONTRIBUTOS
SEMITICA
ESPAO GEOGRFICO
Maria Jlia Ferreira
Introduo
A procura dos
significados,
dossignos
que se escondem por detrs dos sinais que enchem o nossoquotidiano,
no constitui umcampo cientfico com muito relevo dentro da
geografia
portuguesa,apesar de existirem
importantes
trabalhos fora do nossopas;
noentanto, a necessidade de ir alm da
descrio
dos factosgeogrficos
e da suarepresentao
"ingnua"
faz entrar nesse domnio. As disciplinas
que aparecem maisligadas
problemtica
da semitica so aarquitectura,
aantropologia,
asociologia,
as cincias dacomunicao,
alingustica
e apsicologia.
Os sistemas de
significao
afectam os derepresentao
e aambiguidade
dos conceitosapresenta-se
como umalimitao
quepreciso
ter em conta. O debate e oaprofundamento
da temtica tm o mximo interesse para ageografia
terica, colocando-se asseguintes
questes
que orientam a reflexo a fazer: Opragmatismo
das socieda des modernas e,portanto,
aprtica
cientfica actual, reduz aimpor
tncia da procura incessante dassignificaes,
dapesquisa
sistemtica? Estas
preocupaes
tericas socompatveis
com oempirismo
que tem caracterizado ageografia?
Quais
so asimplicaes
e osimpactos
destaabordagem
nadisciplina geogrfica?
Aapropriao
dapaisagem pelos
sistemas sociais eeconmicos,
nomeadamente comocdigo publicitrio,
tem efeitos naprtica geogrfica?
Revista da Faculdade de Cincias Sociaise Humanas, n." 10, Lisboa,Edies Colibri, 1997,
Se os sistemas de
significao
afectam as formas de representao
dapaisagem, objectos
dadisciplina geogrfica, justifica-se
areflexo sobre os valores e as
ideologias
que se manifestam atravs dos sinaisnaquela
inscritos.1. A
representao
do espaogeogrfico:
o
objecto
e osujeito
- observadorRepresentar
o espaogeogrfico
construir umaimagem:
oindivduo, no seu contacto com o
meio,
interioriza elementos dapai
sagem que ficam retidos na memria sob a forma de uma
imagem
residual; esta
depende
do filtropsicolgico
da transmisso(onde
tambm actua o
comprimento
deonda)
e de caractersticaspessoais
(apsicologia
individual e opapel
doinconsciente)
e sociais(destaca-se
aaprendizagem
cultural esocial);
essaimagem
residual a base para atextualizao
do espaogeogrfico1.
Assim,
arepresentao
umaespcie
deespelho,
umajanela
sobre omundo,
umaconstruo,
quereporta o
passado
para o presente; quem a faz reflecte nela elementospessoais
depercepo,
cognio
e comportamento; elaincorpora,
tal como nos seusprimrdios,
"ospreconceitos,
osvalores,
asprefern
cias,
asparcialidades,
avivncia,
a curiosidade, aimaginao,
a ateno,
ainteligncia
e aformao
do seu autor"2.Estes elementos
subjectivos,
associados simagens
provenientes
dos mass media eprpria
emotividade dosujeito-observador
(retm
o que gosta ou detesta mas no o que lheindiferente),
entram como filtros naseleco
dainformao, pois: "
o humor de quem olha qued cidade de Zemrude a sua
forma.
Se passarmos por ela aassobiar,
de nariz no ar atrs doassobio,
conhec-la-emos de baixopara cima:
sacadas,
tendas aondular,
repuxos. Se caminharmosatravs dela com o
queixo
contra opeito,
com as unhasespetadas
naspalmas
das mos, os nossos olharesprender-se-o
ao cho, aos regosde
gua,
aos esgotos, stripas
dopeixe,
aopapel
velho. No sepode
dizerque um aspecto da cidade
seja
maisverdadeiro do que o outro"-1.1 A
hierarquizao subjectiva das necessidades (feita, por exemplo, na pirmide de
Maslow) afecta as formas da representao do espao envolvente e a importncia
relativa daquelas traduz nveis de desenvolvimento psicolgico diferenciados,
justificando a utilizao do desenho como instrumento de avaliao, sobretudonas
crianas(A. BAILLY, 1986: 102-103 e R. LEDRUT, 1973).
2 D.
WOOD(1992:23).
Entender o espao
geogrfico
, assim,compreender
ojogo
dossignos
apartir
dosujeito
que faz arepresentao
(etnocentrismoque leva
valorizao daquilo
a que se d maisimportncia).
O espaohabitado nunca totalmente dominado
pela
vista e, por isso, a suarepresentao
umaabstraco
que no se confunde com ele, mesmoquando,
nalinguagem
corrente, perante um mapa, sediga:
" Portugal"
ou " o mundo", como se assim o fora realmente.Representar
o espaogeogrfico
, portanto, elaborar uma ima gem(em
que apaisagem geogrfica,
enquantoporo
de espaoabrangida
pela
viso,
operacionaliza
oobjecto
darepresentao
directa)
mas tambm umconjunto
deprocedimentos
e tcnicas que per mitemfigurar
o espao terrestre; o resultado desse processo, traduzido numsuporte
fsico ou informtico; um artefacto visual para ser lido einterpretado
por umpblico
geralmente
letrado e a anlise da validade do contedorepresentado.
Um espao
geogrfico,
parapoder
serrepresentado,
deve ter:estrutura
(o
espao sseparado
para finsanalticos);
identidade(distingue-se
dosoutros);
significao (relao espacial
eparadigm
tica com o observador e com os
objectos)
e"imagibilidade"
(oulisibi-lidade, visibilisibi-lidade,
comocapacidade
de criar umaimagem)4.
Semnegar a
importncia
das outrasdimenses,
interessa-nos, no caso presente,
explorar
asignificao.
2. Da
semiologia
semitica: ainveno
de novoscdigos?
"O homem
moderno,
o homem das cidades, passa o tempo a ler.L, em
primeiro
lugar
esobretudo,
imagens,
gestos, comportamentos:este carro
diz-me
o estatuto social do seuproprietrio.."5.
Estas "leituras" so muitoimportantes
pois
implicam
valoressociais,
morais(religiosos),
ideolgicos;
porisso,
impe-se
uma reflexo sobre elas, de forma a submeter oconjunto
dos sinais,aparentemente
sem ordem, a umprincpio
declassificao,
por
exemplo,
atravs de um sistema design:f:
O estec1 j ja sinais constitui o
objecto
dasemiologia
(osigno
nafrase,
um ponto designificao)
enquanto
o dasignificao
pertence
ao da semitica(o
texto, um contnuo designificao)6;
assim interes sa passar dasemiologia
para a semitica. 4 K. LYNCH(1960). 5 R. BARTHES0964). 6 A. RENIER (1981:17).SEMIOLOGIA
Sistema de sinais
(formas)
sinais
representao
Em sentido
restrito,
ossignos
so marcas feitas para serem percebidas; esta intencionalidade que os torna
susceptveis
de tratamento
semitico;
eles tm duas componentes: uma formafsica,
uma marca ou um som, ouseja,
o sinal ouexpresso,
e um contedo, ouseja,
umasignificao,
porque: "Os olhos no vem coisas mas simfiguras
de coisas quesignificam
outras coisas: a tenaz indica oarranca-dentes, a
garrafa
a taverna, a alabarda o corpo daguarda,
abalana
romana a ervanria. Esttuas e escudos representam lees,golfinhos,
torres e estrelas: sinal de quequalquer
coisa-sabe-se l o
qu
-tem por smbolo um leo ou
golfinho
ou torre ou estrela.Outros sinais avisam do que num local
proibido
-entrar no beco com as carroas,
(..)
-e do que lcito
-dar de beber s
zebras,
jogar
bola,
(..)"''
'.Quase
todos os sinais sosignos
e, porisso,
tm um sentido associado. "O mundo est cheio designos,
mas nem todos tm a belasimplicidade
doalfabeto
(..)
soinfinitamente
mais astuciosos embora quase sempre os consideremos
"informaes
naturais"; umsigno
ostenta uma
opo
poltica,
umamanifestao
de"poder"(..).
Decifrar
ossignos
sempre lutar contra a aparente inocncia dosobjec
tos, um constante
esforo
deobservao
ereflexo
sobre o contedodas
mensagens(..).
Opoder
est presente nos mecanismos mais subtis da troca social: no s no Estado, nasclasses,
nos grupos, mas ainda nasmodas,
opinies
correntes,espectculos,
jogos,
desporto, infor
maes,
relaes familiares
eprivadas
e at nosimpulsos
libertado res que procuram contest-lo"8.Por
isso,
segundo
P. BOURDIEU, h que re-orientar o olhar,7 I. CALVINO(1990: 17). 8 R. BARTHES(1986: 238-250). SEMITICA Sistema de significao (contedos) significados cdigos smbolos
textualizao (mtodosda semitica)
conotao apreenso
abater as
barreiras,
adoptar
o mtodo dacrtica,
apesquisa
sistemtica, como
suportes
de toda aactividade9,
h que aceitar a no inocn cia dosobjectos,
procurar ossignificados
deconotao
e das determi nantes(ou
seja,
a intencionalidade dossinais),
pelo
menos seacreditamos em Humberto Eco
quando
diz: "A actividade de redesco brirsignificados
para as coisas, ao invs de exercitar-nos numafilologia
emrelao
aopassado, implica
umainveno
(no umaredescoberta)
decdigos
novos. O salto para trstransforma-se
emsaltopara
afrente"]0.
Mas ser que a semitica do espao
geogrfico
se distancia dasemiotizao
do real atravs dalngua,
do discurso e dapalavra?
apenas ainveno
de novoscdigos?
3. A
paisagem
e o espaogeogrficos:
realidade e conceitosA ideia de
paisagem
remete para o processo depercepo
do espao(confundindo-se
muitas vezes com o conceito de espao vivido),
para arepresentao
daquilo
que nos envolve (em que o peso dasubjectividade
influenciadapelo imaginrio
colectivo),
para a natureza
(traduzindo
um sentimento defiliao
quejustifica
a felicidade humana ou a suaperda)
e para a histria dosjardins
e dos espaos verdes.Em sentido mais restrito e
reducionista,
apaisagem
significa
umaporo
do espaogeogrfico
em que acomponente
fsico-natural dominante. No entanto, no dizer de C. SAUER: "Apaisagem
sobre tudo cultural(conceito
que remonta aos anos vinte destesculo);
elao
conjunto
dasformas sobrepostas
paisagem
fsica
pelas
actividades do homem"u
. A escola da
geografia
cultural12 defendiaque o carcter de uma rea ou
regio
era conferidopela
cultura e que a estticajogava
umpapel
importante (destacando-se
aarquitectura
e os modos devestir).
Esta corrente deixou-se,depois,
dominarpelo
paradigma
funcionalista,
concentrando aateno
nos sistemas actuais e nos processos que ossuportam.
O quedefine,
ento apaisagem
9 Cfr. P. BOURDIEU0989: II). 0 H. ECO (1976:214). 1 CO. SAUER (1925). 2 A escola historico-cultural
prcocupou-se sobretudo com as origens das culturas, a
sua distribuio primitiva, difuso ccaractersticas actuais, tentando a reconstruo
geogrfica?
A individualidadeconseguida
atravs dahomogeneidade
dealguns
dos seus elementos(quais?)
emoposio
com a envolvente?Ela um espao
geogrfico
apropriado
(um
espaovivido?),
"aextenso terrestre utilizada e ordenada
pelas
sociedades tendo emvista a sua
reproduo
(...)
quecompreende
oconjunto
doslugares
e as suasrelaes"
l\
confundindo-se,
muitas vezes, comambiente;
um sistema derelao
e umproduto
social,
organizado,
em que se identificam 5tipos principais
deaco:
apropriao, explorao,
habitao,
troca egesto14.
Ela afinal quase
tudo,
podendo
apresentar escalas etipologias
muitovariadas;
falamosdela,
porexemplo,
como sinnimo do espao visual a olho nu ou dosgrandes
domnios ao nvel mundial, depaisa
gens culturais,polticas,
urbanas, rurais, litorais,
florestais,
minhotasou
alentejanas;
umas vezes com nfase naescala,
outras vezes natipologia
mas traduzindo sempre uma sntese entre o natural e ohumano. O cientismo tem levado procura de taxinomias ou
tipos
ideais (no sentido
Weberiano)
mas as propostas no tm feitohistria;
destacam-se,
pela
actualidade,
as de R. BRUNET sobre os "coremas"15 e os"corotipos"16.
Apaisagem
ser,
ento, um"corotipo",
uma composio singular
de "coremas"?De uma maneira
geral,
noplaneamento
do territrio apaisagem
tem umaconotao
dejardim
e de espaos verdes,aparecendo,
porisso,
como um elemento a proteger, uma reaprivilegiada;
um ele mento naclassificao vegetal
e no zonamento dos usos do solo; umargumento de venda atravs da
aparncia
e daimagem
de um dadoespao, uma rea
turstica,
deacolhimento,
delazer,
deanimao.
Referem-se,
emgeral,
aspaisagens
naturais(sobretudo
plancies
litorais,
demontanha,
fluviais,
foz dosrios,
vulcnicas, vales e desrticas)
e sculturais;
dentro destas destacam-se as urbanas(marcadas
pelo
povoamento,pelas
construes,
pela circulao, pelo
movi-li R.
BRUNET(1992:180). 14 Clr. R.
BRUNET(1992:180).
15 Em
1924, J. Slch propusera o termo "chore" (C. SAUER, 1925, TheMorphology of Lansdcape; in Human Geography, Editcd by J. Agnew et ai., 1996: 300); R. BRUNET (1980) retomou e desenvolveu o conceito, que identifica as estruturas elementaresdoespaogeogrfico (C.GRATALOUP, 1996:197).
16 Termo
proposto por R. BRUNET (1987) para designar um estado intermdio na
mento)
e,actualmente,
as "do territrio do automvel"17que criam
novos
sinais,
sopaisagens
de redes e no delugares,
espaos-movi-mento assentes na
heterogeneidade,
que revalorizam ageo-histria,
oselementos naturais e a
responsabilidade patrimonial
sobreestes18;
apaisagem
passou a ser umimportante
objecto
de consumo19, uma vitrinegigante.
A raridade do elemento natural torna-a, cada vez mais, umobjecto
domarketing,
muito valorizado no contexto do actualparadigma
ambientalista.4. A
Geografia
como arte de representar apaisagem
A
paisagem geogrfica pode
ser considerada como oconjunto
designos
que caracterizam uma unidadegeogrfica
nos domnios fsico e humano; noincio,
o conceito tinha um fortependor
descritivo,
passando,
depois,
a traduzir a sntese dos elementos naturais com astransformaes
acumuladaspelas
diferentescivilizaes.
Ela s temsentido a
partir
de um actor, dosujeito
que apercepciona;
por isso, a sua leitura tem de seraprendida;
ela umobjecto
de estudo. complexa
porque reneconjuntamente
elementos naturaissignificantes,
noapropriados
eapropriados, cdigos
sociais(nos
quais
se relevam osarquitectnicos,
construdos),
cdigos paisagsticos
e estruturasmuito diversificadas
(sistemas
dereas,
dejardins,
porexemplo,
e sis temas deredes,
de corredoresverdes).
Dela fazem parte sinais (marcas feitas sem
inteno)
esignos,
identificandolugares,
indicandoafectao
de usos,obrigao, interdio, autorizao, orientao,
canalizao
dacirculao20.
P. GUIRAUD21 considera que os
signos
sociais so sobretudo os17
G.DUPUY(1995).
18
As vias decirculao so vitrines gigantes para tudo o que vcndvel e comunic
vel; a economia turstica a grande consumidora das paisagens e a 3a idade
constitui o principal grupo de consumidores.
19
O conceito de regio como uma paisagem homognea natural (ou um conjunto
destas) foi cedendo lugar, primeiro ao de regio polarizada (princpio da unicida
de) e, depois, ao de uma estrutura em rede (princpio da conexo e da hierarquia); agora as novas tecnologias permitem repor alguns elementos do princpio da
homogeneidade
sobre o da unicidade, assumindo, no entanto, que todas as paisagens esto apropriadas pelo homeme que a explicao de natureza cada vez mais
social e universal. !0 Cfr. R. BRUNET
(1992:338).
:l
de identidade do indivduo ou do grupo e os de cortesia e que os cdi
gos so os
protocolos,
osritos,
as modas e osjogos;
ageografia
preo-cupa-se com os que se marcam, de formadirecta,
napaisagem;
ossignificados
associados maisfrequentes
so a tica(dentro
dela,
o valor moral e aconduta),
a esttica(congregada
volta do valorpls
tico, do
belo),
opoder
(envolvendo
quer o domnio quer aspertenas),
a funcionalidade(onde
se destaca o sentido doprtico,
oconfortvel,
aorientao
e adireco)
e a intencionalidade(assumindo
a sua for ma extrema nomarketing).
A semitica das
paisagens geogrficas
(como
a cincia dasigni
ficao)
remeteprincipalmente
para osarquitectos
(desenvolveu-se,
primeiro,
naEuropa
e estendeu-sedepois
aosEUA)
e aparece sobvrios
ttulos,
dentro dosquais
se destacam:"semiologia
ou semiticaurbana, do ambiente construdo,
tpica
e semitica doespao"22.
A diversidade de trabalhos assenta em trspostulados
comuns:"
Toda
a realidade
espacial
tem uma dimensosignificante";
"Esta dimensosignificante
apela
a um conhecimentocientfico";
"Asemiologia
ou asemitica
espacial
servir defundamento
tericorestituio
dassignificaes,
sentidos,
atribuies perdidas,
da realidadeespacial
considerada"11,.A semitica
funciona,
portanto, comolegitimao
cientfica davontade de dominar as
significaes
associadas aos espaosgeogrfi
cos epaisagem. Apesar
dos avanos parecerem rudimentares, ela constitui-se comoobjecto
deimportantes
trabalhosprincipalmente
nas correntes
ps-modernas,
levando aquestionar
oparadigma
funcionalista que tem abafado o seu desenvolvimento. No entanto, a
semitica da
paisagem
continua a estarcarregada
deambiguidades
porque ossignos
noimplicam
uma mas vriassignificaes:
a portadas cidades est l como "rito" de passagem ou para assegurar melhor a defesa da cidade? O redondo
perfeio
ou asoluo
mais cmoda e eficaz para reduzir ao mximo opermetro
a defender?24 "Apaisagem, normalmente,
nofoi
criada parasignificar
(...),
no aexpresso
de umprojecto
mas o resultado de umamultiplicidade
deactos (...),
produto
daprtica
exercida sobre o mundofsico"25.
Muitos autores consideram que "a
expresso
semiologia
das22 P.MERL1N(1988:613). 2:1 P. MERLIN (1988: 613-614). 24 Cfr. R. BRUNET (1992: 338). 25 R. BRUNET (1992: 338).
paisagens
geralmente
um abuso de termos, salvopara certos
tipos
de
criao
consciente depaisagens
comfins
estticos ou simblicos"26.
Enquanto
nacartografia significa (pelo
menos desde J.
BER-TIN27)
as regras de bom uso dossignos
esimbologia
daslegendas,
na anlisegeogrfica
perde
o sentido porque aspaisagens
no tmsigni
ficao;
so formas que indiciam muitas coisas sem ter a intencionali dade como caracterstica intrnseca. Ainvestigao
geogrfica
pren-de-se, em
geral,
com o exame dos sinais nointencionais,
que se
observam na
paisagem,
que se lem nas estatsticas e nos textos, que definem asdistribuies
nas cartas e nos mapas.Mas,
"Ento dizPantgruel
"Se ossignos
vosfascinam,
oh quanto vosfascinariam
ascoisas
significadas"
2S.No contexto da
semitica,
ageografia pode
ser entendida como:uma arte de representar, descrever e descodificar a paisagem, logo com capacidade
de proporalgo que surpreenda os fruidores;
um servio prestado no sentido do bom entendimento do espao geogrfico e da funo queeste desempenha nas (epara as) diferentes sociedades;
uma tcnica de codificao das imagens sobre o real, dos significantes, dos
significados e das ideologiasde
suporte29.
Arte,
tcnica,
servio
oudisciplina
cientfica,
ageografia
tem deprivilegiar
oscdigos
visuais(sobre
oslingusticos
etextuais),
factoque leva aos
seguintes
domnios do saber: estrutura da realidade; condies
dapercepo
ecdigos
perceptivos;
cdigos
daexperincia
ecdigos
dereconhecimento;
factores decodificao
eexpressividade
doscdigos;
tipos
designos
e processos e tcnicas dedescodificao.
A geografia deve ento dispor de princpios orientadores da leitura da paisagem
geogrfica e atender s formas significantes, aos cdigos elaborados com inferncia
dos usos (funcionalidade), sestruturas como modelos de relaese aos significados
denotativos (deuma funo) econotativos (porexemplo, da ideologia da funo).
A
representao
daspaisagens
deverespeitar pelo
menos 426 R. BRUNET
(1992: 412). 27 J.
BERTIN(1967).
28 RABELAIS
(IcTiers Livre, 20) in R. BRUNET ( 1992: 412). 29
princpios
fundamentais: localidade ou stio(remete
para aimportn
cia da
geografia);
mobilidade ou movimentogeogrfico
emudana
histrica
(como
o processo deconstruo
e aspermanncias,
ouseja,
aimportncia
dahistria);
identidade colectiva(traduz
aligao
com a comunidade que lhe dvida)
e diversidade esingularidade
dosluga
res(valorizando
os casos nicos ouraros).
Elapode
serentendida,
deforma reducionista, como
produo cartogrfica;
nas formasproduzi
das por esta, destacam-se os mapas
topogrficos,
afotografia
area e asimagens
de satlites. Osprimeiros
constituem umaimportante
tentativa de dar uma vista do mundo como ele
,
privilegiando
osprinc
pios
dalocalizao
e da diversidade doslugares.
O avano das tecnologias
dereproduo permitiu
novostipos
de mapas e adigitalizao
das
imagens
atravs dos scannerspossibilitou
diferentes nveis deresoluo
e, porisso,
configuraes
com aspectos variados.A
fotografia
areaintroduziu,
de forma maiseficaz,
a 3a dimenso e aumentou as escalas das
representaes
que eramestticas,
momentneas e
dependentes
daspossibilidades
dos voos e das condies
atmosfricas. Acaptao
deimagens
apartir
de satlites elimi noualgumas
daslimitaes
dafotografia
area,
abrangendo
reasmuito mais extensas
(at
cerca de35000km2),
no necessitando dasmontagens outrora
exigidas
epodendo
ser feitacontinuamente;
a suaanlise assenta em
complexos
sistemas decodificao
e descodificao
de sinais e emcdigos
visuais com suportedigital, logo
numrico,
adequando-se
aos tratamentos estatsticos nas diversas escalas demedida. Nos dois casos, o momento da tomada de vista fundamental para definir as
imagens
porque ascondies
atmosfricas afectam os sinais e, porisso,
a suarelao
com osobjectos,
ouseja,
alm dosujeito-observador,
a atmosfera constitui tambmumimportante
filtroda
representao.
As
imagens
de satlitepermitem acompanhar,
em tempo real, asmudanas
operadas
nos usos do solo(por
exemplo:
as extenses dosfogos,
das reasardidas,
daspotencialidades
do subsolo, das transformaes
em curso nasperiferias
dasgrandes
reasurbanas),
sendo um instrumentoindispensvel
noprocesso de tomada de deciso sobre as
polticas
deinterveno
noterritrio;
facilitam o domnio e ocontrolo da
apropriao
do espaogeogrfico
e, porisso,
sosuportes
dasprticas profissionais ligadas
a essasproblemticas.
As novastecnologias
darepresentao
doespao
geogrfico reforam
o fortetropismo
que apaisagem
continua a terpara a natureza: evocar a
pri
meira
implica
evocar asegunda (sem
a reduzir aesta),
traduzindo adualidade homem/natureza e
passando
pela
indicao
destios,
luga
res e territrios de ordem natural e sobrenatural (como santurios
naturais)30.
5. A
paisagem,
elemento simblico ecdigo
publicitrioNos
cdigos publicitrios
possvel
encontrarmltiplos
exemplos
deutilizao
dapaisagem
como elementopersuasivo,
como instrumento da sociedade de consumo. Muitos deles so formados
por
um cone
(ou
vrios),
uma mensagem visual ou verba! (muito curta eincisiva, assemelhando-se a um
slogan)
e uma estrutura ouinteraco
que visa o efeito
persuasivo (suportada
porideologias,
dentro dasquais
se destacam: a daesttica,
a da luta de classes, a de consumo e a ambientalista ounaturalista).
Umexemplo
interessanteapresentado
por B. TOUSSAINT31 sobre apublicidade
doqueijo
francsRoquefort,
feita
pela respectiva
sociedade;
assenta em duasimagens
separadas
por um texto:
a Ia
imagem
tem umlago
oval,
carneiros e ovelhas a beber. natureza comsol,
selvagem
com rochedos e rvoresespinhosas;
o texto est numa
etiqueta
verde oval, smbolo degarantia
doqueijo,
e diz: "umaregio (pays),
homens,
umqueijo";
a 2a
imagem
uma cave de cura doqueijo,
parecendo
muitoantiga,
comprateleiras
emoval,
de madeira, com bolor,queijo
emfermentao,
toselvagem
e desrtica de homens como aimagem
anterior.
Os
principais significados
deconotao
so: natural, naturezaselvagem
elivre,
fantasmaecolgico
com a naturezalimpa
e sempoluio
(ausncia
dohomem);
lago,
frescura, pureza; ovelhas porque oqueijo
deovelha;
oval porque oqueijo
oval. As determinantesso sobretudo: rudeza dos aforismos camponeses; estrutura ternria da
composio;
amorfologia
oval como base; autenticidade; natural,gosto
pela
natureza,pelos produtos
no industriais(oposio
clssicanatureza/indstria);
gosto
pelo
antigo,
pela
tradio
culinria. A estru tura ternriaperfeita
e temcorrespondncias
directas:30 Utiliza-se
o conceito de paisagem
quando
se refere a uma ordem espacial, esttica, artstica ou plstica e o de ambiente quando sepretende
situar mais no campocientfico. Neste caso, o objectivo a proteco e a conservao das espcies e
naquele traduzir as dicotomias: urbano/rural; cheio/vazio; belo/leio; forte/fraco;
imponente/dbil.
31
sinais e estrutura significados de conotao Ia imagem
-paisagem, verde, selvagem (natureza, lago oval,ovelhas)
regio (natural, no poluda)
texto- elemento humano >
(etiquetaverde, oval: regio, homens, queijo)
homens
2a imagem
-ambiente, antiguidade > (cave do fabrico, antiga, queijo oval)
queijo (tradio, autntico)
Fonte: B. TOUSSAINT,
adaptado
Como se
v,
apaisagem
usada como smbolo que, no contextodo "fantasma
ecolgico"
serve de elementopersuasivo,
para conven cerque oproduto
dequalidade, garantido,
autntico.Concluso
A
ambiguidade
dosconceitos,
espao epaisagem,
no os invalida como instrumentosoperativos
dageografia
que assenta na observao, representao
ecompreenso
dos elementosdaqueles
e dos sinaisque afinal so
signos
porque transportamimportantes significados
deconotao.
Arepresentao
daspaisagens geogrficas, seja
mental outransposta para um suporte fsico ou informtico
(uma
carta, ummapa, uma
fotografia
ou umaimagem
desatlite), pressupe
um sistema decdigos,
desinais,
designos,
que do sentido aos elemen tosfigurativos.
Aevoluo
dasemiologia
e da semitica nas representaes
geogrficas
reflecte a das cincias e daprpria
sociedade e asconcepes
sobre o mundo e asforas
que o governam. Halteraes
que, por serem
paradigmticas,
afectam oprprio
sistema designifi
cao;
o que acontece, porexemplo,
com apaisagem
no contextodos novos "territrios do
automvel",
apropriada pela
sociedade deconsumo, utilizada como
grande
vitrine e meio para chamar aateno,
para informar e para vender. A
paisagem geogrfica
no,
portanto,
apenas a realidadepassiva, objectiva,
neutra, exterior ao observador;, cada vez
mais,
um elementoapropriado pelos
sistemas econmicose sociais e um smbolo de
identidades;
tem um valor comercial quefuno
da raridade e do exotismo dos seus elementos;preenchida
por sinais e
signos
mas tambm usada como smbolo(de
marca, deEstas
preocupaes,
que nos remetem para asemitica,
tm efeitospragmticos
nageografia,
nomeadamente: naobservao
daspaisagens,
de vistaspanormicas, pois
levam a olhar para alm do que se v(sinais),
procurando
o quesignificam
(signos)
e asrelaes
(estrutura)
e porque se admira o que se v(valorizao);
na anlisedos mapas, como
esteretipos
daspaisagens,
procurando,
para alm dos elementos, as estruturas, asrelaes,
ossignificados,
e no esque cendo que atemporalidade
de cada elemento est quase sempre ausente; na anlise dapaisagem
urbana,exigem
que no sefique
no"morfologismo",
nos aspectosespaciais,
mas que se v maislonge,
at estrutura dos discursosurbansticos,
dos que a construram (racional)
e dos que a usam(no
racional,implcita,
latente).
Discurso que seintegra
nas correntesps-modernas
e passa da dialcticahomem--natureza para
relaes
multidimensionais maiscomplexas32.
A
apropriao tecnolgica
dasrepresentaes
daspaisagens
nopode
levar a uma atitudepassiva
ouperda
da criatividade mas a uma reflexoaprofundada
sobre asperdas
e osganhos
para adisciplina
como efeitos dos avanos verificados. O domnio dacomplexidade
dos sistemas de sinais envolvidos tem de seracompanhado
por uma atitude constante deinterrogao
epela
procura dos sentidos e dossignificados.
Assim, ageografia
moderna, aparentemente tecnicista, maiscultural,
pois
tentacompreender
ojogo
dossignos
queorgani
zam apaisagem
geogrfica
e as suasrepresentaes
simblicas,
ven-do-a como uma estruturageradora
designificados
e como um elemen toapropriado pelos
diferentes sistemas que formam as sociedades.Bibliografia
BAILLY, A. (1986)
-Reprsentations Spatiales
etDynamiques
Urbaines etRgionales,
Quebec.
BARTHES, R. (1964)
-Elementos de
Semiologia, Edies
70, Lisboa. 1979. BARTHES, R. (1986)-Viagem
na IrrealidadeQuotidiana,
Diicl, Lisboa.BERTIN, J. (1967)
-Smiologie Graphique,
Gauthicr-Villars, Mouton, Paris(ed. 1973). BLIJ, H. J.dc (1971)
-Geography: Regions
andConcepts,
Wilcy
International edition, New York.
BILJ,
H.J.de (1977)-Httman
Geography.
Culture, Society andSpace,
JohnWiley
& Sons, New York.BOURDIEU,
P. (1989)-O PoderSimblico, Difcl, Lisboa.
2
BRUNET, R., FERRAS, R.,
THRY,
H. (1992)-Les Mots de la
Geographie.
DictionnaireCritique,
Reclus, La DocumentalionFranaise,
Paris.CALVINO, I. (1990) - Cidades
Invisveis, Estria, Editorial Teorema, 2a
edio.
DIAS, M. H., coord. (1995)
-Os
Mapas
emPortugal, Edies
Cosmos,Lisboa
DUPUY, G. (1995)
-Les Territoires de VAutomobile,
Anthropos,
Paris.DURAND, G. (1964) -A
Imaginao
Simblica,Edies
70, Lisboa, 1993 ECO. H. (1976)-A Estrutura Ausente.
Introduo
Pesquisa
Semiolgica,
Perspectiva,
S. Paulo.FOUCAULT, M. (1966) - As Palavras
e as Coisas,
Edies
70, Lisboa,1991.
GRATALOUP. C. (1996) - Lieux
d'Histoire, Essai de GoHistoire
Systma-tic/ite, Reclus, Paris.
GREIMAS, A.J. (1976)
-Semitica e Cincias Sociais, Seuil, Paris.
GUIRAUD, P.
(1993)
-ASemiologia,
EditorialPresena,
Lisboa.LEDRUT, R. (1973)
-Les
Images
de la Ville,Anthropos,
Paris.LYNCH, K.
(1960)
-AImagem
da Cidade,Edies
70. Lisboa, 1982.MALHEIROS, J. M. (1995)
-"Fantasias e Realismos da
Geografia
Contempornea" in Actas do //
Congresso
daGeografia
Portuguesa, Vol 1, A.P.G. Lisboa.MARK, D.M., FRANK, A.V., dir. (1991)
-Cognitive
and LinguisticsAspects
ofGeographical Space,
NATO series, Netherlands.MERLIN, P. (1988)
-Dictionnaire de VUrbanisme et
dAmnagement,
PUF,Paris
PUMAIN, D., GODARD, F. (1996) - Donns
Urbaines, Anthropos, PIR. Paris.
RENIER, A. (1981)
-"Espace, reprsentation
etsmiotique
de 1'archi-tecture", Introduction aucolloque,
in AAVV-Espace &
Reprsen
tation, Les
ditions
de la Villete, Paris, 1982 (ed. 1989).SAUER, C. (1925)
-The
Morphology
ofLandscape,
in HumanGeography.
An Essential
Anthology,
J.Agncw,
D.Livingstone,
A. Rogers (edit.),1996, Blackwell Publishers, Oxford. TOUSSAINT, B. (1978)
-Introduo
Semiologia,
Pub. Europa-Amrica,col. saber, Lisboa, 1994.
WOOD, Denis (1992)
-The Power
ofMaps, Routledge,
London, 1993.Resumo
Partimos de dois conceitos de forte
ambiguidade
(espaogeogrfico
epaisagem
geogrfica)
cm que oprimeiro implica
uma dimenso mais abrannatureza, embora se fale muitas vezes, em
paisagens
culturais cpolticas.
Reflectimos sobre a representao do espao e das
paisagens,
feitapelo
sujei-to-observador(imagem
residual, etnocntrica esubjectiva)
epelo
agente--comunicador
(textualizao
dasimagens
cproduo
cartogrfica
que
procura a
objectividade
e aaproximao
s caractersticas da realidade).As taxinomias
espaciais
no tmconseguido
impor-se
(referimos aproposta feita por R. BRUNET), continuando a faltar a
delimitao
dosobjec
tos de estudo e a sua sistemtica.
Independentemente
da escala c datipologia
a que se reportam, aspaisagens
socomplexas,
cheias de marcas, sinais esignos
queimporta
entender; apresentamos a semitica como um sistema designificao,
um contributo para esse entendimento.Pressupomos
que ossistemas de
significao
afectam as formas de representao dapaisagem,
objectos
dadisciplina
geogrfica, justificando,
assim, a reflexo sobre osvalores e as
ideologias
que se manifestam atravs dos sinais inscritos napaisagem
e o recurso semitica. Arepresentao
daspaisagens
geogrficas,
comoproduo cartogrfica,
assenta em tcnicas de expresso e de comunicao sobre os elementos do espao
geogrfico (suportadas
porcdigos
visuais
espacializados)
e tambm deve procurar, atravs da semitica, acompreenso dos sinais e dos
signos.
A
geografia
moderna, aparentementepragmtica
e tecnicista,pode
sermais cultural, se tentar
compreender
ojogo
dossignos
queorganizam
apaisagem
geogrfica,
vendo esta como uma estruturageradora
designificados
e como um elemento
apropriado pelos
diferentes sistemas que formam associedades.
Rsum
Nous
partirons
de deux concepts degrande
ambiguile
(espacegogra-phique
et paysagegographique)
dont lepremier implique
une dimensionplus large
etplus
abstraite que le second; bien que l'onparle
de paysagesculturels et
politiques,
le paysagepossde
toujours
une connotation lic lanature. Nous rflchirons sur la
reprsentation
de1'espace
et des paysages,faite par le
sujet-observateur (image
rsiduelle,cthnoccntrique
etsubjective)
et parragent-communicatcur
(attribution de textes auximagos
etproduetion
cartographiquc,
cherchant1'objectivit
et1'approximalion
avec lescaractris-tiques
de laralit).Les taxinomies n'ont pas russi
s'imposer,
continuam ainsi subsisterle manque de dlimitation des
objets
d'tude et leursystmatisation.
Indpen-damment de 1'chelle et de latypologic
laquelle
ils serapportent,
les paysages sont
complexes, remplis
de marques,signaux
etsignes quil
estimportam
de
comprendre.
Nousprsenterons
lasmiotique
comme unsystme
designi-fication,
comme une contribution lacomprhcnsion
de cellecomplexite.
reprsentation
du paysage,objcts
de ladiscipline gografique, justifiant,
ainsila rflexion sur les valeurs et les
idologies
qui
se manifestem travers dessignes
inscrits dans le paysage, et d'o, la necessite de recourir lasmio-tique.
Lareprsentation
des paysagesgographiques,
comme productioncartographique,
repose sur destechniques dexpression
et de communication des lments de1'espace
gographique
(privilgiant
les codes visuelsspatialiss)
et elle doit aussi chercher, dans lasmiotique,
1'entendement dessignes
etdessignaux.
La
geographie
moderno, apparemmentpragmatique
ettechnique,
peuttre
plus
culturelle, si elle essaie decomprendre
lejeux
dessignes qui
or^ani-sentle paysage
gographique,
tout en le voyant comme une structuregratricc
de