Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVELAGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0000158-65.2014.8.19.0000 AGRAVANTE 1: SARAIVA TRANSPORTES TÉCNICOS LTDA AGRAVANTE 2: EXPRESSO FLECHA DE PRATA LTDA
AGRAVANTE 3: DICANALLI COMÉRCIO, TRANSPORTES E EMPREENDIMENTOS LTDA AGRAVADA 1: RSA SEGUROS S/A
AGRAVADA 2: ANDRITZ BRASIL LTDA
Relator: Desembargador MARCELO LIMA BUHATEM
DIREITO CIVIL – AÇÃO DE COBRANÇA – CONTRATO DE SEGURO – TRANSPORTE DE CARGA -COMPETÊNCIA - FORO DE ELEIÇÃO – VALIDADE - MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUE RECONHECEU A VALIDADE DA CLÁUSULA DE ELEIÇÃO – REJEIÇÃO DO AGRAVO
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos este AGRAVO DE
INSTRUMENTO Nº 0360183-02.2013.8.19.0001, em que é AGRAVANTE: SARAIVA TRANSPORTES TÉCNICOS LTDA E OUTROS e AGRAVADA: RSA SEGUROS S/A e OUTRO.
ACORDAM os Desembargadores que compõem a 22ª
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso.
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RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento interposto por
SARAIVA TRANSPORTES TÉCNICOS LTDA, EXPRESSO FLECHA DE PRATA LTDA e DICANALLI COMÉRCIO, TRANSPORTES E EMPREENDIMENTOS LTDA contra decisão do Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca da Capital que acolheu a exceção de incompetência oposta pelas rés Andritz e RSA, ora agravadas, em ação de cobrança, que versa sobre violação das condições do seguro, que previa a isenção de responsabilidade da mesma quanto aos danos oriundos do transporte de carga, movida por todas as agravantes. Eis a decisão agravada, verbis:
“Com razão o Excipiente. Conforme se verifica do
contrato firmado pelas partes, pela cláusula 25ª, foi estabelecido como foro de eleição a Comarca de Curitiba no Estado do Paraná. Com efeito, a relação
jurídica entre Excipiente e Excepto decorre, indubitavelmente, do contrato de fls,33/52, cujo Foro
de eleição não pode ser ignorado, Destarte, se não
há propriamente uma relação jurídica de direito material entre o Excepto e a Seguradora; eis que esta não faz parte do contrato avençado, a cláusula de eleição de Foro é válida e deve ser observada. Assim, não se tratando de relação de
consumo e prevalecendo o foro de eleição, ACOLHO A PRESENTE EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA,
declinando a competência em favor do Juizo da Comarca de Curitiba IPR, competente para processo e julgamento desta demanda”
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Sustentam as Agravantes que a decisão recorrida deve ser reformada, uma vez que se tratando de contrato de seguro, prevalecem as normas do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser declarada nula a cláusula de eleição de foro em contrato de seguro que indicou a cidade de Curitiba/Paraná para dirimir eventuais litígios decorrentes da avença em tela.
V
VOOTTOO..
Conheço do recurso já que tempestivo e por estarem satisfeitos os demais requisitos de admissibilidade.
Ao se analisar a decisão vergastada, tem-se que o juiz acolheu a exceção de incompetência, com base em cláusula contratual de prestação de serviço securitário, sob o fundamento de que o foro de eleição deve prevalecer, medida que favorece a parte recorrida.
Cumpre destacar que a Segunda Seção do STJ superou discussão acerca do alcance da expressão "destinatário final", constante do art. 2º do CDC, consolidando a teoria subjetiva (ou finalista) como aquela que indica a melhor diretriz para a interpretação do conceito de consumidor (REsp n.° 541.867/BA, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, Rel. para o acórdão Min. Barros Monteiro, DJ 16.05.2005).
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Segundo a teoria finalista, a expressão “destinatário final” deve ser interpretada restritivamente. Com isso, o conceito de consumidor deve ser subjetivo e entendido como tal aquele que ocupa um nicho específico da estrutura de mercado – o de ultimar a atividade econômica com a retirada de circulação (econômica) do bem ou serviço, a fim de consumi-lo, de forma a suprir uma necessidade ou satisfação eminentemente pessoal.
Assim, para se caracterizar o consumidor, não basta ser o adquirente ou utente destinatário final fático do bem ou serviço; deve ser também o seu destinatário final econômico; isto é, a utilização deve romper a atividade econômica para o atendimento de necessidade privada, pessoal, não podendo ser reutilizado, o bem ou serviço, no
processo produtivo, ainda que de forma indireta.
In casu, o contrato de seguro é utilizado pela
sociedade empresária, ora 3ª agravante, DICANALLI COMÉRCIO, TRANSPORTES E EMPREENDIMENTOS LTDA, como garantia de melhor desenvolvimento do seu negócio, minimizando os riscos inerentes a sua atividade, viabilizando-a. Logo, inaplicáveis ao caso as regras do código consumerista.
Nesse sentido a jurisprudência do STJ, in verbis:
CIVIL. CONTRATO DE SEGURO. COBRANÇA DO VALOR SEGURADO. CÓDIGO DE DEFESA DO
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ANOS. INAPLICABILIDADE. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS POR FATO DE SERVIÇO. DESSEMELHANÇA COM A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. PRESCRIÇÃO ÂNUA. CÓDIGO CIVIL, ART. 178, § 6º, II. LEI DE INTRODUÇÃO. ART. 2º, § 2º. RECURSO ACOLHIDO. EXTINÇÃO DO PROCESSO.
I - A ação de indenização do segurado contra a seguradora, decorrente do contrato de seguro, prescreve em um ano, não tendo aplicação o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, dispondo essa
norma a propósito da prescrição em cinco(5) anos nas ações de reparação de danos por fato de serviço, que não guarda relação com a responsabilidade civil decorrente do inadimplemento contratual.
II - Na linha do § 2º do art. 2º da Lei de Introdução, a lei nova, no caso o Código de Defesa do Consumidor, ao estabelecer disciplina especial quanto à ação de reparação de danos por fato de serviço, aí incluindo os decorrentes das relações de consumo entre segurado e seguradora, não revogou o art. 178, § 6º, II do Código Civil, sendo esse dispositivo mais amplo, a englobar as demais ações entre segurado e seguradora.
(REsp 232.483/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/02/2000, DJ 27/03/2000, p. 113) (g.n)
SEGURO. PRAZO. APLICAÇÃO DA PRESCRIÇÃO ÂNUA E NÃO DA QÜINQÜENAL PREVISTA NO CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR. FUNDAMENTAÇÃO
QUANTO À PRESCRIÇÃO ÂNUA INEXISTENTE NO ESPECIAL. SÚMULA Nº 283 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. Esta Corte, em casos como o dos presentes autos,
entendeu incidente a prescrição ânua do Código Civil e não a qüinqüenal do Código de Defesa do Consumidor.
2. Não desafiada a contagem do prazo feita pelo acórdão recorrido para o efeito da prescrição ânua, não há como prosperar o especial, à míngua de fundamentação.
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3. Recurso especial não conhecido.(REsp 489.689/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/09/2003, DJ 01/12/2003, p. 349)
CIVIL - PRESCRIÇÃO - RESPONSABILIDADE CONTRATUAL - CONTRATO DE SEGURO - ART. 178, § 6º, INC. II, DO CÓDIGO CIVIL - CODECON - SÚMULA 101/STJ.
I - O Código de Defesa do Consumidor, como lei nova, estabeleceu disciplina especial apenas quanto à ação de reparação de danos por fato de serviço, não revogando o art. 178, § 6º, II, do Código Civil, dispositivo mais amplo, pois engloba toda e qualquer ação entre segurado e segurador.
II - A jurisprudência desta Corte, consolidada por sua Súmula 101, posterior, inclusive, ao Código de Defesa do Consumidor, é no sentido de que a ação do
segurado contra a seguradora, decorrente do contrato de seguro, prescreve em um ano.
III - Precedente.
IV - Recurso conhecido e provido.
(REsp 255.147/RJ, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/02/2001, DJ 02/04/2001, p. 290)
Ademais, na Cláusula 25 do referido contrato (documento 00024 do anexo), as partes elegeram o foro da Comarca de Curitiba, Estado do Paraná para dirimir eventuais dúvidas decorrentes dos mesmos.
Não obstante, consoante Súmula nº 335 do Supremo Tribunal Federal: “É válida a cláusula de eleição do foro para os
processos oriundos do contrato.”
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Sendo caso, portanto, de aplicação do disposto no artigo 111, do Código de Processo Civil:
“Art. 111. A competência em razão da matéria e da hierarquia é inderrogável por convenção das partes; mas estas podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde serão propostas as ações oriundas de direitos e obrigações.
§ 1o O acordo, porém, só produz efeito, quando constar de contrato escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico.
§ 2o O foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.”
No mesmo sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme aresto a seguir exemplificado, verbis:
“Processo AREsp 269426 Relator(a)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA Data da Publicação
04/06/2013
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 269.426 - SP (2012/0253936-4)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA DECISÃO
Trata-se de agravo em recurso especial interposto pela Casa das Tintas Comércio de Tintas Ltda., com
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fundamento no artigo 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, contra acórdão do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado:
"MONITÓRIA - EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA -
CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO - PRETENSÃO DE REFORMA DA DECISÃO QUE ACOLHEU A EXCEÇÃO OPOSTA E DETERMINOU A REMESSA DOS AUTOS À COMARCA DE DOMICÍLIO DO RÉU - CABIMENTO – Cuidando-se de competência relativa, deve predominar o foro de eleição, exceto se presente a hipossuficiência, hipótese não verificada nos autos. Recurso provido" (fl. 168).
A agravante infirmou os fundamentos da decisão denegatória, buscando o processamento do apelo nobre.
É o relatório. DECIDO.
Presentes os pressupostos de admissibilidade do agravo, passa-se à análise do recurso especial. Nas razões recursais, sustenta a recorrente violação dos artigos 110, alínea "a", e 112, parágrafo único, do Código de Processo Civil, afirmando, em síntese, que "fica evidente que o foro competente é o da Ré ora Recorrente, qual seja, o foro cível da Comarca de Criciúma-SC" (fl. 184). Sem razão, contudo.
Eis os fundamentos do acórdão impugnado, no que interessa à espécie:
"(...)
Não se observa incorreção alguma no ajuizamento da demanda no Foro da Comarca de São Bernardo do Campo. Tendo sido ajustado entre as partes um
foro de eleição (cláusula 16ª - fls. 21), este deve prevalecer, salvo nos casos de nulidade da cláusula,
em contrato de adesão (CPC, art. 112, § único), o que não ocorre no caso em exame. Conforme o
enunciado da Súmula nº 335 do C. Supremo Tribunal Federal, é válida a cláusula de eleição do foro para
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(...)
Pelo exposto, dá-se provimento ao recurso para
rejeitar a exceção, reconhecendo o juízo da
Comarca de São Bernardo do Campo como competente para julgar a demanda. (...)" (fls. 169/170 - grifou-se).
A recorrente, por sua vez, deixou de impugnar especificamente os fundamentos do julgado atacado, acerca de que, não se tratando de contrato de adesão, deve, nos termos do enunciado
nº 335 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, prevalecer o foro de eleição acordado entre as partes, motivo pelo qual, é de se aplicar, por
analogia, o óbice previsto na Súmula nº 283 do Supremo Tribunal Federal.
(...)
Ante o exposto, conheço do agravo para negar seguimento ao recurso especial.
Ressalve-se que a relação jurídica entre as partes decorre do
contrato de seguro (fls. 33/35), cujo foro de eleição não pode ser ignorado.
Destarte, se não há propriamente uma relação jurídica de direito material entre o Excepto e a Seguradora; eis que esta não faz parte do contrato avençado, a cláusula de eleição de Foro é válida e deve ser observada.
Ex positis, NEGO PROVIMENTO ao recurso.
Rio de Janeiro, de de 2014.