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"NAo ME ESTRAGUE 0 DlA"{*) E 0 DlSCURSO DOS PARALAMAS DO SUCESSO ENTRE 0 MODERNO E 0 POS-MODERNO

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Academic year: 2021

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"NAo ME ESTRAGUE 0 DlA"{*) E 0 DlSCURSO DOS PARALAMAS DO SUCESSO ENTRE 0 MODERNO E 0 POS-MODERNO

ABSTRACT: "Niio me estrague0dia" was the song chosen to be the conducting line in the comprehension of the ideologies found in Herbert Vianna's speech. in Severino's CD. Thus, we aim at understanding the complexity of Paralamas do Sucesso's speech as the representatives of the contemporary mentality.

"Niio estrague 0meu dia" (Severino, 1994), dos Paralamas do Sucesso,

c

urn marco (entre outras can~oes desse mesmo trabalho, como "0 Rio Severino", por exemplo) de sua fase transitoria entre a modemidade e a pos-modemidade.

Nesta can~iio, apresenta-se a dialetica de dois sujeitos historico-sociais distintos e a visiio de mundo dos autores sobre 0dilema desses sujeitos. Neste sentido, tomamos este discurso como fio condutor das ideologias veiculadas por ele. Estas (as visoes ideologicas), constituem 0 grande rio atado it sociedade it qual pertencem os sujeitos discursivos que, mais do que vozes do discurso ou personagens dessa poesia narrativa, caracterizam-se por serem sujeitos historicos, logo, sujeitos ativos na forma~ao ou transforma~iio do mundo.

o grupo, porem, possui uma trajetoria complexa e em constante muta~ao. Seu discurso e sua visiio de mundo, bem como a maneira de concebe-los, perpassam os limites da modemidade e da pos-modemidade ao longo de sua carreira, pois caminham de uma it outra postura misturando caracteristicas desses dois polos por apresentarem, conforme veremos, influencia de ambos. Por este motivo, podemos afumar que os Paralamas do Sucesso retratam os dilemas do homem contemponlneo, isto e, seus proprios dilemas, ja que siio sujeitos historicos e representantes das decadas de 80 e 90.

Nosso intuito, com a analise dessa can~ao, e mostrar que "Niio me estrague 0dia" refere-se aos dilemas de homens sem rumo, perdidos, sem caminho a seguir, sem metas ou ideais, enfim, sem perspectivas, cren~as ou valores ...homens instaveis, incertos e perplexos como eles, como nos ...homens do fim do seculo.

Nossa analise calca-se em reflexoes sobre 0discurso (Bakhtin, 1981; Maingueneau, 1989) que enfatizam a importftncia dos sujeitos da enuncia~iio, concebidos como

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severino-proletirio, estraga0dia do burgues-patriio, colocando a nu tambcm sua pratica social autoritiria e desprezivel.

As vozes discursivas sao facilmente apreendidas e bem marcadas ate ortograficamente.

a

interessante

e

que a can~ao come~a com a fala do proletlirio colocando-se como sujeito enunciador, possuidor da fala, e seu discurso esta marcado por estar destacado em letras maiusculas.

E

como se as letras garrafais quisessem marcar esse sujeito severino, colocando-o em destaque para que todos prestem aten~lio a sua vozlfalaldiscurso e, conseqiientemente, ao seu dilema, pois como veremos mais adiante, Herbert Vianna ir8 defender tal sujeito.

No segundo verso, aparece0outro sujeito discursivo, apropriando-se da fala, como sujeito ativo. Esta e a grande tensao da can~ao: a disputa actancial, ou seja, a disputa entre0poder de "fala" de ambos os sujeitos do texto enquanto sujeitos discursivos que detem, como a unica arma desta guerra, a linguagem.

Esta can~ao pode ser urn grande exemplo do estilo discursivo dos Paralamas do Sucesso, pois se levarmos em considera~ao a tonica tematica do trabalho ao qual pertence, Severino, veremos que este CD caracteriza-se pela critica social e pelo exercicio de dar a voz ao sujeito severino, urn sujeito discriminado e nao ouvido socialmente, caracterizando-se, neste sentido, como urn discurso modemo, que possui urn ideal, urn direcionamento a seguir.

Voltando as vozes discursivas presentes no enunciado desta poesia, percebemos que a estrutura do texto constitui-se como urn discurso p6s-modemo, pois encontramos na can~ao dois sujeitos fragmentados e misturados, mas que, ao mesmo tempo, tambcm podem ser claramente distinguiveis devido as marcas enunciativas e enuncivas presentes no discurso.

De urn lado, temos urn empresario sempre ocupado com seus neg6cios ("fazendo urn acerto"). Sabemos que e ele 0 sujeito com voz ativa no texto porque e 0 eu do discurso marcado pelo pronome possessivo (meu), pelo verbo em I' pessoa do presente do indicativa e no imperativo ("estou em reuniao", "nao estrague0meu dia", "diga que eu niio estou"), seu espa~o e0agui tambem marcado pelos verbos ("fazendo", "estou" e sua nega~ao ''niio estou" e pelos versos: "nurn belo apartamento", "num restaurante frances", mas principalmente pelo verso primordial da can~ao: "nao estrague 0meu dia" - quase0titulo da canfi:ao) e seu tempo e0agora marcado tam"em pelos verbos no presente do indicativo e no imperativo.

Por outro lado, temos0severino tambem como sujeito no texto. Afirmamos isso porque podemos depreende-lo por ser ele, ora urn tu, ora urn ele, urn outro que nlio0eu, marcado na falaldiscurso intemo do "burgues" no 14"verso ("oh, nao e voce de novo") e pelo principal verso da can~ao( "[voce] nao estrague 0 meu dia") e pelo 8" verso ("diga [a ele] que eu nao estou") que nos leva a uma debreagem enunciva, alem dos 2" e

4"versos da segunda estrofe,0refrao da musica("e tua alma brasileira que ainda veste essa cor" e

"e

tua alma posta a venda sem achar comprador").

Alem dessas marcas visiveis no texto, ha uma marca muito clara, no discurso verbal da canfi:ao,de que se tratam de dois sujeitos e de dois discursos distintos na musica, pois oralmente esse discurso

e

cantado em duas vozes: a voz do severino e cantada num tom mais alto, posta em destaque, como num "grito" desesperado, urn ultimo recurso ao voltar-se ao patrao reivindicando seus direitos. Ja a voz do burgues e cantada por urn coro, dando0efeito de sentido de fortaleza da voz e do discurso que ela carrega, apesar de ser cantada num tom abaixo (em relafi:aoa primeira).

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Ambos os dialogos expressam, cada urn,0dia-a-dia desses dois sujeitos distintos, representando seus mundos. Mundos que, apesar de distintos, convivem juntos e em rela~ao, na sociedade, principalmente nos meios de produ~ao. Urn dependendo do outro, como diria Marx (1982), urn dependendo da "mao-de-obra", 0outro, do "capital". Mas, mais que isso, ambos os mundos opostos03 pinUnide social, convivem em constante divergencia devido it conc~ao de mundo/ideologia e suas praxis diversas. Urn, explorando, 0outro, sendo explorado. Aqui, porem, 0 sujeito que possui a "mao-de-obra" como instrumento de trabalho nao

e

urn sujeito alienado ou "assujeitado", ao contrilrio, e urn operario engajado que reivindica melhores condi~Oes de trabalho c exatamente por isso e que incomoda ou, como0pr6prio titulo da can~ao nos antecipa, "estraga"0dia do burgues.

A voz veiculada pelo severino e colocada ativamente pelo exercicio do dialogo no texto e uma voz que expressa seus conflitos intemos c a miseria de seu mundo, enquanto que a voz veiculada pelo burgues, retrata as "maravilhas" do mundo do capital, mas mais que isso, retrata, principalmente, a indiferen~a e0descaso com que esse sujeito lida com 0 sujeito oprimido, sem atende-lo e sem ouvi-lo, nao dando importincia ou valor algum a ele, ignorando sua existencia, tratando-o como uma nao-pessoa e, assim, mais uma vez como diria Marx (1989), "coisifica a persona" ao trata-la como urn objeto qualquer. Seu discurso e subversivo, pois retrata urn sujeito nada assujeitado que reivindica aurnento porque

e

explorado e nao consegue sobreviver porque "esta faltando" e "ainda e come~o de mes".

A atitude de recusa e rebeldia, do sujeito severino, ou seja, a atitude do anti-sujeito e do anti-heroi que nao quer se "colocar no seu lugar", caracterizado por ser do contra, reivindicando aumento, pedindo, implorando ("ajoelhado") ...e que incomoda 0"dODO do capital", "estragando" seu dia, pois0operario engajado utiliza-se de todas as formas possiveis ao seu alcance, ou seja, a linguagem (sua Unica arma e sua voz/fala/discurso) para fazer-se enxergar, colocando sua realidade a '1m" frente aos olhos do burgues-capitao.

o

titulo da can~ao, "Nao me estrague0dia", e repetido pela voz que representa 0 sujeito capitalista "nao estrague 0 meu dia". Este e0verso principal do poema, pois insere em si todo0dilema e a tensao existente entre os dois sujeitos do discurso e suas realidades tao diversas.

Quanto ao rerrao, e ele a sintese da dialetica discursiva hem posta entre os dois sujeitos, pois, por urn lado, os 1"e 3· versos, que silo identicos, expressam 0ponto de vil>tado severino, representando a inconformidade, a revolta da condi~ao em que este vive ('·nada justifica essa dor''); por outro lado, encontra-se a voz do narrador nos

i

e 4· versos. Este, como narrador/mediador do discurso e que ate aqui encontrava-se fora do mesmo e seu grande enunciador. 0 sujeito que, com'0dialogo direto, amarra 0texto, obtem urn efeito de sentido de verdade, conseguindo persuadir e convencer 0leitor a optar por urn dos discursos colocadosittona.

Politicamente,

ha

no texto dois discursos representados pelos dois personagens: 0 discurso tradicional e conservador retratado pela voz do capitalista, do patrilolburgues,0 discurso da direita; e0discurso subversivo, retratado pela voz do severino-operario, 0 proletario,0discurso da esquerda. Porem, esses discursos sao organizados dentro de urn outro discurso, ou seja, 0discurso da propria can~ao, em que

ha

0posicionamento do autor projetado 03figura do narrador. Este, opta pelo discurso da esquerda e, por isso,

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utiliza meios argumentativos que manipulam e persuadem 0 leitor a "seguir seu exemplo", optando pelo mesmo discurso.

o

enunciador deixa 0enunciatirio aparentemente livre para tomar a postura que quiser, mas, no nivel profundo, coloca a postura subversiva, engajada e reivindicadora do proletario como politicamente correta, ao passo que, opostamente, coloca a postura tradicional, do "dono do capital", como politicamente incorreta, principalmente, frente aos problemas e

a

rela~ao que estabelece com0operario. Desta forma, nao deixa op~ao alguma ao leitor que, sem se aperceber, reitera0discurso defendido pelos Paralamas do Sucesso, defendendo a postura do marginal.

Vale dizer que 0 refrao e cantado apenas pelo narrador, sem 0 coro que 0 acompanhava durante todas as falas do capitalista. Isso da urn efeito de sentido de jun~ao ou, se quiser, sintese da dialetica bem posta no discurso. 0 narrador apresenta-se no refrao indignado, tal qual 0 severino, nao se conforma nem se convence sobre a condi~ao desumana em que se encontra tal sujeito, uma condi~ao de "fim da linha", na verdade, uma faha de condi~ao e de opl;ao,0limite do ser que, para sobreviver, vende a propria alma, segundo0discurso da can~ao, "sem achar comprador".

Podemos dizer ainda que este discurso cumpriu com seu proposito essencial,0da persuasao, pois 0 enunciador convence0 enunciatario, via manipula~ao competente, a indignar-se e a tomar partido do sujeito severino como sujeito que tern sua voz, seus dilemas, enfim, como sujeito historico-social e, principalmente, como sujeito humano.

Em suma, 0 discurso dos Paralamas do Sucesso constroi-se como urn discurso contemporaneo, composto, tanto pelo discurso pos-modemo, devido

a

mistura das vozes fragmentadas, como pelo modemo, por revelar uma visao de mundo critica sobre a dialetica existente entre dois mundos historico-socio-culturais distintos. Mais ainda, podemos afmnar que ele constitui-se como urn discurso complexo, afmal, agrega elementos opostos, colocando, de maneira critica, a problematica de sua convivencia sem apontar solu~ao, ou seja, sem fundi-Ios na supera~ao sintetica da dialetica hegeliana e sim, deixando-os con-viver, como ocorre no mundo e no proprio homem, que contem em si, caracteristicas "sapiens" e "demens", constituindo-se, conforme Morin (1998), como "homo sapiens-demens".

Como vimos, esta can~ao possui urn discurso complexo, bem amarrado pelas teias argumentativas que, trabalhadas em forma de dialogo, conferem-lhe urn sentido global. "Nao me estrague0dia" e urn exemplo do estilo dos Paralamas do Sucesso que possuem, como uma de suas caracteristicas recorrentes, 0discurso contemporaneo da complexidade que mescla caracteristicas da modemidade e da pos-modemidade.

Optamos pelo percurso d'agua do rio em fios discursivos. Nosso leito condutor foi o dialogo travado pelas vozes das personagens da can~ao e, com esse fio, navegamos pelo rio e tecemos nossa teia complexa, reatando nossas aguas.

RESUMO: ''Nao me estrague 0dia" foi a can~ao tomada por nos como fio condutor para0entendimento das ideologias veiculadas pelo discurso de Herbert Vianna, no CD

(5)

Severino. Desta forma, pretendemos compreender a complexidade discursiva dos Paralamas do Sucesso como representantes do discurso contemporfmeo.

ANEXO

Segue anexa a letra da can~ao analisada:

GERANDO UM FILHO Fazendo urn acerto PLANTANDO MILHO Estou em reuniao PEDINDO AUMENTO Nao estrague 0meu dia PASSANDO FOME Diga que eu nao estou NA CONSTRUCAo Num 0010 apartamento NO HOSPITAL

Num restaurante frances AJOELHADO

Oh, nao

e

voce de novo ESTA FALTANDO Ainda

e

come~o de mes

LETRA: HERBERT VIANNA

MUSICA: BI RIBEIRO/HERBERT VIANNA

NADA JUSTIFICA ESSA DOR

E

tua alma brasileira que ainda veste essa cor NADA JUSTIFICA ESSA DOR

E

tua alma posta itvenda sem achar comprador

BAKHTIN, M .. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Sao Paulo: Hucitec, 1981. MAINGUENEAU, D .. Novas Tendencias em Analise do Discurso. Campinas: Pontes /

Editora da UNICAMP, 1989.

MARX, K. 0 Capital. Sao Paulo: Difel, 1982.

MORIN, E. Ciencia com Consciencia. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.

__ . Amor Poesia Sabedoria. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.

PARALAMAS DO SUCESSO. "Nao me estrague 0dia". IN: Severino. Rio de Janeiro: Emi Music Uda, 1989.

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